sábado, 9 de janeiro de 2016

Teoria geral da fraude, da mentira e da corrupcao - Paulo Roberto de Almeida


Teoria geral da fraude, da mentira e da corrupção

Paulo Roberto de Almeida

Escrevo esta crônica em minha qualidade de cidadão, pagador regular de impostos, plenamente consciente de meus direitos e obrigações, não enquanto funcionário público, da carreira diplomática, servidor do Estado (não necessariamente do governo atual) e plenamente consciente das regras legais que impõem restrições a pronunciamentos relativos à política externa ou ao exercício das funções diplomáticas. Nada do que vou dizer tem algo a ver com essas duas vertentes funcionais, e sou portanto livre de me expressar de acordo com minha consciência e deveres cívicos.
A sociedade brasileira tomou consciência – pelo menos seus setores mais esclarecidos – de que o Brasil vem sendo comandado, desde o início de 2003, por uma organização política especial que tomou posse do poder por meios legais, mas que vem se desempenhando no exercício do poder com a intenção de nele permanecer por todos os meios possíveis, legais e ilegais. Pode ser que, no início de suas atividades políticas essa organização não tivesse ainda adquirido todas as características que são as suas atualmente, mas é um fato que suas ações, desde vários anos, tem sido compatíveis com as atividades de uma organização especial em suas manifestações práticas. Tanto é assim que boa parte dos seus dirigentes ou estão sendo processados, ou já foram condenados e cumprem penas, e vários outros serão provavelmente objeto de novas investigações e possivelmente condenados também.
O motivo pelo qual essa organização especial não foi ainda afastada do poder se explica, principalmente, pelo fato de que certa parte daqueles que deveriam julgá-la e condená-la, no âmbito do legislativo ou do judiciário, se encontra ou envolvida nos esquemas de beneficiamento – legal ou ilegal – promovidos por essa organização, ou então é conivente com ela e com seus propósitos, pelo fato de ocupar cargos e funções justamente concedidos por ela. Não se pode vislumbrar, na presente circunstância, condições para que ela venha a ser constitucionalmente afastada do poder, por faltar, justamente, maioria consistente, nesses dois âmbitos, que pudesse se pronunciar em consonância com os meios constitucionais para lograr esse objetivo, que é o da maioria da cidadania. Não existem essas condições inclusive porque a situação econômica ainda não se deteriorou suficientemente para “obrigar” representantes políticos e funcionários do judiciário a adotar uma resposta decisiva ao quadro de descalabro econômico e de erosão moral que integram o processo que pode ser chamado de “Grande Destruição”.
Os cidadãos conscientes são, portanto, obrigados a conviver, por algum tempo mais, com a fraude, com a mentira e com a corrupção, que já se tornaram, desde vários anos, instrumentos corriqueiros de poder, mecanismos de funcionamento do sistema político e alavancas da hegemonia política ainda exercida pela dita organização. Esta é constituída, basicamente, por representantes de antigas correntes alternativas do movimento sindical – que se profissionalizaram rapidamente no peleguismo habitual nesses meios –, por sobreviventes da antiga guerrilha reciclados na atividade política não armada – mas que adquiriram, preservaram e aperfeiçoaram, alguns por treinamento de conhecidas ditaduras, técnicas das antigas organizações clandestinas a que pertenciam – e por uma grande maioria de militantes ingênuos, mal informados ou oportunistas, que partilham, vagamente, dos antigos ideias de justiça social e de distributivismo estatal que essa organização sempre pregou (no começo, provavelmente de modo sincero, depois como tática de preservação do poder).
O que estamos contemplando, no momento presente, é um sistema de poder que se baseia exatamente no trinômio que figura no título desta crônica: fraude, mentira e corrupção. São três crimes políticos que deveriam ser sancionados pelos poderes do Estado, não estivessem estes cingidos por determinados arranjos e combinações que se originam justamente no governo em vigor, que se utiliza dessas ferramentas para se perpetuar no poder. A cidadania consciente já tentou, por diversas maneiras, pressionar aqueles representantes e funcionários desses poderes do Estado a tomar alguma atitude digna, que pudesse livrar o país e a sociedade do pesadelo que é conviver com a podridão moral do partido no poder, responsável quase exclusivo pela Grande Destruição que atingiu o país e que vai demandar anos de sofrimentos à população para ser contornada e superada. Não estamos vendo, no momento presente, circunstâncias possíveis, e condições favoráveis, para que uma nova situação política se instale.
É muito provável, assim, que o estado atual de deterioração econômica, de erosão institucional e de descalabro moral continue durante mais algum tempo, até que outras condições e circunstâncias surjam e imponham alguma outra solução que não a continuidade do pavoroso quadro social e político que somos obrigados a suportar na presente conjuntura de declínio ético em nosso país. Os cidadãos conscientes – que já formam uma maioria em favor de uma mudança radical nos esquemas de poder em vigor, de acordo com o que as pesquisas revelam – se sentem impotentes ante o quadro descrito, daí o motivo para que alguns mais exasperados, mas equivocados, estejam sugerindo meios extralegais de alteração da situação atual. Não é o caso da maioria dos cidadãos conscientes, e deste servidor do Estado, que continuará a lutar por todos os meios legais para que a dignidade política seja plenamente restabelecida no país.
Esta crônica dos tempos correntes não existiria e não seria necessária fossem outros os personagens de nosso sistema político; ela existe pela simples consciência de um dever cívico.

[Anápolis, 23 de novembro de 2015, 3 p.

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