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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Governo tem dinheiro sobrando para financiar a saude... (mas ele prefere o BNDES, para ricos)

Como é que o governo pretende reintroduzir a CPMF, supostamente para financiar a saúde, ao mesmo tempo em que ele corta 50 bilhões de reais do orçamento e concede 55 bilhões ao BNDES?
Você não acha que estão gozando da sua cara, caro leitor?
Paulo Roberto de Almeida

Créditos do BNDES crescem 391% em 5 anos e já são o triplo do Banco Mundial
Ricardo Leopoldo
O Estado de S.Paulo, 10/03/2011

No ano passado, banco de fomento concedeu US$ 96,32 bilhões em empréstimos, enquanto o Banco Mundial emprestou US$ 28,85 bilhões

SÃO PAULO - O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) empresta hoje o triplo do Banco Mundial (Bird). No ano passado, o banco brasileiro concedeu US$ 96,32 bilhões em empréstimos, valor 3,33 vezes superior aos US$ 28,85 bilhões do Bird.

Com a crise global, os bancos estatais e as instituições financeiras multilaterais aumentaram sua participação na economia. O ritmo do banco brasileiro, no entanto, foi bem superior ao do Bird. Entre 2005 e 2010, os empréstimos do BNDES cresceram 391% em dólares, enquanto os do Bird avançaram 196%.

Vale ressaltar, no entanto, que mesmo cinco anos atrás o banco brasileiro já emprestava mais do que o Banco Mundial. Em 2005, o BNDES concedeu US$ 19,6 bilhões em empréstimos, o dobro dos US$ 9,72 bilhões do Bird.

O governo brasileiro estima uma queda nos desembolsos do BNDES em 2011 para US$ 82,86 bilhões (ou R$ 145 bilhões). Ao contrário da época de crise, a economia hoje está aquecida e a equipe econômica tenta conter a inflação. Ainda assim, o Tesouro anunciou na última quinta-feira um novo empréstimo de R$ 55 bilhões para o BNDES este ano.

De acordo com o chefe do departamento econômico do BNDES, Fernando Puga, o avanço dos financiamentos concedidos pelo banco está diretamente relacionado ao crescimento da economia brasileira. Em 2010, o Brasil se tornou a sétima economia do mundo, com um Produto Interno Bruto (PIB) que cresceu 7,5% e atingiu R$ 3,6 trilhões.

Puga destaca que a ampliação dos investimentos no País cresceram com a colaboração do BNDES. Os investimentos que contaram com a participação do banco oficial chegaram a R$ 987 bilhões entre 2006 e 2009.

Esse montante deve subir, segundo o presidente do banco, Luciano Coutinho, para R$ 1,6 trilhão até 2014. "A concessão de empréstimos pelo BNDES, que atende a todos os setores, ocorre com controle, o que gerou um nível de inadimplência de 0,2% em 2010 e 2009", disse Puga.

Subsídios
Os especialistas, no entanto, divergem sobre o impacto do crescimento do BNDES para a economia. Enquanto alguns ressaltam o estímulo aos investimentos, outros criticam o custo fiscal para os contribuintes e a restrição imposta à política monetária.

Desde 2008, incluindo o novo empréstimo anunciado na semana passada, o Tesouro repassou R$ 291 bilhões ao BNDES para garantir o crescimento dos seus desembolsos. Há um subsídio embutido nesses empréstimos, porque o Tesouro capta o dinheiro pagando a taxa Selic (11,75%), enquanto o BNDES empresta cobrando TJLP (6%).

O governo nunca divulgou o valor desse subsídio. Cálculo feito pelo pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Mansueto Almeida, aponta que a conta para os contribuintes brasileiros está em torno de R$ 20 bilhões por ano.

Para o professor da PUC-RJ, José Márcio Camargo, "há uma apropriação de recursos da sociedade pelos empresários que tomam empréstimos no BNDES". Outro problema apontado pelos economistas é que, ao garantir o crescimento do investimento via BNDES, o governo torna mais dura a tarefa do BC de desaquecer a economia.

Já o professor da Unicamp Fernando Sarti ressalta que, sem o BNDES para atuar em projetos de longo prazo, a taxa de investimento do País seria bem menor. "Quem investe em estradas, rodovias e hidrelétricas no Brasil se não tiver a participação do BNDES? Poucos", diz.

Empréstimo ao BNDES é criticado
Mônica Ciarelli e Raquel Landim
O Estado de S. Paulo - 10/03/2011

Luiz Carlos Mendonça de Barros diz que o governo mostra que não tem compromisso em combater a inflação ao injetar R$ 55 bi no banco

O empréstimo de R$ 55 bilhões ao BNDES anunciado pelo Tesouro Nacional foi duramente criticado ontem pelo ex-presidente do banco, Luiz Carlos Mendonça de Barros. Segundo ele, a medida só mostra que o governo "não tem compromisso nenhum com o combate à inflação".

Mendonça de Barros, que hoje é economista-chefe da Quest Investimentos e é ligado ao PSDB, classifica como equívoco a capitalização do banco no momento em que a lógica recomenda uma redução no ritmo de crescimento da economia brasileira.

"É uma contradição falar em corte fiscal de R$ 50 bilhões e do outro lado injetar R$ 55 bilhões no BNDES", argumentou. O ex-presidente do banco no governo tucano afirmou ainda que esses aportes tiram a legitimidade do BNDES, que tem como missão oferecer financiamentos de longo prazo a segmentos não atendidos pelo setor privado.

Segundo ele, o governo atual repete erros passados, como a emissão de títulos para viabilizar a transferência de recursos para instituições públicas. "O que se faz hoje com o BNDES é igual ao que se fazia com a conta movimento no passado. Ao invés de usar o Banco do Brasil, agora usam o BNDES", afirmou o economista em referência a extinta modalidade de repasse utilizada pelo Banco Central para injetar recursos no BB.

O executivo lembra que a conta movimento foi extinta em 1986, durante o governo do presidente José Sarney. "Não se pode viver de títulos emitidos pelo Tesouro. (...) Eles acham que estão aumentando a importância do BNDES , mas, estão é desvirtuando", reclamou.

Mendonça de Barros também não poupou críticas ao que chamou de erro de concepção do BNDES: o fomento a formação de grandes empresas no País.

Ele citou o esforço que o banco fez para viabilizar a criação da JBS. "Qual a importância de se ter um frigorífico com presença mundial? Zero", afirmou. Para o economista, "não se cria uma multinacional da noite para o dia" e o BNDES deveria estar mais focado em ampliar sua atuação em segmentos como o financiamento de máquinas e equipamentos e as exportações, segmentos onde o setor privado não atua de forma mais intensa.

Preconceito
Para o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza, "existe um preconceito com o BNDES" no País. Ele argumenta que não é possível hoje abrir mão do banco estatal no financiamento do investimento, principalmente de longo prazo.

"O investimento é a variável que não pode recuar se quisermos um crescimento sustentável de longo prazo", diz Souza. Ele ressalta que os investimentos já perderam ritmo no fim do ano passado.

A taxa de investimento subiu 0,7% no quarto trimestre, uma desaceleração em relação aos 4% do primeiro trimestre, 3,9% do segundo trimestre e 3,1% do terceiro. A comparação é sempre com o trimestre anterior, livre de influências sazonais.

O economista também discorda da tese de que os repasses para o BNDES ajudam a turbinar a inflação, levando o Banco Central a subir mais os juros.

Souza ressalta que as medidas do BC de restrição ao crédito vão desacelerar o consumo. Além disso, afirma que a inflação no País não é apenas resultado do aquecimento da demanda, mas também da alta das commodities, que encarece os custos das empresas. "Nesse caso, não adianta o BC subir a taxa de juros", disse.

Banco quer ajudar a bancar investimentos de US$ 1 tri
Ricardo Leopoldo
O Estado de S. Paulo - 10/03/2011

A infraestrutura nacional precária, sobretudo em transportes, que precisa ser reparada com rapidez para que o Brasil faça uma boa Copa do Mundo em 2014 e a Olimpíada em 2016, deve requerer um avanço de 62,2% nos investimentos de longo prazo nos próximos quatro anos, quando chegarão a R$ 1,6 trilhão, bem acima dos R$ 987 bilhões registrados entre 2006 e 2009. De acordo com o BNDES, esses recursos, previstos até 2014, envolvem também a indústria, principalmente projetos dedicados à área de petróleo e gás relacionados à exploração do pré-sal.

"Do total de US$ 2 trilhões de investimentos de longo prazo que o Brasil deve registrar entre 2011 e 2014, cerca de US$ 1 trilhão contará com participação parcial do BNDES para seu financiamento", comentou o presidente do banco, Luciano Coutinho, no fim de fevereiro, após participar do 1.º Fórum do Mercado de Capitais Brasil-China.

De acordo com o BNDES, do total de R$ 614 bilhões que devem ser investidos pela indústria entre 2011 e 2014, 60% terão participação do banco oficial. Dos R$ 318 bilhões programados para a área de infraestrutura, 95% terão a cobertura do banco. Na construção civil, a projeção oficial é de que 42% dos R$ 607 bilhões que serão dedicados ao setor deverão ser desembolsados pelo banco.

Na avaliação do sócio da consultoria Tendências e professor do Insper, Juan Jensen, os subsídios implícitos concedidos pelo governo via BNDES deveriam constar do Orçamento federal. Para ele, o repasse de R$ 55 bilhões pelo Tesouro ao banco oficial neste ano não deveria ocorrer. Investimentos no curto prazo, avalia, são pressões de alta da demanda, o que pode provocar estímulos adicionais à inflação.

"Dos recursos emprestados pela instituição, 100% deveriam ser dedicados a investimentos novos, o que não ocorre quando são financiados processos de fusão e aquisição entre empresas", destacou Jensen.

Como o salario minimo diminui empregos no pais...

O exemplo é dos EUA, mas o mesmo efeito se observa no Brasil. Se não existisse salário mínimo, o desemprego no Brasil seria mínimo, sem querer fazer ironia involuntária ou parecer cínico. Qualquer economista sincero confirmaria isto...
Paulo Roberto de Almeida

The Minimum Wage and Job Loss from 2006 through 2010
Blog Political Calculations, March 9, 2011

In 2006, the last full year in which the U.S. federal minimum wage was a constant value throughout the whole year, at least before 2010, approximately 6,595,383 individuals in the United States earned $7.25 per hour1 or less.

For 2010, the first full year in which the U.S. federal minimum wage was a constant value through the year since 2006, the U.S. Bureau of Labor Statistics estimates that an average of just 4,361,000 individuals in the United States earned the same equivalent of the current prevailing federal minimum wage of $7.25 or less throughout the year.
In terms of jobs lost, that means that 2,234,383 of the jobs lost in the U.S. economy since 2006 have been jobs that were directly impacted by the series of minimum wage increases that were mandated by the federal government in 2007, 2008 and 2009.

Interestingly, the average number of employed members of the civilian labor force in 2006 was 144,427,000. In 2010, the average number of employed members of the civilian labor force in the U.S. was 5,363,000 less, standing at 139,064,000.

So, in percentage terms of the change in total employment level from 2006 to 2010, jobs affected by the federal minimum wage hikes of 2007, 2008 and 2009 account for 41.8% of the total reduction in jobs seen since 2006.

1 We had originally identified the minimum wage as $7.85, which we've corrected on the chart (the original is here.) We've also made a number of clarifications and other minor numerical corrections, which we've identified in boldface type - our apologies for the errors in the original post!

Um congresso vendido (e que quer ser comprado) - Marco Antonio Villa

O Congresso virou um balcão
Marco Antonio Villa
9/03/2011

O governo obteve o que desejava. Aprovou o novo salário mínimo. Usou do rolo compressor, da maioria confortável que detém no Congresso Nacional. Um dos destaques foi a fidelidade de alguns partidos, como o PMDB, principalmente na Câmara. Evidentemente que tem um preço. O pagamento são os rendosos cargos de segundo escalão. Dada a desmoralização da política brasileira, isto é visto como algo absolutamente natural. E alguns até teorizam: isto é fruto do presidencialismo de coalização. Só no Brasil...

