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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 3 de maio de 2022

A homenagem de Ricardo Vélez-Rodríguez ao grande mestre Antonio Paim

 Blog de Ricardo Vélez-Rodríguez em: 02/05/2022

ANTÔNIO PAIM: UM ANO DE SAUDADE

Alex Catharino convidou-me para fazer, na noite de 30 de abril, uma live em memória do querido Mestre Antônio Paim (1927-2021), falecido há um ano. Vou pinçar alguns momentos que vivi perto do Mestre, ao longo dos 49 anos durante os quais tive o privilégio de privar da sua amizade e orientação intelectual. 

Lembro-me da manhã da segunda-feira após a semana de Carnaval de 1973, quando o conheci na PUC do Rio. Tinha vindo da Colômbia com uma bolsa da OEA, para fazer o mestrado em Pensamento Brasileiro. O Mestre, que reconhecia um esquerdista à quilômetros, me perguntou acerca do meu interesse pelo Curso. Frisei que me interessava em geral pelo pensamento latino-americano. Ele me respondeu, com certa rispidez, que o Curso da PUC não era de pensamento latino-americano, mas brasileiro. Mas, enfim, queria fazer o mestrado e não discuti com ele. 

Na hora de definir o tema da minha pesquisa, falei que me interessava estudar as origens do autoritarismo brasileiro. Ele me informou, então, que precisaria ler muitos jornais do início do período republicano, pois o autor a ser estudado, Júlio de Castilhos (1860-1903), tinha sido redator de A Federação, o jornal dos ativistas gaúchos alcunhados de Castilhistas, frisando que o pensamento do mencionado autor encontrava-se disperso nos editoriais desse jornal, ao longo das décadas de 80 e 90 do século XIX. 

Topei fazer a pesquisa, para o qual tive de me deslocar por algum tempo para o Rio Grande do Sul, além de consultar as fontes que se achavam no Rio, na Biblioteca Nacional, na Biblioteca do Museu da Marinha. no Real Gabinete Português de Leitura e na Sociedade Sul-riograndense de Cultura. Peguei uma alergia danada por conta dos ácaros presentes nos velhos jornais.

Paralelamente, claro, tive de ler toda a bibliografia existente sobre o Positivismo Gaúcho e as Guerras Civis que ensanguentaram a terra rio-grandense entre 1893 e o final do século XIX (guerra dos Pica-paus e Maragatos) e entre 1922 e 1923 (guerra dos Assissistas contra o eterno presidente do Rio Grande, Borges de Medeiros). E, como se tratava de identificar o pensamento dos Castilhistas em toda a sua extensão, inclusive do ângulo das críticas endereçadas pelos liberais sul-riograndenses contra o positivismo, teria de me familiarizar com os clássicos do Liberalismo: Locke, Montesquieu, Kant, os Pais Americanos (Washington, Madison, Jefferson, Jay, etc.) e com os críticos doutrinários do autoritarismo francês (Guizot, Constant, Tocqueville, Villemain, Cousin, Aron, etc.), além, é claro, de estudar as teses básicas do liberais gaúchos críticos do Castilhismo (notadamente Gaspar da Silveira Martins e Joaquim Francisco de Assis Brasil), assim como o pensamento de Rui Barbosa e Sílvio Romero, no que se refere à crítica à ditadura “científica”.

Defino jocosamente esse período como um autêntico estupro epistemológico. Em pouco mais de um ano tive de dar conta, em rigorosos informes semanais apresentados ao meu orientador (o Mestre Paim, coordenador do Mestrado, tinha definido que ele me orientaria). Apresentei a defesa da minha dissertação em dezembro de 1974, sob o título de: “A filosofia política de inspiração positivista no Brasil: o Castilhismo”. Daí sairia o meu livro intitulado: Castilhismo, uma filosofia da República, já na terceira edição. 

Um efeito colateral importante da minha dissertação: ao ler a ampla bibliografia liberal, notadamente as obras de Tocqueville, pude confessar o que Gilles Lipovetski falou acerca da sua conversão ao liberalismo: “Deixei Marx e adotei Tocqueville”. Pois bem: abandonei o marxismo e virei liberal. Não posso, em virtude disso, não acreditar na validade de uma conversão cultural! 

Continuei estudando o Liberalismo e fiz um Pós-Doutorado no Centre de Recherches Politiques Raymond Aron de Paris (entre 1994 e 1996), sobre o pensamento de Tocqueville, tendo contado com a eficaz e dedicada orientação do meu Mestre Paim e com a ajuda do amigo e saudoso embaixador José Osvaldo de Meira Penna (1917-2017), que me apresentou aos pesquisadores franceses. Foi possível, assim, para mim, receber orientação da grande estudiosa de Tocqueville na França, madame Françoise Mélonio (1951-), autora do clássico Tocqueville et les Français [Paris: Aubier, 1993]. Sob sua orientação publiquei, ulteriormente, pela Editora da Universidade de Toronto, o meu ensaio intitulado: Tocqueville au Brésil [Toronto University Press, The Tocqueville Review, Vol. XX, nº 1 – 1999: 147-176]. A restante parte da minha pesquisa sobre o liberalismo tocquevilliano foi publicada em duas obras: A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville [São Paulo: Mandarim,1998] e O liberalismo francês: a tradição doutrinária e a sua influência no Brasil [Juiz de Fora: Centro de Estudos Estratégicos Paulino Soares de Sousa, 2002] - Edição digital: https://static.poder360.com.br/2018/11/rodriguez_o_liberalismo_frances_trad_doutrinaria.pdf 

