Paulo Roberto de Almeida
País não deve importar agenda de política externa de Trump, diz Sandra Rios
Sandra Rios: O lado positivo dessa mudança é que facilita a coordenação das políticas de comércio exterior. Hoje, os instrumentos de política comercial são distribuídos em diferentes ministérios, principalmente nos atuais Mdic e Fazenda. E eles costumam ter visões distintas sobre política comercial, abertura, necessidade de proteger 1 ou outro setor. É claro que é uma mudança muito grande e há riscos operacionais, mas acho que tem a vantagem de garantir coerência às políticas.
A última reforma comercial relevante foi feita na 1ª metade da década de 1990. Naquela época, abrimos a economia, negociamos o Mercosul e deixamos o país mais ou menos em linha com o que a maior parte dos países em desenvolvimento estava fazendo. A partir de 1995 não houve mais nenhum movimento de abertura e, ao contrário, a partir de 2008 1 conjunto de medidas acabou aumentando a proteção à indústria nacional. Isso teve 1 impacto importante sobre a evolução da produtividade e nossa capacidade de competir no mercado internacional.
O que é fundamental agora é atualizar a nossa política comercial para ficarmos mais em linha com outros países em desenvolvimento de grande porte, como Indonésia e México.
O 1º elemento é a redução da tarifa de importação, levar o país a padrões de outros países em desenvolvimento. Essa reforma é muita vezes combatida com o argumento de que é melhor abrir a economia negociando acordos comerciais, porque aí você abre o mercado, mas ao mesmo tempo ganha mais acesso ao mercado exportador.
Achamos que o Brasil deve continuar negociando acordos comerciais, mas são processos complexos, demorados. Estamos negociando com a União Europeia, por exemplo, há mais de 20 anos. O acordo ainda não foi concluído e acho que não vai sair tão cedo.
Em economia, não se pode esperar tanto tempo. Ninguém está falando em eliminar tarifas de importação, mas reduzir 1 pouco os níveis para tornar a estrutura mais racional enquanto se negocia acordos comerciais.
Um critério importante é a relevância do parceiro. Nos últimos anos, mais notadamente a partir de 2010, a gente concluiu acordos que não vão promover nenhuma mudança na nossa estrutura produtiva e capacidade de competir. O acordo com a UE, esse sim, se fosse implementado, faria com que sentíssemos uma mudança grande no futuro.
O país deve buscar parceiros relevantes, que tenham oferta complementar à nossa. Isso vale, por exemplo, para EUA, Canadá, Japão e Índia. Mas em todos esses casos são negociações complexas.
O Mercosul foi criado como uma união aduaneira. Mas desde o início ficaram evidentes as dificuldades de se implementar o modelo que, em teoria, é superior em termos de integração comercial. Se pudesse funcionar assim, seria ótimo.
Só que os países têm estruturas produtivas diferentes, prioridades diferentes e o que aconteceu foi que se estabeleceu regimes de exceção que foram aumentando com o tempo. Além disso, os países, principalmente Brasil e Argentina, colocaram barreiras ao comércio intrabloco. Assim, não avançamos em vários pontos.
A questão é se vale a pena manter o modelo de união aduaneira, que toma muito tempo das negociações. Nossa visão é que é melhor colocar a atenção nas questões relacionadas à área de livre comércio.
As declarações me parecem equivocadas. Não faz sentido o Brasil entrar nesse movimento de transferência da embaixada em Israel para Jerusalém. Também não vale a pena entrar em disputa comercial com a China, que é o nosso principal mercado. É uma importação da agenda do Trump sem levar em consideração que os recursos de poder e interesses dos países são muito diferentes.
No caso da China, é claro que isso foi provocado também pela percepção de que o país está investindo em setores estratégicos do Brasil, mas mesmo que a gente se aproxime dos EUA, o que acho importante, não vamos vender para eles os produtos que vendemos para a China.
Tem também a questão da retirada do Brasil do Acordo de Paris, que vejo como outro equívoco. A agenda da sustentabilidade interessa ao país, reforça nossos interesses econômicos.
O que preocupa são manifestações no sentido de distanciamento do Brasil de organismos multilaterais. Há críticas do governo eleito, por exemplo, à participação da OMC (Organização Mundial do Comércio) na nossa agenda de política comercial, mas a instituição é muito importante para 1 país como o Brasil, que tem pequena participação no mercado internacional e exporta produtos agrícolas, cuja regulação se dá basicamente na OMC.
O que vem sendo ventilado é de abertura em diversas frentes. Parece positivo, mas ainda não temos detalhes.
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