As votações na Câmara e no Senado permitem várias observações sobre o funcionamento daquelas Casas. E não foram simplesmente sessões ordinárias. Não. Foram, provavelmente, as mais importantes deste semestre. O desenrolar dos trabalhos causa enorme estranheza, inclusive visual. A maioria fica de pé durante a maior parte das sessões. É a minoria que permanece sentada, como ocorre em qualquer parlamento digno deste nome. Quando um orador vai à tribuna, poucos prestam atenção pois sequer conseguem ouvi-lo. O barulho, a dispersão, as conversas em paralelo impedem que os congressistas possam acompanhar o andamento da sessão. Mas quem está se importando com isso?

É fabulosa a quantidade de parlamentares ao redor da mesa diretora, todos querendo ter um segundo de fama. Acreditam que um cochicho com o presidente, caso apareça na televisão, dará ao parlamentar uma enorme importância, sinal de poder para seus eleitores. Um sorriso e um sinal de concordância do presidente, então, é o máximo. Os parlamentares buscam incessantemente locais onde possam aparecer nas imagens, como o corredor central do plenário ou os microfones para os apartes. Na política congressual, a imagem é mais importante que o discurso.

Outro estranho procedimento é a permanência de um funcionário sentado ao lado dos presidentes da Câmara e do Senado durante as sessões, dando as orientações regimentais. Ele interfere nas decisões, sugere encaminhamentos, nega solicitações, como se fosse um parlamentar. É uma espécie de babá. Os presidentes acabam reféns do funcionário que tem mais poder que a maioria dos parlamentares, mesmo não tendo recebido nenhum voto popular. Isto porque o regimento substituiu o debate. Em vez da discussão política, tivemos uma enfadonha batalha regimental.

Em meio às questões de ordem e breves discursos, a maioria dos parlamentares continuava conversando, dando risadas, lendo jornais, consultando a internet ou trocando largos cumprimentos. Sabiam que estavam sendo vistos e alguns até devem ter reforçado a tintura dos cabelos, que varia do preto graúna ao acaju. O desinteresse pelo desenrolar da sessão era compreensível. O resultado da votação era conhecido. Não estavam lá para debater a proposta do governo. Foram simplesmente obedecer às determinações do Palácio do Planalto.

A balbúrdia das sessões foi tão grande que, diversas vezes, as mesas tiveram de informar o que significavam os votos "sim" e "não". Na Câmara, o presidente Marco Maia estava perdido. E, para manter a isonomia com o ambiente, diversas vezes, ficou sentado de costas para os oradores que estavam discursando na tribuna (numa delas, de forma acintosa, quando discursava o líder do governo, Cláudio Vaccarezza, seu adversário dentro do PT). Maia optou dar atenção aos grupos de parlamentares que o procuravam para conversar, em vez de ouvir as intervenções dos deputados. Na sessão do Senado, José Sarney acabou se confundindo várias vezes e a todo momento consultava a funcionária que o assessorava (deve ser registrada a ausência na mesa de Marta Suplicy, tão ciosa, nas sessões ordinárias, no controle do tempo dos oradores).

Em meio à balbúrdia, como em um clube de adolescentes, os parlamentares brincavam, trocavam afagos e elogios. Os membros do baixo clero aproveitaram o raro momento de serem reconhecidos e ouvidos pelos líderes do governo. Estavam ansiosos para votar e ir embora. Afinal, ninguém é de ferro: queriam aproveitar a noite brasiliense.

As votações - a maioria delas não foram nominais - são meteóricas. Os presidentes falam rapidamente: "Quem está a favor, fique como está; quem for contrário, que se manifeste." A fala é tão incompreensível que a maioria do plenário continua conversando. O mais absurdo é que em meio àquela bagunça, o presidente considere uma proposta aprovada. Os contrários à proposta - que não ouviram a "votação" - são obrigados a se dirigir ao microfone para poder registrar seu voto.

Neste jogo do faz de conta quem perde é a democracia. Um jovem interessado por política deve ter ficado decepcionado com o desenrolar das sessões. Não ocorreu nenhum debate. O formalismo regimental - além do grande número de partidos e blocos - impediu que o Parlamento pudesse efetivamente transformar a temática do salário mínimo numa discussão efetivamente política. E não foi um caso isolado: esta é a prática rotineira do Congresso Nacional.

Não há vida parlamentar. E não é por falta de número: no total são 594 representantes do povo. É um dos maiores congressos do mundo democrático. Também não é por falta de recursos: o orçamento anual é de mais de 5 bilhões de reais. Mas quem consegue citar 30 ou 40 nomes de parlamentares que se destacaram na última legislatura?

O Poder Legislativo não consegue desempenhar suas funções constitucionais. O Executivo decide e o Congresso chancela, sem discussão. É tão inexpressivo como um cartório. Mas rendoso. A representação popular foi transformada em um balcão. E para a maioria dos políticos é um ótimo negócio.

Marco Antonio Villa é historiador.

Um negro contra cotas, qualquer tipo de cotas: Walter Williams

Eu já tinha lido esta entrevista nas Páginas Amarelas da Veja desde sábado, mas não conseguia postar a matéria pois a Veja aderiu a uma política estúpida de consulta digital que impede cópias, mesmo aos assinantes. O idiota que fez isso precisa voltar atrás...

Mas, passemos ao que interessa. Aproveito o resumo que fez da entrevista o jornalista Reinaldo Azevedo (que trabalha na Veja), para postar aqui o essencial dessa entrevista que se poderia chamar de genial, mas eu apenas chamaria de sensata, com Walter Williams.
Paulo Roberto de Almeida

Um negro contra cotas e contra as leis que proíbem a discriminação! Sua crença: individualismo, escola de qualidade, igualdade perante a lei e liberdade de expressão
Reinaldo Azevedo, 09/03/2011

Walter Williams é negro, tem 74 anos e dá aula de economia na Universidade George Manson, na Virginia. Já foi engraxate e carregador de taco de golfe. Na juventude, chegou a preferir o radical Malcom X ao pacifista Martins Luther King. Williams está convencido: quem vence o racismo é o mercado, não a política de cotas. Num momento em que o assistencialismo, no Brasil, virou uma categoria de pensamento incontrastável e em que se dá a isso o nome de “redistribuição de renda”, vocês precisam ler a entrevista que ele concedeu a André Petry, publicada nas páginas amarelas da VEJA desta semana. Como todos nós, o economista tem as suas convicções, mas, antes de mais nada, tem alguns números um tanto desconcertantes sobre o tal “estado de bem-estar social”.

Williams se considera um libertário e é um crítico ácido da interferência do Estado na vida dos indivíduos. O indivíduo, diga-se, está no centro de suas preocupações. Ah, sim: ele acha que Barack Obama acabará “sendo ruim para os negros”. Por quê? Porque “seu governo, na melhor das hipóteses, será um desastre igual ao de Jimmy Carter”. Abaixo, reproduzo trechos da entrevista, em que se encontram frases como estas:

- AVANÇO DOS NEGROS - “Os negros, em geral, estão muito melhor agora do que há meio século. Mas os negros mais pobres estão pior.”
- ESTADO E FAMÍLIA - “Há anos, os Estados Unidos subsidiam a desintegração familiar”.
- MÃE SOLTEIRA PREMIADA - “Antes, uma menina grávida era uma vergonha para a família. Hoje, o estado de bem-estar social premia esse comportamento. O resultado é que, nos anos da minha adolescência, entre 13% e 15% das crianças negras eram filhas de mãe solteira. Agora, são 70%.”
- SALÁRIO MÍNIMO - “O salário mínimo, que as pessoas consideram uma conquista para os mais desprotegidos, é uma tragédia para os pobres. Deve-se ao salário mínimo o fim de empregos úteis para os pobres.”
- AÇÕES AFIRMATIVAS - “O ritmo do progresso dos negros entre as décadas de 40 e 60 foi maior do que entre as décadas de 60 e 80.”
- COTAS RACIAIS NO BRASIL - “A melhor coisa que os brasileiros poderiam fazer é garantir educação de qualidade. Cotas raciais no Brasil, um país mais miscigenado que os Estados Unidos, são um despropósito.”
- LIVRE MERCADO E DISCRIMINAÇÃO - “A melhor forma de permitir que cada um de nós - negro ou branco, homem ou mulher, brasileiro ou japonês - atinja seu potencial é o livre mercado. O livre mercado é o grande inimigo da discriminação”.
- LIBERDADE DE EXPRESSÃO - “É fácil defendê-la quando as pessoas estão dizendo coisas que julgamos positivas e sensatas, mas nosso compromisso com a liberdade de expressão só é realmente posto à prova quando diante de pessoas que dizem coisas que consideramos absolutamente repulsivas”.
- AFRO-AMERICANOS - “Essa expressão é uma idiotice, a começar pelo fato de que nem todos os africanos são negros. Um egípcio nascido nos Estados Unidos é um ‘afro-americano’?”
- ÁFRICA - “A África é um continente povoado por pessoas diferentes entre si. Os vários povos africanos estão tentando se matar uns aos outros há séculos. Nisso a África é idêntica à Europa, que também é um continente, também é povoada por povos distintos que também vêm tentando se matar uns aos outros há séculos”.

*
Leia mais um pouco da explosiva sensatez de Walter Williams. A íntegra da entrevista está na revista.

(…)
Em que aspectos a vida dos negros hoje é pior [nos Estados Unidos]?
Cresci na periferia pobre de Filadélfia entre os anos 40 e 50. Morávamos num conjunto habitacional popular sem grades nas janelas e dormíamos sossegados, sem barulho de tiros nas ruas. Sempre tive emprego, desde os 10 anos de idade. Engraxei sapatos, carreguei tacos no clube de golfe, trabalhei em restaurantes, entreguei correspondência nos feriados de Natal. As crianças negras de hoje que vivem na periferia de Filadélfia não têm essas oportunidades de emprego. No meu próximo livro, “Raça e Economia”, que sai no fim deste mês, mostro que, em 1948, o desemprego entre adolescentes negros era de 9.4%. Entre os brancos, 10.4%. Os negros eram mais ativos no mercado de trabalho. Hoje, nos bairros pobres de negros, por causa da criminalidade, boa parte das lojas e dos mercados fechou as portas. (…)
Os negros, em geral, estão muito melhor agora do que há meio século. Mas os negros mais pobres estão pior.

O estado de bem-estar social, com toda a variedade de benefícios sociais criados nas últimas décadas, não ajuda a aliviar a situação de pobreza dos negros de hoje?
(…)
Há anos, os Estados Unidos subsidiam a desintegração familiar. Quando uma adolescente pobre fica grávida, ela ganha direito a se inscrever em programas habitacionais para morar de graça, recebe vale-alimentação, vale-transporte e uma série de outros benefícios. Antes, uma menina grávida era uma vergonha para a família. Muitas eram mandadas para o Sul, para viver com parentes. Hoje, o estado de bem-estar social premia esse comportamento. O resultado é que nos anos da minha adolescência entre 13% e 15% das crianças negras eram filhas de mãe solteira. Agora, são 70%. O salário mínimo, que as pessoas consideram uma conquista para os mais desprotegidos, é uma tragédia para os pobres. Deve-se ao salário mínimo o fim de empregos úteis para os pobres. (…)

As ações afirmativas e as cotas raciais não ajudaram a promover os negros americanos?
A primeira vez que se usou a ex-pressão “ação afirmativa” foi durante o governo de Richard Nixon [1969-1974]. Os negros naquele tempo já tinham feito avanços tremendos. Um colega tem um estudo que mostra que o ritmo do progresso dos negros entre as décadas de 40 e 60 foi maior do que entre as décadas de 60 e 80. Não se pode atribuir o sucesso dos negros às ações afirmativas.
(…)
Num país como o Brasil, onde os negros não avançaram tanto quanto nos Estados Unidos, as ações afirmativas não fazem sentido?
A melhor coisa que os brasileiros poderiam fazer é garantir educação de qualidade. Cotas raciais no Brasil, um país mais miscigenado que os Estados Unidos, são um despropósito. Além disso, forçam uma identificação racial que não faz parte da cultura brasileira. Forçar classificações raciais é um mau caminho. A Fundação Ford é a grande promotora de ações afirmativas por partir da premissa errada de que a realidade desfavorável aos negros é fruto da discriminação. Ninguém desconhece que houve discriminação pesada no passado e há ainda, embora tremendamente atenuada. Mas nem tudo é fruto de discriminação. O fato de que apenas 30% das crianças negras moram em casas com um pai e uma mãe é um problema, mas não resulta da discriminação. A diferença de desempenho acadêmico entre negros e brancos é dramática, mas não vem da discriminação. O baixo número de físicos, químicos ou estatísticos negros nos Estados Unidos não resulta da discriminação, mas da má formação acadêmica, que, por sua vez, também não é produto da discriminação racial.