Tendo regressado à Colômbia no início de 1975, militei no Partido Liberal chefiado pelo ex-presidente Carlos Lleras Restrepo (1908-1994). Em decorrência das minhas atividades na extrema esquerda anteriores a 1973, não consegui voltar à Universidade Externado de Colômbia, de Bogotá, onde trabalhei antes de viajar ao Brasil para fazer o mestrado. Fui convidado pelo Reitor da Universidade de Medellín, o saudoso amigo Orión Alvarez, para ser pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa dessa Universidade. De outro lado, lecionei “História das ideias políticas na América Latina” na Universidade de Antioquia, em Medellín, bem como a cadeira “Humanismo de la Técnica” na Universidade EAFIT. Com o pesado clima de violência que se instalou na Colômbia, ao longo do final dos anos 70 e durante a década seguinte, decidi, em 1979, fazer o doutorado em pensamento luso-brasileiro que era oferecido pela Universidade Gama Filho. Pedi licença sem vencimentos nas Universidades às quais estava vinculado em Medellín e fui fazer o doutorado em Pensamento Luso-Brasileiro, na Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro. 

Mestre Paim, docente e fundador do Curso, foi o meu orientador. O tema da minha tese foi o pensamento sociológico de Oliveira Vianna (1883-1951), que tinha desenvolvido a categoria de “autoritarismo instrumental” para definir a forma em que o Brasil se modernizou, tentando superar a herança castilhista. O título da minha tese foi: Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado Brasileiro, publicada em 1997. Paim me orientou na identificação do Patrimonialismo brasileiro, estudando as fontes weberianas da tipologia Feudalismo / Patrimonialismo em Max Weber e Karl Wittfogel e mergulhando no estudo da obra de Oliveira Vianna (1883-1951).

Para Paim, seria possível superar o Patrimonialismo. Essa possibilidade radicaria em dois pontos: que a sociedade brasileira recuperasse a valorização da livre iniciativa (que tinha se dado pioneiramente no ciclo do açúcar no Nordeste, no século XVII) e, em segundo lugar, que houvesse um amplo processo de privatizações a fim de diminuir o tamanho do Estado, para consolidar uma representação de interesses no Congresso a partir da qual se pudesse organizar um Estado a serviço da Sociedade, não sobranceiro a ela. As obras de Paim intituladas: A querela do estatismo [3ª edição de 2018], Marxismo e descendência [2ª edição de 2009] e Momentos decisivos da História do Brasil[2ª edição de 2014] encarregaram-se de traçar o plano de voo de desmonte do Estado Patrimonial e de sua progressiva substituição por um Estado concebido a partir do ideal liberal da representação de interesses e de valorização da livre iniciativa. 

No entanto, a conclusão a que o Mestre chegou não é alvissareira: o Estado Patrimonial foi reforçado, infelizmente, com a adoção do esquema cultural do cientificismo, aliado à força estatizante vinculada à burocracia e à classe política, que terminou rejeitando os esforços em prol do aperfeiçoamento da representação, com o paralelo e agressivo surgimento da vulgata marxista que instalou essa ideologia no terreno educacional com a obra de Paulo Freire (1921-1997). Paim chama a atenção, em Momentos decisivos da História do Brasil, para a conclusão a que chega o antropólogo Alberto Carlos Almeida, na sua obra intitulada: A cabeça do brasileiro [Rio: Record, 2007]. Segundo o mencionado antropólogo, a elite brasileira encabeçada pela classe política e a magistratura, endossou claramente a escala de valores do Patrimonialismo, em torno à crença de que de que é lícito se enriquecer com o dinheiro público. Hoje, com o agressivo desmonte da Operação Lava Jato e com a instauração de uma minoria monocrática na cúspide do poder judiciário, definidamente autoritária nos moldes do espírito pombalino, fica claro que será difícil, nas próximas décadas, vencer de vez o Patrimonialismo.

Lembrando o paradoxal título da obra de Barbara Tuchman (1912-1989) intitulada:  A marcha da insensatez [Tuchman, 2012], que destacava a desgraça conjuntural, nos Estados Unidos, da presença de opositores ao progresso liberal simbolizados no Cavalo de Tróia, frisa o Mestre Paim: “No caso brasileiro, as opções também se configuraram, quase sempre tão claras como no confronto entre separatismo e unidade nacional, ou entre sistema representativo e autoritarismo. (...). Ao contrário de corresponder àquela expectativa [do progresso liberal], seria justamente o PT que empreenderia um passo que bem pode estar destinado a fechar-nos de vez à realização daquele que seria o nosso autêntico projeto nacional. Trata-se de que haja conseguido enterrar de vez projeto de constituição da ALCA. Ao invés de estarmos integrados ao que seria o provável desfecho do atual ciclo de globalização - a criação de mercado constituído pela junção dos Estados Unidos com a União Européia - , ingressaremos num período de marginalização cujas dimensões e consequências serão certamente funestas (...)” [Paim, Momentos decisivos da História do Brasil, 2014: 13-15].

Como sairmos do buraco patrimonialista nestes confusos tempos de populismos que se contrapõem? Mestre Paim dá a sua resposta: como o erro da elite brasileira consistiu, justamente, em se esquecer dos rumos da história, substituindo os fatos, no contexto do cientificismo marxista, pelas narrativas, o caminho da regeneração virá pela volta ao estudo dos fatos históricos, como ponto de partida para identificarmos a nossa identidade. Trata-se, portanto, de voltarmos às fontes históricas com o objetivo de “difundir o essencial do patrimonio da historiografia nacional” [Paim, Brasiliana Breve, 2019: 14], no contexto arejado da filosofia culturalista da história. 

