Pode ser.
Mas a conclusão que eu tiro da leitura deste artigo é que ele é um estúpido fundamental, já que sua "solução" para o problema da desigualdade -- que eu não considero um problema, obviamente, apenas uma faceta da condição humana -- apenas criaria mais problemas, e não representaria solução alguma.
Em todo caso, leiam com atenção.
Quem quiser ler no original, siga este link: http://finance.townhall.com/columnists/peterschiff/2014/06/02/pikettys-envy-problem-n1846197/page/full
Paulo Roberto de Almeida
O problema de inveja de Piketty
Portal Libertarianismo, 10 de junho de 2014
Não há dúvida de que o novo livro de Thomas Piketty, Capital in the 21st Century (tradução livre, Capital no Século XXI) despertou a atenção do mundo. Na verdade, o fenômeno Piketty (o equivalente econômico à Beatlemania) tem em alguns aspectos se tornado uma história maior do que as ideias em si. Contudo, a popularidade do livro não é de todo surpreendente quando você considera que sua premissa central – como a redistribuição radical de riqueza criará uma sociedade melhor – sempre teve entusiastas (muitos dos quais instigaram revoltas e revoluções). O que é surpreendente, todavia, é que as ideias absurdas contidas no livro possam atrair tantas pessoas que supostamente são inteligentes.
Antes do século XX, o impulso da redistribuição foi refreado somente pelo poder incontestável das classes dominantes e, em menor medida, pelas restrições morais e prática contra o roubo. Karl Marx driblou as objeções morais sob o argumento de que os ricos se tornavam ricos somente por meio do roubo, e que a eliminação da propriedade privada era a chave para o crescimento econômico. No entanto, os resultados funestos das revoluções comunistas do século XX levaram os ventos das velas dos redistribucionistas. Depois dessa derrota, novas ideias eram necessárias para salvar a causa. As 700 páginas de Piketty aparentemente preencheram essa lacuna.
Qualquer pesquisador político dirá que a batalha das ideias é ganha ou perdida nos primeiros 15 segundos. A principal conquista de Piketty não reside na importância do seu livro, ou na sua análise de séculos de estatísticas sobre renda (a qual mostrou sinais de desgaste), mas sim na proposição de uma ideia sedutora e emocionalmente simples: que os ricos enriqueceram porque o retorno sobre o capital investido (r) é geralmente duas a três pontos percentuais maiores anualmente do que o crescimento econômico (g). Portanto, as pessoas com dinheiro para investir (os ricos) sempre enriquecerão, num ritmo mais rápido, do que todas as outras pessoas. O livre mercado, portanto, é uma via de mão única em direção ao crescimento da desigualdade.
Como Piketty vê a riqueza em termos de ganhos de soma zero (alguém enriquece empobrecendo a outrem), ele acredita que o sofrimento das massas aumentará até que esse ciclo seja quebrado por meio de: 1) destruição de riqueza que ocorre durante a guerra ou depressão (o que empobrece os ricos) ou 2) redistribuição de riqueza alcançada por meio da tributação sobre a renda, a riqueza e a propriedade. E embora Piketty pareça admirar os resultados alcançados pela guerra e a Depressão, ele não as defende como políticas. Restam os tributos, os quais deveriam ser majorados o suficiente para evitar as altas rendas e a riqueza sob forma de herança.
Antes de demolir o núcleo de sua tese, devemos nos maravilhar com a absurdidade de sua premissa. No seu livro, ele declara “para aqueles que trabalham para viver, o nível de desigualdade nos Estados Unidos é provavelmente maior do que em qualquer outra sociedade em qualquer momento do passado”. Dado que a igualdade é seu padrão de medida de prosperidade econômica, isso significa que ele acredita que os Estados Unidos é provavelmente o pior lugar possível para uma pessoa não rica ter nascido. Essa é uma declaração muito arrogante. E é verdade, em um sentido muito superficial e limitado. Por exemplo, de acordo com a Forbes, Bill Gates é US$ 78 bilhões de dólares mais rico do que o norte-americano mais pobre. Encontrar outro exemplo de tal disparidade monetária pode ser difícil. Contudo, a riqueza é medida de forma muito mais eficiente de outras formas, através do padrão de vida, particularmente.