Qual o meio mais eficaz para promover a igualdade racial?
Primeiro, não existe igualdade racial absoluta, nem ela é desejável. Há diferenças entre negros e brancos, homens e mulheres, e isso não é um problema. O desejável é que todos sejamos iguais perante a lei. Somos iguais perante a lei. Mas diferentes na vida. Nos Estados Unidos, os judeus são 39% da população, mas ganham 35% dos prêmios Nobel. Talvez sejam mais inteligentes, talvez sua cultura premie mais a educação, não interessa. A melhor forma de permitir que cada um de nós - negro ou branco, homem ou mulher, brasileiro ou japonês - atinja seu potencial é o livre mercado. O livre mercado é o grande inimigo da discriminação. Mas, para ter um livre mercado que mereça esse nome, é recomendável eliminar toda lei que discrimina ou proíbe discriminar.

O senhor é contra leis que proíbem a discriminação?
Sou um defensor radical da liberdade individual. A discriminação é indesejável nas instituições financiadas pelo dinheiro do contribuinte. A Universidade George Manson tem dinheiro público. Portanto, não pode discriminar. Uma biblioteca pública, que recebe dinheiro dos impostos pagos pelos cidadãos, não pode discriminar. Mas o resto pode. Um clube campestre, uma escola privada, seja o que for, tem o direito de discriminar. Acredito na liberdade de associação radical. As pessoas devem ser livres para se associar como quiserem.

Inclusive para reorganizar a Ku Klux Klan?
Sim, desde que não saiam matando e linchando pessoas, tudo bem. O verdadeiro teste sobre o nosso grau de adesão à idéia da liberdade de associação não se dá quando aceitamos que as pessoas se associem em torno de idéias com as quais concordamos. O teste real se dá quando aceitamos que se associem em torno de ideais que julgamos repugnantes. O mesmo vale para a liberdade de expressão. É fácil defendê-la quando as pessoas estão dizendo coisas que julgamos positivas e sensatas, mas nosso compromisso com a liberdade de expressão só é realmente posto à prova quando diante de pessoas que dizem coisas que consideramos absolutamente repulsivas.

O senhor exige ser chamado de “afro-americano”?
Essa expressão é uma idiotice, a começar pelo fato de que nem todos os africanos são negros. Um egípcio nascido nos Estados Unidos é um “afro-americano”? A África é um continente, povoado por pessoas diferentes entre si. Os vários povos africanos estão tentando se matar uns aos outros há séculos. Nisso a África é idêntica à Europa, que também é um continente, também é povoada por povos distintos que também vêm tentando se matar uns aos outros há séculos.
(…)

Reflexoes dirigidas: retrato de um diplomata maduro (eu mesmo...)

Uma aluna que pretende ser diplomata, um dia, me escreveu pedindo algumas dicas para estudar para o concurso. Eu a dirigi a uma seção de meu site que tem de fato algumas dicas (aqui).
Mas ela foi ler outras coisas, e me relembrou de um "artigo" (como ela chamou, na verdade um depoimento pessoal), que escrevi muitos anos atrás, e do qual já estava esquecido (aqui).
Diferentemente das atuais "reflexões ao léu" que ando conduzindo de maneira um tanto anárquica neste mesmo espaço (ver a série neste mesmo blog, bastando procurar por esse nome), essas são reflexões particularmente reflexivas, se me permitem a redundância, ou seja, dirigidas a um objetivo particular, o ato de fazer um balanço de minha vida, e de oferecer um depoimento a respeito num 31 de dezembro, momento dos balanços, este em 2006.
Creio que contém algumas verdades, e agregaria muito pouco a ele, atualmente. Vale!
Paulo Roberto de Almeida

Retrato do diplomata, quando maduramente reflexivo
Paulo Roberto de Almeida

Eu nasci na exata metade do século XX, em São Paulo, capital. Sou descendente, tanto por parte dos avós paternos como maternos, de imigrantes pobres, respectivamente de Portugal e da Itália, todos chegados ao Brasil no início do século, para trabalhar nas fazendas de café da então aristocrática elite cafeeira de São Paulo e do sul de Minas. Meu pai nasceu em Rio Claro, interior de São Paulo, no ano da revolução russa, antes da revolução bolchevique e depois da revolução de fevereiro, que derrubou o tzar e a monarquia dos Romanov. A primeira revolução ocorreu em fevereiro, a segunda revolução em outubro (ou em novembro, dependendo se o calendário é o juliano ou o gregoriano), e meu pai nasceu entre as duas. Minha mãe nasceu em Poços de Caldas, MG, alguns anos mais tarde. Ambos vieram pequenos para São Paulo, com meus avós – mas eles ainda não eram meus avós, obviamente –, que se mudaram para a capital paulista por motivos que desconheço, mas que deve ter algo a ver com o abandono das terríveis condições de trabalho na lavoura cafeeira, onde os imigrantes europeus eram tratados um pouco melhor, mas só um pouco, do que os escravos que eles vieram substituir a partir de 1888.
Não sei como meus pais se conheceram, mas sei, em todo caso, que eles não chegaram a terminar a escola primária, tendo ambos de começar a trabalhar desde muito cedo para ajudar nas despesas domésticas, nas casas dos meus avós, obviamente (que só mais tarde se tornaram meus avós). Eu também comecei a trabalhar muito cedo, para ajudar em casa, na casa dos meus pais, evidentemente, depois que eles se tornaram meus pais, na exata metade do século XX, como já disse. Até onde alcançam minhas lembranças de infância, eu sempre trabalhei, mas pelo menos terminei a escola primária, a secundária, a pós-graduação e tudo o mais que tive direito a fazer numa vida de estudos, que infelizmente começou muito tarde paraa meus padrôes atuais. Sim, só aprendi a ler na tardia idade dos sete anos, que foi quando eu finalmente entrei para a escola, como acontecia com o sistema de ensino público nos anos 1950. Antes disso freqüentei o parque infantil e, bem mais importante, a biblioteca pública infantil, pertos de minha casa, no bairro paulistano do Itaim-Bibi, naquela época chamado de “chácara Itaim” (um pequeno aglomerado de casas humildes, ruas de terra e muitos terrenos baldios, onde jogávamos “peladas” de futebol).
Comecei a freqüentar a biblioteca infantil “Anne Frank” ainda antes de aprender a ler, para jogos e sessões de cinema (Oscarito e Grande Otelo eram os meus heróis cinematográficos). Quando chegou a hora de começar o primário, no ano em que completei sete anos, ensaiei um movimento de recusa, no que fui questionado pela minha mãe sobre a razão de não querer ir para a escola. O motivo, bastante plausível, já demonstrava minha responsabilidade em face do estudo e da minha condição de “analfabeto” até então: “Não posso ir para a escola”, respondi, “porque eu não sei ler”. Motivo recusado, fui inscrito compulsoriamente no “Grupo Escolar Aristides de Castro”, onde passei os cinco anos do primeiro ciclo: quatro obrigatórios da escola primária e um quinto ano de “admissão” (ao ciclo médio, então chamado de ginasial, que fiz no Vocacional).
O mais importante, porém, foi que, assim que aprendi os rudimentos da leitura, passei a ler todos os livros da biblioteca infantil, não apenas durante tardes e tardes seguidas, mas também em casa, já que eu sempre retirava livros para continuar a ler pela noite. Não tínhamos televisão então, o que muito me ajudou em meus hábitos de leitura. Monteiro Lobato, Emilio Salgari, Jules Verne, Karl May, foram alguns dos autores que acompanharam minha infância e a primeira adolescência e a eles devo grande parte do meu enorme conhecimento do mundo, sua história e geografia, além das ciências e das artes. Acho que me tornei autodidata desde o primeiro livro, uma característica que conservei durante toda a vida. A partir de um certo momento deixei de prestar atenção ao que se dizia em aula, desde a metade do “colegial” pelo menos, e passei inclusive a não freqüentar as salas de aula: tudo o que sei, aprendi nos livros, em todo tipo de leitura, da extrema esquerda à suas antipodas, sem nenhum preconceito “religioso”.
Trabalhei desde muito cedo, como disse, primeiro recolhendo sobras de metal de fábrica para vendas ao “ferro velho”, a versão artesanal do moderno sistema de reciclagem. Depois fui pegador de bolas de tênis no Esporte Clube Pinheiros e empacotador no supermercado Peg-Pag. Meu primeiro emprego com registro em carteira deve ter sido aos 14 anos, como office-boy no Moinho Santista, no centro da cidade. Nessa época passei a freqüentar a biblioteca da Faculdade de Direito no Largo de São Francisco, muito mais interessante em termos de livros sérios do que a pequena “Anne Frank”. Comecei a ler Celso Furtado, Caio Prado Jr, os sociólogos paulistas e toda a literatura marxista, a começar por um resumo do Capital por J. Duret, numa tradução das Éditions Sociales. O golpe militar impulsionou minha politização precoce e, em pouco tempo, eu já estava nas ruas, protestando com outros jovens e adolescentes contra a ditadura militar, contra o capital estrangeiro e o imperialismo americano. O mundo era mais simples então: tínhamos duas alternativas político-econômicas, e quem não era revolucionário e socialista, como éramos nessa juventude de rebeldia contra os poderes constituídos, a dominação estrangeira e a situação de pobreza que caracterizava grande parte da população (minha família, inclusive), era apenas indiferente, pois poucos eram os que se proclamavam abertamente capitalistas ou liberais. Essa segunda opção nunca foi muito popular no Brasil, aliás até hoje.
Naturalmente impulsionados pelo romantismo guevarista, radicalizamos na oposição ao regime militar, recorrendo inclusive à luta armada, e nisso fomos fragorosamente derrotados, mais por nossos próprios equívocos políticos do que pela “repressão” do regime militar. Alguns desapareceram, outros foram “eliminados” – por diferentes vias – e muitos foram para o exílio, eu inclusive, ainda que por vias legais e conservando o passaporte. Primeiro, em 1971, passei pelo socialismo – na Tchecoslováquia pós-repressão ao “socialismo de face humana”, de 1968 – e constatei uma coisa da qual já suspeitava bem antes: o socialismo, em sua versão soviética, simplesmente não funcionava, era uma imensa mentira, uma sociedade condenada ao passado, na qual as misérias morais, humanas, eram ainda maiores do que as misérias materiais, a da escassez cotidiana, a da penúria institucionalizada em modo de produção. Enfim, uma verdadeira mentira, com perdão pelo paradoxo. Depois, me instalei no capitalismo – em Bruxelas, na Bélgica –, onde encontrei condições de estudar e de trabalhar. Continuei em meu autoditatismo radical, passando mais tempo na biblioteca do Instituto de Sociologia do que nas aulas do curso de graduação em Ciências Sociais (que eu tinha largado no segundo ano da USP, depois da cassação dos mestres).
Foram seis anos e meio de intensas leituras, entre a graduação, o mestrado – em economia internacional, na Universidade de Antuérpia – e o começo de um doutorado, ao início de 1977, interrompido pela minha volta ao Brasil. Daí ao ingresso na carreira diplomática foram poucos meses, de muita atividade e de muitos projetos. O regime ainda era autoritário, mas na sua fase declinante. Em todo caso, dei início a uma dupla carreira, a de servidor público federal e a de professor universitário, que conservo até hoje, com satisfações e decepções em ambas.
As lides diplomáticas e as universitárias me confirmaram – como ocorre em quase todas as atividades humanas – que coexistem excelências e mesquinharias em todas as trajetórias permeadas por burocracias relativamente auto-suficientes. Trabalhei, e continuo trabalhando, intensamente em ambas, delas retirando gratificações pessoais, profissionais e intelectuais. Também constatei que pequenos ciumes e atos de puro despeito ocorrem das formas inesperadas. Nunca escondi o que penso das coisas, na política e na economia, o que nem sempre é recomendado em burocracias de tipo feudal como podem ser as instituições nas quais trabalho. Continuei refletindo, escrevendo e publicando o que penso ser um reflexo honesto de minhas leituras e pesquisas em ambos ambientes de trabalho. Nem sempre o que escrevo é bem recebido em cada um desses meios. Atribuo isso mais à inveja, ou aos ciumes, do que à oposição ao que tenho a dizer. Afinal de contas, não creio escrever nada de muito extraordinário.
Se ouso agora fazer uma síntese do que sou e do que penso, neste limiar do ano de 2007, eis aqui o que eu poderia dizer. Sou intensamente racionalista, ou seja: não costumo refugiar-me em qualquer tipo de crença, mas procuro descobrir as raízes e as razões das coisas, pelas velhas regras do método científico, isto é, a busca de correlações causais que possam ultrapassar o impressionimo e o subjetivismo inerentes ao homem, a procura de explicações que se submetam ao teste da realidade, ao embasamento empírico, e a prática de um saudável ceticismo quanto a respostas tentativas em quaisquer campos do conhecimento humano. Duvidar é bom, buscar a verdade melhor ainda, mesmo que ela esteja distante, ou seja impossível no momento.
No plano dos valores, mantenho o otimismo de que a bondade não só é possível, mas de que ela é capaz de superar a maldade humana, e esta pode ser incrivelmente infinita. O mundo certamente não é o lugar ideal que gostaríamos que fosse, mas ele já melhorou muito em relação ao passado de mortandades e injustiças. A pobreza ainda é um fardo pesado para mais da metade da humanidade e todos os meus esforços intelectuais e práticos estão dirigidos a reduzir, um pouco que seja, essa fardo, a começar pelo meu país, pela nação brasileira. Minhas contribuições para que isso se faça se situam quase todas no plano da reflexão individual e das proposições em termos de políticas públicas, aqui num ambiente coletivo que ultrapassa o da diplomacia. Não sei se tenho sido eficiente nessa “missão” auto-atribuída, mas entendo que meus esforços didáticos e o meu desempenho enquanto produtor de textos especializados não sejam de todo inúteis.
Entendo que devemos procurar fazer o bem, em quaisquer circunstâncias. Nisso vai até algum grau de sacrifício pessoal, e talvez até familiar, para tentar distribuir o bem em torno de si. Espero poder fazê-lo ainda durante muito tempo, nas minhas formas habituais de atuação, onde estão minhas “vantagens comparativas”: na leitura, na reflexão crítica, na escrita, no ensino, na publicação de textos que possam contribuir para o aprendizado dos mais jovens.
Neste final de ano de 2006, quando faço um breve balanço de minhas atividades e creio poder programar algo do que farei em 2007 e nos anos seguintes, gostaria de resumir o sentido de minha ação da seguinte forma: ser intelectualmente honesto é um dever das pessoas que como eu trabalham sobretudo no plano das idéias e da escrita. Prestar contas do que se faz com o dinheiro público também é um dever, individual e coletivo, e nisso sou de uma radical transparência. No mais, creio que devemos procurar a felicidade e contribuir para a felicidade do maior número de pessoas. Eu me esforço para contribuir para que esse objetivo se cumpra na medida das minhas possibilidades, mas não tenho certeza de ser o mais eficiente possível, ou eficaz, o tempo todo. Gostaria de acreditar que, olhando para trás, agora e mais adiante, se possa dizer de mim, um dia: ele fez alguma diferença para diminuir o grau de sofrimento dos seus semelhantes, tanto quanto para aumentar o quantum de felicidade humana possível nas condições que nos são dadas pela história e pelas circunstâncias nas quais vivemos.
Por fim: por que intitulei este texto desta forma? Não sei. Talvez porque o ser diplomata é minha condição atual, minha situação presente, minhas circunstâncias de vida. O ser reflexivo já é uma característica pessoal, um dado de minha personalidade, naturalmente reservada e bastante introspectiva. Quanto ao “retrato”, trata-se de uma radiografia do momento, uma pequena foto do presente, que talvez não seja o melhor possível, daí o relativo pessimismo que possa transpirar destas linhas. Acredito que o Brasil, seu povo e sociedade (a começar pelos núcleos dirigentes), estejam atravessando uma fase não propriamente exitosa, caracterizada por baixo crescimento, por inúmeros problemas acumulados – alguns se agravando –, com perspectivas de “mais do mesmo” nos anos à frente. Talvez seja passageiro, ou talvez se prolongue mais do que o desejado, pois afinal de contas outras sociedades antes da nossa também decairam relativamente, algumas até entraram em “colapso”. O Brasil não será o primeiro exemplo conhecido de estagnação ou de declínio, relativo ou mesmo absoluto. Mas, tenho certeza de que reencontraremos o caminho do crescimento, da prosperidade, da afirmação dos bons valores humanos e sociais. Gostaria de poder contribuir para isso, tanto quanto minhas forças intelectuais e a minha disposição física o permitirem. Continuo otimista quanto à capacidade das sociedades se regenerarem, a partir dos esforços individuais de pessoas que têm algo a contribuir para o bem da humanidade. As pessoas valem pelo que elas são e pelo que elas possam fazer de bem para a felicidade do maior número.
Vale!
Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 31 de dezembro 2006

