sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Teoria da jabuticaba, prolongamentos eleitorais - Paulo Roberto deAlmeida e ???

Um amigo me enviou a seguinte mensagem, hoje:

As jabuticabas eleitorais (Ou as soluções exclusivamente brasileiras para qualquer assunto contra qualquer evidência de lógica em sentido contrário)

26/09/2014 - 08h02
Mais  três jabuticabas de nossa frondosa árvore amadureceram esta semana: a proposta de diálogo com os terroristas  decepadores de cabeças do Estado Islâmico, a onda da razão que não chegou até a praia, e a substituição definitiva das lideranças políticas pensantes por marqueteiros que plantam ilusões, vendem mentiras, e colhem milhões.
teoria da jabuticaba, desenvolvida pelo escritor e diplomata Paulo Roberto de Almeida, que ainda pretende apresentá-la formalmente à comunidade acadêmica, consiste em defender soluções exclusivamente brasileiras para qualquer assunto contra qualquer evidência lógica em sentido contrário.
Foi o que Dilma Rousseff  fez na ONU, antes e durante o discurso de abertura da assembléia geral, formalidade que o protocolo reserva ao chefe de Estado Brasileiro desde 1947.
Depois de lamentar “profundamente” o ataque  aéreo realizado pelos EUA em território sírio contra os terroristas do Estado Islâmico (ISIS), ela disse:
- O Brasil sempre vai acreditar que a melhor forma é o diálogo, o acordo, a mediação da ONU.
Uma platitude ginasiana, que infantiliza a diplomacia brasileira, como se o ISIS fosse uma organização política legítima com quem se pode sentar à mesa e negociar (O que? A forma mais humana de cortar cabeças ?) e não um grupo jihadista sunita que estupra, mata, decepa as cabeças de mulheres e de “infiéis” e espalha o terror, repelido pelos Estados Unidos e uma coalizão de 50 países, pela própria ONU e até pela “moderada” Al Qaeda.
Como se isso fosse pouco, a presidente usou metade do tempo de seu discurso para contar ao mundo as maravilhosas realizações de seu governo, como se o horário obrigatório de propaganda eleitoral tivesse sido imposto ao mundo.
Uma jabuticaba amarga.
Uma jabuticaba eleitoral foi plantada pela campanha de Aécio Neves, que resolveu batizar  um esboço de reação nas pesquisas como o início de uma “onda da razão”, que iria varrer o país para transformar todos os eleitores em filósofos cartesianos.
Onda de razão é uma contradição em termos, quase um oxímoro, como Partido do Socialismo e da Liberdade. Assim como não se conhece uma experiência concreta da convivência de socialismo com liberdade, o significado da palavra “onda” simplesmente exclui a possibilidade de sua convivência com a razão. Ondas são emocionais, turbulentas, irracionais - a antítese da razão.
Um “wishful thinking”  inventado pelos marqueteiros do neto de Tancredo Neves, com ínfimas chances de dar certo.
A terceira jabuticaba  é a nova roupagem do nosso velho conhecido: o  pensamento mágico, aquele que cria do nada o dinheiro com que o governo paga as suas contas, e que, temperado com uma certa dose de delinquência intelectual, transforma Marina Silva em uma “neoliberal”.
A jabuticaba, também chamada guapuru ou fruita (Foto: Arquivo Google)
A jabuticaba, também chamada guapuru ou fruita (Imagem: Arquivo Google)
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Continuo (PRA):

Fui verificar o link fornecido, e ele remete a um antigo texto meu, de 2005, publicado num jornaleco esquerdista, Espaço Acadêmico, com o qual eu colaborava, até que eles, confirmando que só gostam de quem concorda com eles, dessem por terminada minha colaboração. Aqui vai:

Teoria da Jabuticaba, I: prolegômenos
Espaço Acadêmico, n. 54, novembro de 2005

No contexto da produção sociológica, categoria das obras “inúteis e inacabáveis”, estou interessado em formular e propor formalmente à comunidade acadêmica, uma “teoria da jabuticaba”. Explico rapidamente do que se trata e volto depois aos meus prolegômenos, já que esta teoria deveria merecer, no Brasil, elaboração mais sofisticada, tendo em vista sua relevância teórica na vida intelectual do país e sua importância prática para a própria organização da nacionalidade.
Teoria da jabuticaba é tudo aquilo que só existe no Brasil, como essa saborosa fruta selvagem da respeitada família das mirtáceas (myrciaria jaboticaba). Isso significa, para ser rápido, pertencer a uma família de “explicações sociais” única e exclusiva neste planeta Terra, situação inédita no plano universal, que consiste em propor, defender e sustentar, contra qualquer outra evidência lógica em sentido contrário, soluções, propostas, medidas práticas, iniciativas teóricas ou mesmo teses (em alguns casos, até antíteses) que só existem no Brasil e que só aqui funcionam, como se o mundo tivesse mesmo de se curvar ante nossas soluções inovadoras para velhos problemas humanos e antigos dilemas sociais.
Como já disse um ministro do ancien régime, pensando nas propostas geniais que volta e meia pipocavam com estridência nos meios da oposição (hoje situação), “para cada problema complexo, existe uma solução simples, em geral equivocada”. Pois a teoria da jabuticaba pertence, justamente, a essa família das respostas rápidas a problemas complicados que, aparentemente, se conformam ao chamado senso comum, mas que no fundo derivam de concepções equivocadas sobre a origem desses problemas e apontam para soluções mais errôneas ainda. Nem por isso essas soluções “geniais” deixam de ser apresentadas como a mais perfeita resposta “indígena”, isto é autônoma, a problemas supostamente universais, enchendo de justo orgulho seus formuladores e promotores.
Pois bem, vejamos em primeiro lugar o estatuto do “fenômeno” antes de entrar em seus fundamentos epistemológicos. Infelizmente, se é verdade que ela existe, de fato, trata-se de uma teoria extremamente rara et pour cause. Uma pesquisa rápida na Internet – via Google “normal” – revelou a existência de apenas oito “reações” a essa menção entre aspas, dentre cerca de 33 possibilidades virtuais, mas aparecem respostas repetidas, como uma pesquisa mais acurada se encarregou de comprovar. De fato, uma investigação mais focada nessa expressão – via Google Scholar – deu zero resultado (“Your search – “teoria da jabuticaba” – did not match any articles”), o que não deveria surpreender além da conta. Afinal de contas, essa temática ainda não existe enquanto objeto de preocupações acadêmicas e a teoria ainda precisa ser construída (e testada).
Não seja por isso: estou decidido a “desenterrá-la” enquanto conceito respeitado e respeitável e mesmo a propor sua elevação à categoria de recurso heurístico, para casos evidentemente complicados, como ocorrem ser os problemas sociais do Brasil. Aliás, dos oito retornos na pesquisa Google, dois se referem a um texto anterior meu, sobre o “fim do desenvolvimento” (artigo publicado na revista eletrônica Intellector, disponível no linkwww.revistaintellector.cenegri.org/pauloralmeida.pdf, ou então em meu próprio site:www.pralmeida.org/05DocsPRA/1353FimDesenv.pdf), no qual argumento que o Brasil já é, para todos os efeitos práticos, um país desenvolvido, bastando agora melhorá-lo socialmente (não, sinto muito, mas isto não é uma demonstração da referida teoria).
Uma pesquisa mais acurada sobre os fundamentos epistemológicos da teoria da jabuticaba certamente revelaria seus traços fundamentais, no contexto da formação social brasileira, contribuindo, quiçá, ao desenho de uma proposta explicativa abrangente – no sentido da Verstehen weberiana –, podendo inclusive contribuir para o oferecimento de algum “tipo-ideal” de explicação “jabuticabal”, em perfeita sintonia com o que se espera de uma verdadeira teoria do conhecimento. Antes que isso se faça, vejamos rapidamente quais seriam os contornos conceituais da teoria da jabuticaba, para oferecer em seguida alguns exemplos práticos de como ela se apresenta no Brasil (e daqui para o mundo).
Essa “teoria” – concedamos-lhe aspas, por enquanto, já que alguns poderiam objetar ao seu estatuto “científico” – se apresenta, antes de mais nada, como uma anomalia lógica. Isto é: ela se refere a algum evento real, a algum processo efetivamente existente, mas ela introduz uma irregularidade ou anormalidade nesse processo, ao formular proposições que são aparentemente factíveis ou até mesmo necessárias, mas que contrariam profundamente a lógica formal, quando não a trajetória normal daquele processo ou evento. Nota de dicionário: segundo o Aurélio, anomalia, em astronomia, se refere a “qualquer desigualdade periódica na trajetória normal de um planeta”, o que me convém inteiramente, sendo o planeta, no caso da “minha” teoria, este nosso Brasil. A “teoria da jabuticaba” também contraria a lógica, mas ela tem toda a aparência de algo normal, de solução absolutamente adequada ao problema que tenciona enfrentar.