Por exemplo, acredita-se que o romano mais rico que existiu até hoje foi Crassus, um proprietário de terras do 1º século antes de Cristo. Em um momento quando uma fatia de pão era vendida por 1/2 de um sestércio, Crassus tinha um valor líquido estimado de 200 milhões de sestércios, ou cerca de 400 milhões de fatias de pão. Hoje, nos Estados Unidos, onde uma fatia de pão custa cerca de US$ 3, Bill Gates poderia comprar cerca de 25 bilhões deles. Então, quando medida em termos de pão, Gates é mais rico. Mas essa é praticamente a única categoria onde isso é verdade.
Crassus vivia em um palácio que teria estado além da compreensão de muitos romanos. Ele consumia alimentos exóticos e vinhos finos até se saciar, tomava banhos quentes todos os dias, e tinha seu próprio grupo de servos, criados, cozinheiros, artistas, massagistas, artistas de teatro e músicos. Seus filhos possuíam tutores privados. Se a temperatura aumentasse muito, ele era carregado em um veículo privado até sua casa de praia, tendo servos abanando-o 24 horas por dia. Em contraste, os romanos mais pobres, se não estavam acorrentados a remos ou gladiando com feras selvagens na arena, provavelmente estariam trabalhando pesado nos campos comendo nada mais do que pão, se houvesse pão, é claro. Ao contrário de Crassus, eles não tinham acesso a uma dieta variada, saúde, educação, diversão ou água encanada.
Por outro lado, veja como Bill Gates vive em comparação com os norte-americanos mais pobres. A pia usada por ambos é notavelmente similar, e ambos disfrutam de água corrente quente e fria. Gates certamente tem acesso a alimento e plano de saúde de melhor qualidade, mas os norte-americanos não morrem de fome ou caem mortos nas ruas por causa de doenças, além de terem muito mais para comer do que meramente pão. Para entretenimento, Bill Gates provavelmente liga a TV e assiste aos mesmos programas que os norte-americanos mais pobres assistem, e quando a temperatura se eleva, ele liga o ar-condicionado, algo que muitos norte-americanos pobres também podem fazer. Obviamente que virar hambúrgueres no McDonald´s não é algo agradável, contudo, é muito melhor do que ser um escravo de uma galera. A mesma disparidade pode ser detectada em outros momentos da história, de Kublai Khan a Louis XIV. Monarcas e a nobreza alcançou riqueza inimaginável enquanto era cercada de pobreza atroz. A mesma coisa acontece hoje em lugares como a Coréia do Norte, onde Kim Jong-un vive em esplendor enquanto seus cidadãos literalmente morrem de fome.
Desemprego, enfermidades ou deficiências não são sentenças de morte nos Estados Unidos como eram em outros lugares no decorrer da história. Na verdade, é possível ganhar até mais sem trabalhar. Mesmo assim, Piketty quer que acreditemos que a desigualdade nos Estados Unidos hoje é pior do que em qualquer outro lugar na história. Se você pode engolir esse abacaxi, acho que você está preparado para aceitar tudo mais que ele quer servir.
Todos os economistas, independentemente de sua orientação política, reconhecem que o aumento do capital produtivo é essencial para o crescimento econômico. Somos tão bons quanto as ferramentas ao nosso dispor. Alimento, roupas e moradia são muito mais abundantes hoje em relação a 200 anos atrás porque o capital na forma de equipamentos torna os processos da agricultura, manufatura e construção muito mais eficientes e produtivos (apesar das regulamentações governamentais e dos tributos que diminuem essa eficiência). Piketty tenta mostrar que foi além de Marx, reconhecendo os problemas das economias planificadas.
No entanto, ele acredita que o Estado deveria estipular limites sobre a quantidade de riqueza que os capitalistas podem reter dos frutos de seu trabalho. Para fazê-lo, ele imagina alíquotas de imposto de renda que se aproximariam de 80% sobre rendas acima de US$ 500 mil, combinada com uma alíquota anual de 10% sobre a riqueza existente (em todas as suas formas: propriedades, artes, propriedade intelectual, etc). Para ser efetiva, ele argumenta que esses tributos confiscatórios deveriam ser impostos globalmente de forma que as pessoas ricas não pudessem transferir seus ativos para outras partes do mundo, fugindo, assim, da tributação. Ele admite que essas transferências podem na verdade não aumentar a arrecadação tributária, as quais poderiam ser usadas, supostamente, para ajudar os pobres. Em vez disso, ele afirma que a questão principal é simplesmente evitar que as pessoas ricas permaneçam ricas ou que enriqueçam.