Convencao de Viena sobre Direito dos Tratados - concurso para universitarios

Divulgando:

EDITAL DO CONCURSO DE ARTIGOS ATINENTES À "CONVENÇÃO
DE VIENA SOBRE DIREITO DOS TRATADOS"[1]

A Comissão Organizadora da "Conferência sobre a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de
1969", presidida pelo Prof. Dr. Aziz Tuffi Saliba, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, comunica a todos a abertura do concurso de artigos destinado a selecionar 5 textos, nos seguintes termos:
Objetivo
1º O concurso objetiva promover o estudo e debate do Direito dos Tratados, da Convenção de Viena
sobre Direito dos Tratados (CVDT 1969), bem como discutir as implicações da ratificação da mencionada convenção pelo Brasil.
Participação
2º Poderão participar alunos de graduação que estejam cursando Direito, Ciências do Estado ou
Relações Internacionais, em qualquer instituição de ensino superior do Brasil. É vedada a participação de quem já concluiu qualquer um dos cursos acima.
Trabalhos
3º O artigo deverá ser relacionado ao Direito dos Tratados no geral, a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (CVDT 1969) ou às implicações da ratificação da mencionada convenção pelo Brasil.
4º O artigo deve ser redigido em língua portuguesa, ficando o título, a abordagem crítica, o
posicionamento opinativo e o enfoque metodológico a critério do autor, obedecidas as seguintes
exigências:
a) Ser o artigo absolutamente inédito e não estar pendente de publicação;
b) apresentar no corpo do texto referências ou citações de bibliografias com indicação clara, uniforme e completa dos respectivos autores e fontes;
c) conter, ao final, uma relação bibliográfica clara, uniforme e completa das obras citadas;
d) não conter qualquer referência, direta ou indireta, que possibilite à Comissão Julgadora identificar o candidato, com exceção do disposto neste edital;
e) o artigo deve ter de 10 a 25 laudas, sem contar a primeira página, que conterá apenas o título do artigo e o CPF do candidato e as páginas utilizadas ao final para relação bibliográfica; os parágrafos devem ser justificados; deve ser usada, como fonte de letra, Times New Roman, corpo 12; os parágrafos terão entrelinha de 1,5; o tamanho do papel deve ser A4. Os autores deverão observar as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), especialmente as NBR 6023:2002 e 10520:2002.
Das Inscrições
5º As inscrições, que ficam desde logo declaradas abertas, serão gratuitas e efetivadas mediante o envio do texto por correio eletrônico para o endereço cvdt1969@gmail.com
6º O artigo deverá ser anexado à mensagem eletrônica, nos formatos doc (ou docx) e pdf.
7º O artigo conterá, na primeira página, apenas o título do artigo e número do CPF do candidato. As demais páginas não poderão conter qualquer referência, direta ou indireta, que possibilite à Comissão
Julgadora identificar o candidato.
8º A mensagem eletrônica que encaminhar o artigo deverá conter: o nome do candidato, endereço
físico, número de telefone e número de seu cadastro de pessoas físicas (CPF) e o título do artigo.
9º O artigo deverá ser enviado até as 23:00 horas do 15 de abril de 2011.
10º A inscrição no concurso importa na aceitação de todas as regras contidas neste edital e na cessão, à Comissão Organizadora, sem ônus, pelo prazo de dois anos, do direito exclusivo de publicação dos artigos premiados.
11º Cada candidato poderá participar somente com 1 (um) artigo.
12º Serão admitidos artigos em coautoria (no máximo dois candidatos). Comissão Julgadora
13º Os membros da Comissão Julgadora serão designados pelo presidente da Comissão Organizadora do Evento. A Comissão Julgadora será composta por juristas de notório saber, preferencialmente doutores, vinculados a diferentes instituições do Brasil e do exterior.
14 º A composição da Comissão Julgadora será anunciada na mesma ocasião da proclamação do
resultado do concurso.
Premiação
15º O concurso premiará os 5 melhores artigos. A premiação consistirá em:
a) Publicação dos dois melhores artigos;
b) entrega de livros para os cinco primeiros lugares;
c) entrega de certificado para os cinco melhores artigos.
16º O resultado será anunciado durante a Conferência sobre a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969 (a ser realizada na primeira semana de maio de 2011).
Disposições Gerais
17º A Comissão Julgadora poderá deixar de conferir premiação, se considerar que nenhum dos artigos tem condições de publicação.
18º A não observância das regras contidas neste edital resultará na desclassificação do(s) candidato(s).
19º Mesmo após o anúncio dos resultados, caso seja apurada desconformidade de qualquer um dos
cinco artigos premiados com este regulamento, a Comissão Julgadora poderá anular a concessão da
premiação ao(s) candidato(s).
20º Do resultado do concurso não caberá recurso.
21º Os casos omissos serão resolvidos pela Comissão Organizadora do evento.

Belo Horizonte, 22 de fevereiro de 2011.
Aziz Tuffi Saliba
Presidente da Comissão Organizadora da Conferência sobre Direito dos Tratados de 1969
[1] Com retificações.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Mercosul: morte (util) de um orgao (inutil): Parlasul

Ou Parlamento turístico do Mercosul...

Uruguay evalúa retirarse del Parlasur
Ricardo Portela
La Republica, 9/03/2011

Ultimátum. Sumatoria de desencuentros; el organismo está inactivo hace meses y no hay voluntad para modificar estatutos
Porque el Parlamento del Mercosur no funciona y porque su futura integración con notoria supremacía de legisladores brasileños y argentinos "favorece la asimetría", Uruguay piensa desvincularse del Parlasur. El Estado destina casi U$S 500 mil anuales al organismo legislativo.
Parlasur. Uruguay ha reclamado hasta ahora en vano que se modifique la integración del organismo.

