Paulo Roberto de Almeida
Oposição venezuelana só negocia se Nicolás Maduro anistiar presos
Presidente pretende se encontrar na terça-feira, em Caracas, com membros da Mesa de Unidade Democrática, mas exigências podem frustrar diálogo
Denise Chrispim Marin, Enviada Especial / Caracas
O Estado de S. Paulo, 07 de abril de 2014
CARACAS - A oposição venezuelana afirmou na noite desta segunda-feira, 7, que só negociará com o presidente Nicolás Maduro se houver uma anistia para os manifestantes presos nos protestos dos últimos dois meses. A condição foi revelada depois de o presidente, sem consultar os opositores, ter anunciado uma reunião na terça-feira, 8, com representantes da frente oposicionista Mesa de Unidade Democrática (MUD).
Santi Donaire/EFE
Maduro anunciou unilateralmente encontro com a oposição na terça-feira
O encontro foi sugerido na conversa de Maduro com chanceleres de seis países da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), entre os quais o brasileiro Luiz Alberto Figueiredo. "Será um grande sinal de paz e de democracia para todos os venezuelanos. Advogo a tolerância, a coexistência e convivência dos que pensam diferente", afirmou Maduro, em entrevista depois do encontro com os chanceleres. "Estou desejoso de sentar cara a cara com os dirigentes da oposição. Vamos promover uma grande cruzada nacional de amor e de respeito."
Maduro adiantou que colocaria sobre a mesa de discussão com a MUD seus planos de combate à insegurança pública e de crescimento econômico. A reunião, no entanto, só ocorreria se o governo atendesse quatro exigências da oposição: anistia para os presos políticos, instalação de uma comissão da verdade, renovação equilibrada dos poderes públicos e desmobilização dos grupos paramilitares, conhecidos como "coletivos". A MUD pediu ainda que o primeiro encontro fosse transmitido ao vivo em cadeia nacional.
Até o momento, Maduro não respondeu às reivindicações dos opositores. No fim de semana, os chanceleres desembarcaram em uma Venezuela tão dividida quanto nos dias 24 e 25 de março, quando estiveram no país pela primeira vez para promover o diálogo entre a oposição e o governo. Agora, sinais de fissura dentro do chavismo podem pressionar o governo a dialogar com seus opositores.
Horas antes, Maduro fora cobrado pelo coordenador da Frente Nacional de Classe Média Socialista, Carlos Hurtado, a governar "para todos os venezuelanos". Hurtado, que também é membro do partido do governo, admitiu haver militantes chavistas nas passeatas e comícios convocados pela oposição e insistiu que a oposição tem representatividade eleitoral e deve ser escutada.
"(Maduro), o senhor não é presidente da Praça Venezuela ao Oeste. É presidente de todos os venezuelanos. Goste ou não de um setor, tem de dirigir o país para ambos os setores", afirmou Hurtado, em entrevista à União Rádio, ao referir-se à zona habitada pelos mais pobres em Caracas. "Encontramos camaradas, gente do chavismo, agrupados nas manifestações porque eles são moradores que sofrem quando vão ao supermercado e fazem as mesmas filas (para comprar produtos básicos)."
A declaração de Hurtado ocorreu no momento em que médicos protestavam contra a falta de insumos para tratar seus pacientes e em que os moradores de El Cafetal levantavam novamente as barricadas postas abaixo com violência pelas forças de segurança no domingo.
A Federação dos Centros Universitários (FCU), pouco depois, acusou a perseguição de estudantes mobilizados e seus familiares por grupos paramilitares associados ao governo. Seu líder, Luís Requesens, disse que foi organizada para hoje uma grande mobilização que "surpreenderá o país".
Mesmo confrontados com as declarações de Hurtado, dirigentes dos partidos da base do governo convocaram entrevistas coletivas com a imprensa para reiterar a acusação do ministro do Interior e Justiça, general Miguel Rodríguez, de que a oposição estaria preparando uma nova onda de violência
"Fazemos um chamado à Unasul para que não se deixe levar pelo discurso da oposição de direita fascista e terrorista", declarou Argimiro Ponto, vice-presidente do partido Podemos.
Desde a última visita dos chanceleres, atos de violência foram observados por parte das forças de segurança. Houve ataques ao bairro de El Cafetal, no município de Baruta, da Grande Caracas, e no centro de San Cristóbal, capital do Estado de Táchira, para a remoção de barricadas e prisão de seus responsáveis.
Para evitar uma passeata de estudantes da Universidade Central da Venezuela, em Caracas, a Guarda Nacional Bolivariana e grupos paramilitares os atacaram no câmpus com bombas de gás lacrimogêneo, disparos de balas de borracha e golpes de cassetete.
A perseguição a opositores também tem caráter institucional. A deputada María Corina Machado teve seu mandato cassado pela Assembleia Nacional. O coordenador do partido Vontade Popular, Leopoldo López, foi acusado por quatro crimes e mantido em penitenciária militar, enquanto seu colega de legenda Daniel Ceballos, prefeito de San Cristóbal, foi condenado a um ano de prisão por ter colaborado com as barricadas.
Os chanceleres terão nesta terça encontros com governadores de oposição e esperam poder, desta vez, conversar com Henrique Capriles, candidato derrotado por Maduro nas eleições presidenciais de 2013. Capriles, governador de Miranda, tem tentado adotar uma posição mais moderada na crise política. Ele criticou ontem Maduro por "alimentar uma guerra entre ricos e pobres" no país.
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