Dado que seria ingenuidade presumir que os ricos continuariam a trabalhar e investir no nível atual uma vez que tivessem de encarar as barreiras impostas por Piketty, ele claramente acredita que a economia não sofreria nada com isso. Dado o esforço que é demandado para se obter o lucro e o valor que todo mundo coloca sobre o seu tempo livre, provavelmente todos aqueles empreendedores simplesmente decidirão que 100% de esforço por um retorno de 20% não vale a pena. Piketty realmente acredita que a economia seria beneficiada se os Steve Jobs e os Bill Gates do mundo simplesmente decidissem parar de trabalhar tão logo fizessem meio milhão de dólares?
Como ele considera a riqueza herdada como o pecado econômico original, ele também advoga políticas tributárias que colocarão um fim nela. O que essa medida alcançaria? Se impedirmos a possibilidade de transferir dinheiro ou propriedade a crianças, as pessoas bem sucedidas tenderão a gastar em serviços de luxo (viagem e entretenimento) do que poupar e se planejar para o futuro. Enquanto a maioria dos economistas modernos acredita que a poupança é prejudicial já que reduz o gasto corrente, ela é, na verdade, o capital que financia o crescimento econômico de longo prazo. Ademais, negócios gerenciados com vistas ao longo prazo tendem a oferecer valor incremental à sociedade. Colocar os filhos nos negócios da família também gera valor, não somente para os acionistas, mas para os consumidores. Contudo, Piketty preferiria que os empresários fechassem as portas antes que seus filhos crescessem e fizessem parte do negócio. Como, exatamente, isso beneficia a sociedade?
Se a renda e a riqueza são cortadas, as pessoas com capital e rendas acima desse limite não terão incentivos para investir ou emprestar dinheiro. Acima de tudo, porque correr o risco quando quase todo o retorno seria perdido em tributos? Isso significa que existirá menos capital disponível para ser emprestado aos negócios e indivíduos. A consequência direta será o aumento das taxas de juros, prejudicando o crescimento econômico. Os tributos sobre a riqueza exercerão pressão altista similar sobre as taxas de juros, através da redução dos volumes de capital que estão disponíveis para empréstimo. Pessoas ricas saberão que qualquer riqueza não gasta será tributada em 10% anualmente, de forma que somente os investimentos com retorno maior do que 10%, por uma margem ampla o suficiente para compensar o risco, deveria ser considerado. Essa é uma grande barreira.
A falha principal nos seus argumentos não é moral, ou mesmo computacional, mas sim lógico. Ele nota que o retorno do capital é maior do que o crescimento econômico, todavia falha em considerar comm o capital “gera” benefícios para todos. Por exemplo, é fácil ver que Steve Jobs recebeu bilhões pelo desenvolvimento e venda de produtos da Apple. Tudo o que você precisa fazer é verificar a conta bancária dele. Contudo, é muito mais difícil, se não impossível, medir o benefício muito maior gerado pelas suas ideias na sociedade. Isso é perceptível se você fizer as perguntas corretas. Por exemplo, quanto alguém teria de pagá-lo para que você, voluntariamente, não usasse a Internet por um ano? Provavelmente, a maioria dos americanos escolheria um valor superior a US$ 10.000 dólares. Isso por um serviço que muitas pessoas pagam menos do que US$ 80,00 mensais (às vezes é até grátis, se você consumir uma xícara de café). Esse diferencial é a “matéria escura” que Piketty não consegue identificar, porque nem mesmo se importa em procurar.
De alguma forma, nas várias décadas de sua pesquisa, Piketty negligenciou o fato de que a Revolução Industrial reduziu a desigualdade como um todo. Os camponeses, que tinham estado presos na agricultura de subsistência por séculos, se encontraram com possibilidades econômicas muito maiores dentro de poucas gerações. Então, enquanto a sociedade feudal era dividida em alguns grupos que eram muito ricos e as massas que eram miseravelmente pobres, o capitalismo criou a classe média pela primeira vez na história e permitiu a possibilidade de real mobilidade econômica. Como subproduto, alguns dos empreendedores mais bem sucedidos obtiveram as maiores fortunas vistas até então. No entanto, Piketty somente dá importância aos extremos. Isso porque ele, e seus seguidores, são impulsionados muito mais pela inveja do que pelo desejo do sucesso. No mundo real, todavia, onde a inveja não é comestível, o padrão de vida é o que realmente importa.
// Tradução de Matheus Pacini. Revisão de Ivanildo Terceiro. | Artigo Original
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