Para Paim, “a experiência humana não autoriza inferir como seriam as coisas em si mesmas, isto é, na ausência do próprio homem com seus pontos de vista interessados (referidos a valores). Ao mesmo tempo, radicalizamos o seu posicionamento ao afirmar que toda mudança social pressupõe uma prévia mudança de valoração. (...). Se não desvendarmos as razões do declínio (da mudança), jamais estaremos em condições de compreender por que, nos três séculos subsequentes, terminam sempre em fracasso as tentativas de nos colocar entre as nações capitalistas do Ocidente. Precisamente a essa circunstância denomino de primeiro momento decisivo de nossa história, e neste livro, espero ter capacidade para desvendá-lo” [Paim, Momentos decisivos da história do Brasil,2007: 31].

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Alberto Carlos [2007]. A cabeça do brasileiro. Rio de Janeiro: Record.

MÉLONIO, Françoise [1993]. Tocqueville et les Français. Paris: Aubier. 

PAIM, Antônio [2009]. Marxismo e descendência. 2ª edição. Campinas: Vide Editorial.

PAIM, Antônio [2014]. Momentos decisivos da História do Brasil. 2ª edição, São Paulo: Vide Editorial.

PAIM, Antônio [2018]. A querela do estatismo. 3ª edição, Campinas: Távola Editorial / CEDET. 

PAIM, Antônio [2019]. Brasiliana Breve. Uma coleção para difundir a historiografia nacional. Brasília: Edições do Senado Federal, vol. 258. 

TOCQUEVILLE, Alexis de [1977]. A Democracia na América. 2ª edição. (Tradução, prefácio e notas de Neil Ribeiro da Silva). Belo Horizonte: Itatiaia / São Paulo: EDUSP.

TUCHMAN, Barbara [2012].  A marcha da insensatez: De Troia ao Vietnã. (Tradução de Carlos de Oliveira Gomes). Rio de Janeiro: Best Seller / Record. 

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1980]. Castilhismo: uma filosofia da República. 1ª edição. Porto Alegre: EST / Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul. 2ª edição corrigida e aumentada. (Apresentação de Antônio Paim). Brasília: Senado Federal, 2000. 3ª edição corrigida e aumentada. (Apresentação de Antônio Paim), Brasília: Senado Federal, 2010.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1997]. Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro. (Apresentação de Antônio Paim). Londrina: Editora da UEL.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1998]. A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville. São Paulo: Mandarim.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1999]. Tocqueville au Brésil. Toronto University Press, The Tocqueville Review, Vol. XX, nº 1 – 1999: 147-176. 

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [2002]. O liberalismo francês: a tradição doutrinária e a sua influência no Brasil. Juiz de Fora: UFJF - Centro de Estudos Estratégicos Paulino Soares de Sousa, da Universidade Federal de Juiz de Fora - Edição digital: https://static.poder360.com.br/2018/11/rodriguez_o_liberalismo_frances_trad_doutrinaria.pdf 


A pujante indústria da droga no Afeganistão - The Washington Post

 

Powdered ephedra

Ephedra powder is mixed with chemicals in one of the steps to produces methamphetamine in Farah province, Afghanistan, on March 19. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

Ephedra powder is mixed with chemicals in one of the steps to produces methamphetamine in Farah province, Afghanistan, on March 19. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

BAKWA, Afghanistan — Afghanistan’s fastest-growing drug industry operates from desert outposts in plain view.

One of its most bustling hubs, five hours west of Kandahar, can only be reached by miles of dirt tracks that lead to a row of dusty shops topped with Taliban flags. Wholesalers like Abdulwadood work openly here, moving dozens of kilos of methamphetamine every week.

In the middle of his crowded shop, he casually tosses a half-kilo bag of long glassy shards onto the carpet. Its street value in Europe is tens of thousands of dollars. Abdulwadood will sell it for about $250.

“Every year, sales and production just increase and increase,” he said, speaking on the condition that only his first name be used to discuss the illicit drug industry. Behind him the rest of his stock was piled in a corner. He expected to sell the roughly 20 kilos of shisha — the Afghan term for meth — in just a few days.

For decades, the country has been a global hub for opium production, estimated to supply 80 percent of the world’s opiate users. Now its meth industry is growing at breakneck speed, stoking fears among Western experts and officials that, under the Taliban, Afghanistan could become a major supplier as demand rises globally.

Workers stand around a bag of powered ephedra in Farah province, Afghanistan, on March 19. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

Workers stand around a bag of powered ephedra in Farah province, Afghanistan, on March 19. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

Patients of the rehabilitation center for drug addicts lay on their bed in their first period of detoxification in Kabul, Afghanistan, on March 24. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

Patients of the rehabilitation center for drug addicts lay on their bed in their first period of detoxification in Kabul, Afghanistan, on March 24. (Lorenzo Tugnoli for The Washington Post)

Hundreds of meth labs have appeared in Afghanistan over the past six years, according to independent experts, former government officials and drug traders. And more are being built each month as the country’s economic crisis forces Afghans to find new sources of income. The vast majority of meth produced is for export, but an increasing number of Afghans are turning to it as their drug of choice.

The sudden boom in meth production came after drug traffickers discovered a potential bonanza in a native plant called ephedra — known here as oman — which grows wild and is a natural source of the drug’s key ingredient.

Sellers at the meth bazaar in rural western Afghanistan have long been free to ply their trade. The previous government largely turned a blind eye, said Abdulwadood, and the Taliban have taken the same approach since coming to power. Though Taliban fighters sometimes inspect the market, they have not tried to shut it down.

