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quarta-feira, 15 de janeiro de 2020
Livro sobre o primeiro ano do governo Bolsonaro - Thais Oyama
Paranoia de Bolsonaro emerge em livro que esmiúça crises do 1º ano de governo
Obra da jornalista Thaís Oyama expõe um político dado a decisões repentinas e com 'raciocínio binário' sobre aliados e inimigos
No livro “Tormenta”, a jornalista Thaís Oyama mostra como Jair Bolsonaro chegou ao Palácio do Planalto e, principalmente, como ele conduziu o governo federal ao longo deste primeiro ano de mandato.
Peça a peça, a autora reúne as principais decisões da administração, as relações com o Congresso, as participações em fóruns internacionais e as crises mais agudas. Ao lembrar esses episódios, Oyama esmiúça os jogos de poder nos bastidores, invariavelmente repletos de intrigas.
Nota-se pelo relato da jornalista, ex-redatora-chefe da revista Veja, que essas peças bolsonaristas formam uma torre instável. E, por ausência ou deficiência de comando, essa torre parece estar sempre prestes a ruir.
O Bolsonaro retratado por Oyama ao longo de 272 páginas é um homem público extremamente desconfiado. Cultiva muitas suspeitas, inclusive, em relação àqueles que o cercam.
Durante a campanha, depois de ser transferido para São Paulo após levar a facada em Juiz de Fora (MG), enfatizou que não queria ser internado no hospital Sírio-Libanês, “um hospital de petistas”, segundo ele. Foi conduzido para o Albert Einstein.
Também em meio à corrida eleitoral, desistiu de convidar Janaina Paschoal —hoje deputada estadual pelo PSL em São Paulo— para compor sua chapa como vice. “Essa mulher vai pedir meu impeachment”, disse à época, de acordo com Oyama.
Não se tranquilizou, porém, depois de escolher Hamilton Mourão como vice. Ao longo do primeiro ano de governo, sua relação com o general foi marcada pela tensão. O presidente desconfia que o vice cobiça o cargo máximo da República e, por isso, conspira contra ele.
“Num fim de semana de outubro, enquanto tomava água de coco na beira da piscina do Alvorada com um amigo, o presidente disse que, apesar do receio que tinha de ser alvo de drones, gostava de conversar ao ar livre porque dificilmente seria grampeado”, escreve Oyama. “Seu temor, confidenciou, era ser espionado por Mourão."
As paranoias de Bolsonaro alcançam o Congresso. Segundo a jornalista, o presidente determinou que assessores do amigo e deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ), conhecido como Hélio Negão, se dediquem a “caçar esquerdistas” no segundo escalão dos ministérios, o que implica vasculhar redes sociais atrás de menções a Lula, por exemplo.
“Jair Bolsonaro tem raciocínio binário, dizem conhecidos de longa data”, registra a autora. “Quem não é seu amigo é seu inimigo. E enquanto os amigos de verdade são poucos, os inimigos estão em toda a parte.”
O livro expõe ainda um político dado a decisões repentinas e com enorme dificuldade de dedicar atenção ao interlocutor quando o tema, ainda que seja importante, não lhe interessa.
Conforme noticiado na época, Moro enfrentou um processo de fritura de Bolsonaro em meio à crise com a Polícia Federal e à interferência do presidente no órgão. Na ocasião Bolsonaro afirmou: "Se eu não posso trocar o superintendente, eu vou trocar o diretor-geral". E completou: "Se eu trocar hoje, qual o problema? Está na lei que eu que indico e não o Sergio Moro. E ponto-final".
“A despeito dos conselhos de auxiliares, Bolsonaro decidiu que iria mesmo demitir Moro. ‘Vou pagar pra ver’, disse. O general Heleno, que já tinha gastado seu arsenal de argumentos em defesa do ministro, ao notar a determinação do presidente, descarregou a última bala: ‘Se demitir o Moro, o governo acaba’, disse”, escreve Oyama.
O ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), aliás, é presença constante no livro. O fato de Bolsonaro e o general Augusto Heleno serem próximos desde os anos 1970 não implica uma paciência ilimitada do alto oficial com o amigo presidente.
Na reta final da campanha, Heleno estava com Bolsonaro em um encontro com empresários em São Paulo. Num intervalo dessa reunião, Heleno se afastou de todos e, sem saber que estava sendo gravado, disse ao celular: “O cara não sabe nada, pô! É um despreparado”.
De acordo com a jornalista, durante encontros reservados ocorridos em setembro de 2019, o ministro do STF disse que um movimento golpista havia sido articulado por Mourão e outros generais meses antes.
Nessas ocasiões, Toffoli também falou que agiu para abortar a “quartelada” e avisou Bolsonaro, “que tomou suas medidas”.
A autora tentou ouvir Toffoli sobre esse episódio, mas ele não se manifestou.
Segundo Oyama, o mandatário pediu a Queiroz que faltasse a um depoimento ao Ministério Público do Rio de Janeiro.
De acordo com o livro, "dois dias antes da data estabelecida para o depoimento, Bolsonaro mandou abortar a operação —Queiroz não deveria mais comparecer ao interrogatório. O presidente eleito fora convencido por um advogado amigo que a melhor estratégia para abafar a história era tirar Queiroz e o Ministério Público Estadual do cenário e, por meio do foro privilegiado de Flávio, jogar o caso para o STF —onde poderiam resolvê-lo 'de outra maneira'. O nome do advogado amigo era Frederick Wassef".
Nas páginas finais de “Tormenta”, a jornalista descreve uma reunião de Bolsonaro com deputados aliados no Planalto. Discutiram um acordo do presidente com os partidos do chamado centrão para tirar o Coaf, órgão de inteligência financeira, das mãos de Moro.
Os parlamentares reclamaram com veemência do acerto, em nada condizente com o que anunciavam como “nova política”, e Carla Zambelli (PSL-SP) saiu da sala aos prantos. O presidente não se comoveu.
“Bolsonaro não cedeu à velha política de uma vez: curvou-se a ela aos pouquinhos”, escreve Oyama.
Nas redes sociais, Bolsonaro criticou o livro, que chega às livrarias no dia 20. "Essa imprensa é uma vergonha. Lê meus pensamentos e ministros se convencem a não demitirem a si próprios", disse nesta terça-feira (14).
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