Não se sabe o que pretende fazer o governo ou a diplomacia brasileira, em face dos problemas crescentes na Venezuela, com um impasse total entre a Assembleia eleita democraticamente e os dois outros poderes, dominados pelo chavismo e até agora apoiados pelos militares.
Argentina deveria assumir o protagonismo diplomático para tentar resolver os impasses.
Depois do golpe contra o governo Chávez, em 2002, o Brasil dos companheiros, ainda que explicitamente favorável ao governo chavista, liderou um esforço de pacificação, chamado "Amigos da Venezuela" (que era majoritariamente de amigos do Chávez).
E agora, o que se faz?
Aparentemente nada...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília 23 de janeiro de 2016
Rejeição a decreto aprofunda embate entre chavismo e
Legislativo
POR JANAÍNA FIGUEIREDO, CORRESPONDENTE
O Globo, 23/01/2016
7:00 / atualizado 23/01/2016 7:00
Maduro fica sem opção na
Assembleia para aprovar emergência econômica
BUENOS AIRES -
Depois de uma semana de forte tensão e troca de acusações entre Executivo e
Legislativo, a bancada majoritária da oposição na Assembleia Nacional (AN) da
Venezuela rejeitou ontem, por 107 votos contra 53, o decreto de emergência
econômica enviado há uma semana pelo presidente Nicolás Maduro. No debate
prévio à votação, congressistas do governista Partido Socialista Unido da
Venezuela (PSUV) acusaram a Mesa de Unidade Democrática (MUD) de “estar virando
as costas para o país”. Deputados opositores reiteraram que o polêmico decreto
daria “amplos poderes ao presidente para, até mesmo, expropriar empresas” e
denunciaram o que consideram uma “armadilha” do governo Maduro “para tentar
transferir a responsabilidade da crise”.
Já durante a semana, quando
as mais altas autoridades da AN anteciparam a rejeição do decreto, o chefe de
Estado assegurou lamentar muito “este giro negativo, muito negativo, que tem
mais a ver com outros planos e não com os que possam permitir sair desta
situação”. O governo chegou a consultar antecipadamente o Tribunal Supremo de
Justiça (TSJ), que decidiu pela constitucionalidade do decreto. A maioria
opositora na AN, entretanto, avisou que a prerrogativa de aprovar ou rejeitar a
medida é do Legislativo, abrindo caminho a um novo embate também com o
Judiciário, controlado pelos chavistas.
— Criar um novo confronto
seria um erro por parte do governo, a última coisa de que precisamos neste
momento é de confronto. Nós estamos dispostos a dialogar e fizemos uma série de
propostas ao Executivo — disse ao GLOBO o deputado da MUD Elias Mata, que
integrou a comissão parlamentar de avaliação do decreto.
O presidente da comissão,
deputado José Guerra, defendeu ontem a necessidade de “ter uma nova política
fiscal e, principalmente, de fazer um esforço conjunto para ter um novo modelo
de país, um modelo de progresso”.
— Este governo nos colocou
num atoleiro e hoje está desnorteado, não sabe o que fazer com o país — afirmou
Guerra. — Seria irresponsável aceitar um decreto desta magnitude às cegas,
amputaríamos as competências da AN. Quem passou por uma faculdade de Economia
não pode redigir um documento como esse.
Em seu relatório entregue
ao Legislativo, a comissão comandada pelo deputado deixou claro que o decreto
não podia obter sinal verde por várias razões: implicaria a anulação das
funções do Parlamento; não protege o gasto social; omite causas centrais da
crise econômica, como o modelo cambial; deixa espaço para gastos descontrolados
do governo; e não garante a estabilidade da moeda.
— A rejeição do decreto não
deveria gerar um conflito, já que a Assembleia está usando suas competências
constitucionais e foi dada ao governo a possibilidade de explicar o decreto,
algo que o Executivo não fez — disse o deputado da MUD Enrique Márquez.
Com um resultado que era
esperado, a minoria parlamentar do PSUV, autoproclamada “bancada patriótica”,
aproveitou o debate para insistir num ponto central do discurso chavista:
acusar a oposição de não querer colaborar com o governo para superar a crise.
— Ninguém duvida de que
estamos atravessando uma emergência econômica, e vocês, como oposição, devem decidir
que atitude tomam. Estão contrariando as ações de um governo que pretendem
derrubar num prazo de seis meses, como disse próprio o presidente da AN, Henry
Ramos Allup — criticou o deputado Héctor Rodríguez, líder do bloco.
Em meio a aplausos de seus colegas
de bancada, Rodríguez disse que a oposição venezuelana “deve optar entre estar
a favor ou contra o povo venezuelano”. Para os congressistas do PSUV, ontem a
MUD “virou as costas para o país”.
As acusações foram
rebatidas por vários deputados da oposição, entre eles Omar Barboza, que
insistiu na “armadilha de Maduro para tentar se livrar da culpa de uma crise
que foi provocada por seu governo”.
— Por que o governo não
decretou a emergência econômica antes, quando tinha maioria parlamentar? Por
que não discutiu o decreto com a nova AN, sabendo que já não tinha maioria?
Vejo muito cálculo político em tudo isso — alfinetou Barboza.
A oposição deixou claro que
não vai abrir mão de suas faculdades constitucionais e pediu ao Palácio de
Miraflores a negociação de um “pacto para respeitar as atribuições
constitucionais de cada um dos Poderes que existe no país”.
A Venezuela viverá um
conflito permanente de Poderes que poderia incluir, até mesmo, uma tentativa da
Assembleia Nacional (AN) de destituir ministros do governo do presidente
Nicolás Maduro. Essa é a avaliação de Luis Vicente León, diretor da empresa de
consultoria Datanálisis, que ainda vê o chefe de Estado “com poder político
suficiente para permanecer no Palácio de Miraflores”.
A oposição acusou o
governo de enviar o decreto de emergência sabendo que seria rechaçado para,
assim, poder culpar a Mesa de Unidade Democrática (MUD) pela crise...
Isso está bastante claro. A
aprovação do decreto era praticamente impossível. Teria permitido o uso de
créditos e recursos do Estado sem controle; a intervenção de empresas privadas
sem passar pela Justiça; e até mesmo a implementação de confiscos.
O que vai acontecer
agora?
Acho que o governo adotará
as mesmas medidas que pretendia aplicar com o decreto, mas sem ele.
Mas isso seria legal?
O governo pode usar o
Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) para obter a aprovação. Legal não é, porque o
decreto foi rechaçado pela AN. Mas na Venezuela de hoje assim é como se
governa. Maduro dirá que a oposição é culpada pelo agravamento da crise e isso
vai ajudá-lo a unificar o chavismo e confundir setores independentes.
Haverá um choque de
Poderes permanente?
Sim. O governo vai
continuar usando o TSJ para boicotar a AN.
E a oposição avançará
com seu plano de buscar uma maneira de tirar Maduro do poder?
A oposição já disse que vai
buscar os mecanismos para tirar Maduro nos próximos seis meses. Mas não está
claro se conseguirá isso. O presidente ainda tem poder político para
permanecer. Ele controla o TSJ, tem dinheiro, o apoio dos militares, de meios
de comunicação...
Qual poderia ser o
próximo conflito de Poderes?
A AN poderia pedir o
impeachment dos ministros da equipe econômica. Com a maioria qualificada, a MUD
pode fazer isso. E o governo pode apelar ao TSJ para impedir uma ação desse
tipo. As tensões serão cada vez maiores.
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