A “teoria” em questão constitui, em segundo lugar, uma contradição nos termos, uma vez que ela consagra o próprio problema que pretende resolver. Ou seja: o que ela proclama não é a solução do problema, mas sua eternização ou perenidade, pois a solução desse problema a inviabilizaria enquanto “teoria”, isto é (ainda segundo o dicionário), um conjunto de princípios fundamentais ou de proposições sobre um domínio qualquer de conhecimento. Para que ela seja “teoria” e adquira com isso a devida respeitabilidade é preciso que o aglomerado de banalidades lógicas que ela pretende promover seja aceito enquanto “solução genial” a angustiantes problemas da nacionalidade.
A “teoria”, finalmente, é absolutamente indígena, autóctone, legitimamente nacional, como a própria fruta que lhe dá o nome, constituindo mais uma dessas nossas contribuições originais para o bem-estar da humanidade. Ela pode, talvez, rivalizar com o “jeitinho”, a “caipirinha”, a “broa de milho” (um ministro da cultura chegou a propor sua universalização) e outras tantas invenções, como por exemplo, no campo da ética política e da contabilidade partidária, a normalização do “caixa 2” e dos chamados “recursos não contabilizados”, que devem deixar boquiabertos de admiração nossos vizinhos imediatos e outros observadores estrangeiros.
Interrompo, pelo momento (prometendo voltar em outra ocasião), esta tentativa de sistematização de propostas sobre este campo novo de conhecimento prático – mas que ainda requer, volto a alertar, algum teste para sua validação empírica – para propor um conjunto de exemplos, nos mais diversos campos da inventividade nacional, destinados a ilustrar esta discussão inicial sobre a “teoria da jabuticaba”, esperando receber depois contribuições de gente mais sábia do que eu, ou de simples curiosos na matéria, leitores eventuais desta digressão utópica e interessados, como eu, em desvendar as razões do sucesso da referida teoria neste nosso Brasil. Vejamos alguns poucos casos nos quais se poderia aplicar a nova doutrina que aqui vem proposta em caráter preliminar.
Bolsa escola: Trata-se, obviamente, da genial solução encontrada para “reter” as crianças nas escolas e “obrigá-las” – aqui obviamente no sentido alegórico – a aprender alguma coisa, contra a prestação regular, geralmente de caráter mensal, de algum tipo de contribuição financeira, que se dirige à mãe do aluno visado, como contrapartida para o esforço de enviá-lo à escola, em lugar de ajudar no orçamento familiar mediante algum tipo de trabalho informal ou de simplesmente ficar na rua jogando bolinha de gude (não considero alternativas mais enriquecedoras). Esse programa, quando introduzido em caráter experimental, depois testado em escala mais ampla no Distrito Federal, chegou a ser incorporado, em escala modesta, pelo governo federal, tendo sido inclusive oferecido, pelo seu principal propagandista, à comunidade internacional, como se um “bolsa escola universal” fosse algo de que devêssemos nos orgulhar e vangloriar.
Ele é, no entanto, um perfeito exemplo da teoria da jabuticaba, pois que incide sobre um problema real – a ausência dos bancos escolares de crianças de famílias carentes – e propõe a solução aparentemente lógica: pagar pela freqüência. Que o programa seja apresentado como solução provisória, emergencial e com um horizonte finito de aplicação (isto é, tendencialmente dispensável) pode ser aceito por qualquer mente aberta e propensa a aceitar second best solutions. Que ele seja considerado como a trouvaille genial capaz de nos conceder um prêmio Nobel de economia (ou da paz), sendo, como tal, digno de exportação, constitui, precisamente, o paradigma acabado do que se requer como teste prático da citada teoria.
Parece evidente, com efeito, que em qualquer país normal o objetivo básico a ser alcançado pela política macroeconômica seja uma dinâmica econômica suscetível de fornecer emprego e renda em níveis suficientes à maior parte dos cidadãos, que podem assim prover às suas necessidades básicas, inclusive a manutenção dos filhos nas escolas públicas com o adequado provimento de material escolar. A anomalia é justamente esta: o bolsa escola não é algo de que devemos nos orgulhar, mas a confissão estarrecedora de nossas piores mazelas econômicas e sociais, uma excrescência assistencial que transforma pais e mães em dependentes crônicos da mesada dos filhos.
Tal como concebido – e eventualmente desativado por não se sabe qual razão imperiosa de racionalidade fiscal – o bolsa escola tinha tudo para se perpetuar como programa de transferência de renda por motivos aparentemente nobres e compreensíveis nas condições brasileiras. Mas ele constitui a confissão de um fracasso, não o retrato de um estado desejável de “inclusão social”. O surpreendente, justamente, é que ele seja apresentado, orgulhosamente, como programa exemplar. É tudo o que se requer de um modelo acabado de “teoria da jabuticaba”.
Bolsa família: Trata-se de uma derivação ou substituição do anterior, ou melhor, uma consolidação de diversos programas sociais, tendente a conceder auxílio a famílias vivendo com menos de meio salário mínimo. No Brasil se conseguiu tirar um número da cartola – 11,5 milhões de famílias – e se persegue ardorosamente o objetivo de incluir todas elas no mensalão governamental. É um outro nobre objetivo, o de fazer com que cada brasileiro tenha três refeições por dia, café, almoço e janta, nessa ordem e com essa simplicidade cartesiana. Não se cogitou de investimentos em infra-estrutura e educação, não se cogitou de promover o emprego e a formação técnico-profissional, ainda que esses objetivos figurem entre os elementos declarados do programa. O elemento novo em relação ao programa anterior é, justamente, essa vontade deliberada de incluir o maior número possível de brasileiros “assistíveis”, não o de tornar “desassistíveis” o maior número de pessoas por via de capacitação profissional e inclusão no mercado de trabalho, que não comparece em absoluto, tendo sido substituído pelo símbolo mágico do “cartão magnético”. Ao contrário: o mercado foi declarado incapaz de resolver os problemas sociais do Brasil, uma curiosa excepcionalidade em dez mil anos de história civilizada.
A “teoria da jabuticaba” entra, precisamente, por esse viés assistencialista que o programa inevitavelmente carrega consigo, como se o objetivo maior das três refeições diárias tivesse necessariamente de passar pelas mãos do governo, no caso o brasileiro. Ao proclamar que o combate à fome é um “objetivo estratégico” do país, as autoridades responsáveis não se dão conta de que, ao fazê-lo, eles estão na verdade confirmando o fracasso do Brasil enquanto sociedade e enquanto nação, pois a alimentação diária é algo tão básico e elementar que sequer mereceria figurar entre os “objetivos estratégicos” de qualquer nação, só ocorrendo neste país por uma dessas manifestações recorrentes da “teoria da jabuticaba”. Não estou obviamente considerando aqui aspectos políticos ou diretamente eleitorais do programa em apreço, mas apenas sua “lógica jabuticabal”.
Reserva de mercado para jornalistas: Não é só uma excrescência, é uma perfeita aberração, em tudo e por tudo contrária ao bom senso, à lógica econômica, à boa gestão das empresas de mídia e às necessidades dos leitores e consumidores de informações jornalísticas. Infelizmente, escrevo esta rubrica da “teoria da jabuticaba” – tendo já uma antiga birra contra a obrigatoriedade de diploma de jornalista para trabalho em jornal – no exato momento em que uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (Brasília) cassou uma decisão que declarava inconstitucional uma decisão de primeira instância, que se opunha à obrigatoriedade do diploma de jornalista. Não conheço outro país que imponha essa condição para o exercício da profissão, que deveria estar ao alcance de qualquer profissional, com ou sem diploma, medianamente instruído nas artes da língua e disposto a se aperfeiçoar na prática diária, não nos bancos das faculdades de jornalismo, que são uma outra faceta dessa guilda de defensores do mercado fechado que é formada pelos sindicatos de jornalistas. Essa exigência absurda preenche todos os requisitos para se qualificar de pleno direito como membro distinguido da família da “jabuticaba”.
Muitos outros exemplos poderiam ser arrolados em apoio desta minha construção tentativa de uma teoria da jabuticaba – e estou aguardando contribuições voluntárias de leitores atentos – mas esses poucos bastam para chamar a atenção sobre como é rica e variada a nossa galeria de modelos ideais da referida teoria. Seria preciso, a partir de agora, continuar a obra de formalização conceitual da teoria em questão, propor alguma estrutura explicativa convincente sobre as razões de porque ela encontrou um terreno particularmente fértil no Brasil – certamente que outros países terão suas particularidades e bizarrices nacionais, sendo os Estados Unidos um grande candidato a galardão nessa área – e prosseguir a obra de compilação de exemplos patentes e reconhecidos da referida teoria (com vários outros incógnitos e não sabidos). Estou seguro de que a teoria se sustenta totalmente com base na vasta experiência nacional em matéria de bizarrices econômicas e de surrealismos jurídicos. As bases estão lançadas: falta agora completar a cartografia do modelo. Mãos à obra!

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Continuo e concluo:

Depois da "teoria", ainda fiz mais uma ou duas matérias com exemplos práticos de jabuticabas (que por definição são exclusivamente brasileiras). Nisso sou muito ajudado pelo pessoalzinho do PCdoB, inclusive deputados, que são especialistas em propor soluções jabuticabais aos nossos problemas mais agudos.
Voltarei ao assunto.
Paulo Roberto de Almeida 
Hartford, 26/09/2014

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