“The only reason we are in this business is because there are no other jobs,” Abdulwadood said. “Of course, if the economy gets worse, more people will start producing shisha.” – Susannah George and Joby Warrick

Read more: The drug trade now flourishing in Afghanistan: Meth

segunda-feira, 2 de maio de 2022

Quão credível é a ameaça de guerra nuclear da Rússia no caso da Ucrânia? Rememorando o caso dos mísseis soviéticos em Cuba

Quão credível é a ameaça de guerra nuclear da Rússia no caso da Ucrânia?

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Rememorando o caso dos mísseis soviéticos em Cuba.


 Por duas ou três vezes, o próprio Putin, seu eterno chanceler Lavrov, e outros observadores, comentaristas ou jornalistas seguindo os assuntos da guerra de agressão da Rússia, ou do Putin, contra a Ucrânia e os ucranianos, chegaram a mencionar a possibilidade de uma guerra nuclear, sem que se saiba exatamente por que, com quais motivos ou dirigida a quais envolvidos nesse conflito, que são, ademais da própria Rússia e a Ucrânia, todos os países vizinhos, pró-Rússia (como a Belarus), ou os "ocidentais" membros da OTAN, ou seja, os bálticos e membros recentes da UE e da OTAN na Europa central e oriental, os próprios países líderes da UE ou da OTAN (França, GB e Alemanha), alguns escandinavos e, sobretudo, os Estados Unidos, o capitão e comandante da OTAN.

Sempre achei essa ideia estapafúrdia, despropositada, sem sentido, pura chantagem dos agressores russos, que não conseguiram realizar seus objetivos primários – ocupar toda a Ucrânia, eliminar seu governo atual e colocar um governo fantoche no lugar, ou seja, transformá-la numa nova Belarus – e resolveram partir para a intimidação nuclear contra não se sabe bem quem exatamente, supostamente algum membro da OTAN que decidisse intervir na guerra (já estão intervindo, mediante sanções e ajuda militar à Ucrânia, que não é nem da UE, nem da OTAN, mas aspira ingressar em ambas).

Não acredito, repito, em guerra nuclear, pois isso representaria a aniquilação de dezenas, possivelmente centenas de milhões de vidas humanas de um lado e outro, e a destruição da vida na Europa central, setentrional, meridional, oriental, ocidental, etc., etc., etc. Os generais e alguns estadistas responsáveis sabem disso, mas jornalistas e observadores ligeiros continuam especulando, como é de seu feitio, assim como os estrategistas amadores.

Em todo caso, como eu despertei para o tema da política internacional com a crise dos mísseis soviéticos em Cuba, sessenta anos atrás, fui buscar na biblioteca o livro quintessencial de reflexão sobre esse caso emblemático da política do MAD durante a Guerra Fria, este aqui, publicado originalmente em 1971 e objeto de uma segunda edição revista em 1999.

Permito-me unicamente reproduzir a primeira e metade da segunda página da Introdução, com as questões que serão examinadas ao longo do livro, aliás muito chato, pois combina descrição empírica daqueles terríveis quinze dias de outubro de 1962 com capítulos especulativos sobre modelos decisórios em situações de alto stress como foram aqueles dias e situações de quase aniquilação nuclear. Lembro-me que minha mãe foi me buscar na escola num daqueles dias, quando normalmente eu voltava sozinho, a pé, durante três ou quatro quarteirões da zona sul de São Paulo: não sei exatamente para quê, pois é evidente que não tínhamos os abrigos nucleares construídos por americanos, russos e europeus para se proteger (inutilmente) do Armageddon nuclear caso ele ocorresse. Mais tarde, os uruguaios diriam que a solução era ir para o Uruguai, um país no qual, segundo eles, "no pasa nada!". 



Em todo caso, as questões em causa naquele conflito não encontram nenhuma correspondência com a situação atual. Para quê, exatamente, os russos usariam a arma nuclear, contra quem e onde? Estas questões alinhadas no livro do Allison (muito chato, diga-se de passagem) não encontram paralelo com o caso cubano ou outros casos menores ocorridos durante toda a era da Guerra Fria e além (tem os aventureiros coreanos do norte, iranianos, israelenses e os irmãos inimigos Índia e Paquistão).

O próprio Allison veio agora recentemente (desde 2015, pelo menos) com a ideia maluca de uma "armadilha de Tucidides", que seria uma guerra entre China e EUA, que só poderia ser nuclear. Se não for, seria uma proxy war, como as muitas que já ocorreram desde o final dos anos 1940, inclusive a atual, na Ucrânia.

Em todo caso, cabe recomendar, ou pelo menos esperar, cabeça fria e racionalidade da parte dos malucos que nos governam, alguns mais malucos do que outros, obviamente, Putin em primeiro lugar, o baixinho da Coreia do Norte em segundo lugar, talvez os aiatolás, depois que o Saddam Hussein e o Kaddafy já se foram. Ainda bem que Brasil e Argentina resolveram baixar suas armas nos coldres, pois era sumamente ridícula qualquer competição militar nuclear ou tradicional entre os dois grandes do Cone Sul sul-americano. Mas até hoje existem militares e diplomatas que consideram FHC um traidor, porque resolveu vincular o Brasil ao TNP (em 1996-98). Ainda bem que o fez, inclusive porque a Constituição de 1988 já tinha liquidado qualquer hipótese diferente.