Agotado porque sus propuestas son sistemáticamente archivadas. Desahuciado porque desde finales del año pasado en él no hay nada que hacer ya que no funciona y no hay a la vista posibilidades de que se reactive en un plazo más o menos acorde.
Y cansado porque algunos países, no asumen sus deudas, como Brasil, de más de 1 millón de dólares para con el organismo, Uruguay golpeó la mesa, dijo "basta", advierte que el Parlamento del Mercosur está inactivo y que de no modificarse su estatuto piensa retirar sus legisladores de esta entidad; un organismo que está inoperante, que al Estado nacional le cuesta casi medio millón de dólares al año y, al día de hoy, sus legisladores están inhabilitados para estar allí.
A esta tajante decisión de eventualmente abandonar el escenario parlamentario regional no se llega de la noche a la mañana. "Hay una sumatoria de hechos que desde hace más de un lustro se vienen repitiendo y, por lo que vemos, no hay voluntad de que los demás miembros del Parlamento del Mercosur cambien su accionar", comentó anoche a este diario el presidente de la delegación uruguaya del Parlasur, el diputado Rubén Martínez Huelmo.
La delegación de Uruguay presentó una relación de asuntos que apuntan a salvaguardar la continuidad institucional y administrativa del Parlamento del Mercosur, pero los legisladores uruguayos que integran la entidad no avizoran voluntad política de parte de las demás delegaciones.
Desde fines del año pasado el Parlasur no reúne a sus miembros. Sus actuales integrantes son diputados designados por los parlamentos de cada país del bloque regional y, según el estatuto vigente, hoy no están habilitados porque el período de gestión por el cual fueron elegidos ya caducó.
Los estatutos dictaminan que en este año ya tendrían que haber asumido los nuevos legisladores del Mercosur electos por los ciudadanos de cada país integrante del bloque.
Unicamente Paraguay ha cumplido con este requisito. Lo hizo en las elecciones de abril del año 2008. Brasil y Argentina anunciaron que cumplirían con ello en este año, pero nada oficial. Uruguay, por su parte, ni se imagina convocar a una elección nacional para que de allí surjan los legisladores para el Parlasur. No hay intención, ni las leyes constitucionales contemplan comicios de esta naturaleza. Entonces, con este escenario, Uruguay planteó en los organismos correspondientes que se postergaran los plazos hasta el 2014. Concomitantemente, también se pospondría la nueva conformación numérica del Parlasur la que dictamina que en la etapa que debería haber comenzado, Brasil pasaría a tener 75 parlamentarios, Argentina 43 y Uruguay y Paraguay 18 representantes cada uno.
Precisamente sobre este proporción nuestro país tampoco está de acuerdo.
"Así, el Parlasur estaría fomentando las asimetrías y los países como el nuestro quedarían rezagados y en franca minoría en todas las decisiones que el parlamento adopte", destacó Martínez Huelmo.
El legislador reconoce que con el Parlasur en construcción y en suspenso "tenemos una piedra en el zapato" por lo que desde la delegación uruguaya se insiste en "reformular el reglamento" del bloque legislativo regional.
El Consejo del Mercado Común (CMC) debería laudar esta situación de inoperancia que se registra en el Parlasur en una reunión convocada para finales de marzo próximo en Asunción del Paraguay, país que actualmente ejerce la presidencia pro témpore del bloque regional.
De no arribarse a un acuerdo en esta instancia, el "plan B" es que cada país llegue a una solución en cuanto a modificar los estatutos del Parlasur, "pero eso llevaría muchísimo tiempo", reconoce Martínez Huelmo.
En punto muerto el Parlasur, la decisión inmediata está pendiente de la acción de las cancillerías de cada nación del Mercosur. A fines de este mes de marzo, blancos y colorados podrían estar llamando a sala al ministro de Relaciones Exteriores Luis Almagro, para que este informe sobre los probables acuerdos que deberían arribarse en la reunión de cancilleres en Asunción, Paraguay, citada para estudiar la propuesta uruguaya de postergar hasta el 2014 la llamada "primera etapa" constitutiva del Parlasur.

Curiosidadade da semana (de Carnaval): brasileiro trata mal o avestruz...

Sério, não estou brincando. Pelo fato de tratarmos mal do pobre do avestruz, nos convertemos nos maiores importadores de penas de avestruzes do mundo. Sorte dos sul-africanos, que tratam seus avestruzes com todo o respeito que eles merecem...
Paulo Roberto de Almeida

Brasil é maior importador de pluma de avestruz
Amanda Vidigal Amorim
Brasil Econômico, 08/03/2011

Não é de espantar que o Brasil seja o maior importador de plumas de avestruz do mundo. O produto, extensamente utilizado para produzir fantasias de Carnaval, vem na maioria das vezes de países africanos.

Márcia Bissoli, criadora de avestruz, afirma que há quatro anos tentou investir nas plumas para atender o mercado brasileiro, mas não teve sucesso.

"Como o nosso forte é o abate do animal para a venda da carne e do couro, não tivemos sucesso. É preciso criar o animal apenas para a venda das plumas para conseguir um produto de qualidade."

Stefano Volpi, presidente da Associação Brasileira de Criadores de Avestruz, afirma que o Brasil não investiu no produto, e que hoje há menos de dez criadores especializados no país.

"O Brasil começou a criar o animal pensando que venderia a carne a R$ 80 o quilo, o que nunca aconteceu. Em 2006 vimos quase todas as fazendas que criavam avestruz sumirem", afirma Volpi.

Para o executivo, hoje é mais caro comprar plumas nacionais do que as importadas, com o agravante de que as nacionais são de qualidade inferior.

Ernesto Hattge, proprietário da fazenda Clube do Avestruz, explica que o problema é que para conseguir uma pluma de qualidade é preciso tratar o animal de maneira diferenciada, cuidando sempre para que não tenha piolhos e fornecendo alimentação balanceada, para que as plumas cresçam bonitas.

"Eu tentei produzir, mas não consegui ter um produto de qualidade", afirma Hattge.

ara Volpi não existe mistério, o que existe é falta de preparo dos criadores. "O custo de criar um avestruz para o abate não é menor do que o de criar o animal apenas para desplumar. O que as pessoas não fazem é cuidar direto para que o animal tenha plumas de qualidade", afirma.

O animal que vai para o abate tem cerca de dois quilos de plumas retirados, e normalmente elas vão para a produção de espanadores, já que a qualidade não é boa.

O avestruz criado especificamente para a desplumagem tem cerca de dois quilos de plumas retirados anualmente.

O macho, que apresenta em algumas partes do corpo plumas brancas é o mais valioso. A fêmea, com plumagem acinzentada, não é tão interessante para os criadores quanto o macho.

"O que vai mesmo para as fantasias de carnaval são plumas retiradas do rabo e de uma parte do corpo do avestruz, são as maiores e mais bonitas, além de terem uma coloração melhor no caso dos machos", diz Volpi.

Brasil, política comercial: o protecionismo em construcao...

Valoração aduaneira é um disfarce para atribuir um preço baixo demais a uma mercadoria importada, com base numa média teórica que ignora economias de escala -- como é o caso do imenso comércio exterior chinês --, ganhos de produtividade, ou simplesmente custo de mão-de-obra mais baixo, que é uma vantagem competitiva, e comparativa, tão legítima quanto custos reduzidos de energia ou do prórpio capital em outros países.
O que o Brasil -- ou suas autoridades comerciais -- está fazendo é arrumar desculpas para barrar a entrada de produtos chineses, contentar os industriais brasileiros e assim se isolar do mundo. As indústrias brasileiras se tornarão menos, não mais competitivas, os consumidores pagarão o preço dessa política, transferindo renda para quem não devia merecer e vamos continuar nos isolando dos mercados internacionais, eternizando o atraso tecnológico e competitivo.
Pior solução não poderia haver, mas o governo é incapaz de fazer a coisa certa: atuar sobre o "custo Brasil", que ele mesmo criou com essa carga fiscal extorsiva.
Para trás, Brasil, a todo vapor...
Paulo Roberto de Almeida

Receita investe contra invasão chinesa
Martha Beck e Vivian Oswald
O Globo, 9/03/2011

Uma arma poderosa deve compor o arsenal de defesa comercial que a equipe econômica está montando para proteger a indústria brasileira da atual enxurrada de produtos importados, sobretudo da China. A Receita Federal quer intensificar o uso da chamada valoração aduaneira e fixar um valor para tributar mercadorias que ingressam no mercado nacional com preços excessivamente baixos.

A valoração aduaneira — pouco utilizada atualmente — é um instrumento validado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e consiste em atribuir preço a um produto no mercado internacional para fins de recolhimento de impostos. Isso é feito utilizando-se critérios técnicos também previamente acertados pelos membros da OMC, que podem refletir, por exemplo, uma média histórica do valor de exportação da mercadoria. O objetivo é reduzir a competição desleal entre produtos nacionais e estrangeiros e a sonegação fiscal.



Pacote inclui medidas técnicas e ecológicas



A medida emergencial faz parte de um pacote em estudo que ainda inclui, como antecipou O GLOBO, a aplicação de barreiras técnicas (como a exigência de certificação de qualidade de mercadorias importadas) e ecológicas (como a exigência de produtos importados fabricados em empresas com baixa emissão de carbono), elevação do imposto de importação e ações antidumping.

O governo admite, contudo, que é preciso cautela. Seu arsenal precisa ser muito bem calibrado para evitar futuras ações na Organização Mundial do Comércio. Todas as medidas são instrumentos referendados na esfera multilateral. Mas, quando usadas em excesso, podem provocar disputas.

— Agora que a economia internacional está desaquecida, o mundo todo está olhando para o mercado brasileiro com interesse — afirma um técnico da área econômica.

A equipe econômica também quer evitar os efeitos colaterais no mercado interno. O aumento do Imposto de importação, por exemplo, pode ter impacto sobre o custo das empresas que compram insumos no exterior e sobre a já pressionada inflação.

Segundo o vice-presidente da Associação de comércio exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, um pacote de defesa comercial ajuda, mas não resolve o problema:



Ausência de mecanismo poderia causar demissões



— Se a alíquota de importação subir para 35% (teto fixado pela OMC), isso ajuda, mas não permite que os exportadores compensem todas as perdas de competitividade.

Castro lembra que a manipulação cambial chinesa tornou os produtos daquele país 30% mais baratos que os nacionais. Além disso, o real fortalecido em relação ao dólar encarece em 40% a produção brasileira. Mesmo assim, as medidas são consideradas cruciais hoje:

— Sem esse tipo de mecanismo, este momento da economia pode fazer com que empresas demitam funcionários ou até fechem suas portas. O que está acontecendo no mundo hoje é uma guerra capitalista selvagem — destaca o diretor de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Gianetti.

Segundo a especialista Carol Monteiro de Carvalho, do escritório Bichara, Barata, Costa & Rocha Advogados, o Brasil já vem usando mais defesa comercial e uma prova disso é o aumento das ações antidumping:

— É nítido o efeito do câmbio sobre essas medidas. Elas aumentam na mesma proporção que o câmbio se valoriza.

Wikileaks Brasil-EUA: panorama eleitoral brasileiro um ano antes das eleicoes de 2010

Um telegrama que revela o estado da compreensão, se o termo se aplica, da oposição brasileira ao governo do PT em conversa com enviado americano. Até aquele momento, Serra, que ainda não se tinha declarado candidato (ele só o fez em março de 2010) tinha a preferência dos eleitores. De todo modo, a conversa reincidiu em obviedades políticas que não trazem, naquele momento ou agora, nada de novo sobre o que já se sabia na época ou agora sobre o processo político eleitoral, fortemente dominado pela personalidade do presidente carismático.
Paulo Roberto de Almeida

WikiLeaks
Cenário eleitoral no Brasil em dezembro de 2009

241953/ 12/29/2009/ 16:5309 SAOPAULO667/ Consulate Sao Paulo/ CONFIDENTIAL
Excertos dos itens “confidenciais” do telegrama 09SAOPAULO667.

ASSUNTO: Em São Paulo, líderes políticos expõem preocupações sobre o governo do Brasil ao Secretário Assistente para o Hemisfério Ocidental do Governo dos EUA Arturo Valenzuela

1. (C) RESUMO: No trecho final de sua visita de uma semana ao Cone Sul, o Secretário Assistente para o Hemisfério Ocidental do Governo dos EUA Arturo Valenzuela encontrou-se com figuras expressivas da política local e observadores econômicos em São Paulo, os quais manifestaram preocupações com a política externa do Brasil, gastos públicos e manobras políticas com vistas às eleições de outubro de 2010. Em encontro posterior, privado, com AV [Arturo Valenzuela], o governador de São Paulo, que está na dianteira das pesquisas de intenção de voto Jose Serra alertou para o fato de que a radicalização e a corrupção crescem no Partido dos Trabalhadores (PT), no governo e sugeriu que, como presidente, conduzirá política exterior mais afinada com os EUA. FIM DO RESUMO.

