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sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Risco de isolamento na diplomacia - Eliane Cantanhede (OESP)

Eliane Cantanhede alerta para os riscos de isolamento do Brasil, eventualmente derivados de uma postura diplomática da nova administração excessivamente em oposição, ou muito alternativa, em relação às posições tradicionais do Itamaraty, ou em confronto com o que se fazia sob o chamado lulopetismo diplomático. Ela acha que o PT rachou o Itamaraty, e que o novo governo também poderá fazer o mesmo. Creio, pessoalmente, que pode ser um pouco diferente. Sob o lulopetismo, com exceção das bolivarianices conhecidas, e de uma secreta, clandestina mesmo, aderência aos interesses dos seus mestres cubanos, os companheiros preservaram aquilo que era o mainstream do Itamaraty tradicional: desenvolvimentismo, multilateralismo, terceiro-mundismo, antiamericanismo, anti-imperialismo, anti-hegemonismo, as tais de parcerias estratégicas com alguns atores do mundo não-hegemônico, atuação por meio do Grulac, do G-77 e outros grupos de "periféricos", integração regional, prioridades para a América do Sul, a Africa, defesa dos temas globais do politicamente correto e das causas progressistas, enfim, esse mundinho que o Itamaraty conhecia e conhece muito bem. O que se promete de janeiro em diante é bastante diferente, dai as advertências premonitórias de observadores, estudiosos, diplomatas, parceiros, enfim, tutti quanti circulam em torno da política externa e da diplomacia brasileira no último meio século. Será que vamos mudar tanto assim?
Paulo Roberto de Almeida

Brasil torce o nariz para o multilateralismo e aposta num nacionalismo arrogante
Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo 
14 Dezembro 2018 | 05h00

Se há três áreas em que o Brasil tem protagonismo consolidado nos foros internacionais, essas áreas são meio ambientedireitos humanos e migração. O temor é o Brasil encolher e retroceder justamente nas três, não só pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, mas também pelo futuro chanceler Ernesto Araújo e suas ideias extravagantes. 
Qualquer um que tenha participado de grandes encontros sobre meio ambiente sabe, viu, constatou como a voz do Brasil é relevante, não só pela Amazônia, mas pela grande biodiversidade brasileira. Como “Deus é brasileiro”, não temos tsunamis nem terremotos, mas, sim, sol o ano inteiro, água doce e salgada, florestas variadas, combustível fóssil e renovável, solo fértil, vento e chuva. E uma das leis mais modernas na área. 
O Brasil também pode se orgulhar de, depois de vinte anos, ter feito a transição do regime militar para a democracia sem um único tiro, uma única gota de sangue, e assim passou a ser uma voz ouvida e respeitada na área de direitos humanos – apesar de tudo, principalmente do horror medieval nas penitenciárias e cadeias comuns. 
Por fim, o povo brasileiro é uma síntese de todas as etnias e dos mais variados sobrenomes do mundo todo. O nosso País é lindamente multiétnico e acolhedor. Isso tem enorme valor, atrai respeito, admiração e espaço nos grandes debates sobre migração, como na construção do Pacto Global de Migração, que reúne 160 países. 
É surpreendente, portanto, a forma como o futuro chanceler (faltam alguns dias...) Ernesto Araújo puxou o tapete do atual, Aloysio Nunes Ferreira. Em Marrakesh, o ainda chanceler subscrevia o pacto em nome do Brasil. Em Brasília, seu quase sucessor anunciava, simultaneamente, que o Brasil vai sair do pacto. Nada poderia ser mais antidiplomático. 
“Foi mais do que surpreendente, foi chocante”, disse Nunes Ferreira por telefone, depois de ter reagido a Ernesto Araújo pelo mesmo veículo que ele usara para negar o pacto de migração: o Twitter. Novos tempos. 
São sinais preocupantes da política externa, já rechaçados pela China, pelo Egito, agora pela Alemanha, que põe o pé no freio no acordo União Europeia-Mercosul, e pela Liga Árabe, que acaba de entregar uma carta no Itamaraty questionando a mudança da embaixada brasileira, de Tel-Aviv para Jerusalém, o que agrada a Israel e irrita todo o mundo árabe. 
Essas manifestações e ações de Araújo – logo, de Bolsonaro – seguem um único mentor, Donald Trump, e uma ideologia, o antimultilateralismo. Sai a adesão aos órgãos multilaterais ou regionais, como ONU, OMC, Mercosul, e entra em cena um nacionalismo a la Trump: voltado para dentro, voluntarioso, arrogante, de confronto. 
Todas as sinalizações externas do governo Bolsonaro replicam, sem tirar nem por, as posições de Trump: contra o Acordo de Paris, contra o Pacto de Migração, beligerância com a China, alinhamento explícito a Israel, implicância com a ONU e a OMC... Só que, assim como o Brasil não são os EUA, Bolsonaro não é Trump. E nem tudo o que é bom para os EUA é bom para o Brasil.  
Se as exportações, a agricultura, a pecuária, os minérios e os programas de cooperação passarem a ser afetados, a coisa pode deixar de ser só pitoresca e ficar séria. Até por isso, já começa o recuo na resistência à China. 
Não falta quem questione o próprio papel do deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, e suas credenciais para ser a voz e a cara do Brasil no exterior. Sabatinar o futuro chanceler?! Falar pelo Brasil nos EUA sem passar pela embaixada ou pelos consulados?! 
Se o PT rachou o Itamaraty, essa postura e essas ingerências também vão rachar. A tendência é virar uma guerra e guerras nunca são boas.

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