Concluo: não haverá guerra nuclear. Mas espero que a Rússia seja condenada a pagar toda a destruição material e em vidas humanas que a loucura do Putin provocou. Não, não será uma reprodução do Tratado de Versalhes de 1919, e a Rússia não se converterá numa nova Alemanha com desejos de vingança. Ela tem de ser contida em seus instintos primitivos, sendo colocada numa espécie de "curral de contenção econômico". Essa é única forma de mostrar ao povo russo que ele precisa escolher dirigentes mais compatíveis com a Carta da ONU e com os grandes princípios do Direito Internacional. A China tem todo interesse que seja assim, pois do contrário ela também pagará um preço  se escolher outro caminho.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 2 de maio de 2022


Debate-lançamento do livro de Paulo Fernando Pinheiro Machado sobre o Visconde do Uruguai, o fundador da diplomacia brasileira: Paulino José Soares de Souza: 2/05/2022, 17hs

 Participarei, nesta tarde, deste lançamento, cuja via de acesso é este link: 

https://lnkd.in/dGtjhG5k


Tive o prazer de prefaciar o livro, como registrei nesta postagem: 

A construção da diplomacia brasileira por um de seus pais fundadores”, Prefácio ao livro de Paulo Fernando Pinheiro Machado: Ideias e diplomacia: O Visconde do Uruguai e o nascimento da política externa brasileira– 1849-1853 (Lisboa: Lisbon International, 2022, p. 15-29); apresentado parcialmente no blog Diplomatizzando (23/12/2021; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/12/ideias-e-diplomacia-o-visconde-do.html).

Também preparei algumas notas para o debate desta tarde: 

Paulino, Visconde do Uruguai: apresentação de livro

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Apresentação-debate sobre o livro de Paulo Fernando Pinheiro Machado: Ideias e diplomacia: O Visconde do Uruguai e o nascimento da política externa brasileira– 1849-1853 (Lisboa: Lisbon International, 2022); dia 2/05/2022, na TV-IAB (https://www.youtube.com/tviab). 

 

Uma carreira impressionante na burocracia e na política do Império, desde as Regências e sobretudo na construção do Partido Conservador, a partir do Regresso:

1) Juiz de comarca, 1835

2) Deputado fluminense na primeira Assembleia Provincial, 1835

3) Presidente da província do Rio de Janeiro, de 1836 a 1840

4) Deputado na Assembleia Geral, a partir de 1837

5) Ministro da Justiça, duas vezes: 1840 e 1841

6) Ministro dos Negócios Estrangeiros, três vezes: 1843, 1849 e 1852

7) Senador do Império, 1849

8) Membro do Conselho de Estado, 1849

9) Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário, 1854 na França, Grã-Bretanha e Santa Sé.

10) Autor do Ensaio de Direito Administrativo, 1862, dois tomos, iniciado em 1858, depois que o Marquês de Olinda, presidente do Conselho de Ministros solicita sua colaboração para o que ele chama de “alguns quesitos da nossa organização administrativa” (p. 6)

11) Autor dos Estudos Práticos sobre a Administração das províncias do Brasil, 1865, dois tomos.

 

Diálogo com Tavares Bastos sobre as questões da centralização e descentralização no Império, objeto da dissertação de mestrado e livro de Gabriela Nunes Ferreira (1999); à parte a questão de um dos mais importantes debates, válido e atual até hoje, apreciei muitíssimo a comparação das leituras que fizeram Tavares Bastos e Paulino sobre a grande obra de Tocqueville, cada um escolhendo os trechos que melhor convinham às suas posições respectivas.

 

Livro de Paulo Fernando destaca, na vertente diplomática de Uruguai, o fato de que ele não deixou memórias ou um testemunho direto sobre a imensa obra que ele conduziu nas três vezes em que esteve no MNE, tanto na organização diplomática e no recrutamento de pessoal qualificado, quanto no âmbito da própria política externa, daí merecendo o epíteto legítimo de “pai fundador” da PExtBr.


As razões são expostas por ele mesmo, no preâmbulo do Ensaio:

 

     “Comecei a reunir e a pôr em ordem numerosos documentos, e correspondência mesmo particular que possuo (dá muita luz sobre os fatos) com o fim de escrever umas memórias sobre a nossa política exterior, especialmente dos tempos em que tive a honra de dirigir a Repartição dos Negócios Estrangeiros.

     “Encontrei, porém, dificuldades que me foram inclinando a adiar esse projeto. A história de tais acontecimentos, escrita por quem foi neles, há pouco tempo, também ator, e teve nas mãos o fio dos segredos da época, pode fazer algum mal, quando os fatos não manifestaram ainda todas as consequências que os pejam. Repugnava-me, além disso, entrar em certas apreciações, as quais poderiam, talvez, molestar pessoas, às quais consagrei e consagro respeito e afeição, e que mui bons serviços têm prestado ao país.


(p. 6 da edição de 1997 do Ensaio, feita pelo Ministério da Justiça)

 

(...)


Depois o Marquês de Olinda o convidou para se ocupar de quesitos de direito administrativo, e assim ele adiou o seu projeto de escrever sobre a diplomacia.

 

            Há todo um debate, no capítulo III, sobre as diferenças entre o direito constitucional, ou político, e o direito administrativo, que Paulino se esforça por separar em seu Ensaio, o que envolve também a questão da centralização. Ele critica os países da América do Sul:

            “Quando o país não tem essas instituições [as do direito administrativo] ou as tem mas concebidas, mal assentadas, mal desenvolvidas, cada mudança política traz completa mudança administrativa, e o arbítrio revolucionário não encontra empecilho algum.