Em Sao Paulo, observadores políticos e econômicos

2. (C) Concluindo sua visita à região com rápida passagem por SP no sábado, dia 18/12, Arturo Valenzuela participou de almoço oferecido pelo Cônsulo Geral e nove especialistas e observadores políticos e econômicos, entre os quais o ex-ministro de Relações Exteriores Celso Lafer, o ex-embaixador do Brasil nos EUA Rubens Barbosa, e o ex-ministro de Ciência e Tecnologia Jose Goldemberg. Valenzuela apresentou panorama genérico de sua viagem e destacou a alta prioridade que o governo dos EUA dá ao relacionamento bilateral. Identificou a cooperação com o Brasil em questões regionais, inclusive Honduras, como tendo “importância crítica”.

3. (C) Todos os convidados brasileiros criticaram a política exterior do governo Lula, manifestaram preocupações sobre a crescente radicalização do Partido dos Trabalhadores e destacaram a deterioração das contas públicas. O ex-ministro RE descreveu a posição do Brasil em relação ao Irã como “o pior erro” da política exterior de Lula. O embaixador Barbosa citou o papel do Brasil em Honduras como grande fracasso. Todos criticaram a atenção que o Brasil está dando em questões internacionais com as quais o Brasil pouco tem a ver e nada a fazer (Irã, conflito Israel-palestinos, Honduras etc.), ao mesmo tempo em que se ignoram questões mais próximas, inclusive as relações com o Mercosul.

4. (C) Roberto Teixeira da Costa, vice-presidente da empresa Brazilian Center for International Relations (CEBRI) e o professor Goldemberg questionaram especialmente o interesse no Irã, dado o pequeno volume de negócios e pobres perspectivas comerciais e a improbabilidade de qualquer cooperação nuclear. [NOTA: Em conversa particular com o encarregado, Goldemberg, que também é renomado físico nuclear, disse que o Brasil nada tem a oferecer ao Irã, no campo dos combustíveis nucleares, dado que o Irã está muito a frente do Brasil na campacidade para centrifugar. Além disso, registrou que muito apreciou recente advertência da secretária Clinton, sobre países que estejam trabalhando muito próximos do Irã. E que o Brasil deveria levar mais a sério aquela advertência. FIM DA NOTA.]
O assessor-secretário Valenzuela destacou que um Irã, cada dia mais isolado, está à caça de qualquer oportunidade, como a que o governo Lula lhe deu, para esconder a ausência de cooperação e a impopularidade na comunidade internacional.

5. (C) No plano doméstico, os participantes brasileiros explicaram a estratégia do PT de tornar as próximas eleições nacionais um referendum para o governo Lula, que será apresentado como avanço em relação do governo de Cardoso. E todos alertaram para a intenção do PT, de conduzir campanha agressiva. Essa via, disseram todos, pode conseguir apresentar Jose Serra como candidato de Cardoso e ajudará a transferir uma parte da popularidade de Lula para Dilma Rousseff – que jamais concorreu a cargo público e até agora tem mostrado pouco carisma como candidata.
O Ombudsman da Folha de Sao Paulo (sic) Carlos Eduardo Lins da Silva, também presente, destacou que o PT terá força econômica que jamais teve antes, para a campanha eleitoral, depois de oito anos de governo. E o cientista político Bolivar Lamounier disse que um PT cada dia mais radical provavelmente fará campanha negativa contra a oposição. O ombudsman da Folha de Sao Paulo, Lins da Silva, acrescentou que, no caso de o PT não vencer as eleições presidenciais de 2010, com certeza usará a riqueza recém adquirida para trabalha como oposição agressiva.

6. (C) Economicamente, Teixeira da Costa disse que a percepção pública sobre o Brasil estava sendo super otimista e que os mercados despencarão rapidamente, caso a situação internacional se deteriore. Ricardo Sennes, Diretor de negócios internacionais da empresa de consultoria Prospectiva, concordou com a avaliação e disse que as contas públicas estão sob forte e crescente stress. Que a economia brasileira continuava a ser não competitiva no longo prazo, por causa da fraca infraestrutura, alta carga tributária e políticas trabalhistas rígidas. Mas todos concordaram que a forte performance da economia brasileira nos últimos oito anos e a recuperação pós-crise econômica global ajudarão na campanha eleitoral de Dilma Rousseff. Sobre o papel de destaque que o Brasil teve na recente Conferência sobre o Clima, em Conference (COP-15), o professor Goldemberg disse que a performance do presidente Lula foi medíocre. E fez piada, dizendo que o Brasil deixou em Copenhague a impressão de que o Brasil desenvolveu-se muito nas duas últimas semanas. Mas elogiou muito a apresentação da secretária Clinton e disse que os países de ponta deveriam reunir-se em pequenos grupos (não como no G-77) para conseguir fazer avançar questões de financiamento e fiscalização.

O governador de São Paulo, primeiro colocado nas pesquisas eleitorais

7. (C) Em encontro de 90 minutos, privado, no Palácio do Governo, Jose Serra disse praticamente a mesma coisa sobre tendências da política nacional, corrupção crescente, gastos públicos e política externa.
Serra contou ao secretário-assessor Valenzuela que o Partido dos Trabalhadores está fazendo todos os esforços para construir uma base de poder de longo prazo, agora que conseguiu chegar ao governo. Serra alertou que o Brasil está alcançando níveis nunca vistos de corrupção e que o PT e a coalizão que o apóia usam os crescentes gastos públicos para construir uma máquina eleitoral para as próximas eleições. Por isso, e porque seu partido (PSDB), segundo o governador, é partido relativamente mais pobre, Serra não pareceu muito firmemente convencido de que chegará à presidência em outubro de 2010.

8. (C) Além de toda a política doméstica, Serra criticou a política externa do governo Lula e sugeriu que, se eleito, dará ao Brasil direção mais internacionalista. Serra citou Honduras como exemplo específico de fracasso do governo Lula, culpando o governo brasileiro e o presidente Zelaya por não deixarem que se construa solução viável. E falou muito positivamente de seu próprio engajamento, em questões de clima, com o estado da California, como exemplo de oportunidade para trabalho conjunto em questões complexas. Mas, reiterando a posição que tem assumido publicamente, Serra criticou a tarifa que os EUA impuseram ao etanol importado do Brasil, a qual, para ele, seria economicamente ilógica.

9. (C) Sobre o crescente populismo na região, Serra disse que a presidente da Argentina Cristina Kirchner pareceu-lhe “cordial e esperta” e sugeriu que, se o governo dos EUA está preocupado com as políticas populistas de Kirchner, muito mais preocupado ficará com a candidata Dilma Rousseff do PT. Alertou também que as referências que o governo dos EUA tem feito sobre uma “relação especial” com o presidente Lula não soa bem em todos os segmentos no Brasil e pode ser manipulada pelo PT. [COMENTÁRIO: À parte a Argentina, Serra pareceu em geral mal informado ou desinformado sobre recentes desdobramentos no cone sul, inclusive sobre a situação política do presidente Lugo do Paraguai, parecendo imerso, principalmente na política brasileira provinciana. FIM DO COMENTÁRIO.]
No final, Serra disse que está trabalhando em vários artigos para jornal, nos quais articulará suas críticas à política externa do governo Lula, a serem publicados nos próximos meses.

Reflexões ao Léu, 6: A Grande Estratégia do Brasil - Paulo Roberto de Almeida

Reflexões ao Léu, 6: A Grande Estratégia do Brasil
Paulo Roberto de Almeida


O Brasil possui uma estratégia, grande ou pequena? Talvez, embora nem sempre se perceba. Os militares talvez tenham pensado em alguma, e ela sempre envolve grandes meios, para defender as grandes causas: a soberania, a integridade territorial, a preservação da paz e da segurança no território nacional e no seu entorno imediato. Enfim, todas aquelas coisas que motivam os militares. Os diplomatas, também, talvez tenham escrito algo em torno disso, e ela sempre envolve o desenvolvimento nacional num ambiente de paz e cooperação com os vizinhos e parceiros da sociedade internacional, no pleno respeito dos compromissos internacionais e da defesa dos princípios e valores constitucionais, que por acaso se coadunam com a Carta da ONU. Mas eles também acham que está na hora de “democratizar” o sistema internacional, que ainda preserva traços do imediato pós-Segunda Guerra, ampliando o Conselho de Segurança da ONU, reformando as principais organizações econômicas multilaterais e ampliando as possibilidades de participação dos países em desenvolvimento nas instâncias decisórias mundiais; enfim, todo aquele discurso que vocês conhecem bem.
Tudo isso é sabido, e repassado a cada vez, nas conferências nacionais de estudos estratégicos, em grandes encontros diplomáticos, nos discursos protocolares dos líderes nacionais. Até parece que possuímos de fato uma grande estratégia, embora nem sempre isso seja percebido por todos os atores que dela participam, consciente ou inconscientemente. Aparentemente, ela seria feita dos seguintes elementos: manutenção de um ambiente de paz e cooperação no continente sul-americano e seu ambiente adjacente, num quadro de desenvolvimento econômico e social com oportunidades equivalentes para todos os vizinhos, visando a construção de um grande espaço econômico integrado, de coordenação e cooperação política, num ambiente democrático, engajado coletivamente na defesa dos direitos humanos e na promoção da prosperidade conjunta dos povos que ocupam esse espaço.
Muito bem, mas esses são objetivos genéricos, até meritórios e desejáveis, que precisam ser implementados de alguma forma, ou seja, promovidos por meio de iniciativas e medidas ativas, o que envolve inclusive a remoção dos obstáculos que se opõem à consecução desses grandes objetivos. É aqui que entra, de verdade, a grande estratégia, quando se tem de adequar os meios aos objetivos, não simplesmente na definição de metas genéricas. A estratégia é que permite se dizer como, e sob quais condições, o povo do país e suas lideranças vão mobilizar os recursos disponíveis, as ferramentas adequadas e os fatores contingentes – dos quais, os mais importantes são os agentes humanos – por meio dos quais será possível alcançar os grandes objetivos e afastar as ameaças que se lhes antepõem. Uma verdadeira estratégia diz o que deve ser feito, na parte ativa, e também, de maneira não simplesmente reativa, como devemos agir para que forças contrárias dificultem o atingimento das metas nacionais.


Nesse sentido, se o grande objetivo brasileiro – que integra nesta concepção sua “grande estratégia” – é a consolidação de um espaço econômico democrático e de cooperação econômica no continente, devemos reconhecer que avançamos muito pouco nos últimos anos. A despeito da retórica governamental, não se pode dizer, atualmente, que a integração e a democracia progrediram tremendamente na última década. Ao contrário, olhando objetivamente, esses dois componentes até recuaram em várias partes, e não se sabe bem o que o Brasil fez para promovê-los ativamente. O presidente anterior foi visto abraçado com vários ditadores ou candidatos a tal, esqueceu-se de defender a liberdade de expressão, os valores democráticos e os direitos humanos onde eles foram, e continuam sendo, mais ameaçados, quando não vêm sendo extirpados ou já desapareceram por completo. A integração que realmente conta, a econômica e comercial, cedeu espaço a uma ilusória integração política e social que até pode ter rendido muitas viagens de burocratas e políticos, mas não parece ter ampliado mercados e consolidado a abertura econômica recíproca.


Desse ponto de vista, o Brasil parece ter falhado em sua grande estratégia, se é verdade que ele realmente possui uma. Se não possui, está na hora de pensar em elaborar a sua. Passada a retórica grandiloquente – contra-produtiva, aliás – da liderança e da união exclusiva e excludente, contra supostas ameaças imperiais, pode-se passar a trabalhar realisticamente na implementação da grande estratégia delineada sumariamente linhas acima. A julgar pelos primeiros passos, parece que começamos a retificar equívocos do passado recente e a enveredar por um caminho mais adequado e mais conforme a nossas velhas tradições diplomáticas.


Brasília, 9 de Março de 2011

terça-feira, 8 de março de 2011

Mercosul anti-americano?: no que depender do Chavez...

Mas não só dele. Muitas outras pessoas, que negavam de público (e vão continuar negando), alimentavam esse anti-americanismo infantil e basicamente estúpido, de querer sair da "dependência comercial americana", como se comércio fosse algo espúrio...

