Estou terminando um longo ensaio sobre o colega diplomata, mas sobretudo um grande intelectual, talvez o maior que tenha integrado a carreira diplomática, que ainda precisa ser revisto e normalizado para fins de publicação.
Eis o esquema e a bibliografia, limitada à parte de ciência política, excluindo portanto toda a parte de crítica literária.
José Guilherme Merquior: o esgrimista liberal
Paulo Roberto de Almeida
A caracterização de Merquior como “esgrimista liberal” foi atribuída pelo grande intelectual mexicano Enrique Krauze ao embaixador brasileiro pouco depois de seu precoce falecimento, em janeiro de 1991. José Mario Pereira, o editor da Topbooks que, à exceção do “último”, sobre o Liberalismo antigo e moderno, publicou os derradeiros livros do intelectual, diplomata e acadêmico (nessa ordem), transcreveu um trecho da homenagem do historiador mexicano no comovente ensaio que Pereira preparou sobre o “fenômeno Merquior” para a coletânea organizada por Alberto da Costa e Silva: O Itamaraty na Cultura Brasileira (Brasília: Instituto Rio Branco, 2001; pp. 360-378).
(...)
[Seções:]
Uma produção intelectual extraordinariamente rica, diversificada, densa
Merquior diplomata: o sistema internacional e a Europa ocidental
A legitimidade intelectual de Merquior, diplomata
Rousseau e Weber na trama da legitimidade
A natureza do processo
O argumento liberal: o liberalismo moderno é um social-liberalismo
Reflexões sobre os liberalismos contemporâneos
O marxismo ocidental: um debate para encerrar o ciclo dos irracionalismos
Entre o marxismo e o liberalismo, a Revolução Francesa repensada
O liberalismo, antigo e moderno: a “Suma” de José Guilherme Merquior
A trajetória intelectual de José Guilherme Merquior: o triunfo da razão
(...)
[Final:]
Teria Merquior sido um grande chanceler para o Brasil? Provavelmente sim, mas creio que o Itamaraty seria muito pequeno, e muito burocrático, para ele. No cargo, poderia ter reformado rituais e comportamentos do estamento diplomático, num sentido iluminista, liberal e liberista; mas ainda assim, isso seria pouco para o seu espírito libertário. O que ele teria feito, certamente, seria iluminar com a sua notável inteligência os métodos e os objetivos de trabalho, colocando a razão, e o sentido da História, acima de quaisquer outras conveniências conjunturais, o que provavelmente teria provocado resistências burocráticas, corporativas e de grupos de interesse econômico. Seria tolerante com os pecados menores de uma burocracia tradicional como o Itamaraty, mas teria deixado uma marca indelével na instituição. Para repetir sua tese na London School, inauguraria um período de “burocracia carismática” na velha Casa de Rio Branco, o que talvez a tivesse transformado para sempre, inaugurando novos padrões de inteligência. Vários colegas, dotados do mesmo espírito, mas hoje cingidos pelas regras sacrossantas da hierarquia e da disciplina, partilhariam e apoiariam tais intenções. Teria sido divertido...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3577: 7 de fevereiro 2020
Referências bibliográficas:
Obras de José Guilherme Merquior consultadas para este ensaio:
“O discurso como orador da turma do Instituto Rio Branco de 1963”, in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 39-45.
“O sistema internacional e a Europa Ocidental” (Bonn, janeiro-fevereiro de 1973). [Brasília:] Ministério das Relações Exteriores, 1973 (separata).
O estruturalismo dos pobres e outras questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1975.
A Estética de Lévi-Strauss. Brasília: Editora da UnB, 1975.
L’Esthétique de Lévi-Strauss. Paris: PUF, 1977.
De Anchieta a Euclides: breve história da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977.
O problema da legitimidade em Política Internacional: tese apresentada no I Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco (1978); in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 48-80.
Rousseau and Weber: two studies in the theory of legitimacy. Londres: Routledge & Kegan Paul, 1980.
O fantasma romântico e outros ensaios. Petrópolis: Vozes, 1980.
As Ideias e as Formas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.
A natureza do processo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
O argumento liberal. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983.
Michel Foucault ou o niilismo da cátedra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
Crítica, 1964-1989: ensaios sobre arte e literatura. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.
Western Marxism. Londres: Paladin, 1986; 1991.
O Marxismo Ocidental. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986; São Paulo: É Realizações, 2018.
“El otro Occidente: um poco de filosofia de la história desde Latinoamerica”, Cuadernos Americanos Nueva Epoca, n. 13, enero-febrero 1989.
“O repensamento da Revolução”, in: Furet, François; Ozouf, Mona (orgs.). Dicionário Crítico da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, pp. xvii-lvii.
Liberalism old and new. Boston: Twayne Publishers, 1991.
O Liberalismo, antigo e moderno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991; tradução do original em inglês de Henrique de Araújo Mesquita.
Algumas reflexões sobre os liberalismos contemporâneos (1986). Rio de Janeiro: Instituto Liberal do Rio de Janeiro, 1991, 27 p.
Outras obras:
Almeida, Paulo Roberto de. Révolutions bourgeoises et modernisation capitaliste: Démocratie et autoritarisme au Brésil. Sarrebruck: Éditions Universitaires Européennes, 2015.
_______ . Marxismo e socialismo no Brasil e no mundo: trajetória de duas parábolas da era contemporânea. Brasília: Edição de Autor, 2019.
Azambuja, Marcos Castrioto. “Merquior: dois momentos e duas dimensões”, in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 21-24.
Campos, Roberto. “Merquior, o liberista”, prefácio a O Liberalismo, antigo e moderno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991, pp. 1-14.
Costa e Silva, Alberto da (org.): O Itamaraty na Cultura Brasileira. Brasília: Instituto Rio Branco, 2001.
Fonseca Jr., Gelson. “Introdução ao texto O problema da legitimidade em Política Internacional”, in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 31-38.
Franco, Afonso Arinos de Melo. O índio brasileiro e a Revolução Francesa: as origens brasileiras da teoria da bondade natural. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1937.
Furet, François; Ozouf, Mona (orgs.). Dicionário Crítico da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989; Prefácio de José Guilherme Merquior; tradução de Henrique Mesquita.
Gellner, Ernest; Cansino, César (orgs.). Liberalism in modern times: essays in honour of José G. Merquior. Londres: Oxford University Press, 1996.
______ . Liberalismo, fin de siglo. Almeria: Editorial Universidad de Almeria, 1998.
Lafer, Celso. “José Guilherme Merquior: O problema da legitimidade em Política Internacional”, in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 9-14.
Pereira, José Mario. “O fenômeno Merquior” in: Alberto da Costa e Silva (org.): O Itamaraty na Cultura Brasileira. Brasília: Instituto Rio Branco, 2001, pp. 360-378.
Ricupero, Rubens. “A diplomacia da inteligência”, in: Lafer et alii, José Guilherme Merquior, diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 15-20.
Seixas Corrêa, Luiz Felipe de. “José Guilherme Merquior: um depoimento pessoal”, in: Lafer, Celso et alii. José Guilherme Merquior, Diplomata. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1993, pp. 25-30.
Universidade de Brasília, Encontros Internacionais da UnB, Brasília, Editora da UnB, 1980.
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