“Tais são as Repúblicas Hispano-Americanas. Têm organização política constantemente mutável. Quase não têm organização administrativa. Tudo é precário e depende do arbítrio das revoluções. (p. 27) 

Ele trata dessas necessárias distinções pouco adiante, no mesmo capítulo: 

“A distinção da qual se trata, não se dará por certo em um país onde a falta de conveniente desenvolvimento da parte administrativa, deixa a administração completamente confundida com a política, como acontece entre nós, por quanto entre nós a mesma administração é apenas mero instrumento nos cálculos de parcialidades políticas pessoais, e reduz-se à máquina de eleições, o que é um grande mal.” (p. 30). 

Entra aqui, uma grande nota, número 16, que está consignada ao final do volume, entre as páginas 449 e 450:

“Não há talvez país em que a administração esteja mais confundida com a política do que o Brasil, e onde menos tenha feito a legislação para distingui-las e separá-las. Tudo é política, principalmente pessoal; tudo ressumbra política, e é considerado pelo lado político. A imprensa somente se ocupa de política; todas as discussões nas Câmaras e fora delas são políticas, ou têm relação com a política. As grandes questões econômicas, e administrativas, que tanto importam ao futuro do Império [Brasil], são postas de lado, exceto quando acidental e ocasionalmente se manifesta a urgência da solução de algum caso especial.

“Em um país cuja administração está, para assim dizer, no caos e na infância, passam sessões e sessões legislativas sem que seja adotada medida administrativa de alguma importância, excetuadas as que são de expediente, e tendem a satisfazer vagamente em uma espécie, alguma necessidade indeclinável que urge, alguma pretensão que aperta, pondo a faca na garganta.

“A administração é por muitos considerada como um simples e cego instrumento da política para montar e desmontar partidos e influências eleitorais. (...)

“Não há, sobretudo agora, verdadeiro espírito público. As antigas bandeiras quase que desapareceram. Preponderam as paixões e os interesses na maior parte dos lugares. Não se luta por princípios claros e definidos. Luta-se por pessoas, por posições, influência e para granjear patronos que obtenham favores. (p. 449-50). (...)

“Acresce para aumentar essa desmoralização [a nomeação política de funcionários, inclusive juízes] o emprego do dinheiro nas eleições, e Paulino retomava aqui trechos de uma carta do presidente americano Buchanan: ‘Se essa prática tem de continuar crescendo, até o ponto de infectar os eleitores e seus representantes nas legislaturas dos estados e na nacional, achar-se-á infestada a fonte do governo livre, e iremos dar, como a história o prova, no despotismo militar.” (p. 450) (...)

Paulino retoma: 

“Os partidos entre nós vivem acusando-se reciprocamente dos mesmos atos, e encobrindo-os e justificando-os quando são seus, o que destrói as noções do justo e honesto.

“Cada um pretende que o funcionário administrativo lhe preste aquele auxílio contra o qual levantará celeuma, se for dado ao adversário. A intervenção do Governo em nosso favor é justa; é um crime se a bem do nosso contrário [adversário]” (p. 450)

E Paulino conclui sua longa nota 16, capítulo III, por estas palavras: 

“Na minha humilde opinião, a justiça e a estabilidade na administração, a sua separação, quanta seja possível, da política, são meios poderosos que muito poderão contribuir para pôr um paradeiro ao dano que o modo pelo qual se tem feito nestes últimos tempos as eleições entre nós, tem causado e está causando ao país.” (p. 450)

  

            Seguir o debate em torno dos grandes temas da agenda internacional do Brasil, sobretudo no Prata, foco central da política externa durante todo o decorrer do Império.


O restante fica para o debate...


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 2 de maio de 2022


Zeina Latif: livro sobre o (não) desenvolvimento do Brasil: obstáculos históricos, políticos, educacionais

  Zeina Latif acaba de publicar um livro sobre o Brasil. 

Livro Nós do Brasil, por Zeina Abdel Latif


Seguindo a tradição de escritos sobre a formação econômica brasileira, Nósdo Brasil é uma obra oportuna sobre as armadilhas, ou "nós", do crescimento de nosso país. Zeina Latif, uma das maiores economistas do Brasil, transcende aqui sua área de especialidade ao se debruçar sobre as mazelas de vários aspectos da realidade brasileira para investigar as origens dos entraves ao desenvolvimento no país. A história do Brasil, mesmo quando comparada à de seus vizinhos latino-americanos, guarda algumas peculiaridades: teve um período mais longo de escravidão; abrigou a monarquia; manteve a integridade de seu território; instaurou a República tardiamentte; sofreu com diversos golpes de Estado...
Editora: Record; 1ª edição (18 abril 2022)  Páginas: 252 páginas  ISBN-10: 6555874481  ISBN-13: 978-6555874488  ASIN: B09X21MGPW

Estão disponíveis a introdução e trechos do primeiro capítulo, que contém reflexões absolutamente pertinentes sobre as raízes e razões de nosso atraso e letargia.

Trecho do capítulo 1: 



MILICOS BURROS DO PLANALTO estão impedindo o Itamaraty de fazer Política Externa - matéria do Globo (Janaína Figueiredo, Lauro Jardim)

 A CACOFONIA na área externa do Brasil. Se os milicos BURROS do Planalto querem que o Itamaraty seja como eles – Hierarquia, Disciplina, aquelas bobagens –, eles teria de deixar o Itamaraty funcionar como se faz em operações de guerra: UNIDADE DE COMANDO, coerência nas ordens e acatamento disciplinado.