Wikileaks traz críticas dos EUA ao Mercosul
Estado de S.Pauoo, 7/03/2011

O jornal portenho “Página 12″ divulgou hoje o conteúdo de telegramas do Departamento de Estado dos EUA que indicavam que em 2007 o governo do então presidente George W. Bush considerava que “a entrada da Venezuela no Mercosul altera claramente o balanço e a dinâmica da organização”. Segundo os telegramas, filtrados pela Wikileaks, Washington considerava o bloco comercial do Cone Sul uma organização de oposição pertinaz aos Estados Unidos: “o Mercosul gradualmente foi transformando-se de uma união alfandegária imperfeita em uma organização mais restritiva e antiamericana”.

Na época, a Venezuela – governada pelo presidente Hugo Chávez – estava tentando ser aceita como sócia plena do Mercosul. Apesar da aprovação dos parlamentos do Uruguai e da Argentina, encontrava resistências nos Senados brasileiro e paraguaio (o senado brasileiro aprovou a entrada da Venezuela em 2009, enquanto que o Paraguai ainda não debateu o pedido de inclusão do país caribenho, devido à resistência da oposição e de parte do bloco governista).

As definições dos EUA sobre o Mercosul foram emitidas durante uma série de reuniões que foram realizadas nos dias 8 e 9 de maio de 2007 no Rio de Janeiro pelos embaixadores americanos no Brasil, Uruguai, Argentina, Paraguai e Chile. O telegrama, classificado como “secreto” no dia 17 de maio de 2007 por Michael J. Fitzpatrick, da embaixada dos EUA na capital paraguaia, Assunção, leva o título de “Conferência: uma perspectiva do Cone Sul sob a influência de Chávez”.

Segundo os telegramas filtrados pela Wikileaks e publicados pelo “Página 12″, os embaixadores americanos concluíram no final da reunião que “a campanha de Chávez para expandir sua influência no Cone Sul é multifacética e está apoiada em grande parte – mas não totalmente – em uma generosa assistência energética e acordos de investimento”. Os diplomatas consideraram que “poucos países provaram que foram capazes de resistir ao atrativo da ajuda venezuelana e seus pacotes de investimento”.

Os telegramas indicam que os embaixadores consideraram necessário pedir “mais ferramentas e recursos” para enfrentar o que denominaram de “esforços políticos para fissurar a democracia, planejar estratégias econômicas para estrangular o livre comércio, a politização do Mercosul e a expansão dos laços da área de defesa”.

O então presidente Néstor Kirchner (2003-2007), falecido em outubro do ano passado, passou pelo crivo analítico dos diplomatas. “Embora Kirchner compartilhe algumas posturas esquerdistas de Chávez, ele é um pragmático”, sustentaram. O governo da presidente Cristina Kirchner, que estava em pleno feriado de carnaval, não fez declarações oficiais sobre o conteúdo dos telegramas filtrados pela Wikileaks.

Nao sabia o que fazer na vida; foi ser diplomata...

Quase isso. Mas pelo menos ele é sincero.
Resta saber se vai entrar na indústria das indenizações também...

Minha história - Jom Tob Azulay: Filho pródigo
Depoimento a JULIANA ROCHA, DE BRASÍLIA
Folha de S.Paulo, 8/03/2011

Um amigo passou em quarto lugar [no Itamaraty] e foi impedido de se matricular por ter sido líder estudantil Eu tinha que ver a lista de pessoas que não podiam ter o passaporte renovado Estava exercendo funções policiais. Eu tinha que sair

RESUMO
Jom Tob Azulay assistiu à caça às bruxas que a ditadura militar promoveu no Itamaraty, onde entrou em 1965. Testemunhou expurgos e, a contragosto, foi incumbido de executar a política do regime nos postos em que serviu. Pediu desligamento em 1976. Após décadas trabalhando como cineasta, reencontrou-se com a diplomacia e foi reintegrado ao Itamaraty.

Jom Tob Azulay, 69, pertence à geração que entrou para o corpo diplomático na ditadura militar, vendo-se na obrigação de representar um regime com o qual não se identificava. Desde o exame de admissão até deixar o Itamaraty, em 1976, assistiu à perseguição política no ministério, ao qual acaba de ser reintegrado pela comissão da anistia. Servirá na Índia, como conselheiro, até completar 70 anos, em dezembro, quando deverá se aposentar.

MENINO DO RIO
Tive uma educação típica de classe média do Rio de Janeiro, criado em Ipanema, nos anos 50. Não me envolvi com atividades estudantis na faculdade. Eu era praiano, frequentava os pontos de encontro da bossa nova.
Comecei a namorar uma dinamarquesa sete anos mais velha, que me deu uma visão de vida europeia. Me ensinou a falar francês e inglês, a me vestir, a ter certa sofisticação. Eu não sabia o que fazer e o Itamaraty era uma opção interessante.

EXAME IDEOLÓGICO
Comecei a estudar para ser diplomata em 1963, no auge do predomínio do pensamento de esquerda. Minha formação foi dentro da visão crítica da realidade do país.
Prestei o exame no ano seguinte ao golpe e não sabia como adaptar tudo o que tinha estudado à nova realidade. Sabia que a prova do Rio Branco era ideológica. Certas palavras não se podia usar, como conscientização, que era considerado neologismo.
A minha primeira frustração foi quando um dos meus grandes amigos passou em quarto lugar e foi impedido de se matricular por ter sido líder estudantil.

CAÇA ÀS BRUXAS
Teve uma caça às bruxas no Itamaraty. Eu participava das passeatas. A gente formava grupos, discuta a realidade. A incompatibilidade com o regime era percebida.
Em 1969, se institui a Comissão Câmara Canto, que ceifou 40 diplomatas. Quando fui convocado por ela, pensei que minha vida tinha acabado. Me sentia culpado em relação àquele regime.
Fui recebido por três embaixadores que me perguntaram se eu conhecia algum homossexual, comunista ou alcoólatra. Disse que não. Concordar em responder já é uma vergonha. Escapei, mas aquilo me afetou.
A única coisa digna que se deveria fazer é dizer que isso não é pergunta que se faça, e que eu não vou responder a nada que seja insultuoso. Mas se eu desse essa resposta, estava liquidado. Aquilo era uma comissão de delação, o que mostra que a instituição estava envenenada.

OS CORREDORES
Em 1969, a postura dos militares com o Itamaraty mudou porque souberam que estavam mandando informações e denúncias de tortura pela mala diplomática para a Anistia Internacional.
Havia um clima de repressão enraizado através das DSIs (Divisão de Segurança de Informações). Tinha um representante do DSI na Secretaria-Geral do Itamaraty.
O coronel Paiva Chaves tinha um gabinete. Tudo passava por ele. O Itamaraty foi humilhado, sua autoridade foi quebrada. O pior, a gente via os oficiais pelos corredores. Um dia, ouvi: "Não vamos torturar um diplomata".

A SAÍDA
Em Los Angeles, conheci os realizadores do filme "Brazil: A Report on Torture" -documentário com depoimentos e simulações de tortura (1971). Eu vi que estava diante de algo perturbador.
Sempre que podia, eu passava esse filme para amigos. Uma vez, passei na casa do músico Oscar Castro Neves, onde estavam Tom Jobim, Elis Regina e mais uns 40 brasileiros. As senhoras gritavam: "O que é isso?".
Na época, eu trabalhava no setor consular de Los Angeles, onde tinha que ver a lista de pessoas que não podiam ter o passaporte renovado, receber visto ou apoio e deviam ter a presença denunciada. Estava exercendo funções policiais. Aí eu percebi que tinha que sair.
Tinha crises por ser obrigado a não renovar passaporte, como o do professor Alberto Guerreiro Ramos. Então, pedi para sair em 1976. Fiquei quieto no meu canto. Por isso nunca fui preso.
Fui me dedicar à atividade que me permitia um mínimo de oxigenação: o cinema. Nesses 35 anos fora do Itamaraty, fui produtor, fotógrafo e roteirista. Foram três longas: "Os Doces Bárbaros", de 1978, "Corações a Mil", de 1983, e "O Judeu", de 1995, além do documentário "Caminhos da Diplomacia Brasileira", de 1996.

A ANISTIA
Em 2001, fui trabalhar na Ancine [Agência Nacional do Cinema]. Lá fiz diplomacia como nunca. Fiz um acordo Brasil-Alemanha, que reacendeu a alma do diplomata.
Em 2007, o [embaixador] Jerônimo Moscardo perguntou porque eu não voltava para o Itamaraty. Argumentou que saímos porque havia um clima de perseguição.
Entrei na Comissão da Anistia, onde três colegas, entre eles o ex-ministro da Defesa José Viegas, depuseram a meu favor. A volta representa o exorcismo de tudo isso. Disse na comissão que não havia como continuar. Eu não podia conviver com aquilo. No meu julgamento, passou trechos de "Brazil: A Report on Torture". Em quase 40 anos de existência do filme, foi a primeira vez que foi exibido no país.
É indescritível que o brasileiro tenha sido aquilo, tenha submetido seus filhos àquilo. Isso nunca passou porque as sociedades reprimem no seu inconsciente aquilo de que se envergonham.
Agora que fui reintegrado, vou para a Índia até dezembro, quando faço 70 anos e me aposento.

Libia: dificuldades da "no-fly zone" - Georges Friedman (Stratfor)

Mais complicado do que parece...

How a Libyan No-fly Zone Could Backfire
By George Friedman
Stratfor, March 8, 2011

Calls are growing for a no-fly zone over Libya, but a power or coalition of powers willing to enforce one remains elusive.

In evaluating such calls, it is useful to remember that in war, Murphy’s Law always lurks. What can go wrong will go wrong, in Libya as in Iraq or Afghanistan.

Complications to Airstrikes
It has been pointed out that a no-fly zone is not an antiseptic act. In order to protect the aircraft enforcing the no-fly zone, one must begin by suppressing enemy air defenses. This in turn poses an intelligence problem. Precisely what are Libyan air defenses and where are they located? It is possible to assert that Libya has no effective air defenses and that an SEAD (suppression of enemy air defenses) attack is therefore unnecessary. But that makes assumptions that cannot be demonstrated without testing, and the test is dangerous. At the same time, collecting definitive intelligence on air defenses is not as easy as it might appear — particularly as the opposition and thieves alike have managed to capture heavy weapons and armored vehicles, meaning that air defense assets are on the move and under uncertain control.

Therefore, a no-fly zone would begin with airstrikes on known air defense sites. But it would likely continue with sustained patrols by SEAD aircraft armed with anti-radiation missiles poised to rapidly confront any subsequent threat that pops up. Keeping those aircraft on station for an extended period of time would be necessary, along with an unknown number of strikes. It is uncertain where the radars and missiles are located, and those airstrikes would not be without error. When search radars and especially targeting radars are turned on, the response must be instantaneous, while the radar is radiating (and therefore vulnerable) and before it can engage. That means there will be no opportunity to determine whether the sites are located in residential areas or close to public facilities such as schools or hospitals.

Previous regimes, hoping to garner international support, have deliberately placed their systems near such facilities to force what the international media would consider an atrocity. Libyan leader Moammar Gadhafi does not seem like someone who would hesitate to cause civilian casualties for political advantage. Thus, the imposition of a no-fly zone could rapidly deteriorate into condemnations for killing civilians of those enforcing the zone ostensibly for humanitarian purposes. Indeed, attacks on air defenses could cause substantial casualties, turning a humanitarian action into one of considerable consequence in both humanitarian and political terms.

Airstrikes vs. Ground Operations
The more important question is what exactly a no-fly zone would achieve. Certainly, it would ground Gadhafi’s air force, but it would not come close to ending the fighting nor erode Gadhafi’s other substantial advantages. His forces appear to be better organized and trained than his opponents, who are politically divided and far less organized. Not long ago, Gadhafi largely was written off, but he has more than held his own — and he has held his own through the employment of ground combat forces. What remains of his air force has been used for limited harassment, so the imposition of a no-fly zone would not change the military situation on the ground. Even with a no-fly zone, Gadhafi would still be difficult for the rebels to defeat, and Gadhafi might still defeat the rebels.

