Só desistiu de concorrer porque iria perder, mas quer continuar mandando, como sempre mandou, apenas que hoje convertido em capataz do senhor de todos os capatazes.
E quem o chamou de maior ladrao do Brasil fou justamente aquele que é hoje seu maior aliado, o guia genial dos povos, e o chefe de todos os chefes, o atual dono do atraso da política brasileira.
Eles se merecem...
Paulo Roberto de Almeida
Meus caros, este discurso do Nivaldo Cordeiro eu jamais esqueci, porque é a síntese sobre José Sarney mais perfeita que já li. Trata-se de um artigo de 2009 que continua atualíssimo hoje, depois que recentemente aquele político maranhanse declarou que não vai concorrer a cargos públicos.
Por Nivaldo Cordeiro
Junho de 2009
Eu sempre soube que José Sarney nunca foi um estadista, no sentido dicionarizado de ser uma pessoa que tem liderança política e sabedoria para se portar acima dos interesses gremiais menores e em prol dos interesses gerais. Sempre me pareceu que o senador pautou sua vida política pela mesquinharia, pelo compadrio, pelo usufruto do poder de Estado para fazer prevalecer seus instintos de clã naquilo que tem de mais retrógrado. Tem me parecido que a ética dos cupinhas é a que preside as relações dele com o poder, desde a origem.
A crise que eclodiu nos últimos dias, em torno dos atos ditos secretos do Senado (uma vergonha inominável, mais do que uma afronta à Constituição), é a expressão mais degradante das práticas nepotistas que se tem notícia. Esses atos colocaram Sarney sob as luzes da ribalta e atraíram a ira de toda a Nação brasileira. Noticiou-se que irmão, neto, sobrinho - e sabe-se lá mais quantos familiares seus - foram objeto dessa forma suja de ocultação do ato administrativo ordinário. Houve uma locupletação espantosa da parentela com as verbas públicas.
O que mais incomodou no discurso de Sarney foi o pseudo tom majestático que o senador lhe deu, como se o seu passado servisse de biombo para esconder as pequenas estripulias nepotistas que foram noticiadas, como se, associadas a elas, não estivesse a falta gravíssima de não se dar a devida publicidade legal aos atos de gestão.
Nem o passado do senador Sarney é grandioso e nem as atuais denúncias são miudezas. Elas testemunham, sim, a mesquinharia de quem se julga dono do poder e acima das leis, como um faraó renascido no Maranhão. Nem ditadores conseguiram essa proeza de ficarem acima das leis, quanto mais nobres senadores, símbolos da República e das práticas republicanas, que têm que dar satisfação cotidiana dos seus atos.
Graças a Deus ainda vivemos dentro de uma sociedade aberta e que tem uma imprensa livre, apesar de tudo. Nada pode ter ocultação permanente, esse é o testemunho que nos ficou dos grandes escândalos recentes do governo Lula, como o do mensalão, de triste memória.
E numerar a longa carreira política do senador como álibi no seu discurso só demonstrou a má fé que lhe move. Qualquer ser, se somar seus atos bons e esconder seus atos indignos, poderá fazer crer aos interlocutores que é um portador de santidade, uma evidente falsificação. O fato é que sua vida política, para além dos cargos eletivos ocupados e das honrarias angariadas por força desses cargos, ao longo de sua vida pública, aí incluindo a eleição para a Academia Brasileira de Letras, está longe de ser virtuosa.
Toda a gente sabe de sua responsabilidade maior sobre a origem da hiperinflação, que legou ao término de seu mandato na Presidência da República, testemunha indelével da má gestão administrativa oriunda de sua ética de cupinchas . Eu próprio pude testemunhar a febre de nomeações imorais de levas de levas de cabos eleitorais, para cargos públicos estáveis, durante o seu governo, sob a vigência da lei anterior à Constituição atual, legalidade que jamais serviu para esconder a imoralidade do que foi feito.
Os últimos dias antes de viger a nova Constituição foram pavorosos em matéria dessas nomeações imorais, devidamente assinadas nos decretos pelo presidente em exercício. Basta consultar o Diário Oficial da época, pois então não se usava a prática de atos secretos.
Nunca é demais recordar que o Estado do Maranhão continua a ser uma das unidades federativas mais pobres e subdesenvolvidas do Brasil, em grande parte por causa da incúria dos governantes que se sucederam no poder ao longo das últimas décadas, basicamente Sarney em pessoa, seus familiares e seus compadres políticos.
Que retórica mais pobre essa de tentar colocar como escudo protetor o espírito corporativo do Senado, como podemos ler no trecho: "não é a primeira vez que digo isso aqui, vou repeti-la - a instituição é maior do que todos nós somados". Claro que a instituição é maior do que cada um dos seus membros isolados, claro que o Senado é uma das faces do povo brasileiro. Pura redundância, um truísmo. Mas não se pode dizer que as travessuras nepotistas secretas denunciadas tornem um dos pares diferenciados dos demais em sentido positivo, mas o torna certamente diferenciado em sentido negativo, motivo de execração pública.
É possível que a gravidade do escândalo leve eventualmente à abertura de processo de cassação dos responsáveis, se o Senado reagir à altura do que esperam muitos dos brasileiros, entre os quais me incluo.
"Não seria agora, na minha idade, que iria praticar qualquer ato menor que nunca pratiquei na minha vida", declarou Sarney. Precisamente o contrário! Em qualquer idade que ele tenha transitado no poder, mormente agora, o que se ouve é que a prática nepotista sempre foi usada, alargada para atender toda sorte de compadrio político. Os documentos vindos a públicos atestam isso à sobeja.
Querer diluir a presente crise no contexto de uma suposta crise global da instituição dos parlamentos pelo mundo é recurso sofistico atroz. É como se não existisse fato causador do escândalo que tomou conta dos meios de comunicação, como se o escândalo não tivesse motivação concreta, sabida e reconhecida. Todos os nomeados têm o seu sobrenome ou lhe são aparentados.
Mesmo assim o senador Sarney não teve pejo de dizer: "Então, é com essa responsabilidade que nunca tive meu nome associado a qualquer das coisas que são faladas aqui dentro do Congresso Nacional, ao longo do tempo, porque isso é uma crise mundial. O que se fala aqui no Brasil sobre o Congresso fala-se na Espanha, fala-se na Inglaterra, fala-se na Argentina, fala-se em todos os lugares".
Ora, se o irmão de Sarney, seu neto, sua sobrinha e sabe-se lá mais quem são denunciados pela imprensa, então é o nome, sim de Sua Excelência, que está conspurcado pelo nepotismo. Eles, os seus parentes diretos, estão lá precisamente porque você é senador da República e no momento é o presidente do Senado Federal. Os parentes nunca estiveram lá por méritos pessoais. Seus parentes diretos não apenas adquiriram ricos proventos em cargos públicos sob a sua jurisdição, e até mesmo um garoto que pode se dizer ainda imberbe e não formado, netoseu, lá foi nomeado.
Não há grandeza alguma no discurso de Sarney, mas uma majestade postiça e inconveniente que agrediu aos que lhe ouviram e agride àqueles que leem a peça. Pura retórica vazia. Uma palavra fantástica que nunca terá o poder de fantasiar o mal feito. O discurso bem poderia ter sido mais singelo e curto e substantivo, que dissesse o que a Nação quer ouvir, mas seria demais esperar tal grandeza.
Eu nunca esperei!
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