Se todo mundo se julga no direito de opinar e mandar, só pode dar confusão no pedaço.
APRENDAM MILICOS BURROS: deixem o Itamaraty trabalhar. Outro que está sempre interferindo é o incompetente do Guedes, um cara que nunca aprendeu o que é política externa ou mesmo política comercial.
Paulo Roberto de Almeida


Após um ano no posto, chefe do Itamaraty sofre desgaste com interferências em sua área
Guerra e discussões sobre a posição do Brasil no cenário internacional geram rumores de fritura de Carlos França, ratificado por Bolsonaro
Janaína Figueiredo
O Globo, 02/05/2022

A invasão da Ucrânia pela Rússia, iniciada em 24 de fevereiro, encerrou o que poderia ser chamado de período de graça do ministro das Relações Exteriores, Carlos França, que chegou ao posto em março de 2021. Desde então, questionamentos internos ao chanceler têm se intensificado, provocando o que fontes do governo consideram um “tiroteio” do qual, até agora, França saiu ileso.

Semana passada, o presidente Jair Bolsonaro, com quem o chanceler mantém uma excelente relação, ratificou França no cargo, na tentativa de pôr panos quentes em rumores sobre a possibilidade de uma troca de comando no Itamaraty, em plena campanha eleitoral.

— A nossa política externa, que tem à frente o ministro Carlos França, é realmente reconhecida por todos nós e por todo o mundo afora. Todos querem fazer comércio conosco — disse o presidente durante a abertura de uma feira de agricultura em Ribeirão Preto (SP).

França navegou em águas tranquilas durante quase um ano, mas hoje enfrenta fortes interferências em sua área, e elas têm alimentado versões sobre a fritura do ministro. Em palavras de uma fonte do governo, “hoje todo mundo dá pitaco sobre a guerra: temos a ala militar, a Faria Lima [em referência à equipe econômica], os ideológicos, e o Itamaraty”.

Bolsonaro ouve todos, e hoje continua respaldando o ministro das Relações Exteriores que, por seu passado como chefe de protocolo do Palácio do Planalto, tem acesso privilegiado ao poder e ao mundo político.

Poucos acreditam que França deixará o cargo antes das eleições, mas esse cenário não pode ser totalmente descartado. O desgaste é evidente. Relações que fluíam com facilidade alguns meses atrás, hoje, confirmaram fontes do governo, enfrentam tensões.

Uma delas é do chanceler com o secretário de Assuntos Estratégicos, almirante Flávio Viana Rocha, que circula com assídua frequência pelas embaixadas de Brasília, recebe muitos embaixadores no Palácio do Planalto e tem uma agenda internacional que, segundo fontes, “provoca desajustes”. França e o almirante sempre tiveram um vínculo cordial, e Viana Rocha, conhecido por sua simpatia e capacidade (entre outras, fala vários idiomas), trabalha em permanente contato com o Itamaraty. Mas os tempos mudaram, insistem as fontes.

Guedes e a OCDE
Hoje, França é mais cobrado internamente, e as brigas por espaço e por influenciar a posição do país sobre a guerra — condenação à agressão russa, mas não alinhamento aos EUA e à União Europeia — se acentuaram.

Alguns votos recentes do Brasil em organismos internacionais, como na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), causaram “desconforto” no Ministério da Economia e, hoje, segundo fontes, existe um “receio” pela possibilidade de que políticas do Itamaraty que estão causando mal-estar entre americanos e europeus possam prejudicar a agenda econômica.

A visão nessa ala do governo é de que existem falhas de comunicação sobre a posição brasileira e, partindo dessa avaliação, o ministro Paulo Guedes tem falado sobre o assunto, no Brasil e no exterior.

— O Brasil vai trabalhar sempre no sentido de reforçar os valores das instituições multilaterais e abraçar a OCDE. Vamos avançar em todas as frentes. Queremos acesso à OCDE, queremos o acordo Mercosul-União Europeia, para garantir a segurança alimentar e energética dessa grande comunidade de nações — declarou o ministro da Economia, recentemente.

Depois de o Brasil se abster numa votação sobre a exclusão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, alinhada com seus sócios dos Brics (China, Índia e África do Sul, além de Rússia), Guedes criticou as guerras atuais, as quais chamou de “retrocesso”. O medo é de que o estremecimento das relações, sobretudo com os europeus, possa causar danos colaterais.

No próximo mês, o conselho de embaixadores e ministros da OCDE (organismo com sede em Paris e dominado amplamente pelos europeus) deve aprovar o chamado roteiro de ascensão para os seis países em processo de adesão, entre eles o Brasil. Estão se aproximando instâncias-chave no caminho para alcançar uma meta traçada por Guedes no começo do governo, o que eleva ainda mais as tensões.

As falas do ministro da Economia não caem bem em setores do Ministério das Relações Exteriores, que defendem a entrada do Brasil em organismos como a OCDE com uma voz própria e não abaixando a cabeça para as cada vez mais explícitas pressões externas, sobretudo de países da UE.

‘Demoras e titubeios’
Existe entre diplomatas estrangeiros em Brasília a sensação de que muitas vozes dentro do governo estão opinando sobre a política externa desde que a guerra estourou, o que leva a demoras e titubeios do Brasil, termos usados por uma das fontes consultadas, que enfraquecem a gestão de França. O chanceler é visto como um equilibrista, que deve conciliar a visão do Planalto, para muitos observadores estrangeiros claramente pró Rússia, com as demandas de outros ministérios, a ala militar e tradições diplomáticas brasileiras.

As declarações de França defendendo a permanência da Rússia no G-20, na contramão do que pregam europeus e americanos, foram consideradas “inadmissíveis” por diplomatas de países da UE. Uma das fontes consultadas afirmou que “com a Rússia dentro, não haverá cúpula do G-20”.

— Você pode imaginar uma reunião com Putin e [o chanceler Serguei] Lavrov sentados à mesma mesa que autoridades europeias? Isso seria impensável — disse a fonte.