The attractiveness of the no-fly zone in Iraq was that it provided the political illusion that steps were being taken, without creating substantial risks, or for that matter, actually doing substantial damage to Saddam Hussein’s control over Iraq. The no-fly zone remained in place for about 12 years without forcing change in Saddam’s policies, let alone regime change. The same is likely to be true in Libya. The no-fly zone is a low-risk action with little ability to change the military reality that creates an impression of decisive action. It does, as we argue, have a substantial downside, in that it entails costs and risks — including a high likelihood of at least some civilian casualties — without clear benefit or meaningful impact. The magnitude of the potential civilian toll is unknown, but its likelihood, oddly, is not in the hands of those imposing the no-fly zone, but in the hands of Gadhafi. Add to this human error and other failures inherent in war, and the outcome becomes unclear.

A more significant action would be intervention on the ground, an invasion of Libya designed to destroy Gadhafi’s military and force regime change. This would require a substantial force — and it should be remembered from Iraq that it would require a substantial occupation force to stabilize and build a new regime to govern Libya. Unlike in Egypt, Gadhafi is the regime, and sectarian elements that have been kept in check under his regime already are coming to the fore. The ability of the country to provide and administer basic government functions is also unknown. And it must also be borne in mind that Gadhafi clearly has substantial support as well as opposition. His supporters will not go without a fight and could choose to wage some form of post-invasion resistance, as in Iraq. Thus, while the initial costs in terms of casualties might be low, the long-term costs might be much higher.

It should also be remembered that the same international community that condemned Saddam Hussein as a brutal dictator quite easily turned to condemn the United States both for deposing him and for the steps its military took in trying to deal with the subsequent insurgency. It is not difficult to imagine a situation where there is extended Libyan resistance to the occupying force followed by international condemnation of the counterinsurgency effort.

Having toppled a regime, it is difficult to simply leave. The idea that this would be a quick, surgical and short-term invasion is certainly one scenario, but it is neither certain nor even the most likely scenario. In the same sense, the casualties caused by the no-fly zone would be unknown. The difference is that while a no-fly zone could be terminated easily, it is unlikely that it would have any impact on ground operations. An invasion would certainly have a substantial impact but would not be terminable.

Stopping a civil war is viable if it can be done without increasing casualties beyond what they might be if the war ran its course. The no-fly zone likely does that, without ending the civil war. If properly resourced, the invasion option could end the civil war, but it opens the door to extended low-intensity conflict.

The National Interest
It is difficult to perceive the U.S. national interest in Libya. The interests of some European countries, like Italy, are more substantial, but it is not clear that they are prepared to undertake the burden without the United States.

We would argue that war as a humanitarian action should be undertaken only with the clear understanding that in the end it might cause more suffering than the civil war. It should also be undertaken with the clear understanding that the inhabitants might prove less than grateful, and the rest of the world would not applaud nearly as much as might be liked — and would be faster to condemn the occupier when things went wrong. Indeed, the recently formed opposition council based out of Benghazi — the same group that is leading the calls from eastern Libya for foreign airstrikes against Gadhafi’s air force — has explicitly warned against any military intervention involving troops on the ground.

In the end, the use of force must have the national interest in mind. And the historical record of armed humanitarian interventions is mixed at best.

CSNU: sempre igual a ele mesmo, ou seja: inoperante

Retifico imediatamente: não se trata exatamente da ONU e sim dos países membros, no caso os 5P, ou cinco membros permanentes, que são também as grandes potências.
Sempre ocorre esse tipo de impasse: os três países ocidentais pretendem defender valores e princípios democráticos e de direitos humanos, e os dois outros, Rússia e China, bloqueiam a resolução, invocando sempre seu direito de veto e a questão da soberania. Se ambos fossem democracias, no sentido ocidental da palavra, isso provavelmente não ocorreria.
A ONU vive desses impasses, todos baseados na soberania absoluta das nações, um princípio da era moderna que ainda não foi transformado na era contemporânea.
Paulo Roberto de Almeida

Is China a definite 'no' on no-fly zone?
Joshua Keating
Foreign Policy, 08/03/11

The Russian government has already voiced its opposition to imposing a no-fly zone on Libya, and it has generally been assumed that China -- the other half of the U.N. Security Council's sovereignty caucus -- would be strongly against the idea as well. But the Financial Times' Daniel Dombey seems to detect some wiggle room in Beijing's rhetoric:

Beijing said on Tuesday it would urge countries “to settle the conflict and calm the situation through dialogue and other peaceful means”, according to Jiang Yu, a foreign ministry spokeswoman.

The announcement is likely to encourage western planners who are stepping up preparations for a no-fly zone.

Ivo Daalder, US ambassador to Nato, said on Monday the alliance could impose such a measure by the end of the week, although he added that the US would also seek a UN Security Council resolution.

Ms Jiang said Chinese support in the security council for action beyond sanctions “depends on whether it helps Libya to return to stability as soon as possible”.

She added: “In the decision-making process, we believe, Libya’s sovereignty, territorial integrity and independence should be respected,”

That's not exactly a ringing endorsement, though it is a bit less forceful in opposition than one might expect. Then again, the Chinese delegation may figure that with Russia putting its foot down against "superfluous" intervention, they can afford to be a bit circumspect.

Politica Externa de Dilma Rousseff - Direitos Humanos: retificando os equivocos

Nada como um dia depois do outro: sempre se pode corrigir erros da véspera, no caso, do governo anterior. Erros é uma maneira de dizer, claro; ativistas de direitos humanos teriam outros conceitos para descrever as posturas do governo Lula, sempre amigo de ditadores.
Interessante que as pessoas, no caso diplomatas, não têm nenhum problema em defender um argumento, e depois o seu contrário, sem que isto lhes cause o menor rubor na face.
Alguns chamariam isso de flexibilidade, outros de disciplina. Eu teria outros nomes...
Paulo Roberto de Almeida

Política externa
Embaixadora brasileira na ONU dá sinais de que país vai mudar voto sobre violações de direitos humanos no Irã

“O que eu posso dizer é que para todos os efeitos, nós concordamos em tudo"
Shirin Ebadi, sobre encontro com a embaixadora do Brasil junto às Nações Unidas em Genebra

O governo brasileiro deu nesta segunda-feira mais um passo para corrigir um grande erro cometido durante os oito anos da administração anterior: apoiar países que violam sistematicamente os direitos humanos, como o Irã. A embaixadora do Brasil junto à Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, Maria Nazareth Farani de Azevêdo, recebeu a vencedora do Prêmio Nobel da Paz e crítica ferrenha do regime iraniano, Shirin Ebadi, para um almoço em sua casa. O encontro foi realizado em meio às reuniões do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que ocorrem desde o final de fevereiro, e que devem culminar com a votação nas próximas semanas de uma resolução, condenando as violações aos direitos humanos no Irã.

O almoço desta segunda - que contou ainda com embaixadores de diversos países da América Latina, África e também dos Estados Unidos na ONU - é um sinal de que o Brasil deve apoiar a resolução, que estabelece também o envio de um relator especial da entidade a Teerã. “Por uma questão de princípios e pela maneira como a ONU trabalha, as pessoas não fazem promessas umas às outras fora das sessões oficiais”, disse Ebadi ao site de VEJA sobre a conversa com a embaixadora brasileira no encontro extra-oficial. “O que eu posso dizer é que, para todos os efeitos, nós concordamos em tudo.”

Ebadi sempre criticou duramente a atitude do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de tratar como amigo o fanático que governa o Irã e nega o Holocausto, Mahmoud Ahmadinejad. A iraniana agora vê mudanças na política externa do Brasil. “O país está prestando muito mais atenção nos direitos humanos.”

Ativistas que também participaram do almoço comemoraram o fato de a embaixadora brasileira ter convidado à sua casa um símbolo contra o regime opressor iraniano e outros representantes na ONU. “ A embaixadora estava muito aberta e ela expressou grande apoio ao que a Shirin Ebadi dizia”, afirmou Julie Gromellon, representante da Federação Internacional de Ligas de Direitos Humanos junto à ONU. “O fato de a embaixadora ter convidado todos é um sinal de que o país vai votar a favor da resolução. Acredito que agora a embaixadora esteja aguardando declarações vindas de níveis mais altos do governo brasileiro para deixar isso ainda mais claro.”

Sinais - Mesmo antes de sua posse, a presidente Dilma Rousseff já vinha dando sinais de que mudará a política externa do Brasil. Em uma entrevista concedida ao jornal americano The Washington Post, em dezembro do ano passado, ela condenou o apedrejamento no Irã e qualquer outro tipo de "prática ‘medieval’ contra mulheres”. Ela se referia à sentença decretada contra a iraniana Sakineh Mohammadi-Ashtiani por adultério pela arbitrária Justiça da Repúlica Islâmica.

A declaração de Dilma marcou um contraste com a política externa que o Itamaraty vinha adotando nos últimos oito anos. Um mês antes da entrevista da presidente, o Brasil - sob a batuta de Lula - se recusou a apoiar uma resolução na ONU que pedia o fim do apedrejamento no Irã. A medida, que acabou sendo aprovada mesmo sem o voto do Brasil, também condenava Teerã por "graves violações de direitos humanos" e por silenciar jornalistas, blogueiros e opositores.
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Brasil presta homenagem a opositora de Ahmadinejad
Jamil Chade, correspondente
O Estado de S.Paulo, 08 de março de 2011

Diplomacia brasileira oferece almoço, em Genebra, a Shirin Ebadi, Nobel da Paz; Teerã se irrita com sinais de mudança na política externa do País

GENEBRA - Pela primeira vez, o governo brasileiro abriu as portas de sua diplomacia à maior opositora do regime de Mahmoud Ahmadinejad, em um gesto político explícito contra as violações de direitos humanos no Irã. A missão brasileira perante a ONU ofereceu um almoço na segunda-feira, 7, em Genebra, em homenagem à dissidente Shirin Ebadi, prêmio Nobel da Paz, perseguida pelo regime e refugiada na Europa.
O governo iraniano não escondeu a irritação e interpretou a atitude como um recado claro do Brasil de que a lua de mel entre Brasília e Teerã acabou.
"Se a comunidade internacional não agir, o Irã em breve se transformará numa nova Líbia", afirmou Ebadi durante o almoço, que também contou a presença de embaixadores de países como Estados Unidos e outros que defendem uma posição mais dura contra o Irã.
Sanções. Ebadi pediu que o Brasil e os Estados Unidos adotem sanções políticas contra membros do regime de Ahmadinejad, como a negação de vistos para políticos e congelamento de ativos dessas pessoas envolvidas na repressão.
A vencedora do prêmio Nobel, considerada uma das maiores opositoras de Ahmadinejad, ainda defendeu a ideia dos EUA e da Europa de estabelecer na ONU um relator internacional que investigue as violações de direitos humanos no Irã.
"Precisamos dessa investigação para abrir uma nova etapa do diálogo com o Irã. Seria um sinal importante para o povo iraniano que sofre com a repressão."
"Se o Brasil e a comunidade internacional não querem mais uma Líbia, precisam começar a se mover imediatamente para promover um novo diálogo com Ahmadinejad, antes que ele siga o caminho de Muamar Kadafi", enfatizou Ebadi, segundo relato de presentes no almoço. "O povo no Irã não vai silenciar e o governo, de outro lado, continuará com seu massacre", alertou.
A proposta (sobre sanções ao Irã) vai à votação no dia 21. O Brasil já indicou que poderá rever suas posições, algo impensável durante o governo Lula.
Na segunda-feira, a embaixadora Maria Nazareth Farani Azevedo, que promovia o almoço, declarou aos convidados que o Brasil "apoiava" a posição de Ebadi. O Estado obteve informações de que o Itamaraty está sendo pressionado pelos EUA não apenas a aceitar a investigação, mas também para copatrocinar a resolução que pediria o estabelecimento de tal mecanismo.
Durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a opção do Itamaraty foi a de manter um diálogo apenas com o governo de Ahmadinejad. Lula chegou a criticar a oposição ao regime iraniano. Ebadi alertou que o brasileiro estava ofendendo o povo iraniano ao não atender aos apelos da oposição.
Organizações não governamentais (ONGs) comemoram os novos sinais da política externa brasileira. "Não temos ainda garantia de que o Brasil apoiará a criação de uma investigação contra o Irã. Mas abrir suas portas aos dissidentes já é um grande passo", afirmou a assessoria de imprensa da Federação Internacional de Direitos Humanos, uma das entidades envolvidas na organização do encontro.