Não são tempos tranquilos para França. Sinais de fogo amigo apareceram pela primeira vez na gestão do chanceler, que continua sendo visto como a melhor opção por diplomatas ativos e já afastados. Na visão do embaixador Rubens Barbosa, que já chefiou as embaixadas brasileiras em Washington e Londres e atualmente preside o Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), uma mudança agora seria ruim para o Brasil.

— Não creio que o presidente vá fazer uma mudança neste momento. Uma mudança agora pareceria uma capitulação diante dos EUA e da UE — diz Barbosa.

Ambiguidades
O deputado federal Marcel van Hatten (Novo-RS), integrante da Comissão de Relações Exteriores e Defesa da Câmara, concorda que “no momento, França é a pessoa mais adequada para o posto”.

— O chanceler acomoda os interesses do presidente com os do país — opina ele.

Não é a mesma opinião que predomina em embaixadas estrangeiras em Brasília. As críticas pelo que é considerado falta de clareza e ambiguidade do Brasil em relação à guerra aumentam a cada semana, e os supostos massacres cometidos pelos militares russos na Ucrânia aprofundam o mal-estar.

Mas França está firme, e fontes do governo que defendem sua gestão garantem que “o ministro é ponderado, equilibrado, o melhor que poderíamos ter neste momento. O Brasil precisa ter uma política externa independente”.



O apelido de Flávio Rocha entre os diplomatas no Itamaraty

Por Lauro Jardim
O Globo, 01/05/2022

No Itamaraty, o ministro Flávio Rocha, chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), tem sido chamado de "chefe da SAI", ou seja, uma inexistente Secretaria de Assuntos Internacionais.

O motivo, na visão dos diplomatas, é a quantidade de vezes em que Rocha se mete em temas de relações exteriores.


Entrevista do embaixador Aldemo Garcia com o Prêmio Nobel da Paz, José Ramos Horta (YouTube)

Entrevista do embaixador Aldemo Garcia com o Prêmio Nobel da Paz, José Ramos Horta (Novembro 2020)



38 visualizações 28 de abr. de 2022  
Uma Visão do Timor-Leste por José Ramos-Horta

O novamente presidente do Timor Leste, José Ramos-Horta, prêmio Nobel da Paz, que lutou pela libertação e independência de seu país, desde a sua invasão pela Indonésia em 1975, concedeu uma entrevista ao diplomata Aldemo Garcia, quando embaixador do Brasil em Dili, onde trata dos diversos temas de interesse do seu país, do Brasil e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), agora disponível neste canal do YouTube:

Teorias desenvolvimentistas da CEPAL, em novo livro de Margarita Fajardo: The World That Latin America Created (2022)

Margarita Fajardo: 

The World That Latin America Created: The United Nations Economic Commission for Latin America in the Development Era

Harvard University Press 2022

The World That Latin America Created: The United Nations Economic Commission for Latin America in the Development Era presenta un relato que explica cómo un grupo de intelectuales y políticos transformó la economía del desarrollo y le dio a América Latina una nueva posición en el mundo. Después de que la Segunda Guerra Mundial demoliera el viejo orden, un grupo de economistas y legisladores de toda América Latina imaginaron una nueva economía global y lanzaron un movimiento intelectual que eventualmente conquistaría el mundo. 

Con base en la hipótesis de que los sistemas de comercio y finanzas internacionales estaban frustrando las perspectivas económicas de América Latina y otras regiones del mundo, a través de la Comisión Económica para América Latina de las Naciones Unidas (CEPAL, las siglas en español y portugués) los cepalinos desafiaron las ortodoxias de la teoría y la política del desarrollo para poner una alternativa basada en la teoría del centro y la periferia. Eventualmente, los cepalinos establecieron su propia forma de hegemonía, superando a Estados Unidos y al Fondo Monetario Internacional como entidades que marcaron la agenda de una región tradicionalmente mantenida bajo la órbita de Washington y sus instituciones en la era del desarrollo. Al hacerlo, los cepalinos reformaron la gobernanza regional e internacional y establecieron una agenda intelectual que todavía resuena hoy.

A partir de la revisión de fuentes inexploradas de las Américas y Europa, Margarita Fajardo vuelve a contar la historia de la teoría de la dependencia, revelando la diversidad de un movimiento a menudo demasiado simplificado y la tensa relación entre los cepalinos, sus críticos dependentistas y la izquierda regional y global. En este sentido, The World That Latin America Created es una historia de las instituciones, los personajes y la ideas latinoamericanas que tuvieron un impacto real en la gobernanza de la economía regional y global.

Margarita Fajardo es historiadora egresada de la Universidad de los Andes y doctora por la Universidad de Princeton. En los últimos años, ha recibido becas del Centro de Historia de la Economía Política de la Universidad de Duke. Su trabajo ha sido publicado en Latin American Research Review y en una serie de volúmenes editados sobre el desarrollismo en América Latina, las ciencias sociales de la Guerra Fría y las ciencias sociales globales. Está interesada en la historia del capitalismo latinoamericano y global, así como en la historia y la economía política de las ideas y de la ciencia.

Twitter: @mmfajardoh

NewbooksNetwork, abr. 29, 2022

 

China, três visões do seu crescimento econômico - Chartbook 118 - Adam Tooze

 Roubo, do último Chartbook de Adam Tooze, três gráficos sobre seu desempenho espetacular, mas a sua produção por trabalhador ainda está bem abaixo da dos trabalhadores americanos.

Primeiro, seu desempenho em matéria de PIB: 


Agora o valor agregado por trabalhador: 


Finalmente, as matrículas no terceiro ciclo têm crescido consistentemente: