O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 12 de março de 2013

Brasil: um pais que nao perde oportunidade de...

...perder oportunidades, segundo a frase genial de Roberto Campos.
Pois é, é isso aí, como na incapacidade de exportar o que produz...
Paulo Roberto de Almeida
 
Problemas com clima e logística atrapalham venda de soja brasileira para a China

Informa Economics FNP

Canal Rural,  06/03/2013

Segundo analistas, país asiático optou por comprar cerca de 60 toneladas de soja dos Estados Unidos

A demora maior para embarque no Brasil está transferindo parte das compras de soja feitas pela China para os Estados Unidos. De acordo com analistas, o país comprou cerca de 60 toneladas de soja americana, o equivalente a dois navios. O fato é atribuído a problemas como clima e logística.

A produção de soja do Centro-Oeste brasileiro deveria ser a primeira a entrar no mercado, mas as chuvas atrasaram a colheita, e a oferta ficou concentrada na segunda quinzena de fevereiro. Normalmente, a produção desta região chega ao mercado um mês antes. Para piorar a situação, as mudanças nas leis dos motoristas fizeram com que o preço do frete disparasse para os principais portos do país.

- Tem gente lá no Mato Grosso cobrando R$ 350, do Norte de Sorriso para Santos. R$ 350 por tonelada é bastante, dá R$ 20 por saca. As empresas e os próprios caminhoneiros veem que tem oportunidade de ganhar mais, aí aproveitam e sobem o preço mesmo. E quem paga mais tem mais disponibilidade de caminhão, consegue fazer os embarques dos seus navios e fazer as entregas conforme os contratos combinados - diz o analista de mercado Artur Malvasi.

Além dos problemas provocados pelo atraso da colheita, as manifestações dos trabalhadores portuários nos últimos dias atrasaram o carregamento de navios chineses.

- O que acontece é que eles precisam da soja agora, o governo chinês não libera a soja, o Brasil está com a logística precária e eles, com medo do atraso nas entregas, buscam soja da safra velha norte-americana para ter produto agora. Essa demanda é boa para o mundo inteiro, porque ela sustenta preço - fala Malvasi.

Para a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), a compra da soja americana pelos chineses não é motivo de preocupação. Segundo a Anec, o caso é pontual, e o Brasil vai continuar abastecendo o mercado asiático.

- Isso é meramente ocasional, porque o normal agora é comprar do Brasil, já que a nossa safra começa agora. Como há um line up muito grande de navios - são mais de 90 navios esperando em Santos e muito mais de 50 em Paranaguá -, é normal que tenha acontecido isso, uma decisão deles Era apenas dois navios de 50 mil toneladas, em vez de entrar nessa linha e ficar esperando. Não há razão neste momento para preocupação, mesmo porque não há rescisões de contrato ou coisa parecida - comenta Sérgio Mendes, diretor da Anec.

A indústria está confiante. A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) acredita que uma possível safra recorde é positiva, porém vai trazer desafios no setor logístico.

- Esse ano vai ser o ano do recorde de safra, essa é a melhor notícia que nos temos, que esta indo super bem. Recorde dos recordes, na soja, no milho. Realmente, a perspectiva é muito boa, com preços excelentes. Em contrapartida, vai ser o ano da logística, vamos ter que ser o mais eficiente possível. Estamos aí transportando 45 milhões de toneladas a mais de grão do que há cinco anos, mas as rodovias são as mesmas. A ferrovia melhorou, mas temos os mesmos portos e os mesmos armazéns - fala Fábio Trigueiro, secretário-geral da Abiove.

O analista de mercado da Informa Economics FNP, Aedson Pereira, diz que a partir de agora, a demanda mundial por grãos volta para a América Latina, mas que o governo brasileiro precisa olhar com mais atenção para a infraestrutura logística do país.

- Nós temos um cenário com produção recorde, então o mundo como um todo, principalmente a China, depende, e muito, dos resultados de oferta que o Brasil tende a apresentar. Issso aí gera até uma oportunidade para o produtor brasileiro vender, fazer novas operações, porque melhora na liquidez de negócios. O Brasil precisa urgentemente de uma nova política voltada para melhorar a infraestrutura em armazenagem, transporte, diminuir a nossa dependência de frete rodoviário, o ferroviário, nos portos, tudo isso visando aumentar a velocidade para atender essa demanda externa que cresce cada vez mais - diz Pereira.
Fonte: Canal Rural

Crescente irrelevancia do Mercosul - Editorial Estadao

Nao foi por falta de aviso, inclusive por parte deste escriba, aliás desde antes de 2003.
De fato, desde 1995, ou seja, desde que foi "consolidado" enquanto União Aduaneira, que o Mercosul só recua, tanto na integração interna, quanto na externa, onde se tornou cada vez mais introvertido e protecionista.
A partir de 2003, a esses fatores de "protecionismo natural", digamos assim, se somaram os fatores ideológicos, de dois governos dotados de economias esquizofrênicas que pretendiam (e conseguiram) fazer rodar para trás a roda da História. Pior: o Brasil conseguiu ajudar a Argentina a desmantelar o Mercosul, com sua política caolha, míope, cega, enviesada, nebulosa (tem mais adjetivos e sinônimos disso tudo?) de apoio a tudo o que os hermanos decidiam, uma política decidida pessoalmente pelo ex-SG do MRE, depois Alto (ou auto?) Representante do Mercosul e ainda hoje influente no setor.
Deu no que tinha de dar: desastre comercial, recuo econômico, mediocridade comercial.
Paulo Roberto de Almeida 

O mundo gira sem o Mercosul

12 de março de 2013 | 2h 13
Editori O Estado de S.Paulo
 
O governo argentino pretende arrancar mais vantagens do Brasil, em mais uma revisão do acordo automotivo assinado em 2000 para acabar em 2005, mas a partir daí prorrogado várias vezes. Em toda prorrogação foram fixados novos benefícios para o lado argentino, por meio de fórmulas calculadas para dispensar aquele sócio de se tornar competitivo. A nova esperteza argentina é mais uma comprovação do erro cometido pelo governo petista, há dez anos, quando optou por um regionalismo ingênuo inspirado em bandeiras terceiro-mundistas.
Na última negociação, o acordo foi estendido até 2013. A partir daí valeriam normas de livre comércio, mas a presidente Cristina Kirchner decidiu mudar o jogo mais uma vez. Comércio aberto está fora da agenda da Casa Rosada. O assunto estava na pauta do encontro bilateral marcado para a semana passada e suspenso por causa da morte do presidente Hugo Chávez.
Desta vez, o governo argentino quer, além da extensão do pacto bilateral, a fabricação, em seu país, de parte dos produtos incluídos no programa brasileiro Inovar-Auto. Em outras palavras, a indústria instalada na Argentina deve ganhar, se Brasília estiver de acordo, uma carona em um programa custeado pelo contribuinte brasileiro. Será uma surpresa se, no fim da história, a presidente Dilma Rousseff recusar mais esse mimo à companheira Cristina Kirchner.
Há vários anos o governo brasileiro vem moldando boa parte de suas decisões estratégicas de acordo com os interesses definidos em Buenos Aires. Foi assim no episódio da suspensão do Paraguai e da admissão da Venezuela como quinto membro do Mercosul. Nas negociações com a União Europeia sempre prevaleceram as restrições argentinas, mesmo quando o Itamaraty se mostrou disposto ao entendimento com os europeus.
Na adiada reunião bilateral com a companheira Cristina Kirchner, a presidente Dilma Rousseff havia se preparado para anunciar novas concessões, como a participação do BNDES no financiamento de obras de infraestrutura e a abertura de uma cota para importação de camarões argentinos. A pauta deveria incluir também assuntos menos agradáveis, como as dificuldades da Vale para executar um projeto de exploração de potássio. Sem um acordo para compensar a alta de custos causada pela inflação e outros problemas de relacionamento com o setor público, a companhia poderá suspender o investimento.
Crescentemente atolado no difícil relacionamento com a Argentina, o governo brasileiro tem espaço cada vez menor para se ajustar às novas condições do mercado internacional. Formalmente, o Mercosul é uma união aduaneira, embora nem chegue a funcionar de modo satisfatório como área de livre comércio. Como sócios de uma união aduaneira, os países-membros devem respeitar a regra da tarifa externa comum. Por isso, podem negociar acordos comerciais apenas em bloco. Toda concessão tarifária a qualquer parceiro de fora depende da aprovação dos demais.
Até agora, o Mercosul negociou poucos acordos de livre comércio, sempre com parceiros em desenvolvimento e, em alguns casos, sem relevância econômica para o Brasil. Enquanto isso, acordos bilaterais e inter-regionais multiplicam-se em todo o mundo, sem a participação do Brasil. Ou seja, o Brasil está cada vez mais fora do jogo relevante para o comércio internacional. Os EUA empenham-se em concluir um acordo com parceiros do Pacífico. O entendimento inclui vários países em desenvolvimento da Ásia e da América Latina e em breve poderá incluir também Japão e Coreia do Sul. Ao mesmo tempo, autoridades americanas e europeias dão os primeiros passos para um acordo de comércio e investimentos entre os dois lados do Atlântico Norte. Para Jeffrey Schott, do Peterson Institute for International Economics, o Brasil errou tanto na Rodada Doha, ao se aliar à Índia e à China, como na agenda bilateral, amarrada ao Mercosul. Os fatos, até agora, confirmam esse diagnóstico.

Dualismo cambial na Argentina e na Venezuela

E sua insustentabilidade. Uma analise de economista do Citi group.

Argentina and Venezuela– The Unstable Economics of Dual Exchange Rates
Joaquin A Cottani
Citi group Research
Emerging Markets Economics Today
12 March 2013


This piece is a summary of our Argentina & Venezuela Macro View - The (Unstable) Economics of Dual Exchange Rate Regimes

Argentina and Venezuela have de-facto dual exchange rate systems featuring an official peg and a black market float. The fact that the float is "black" rather than "white" or "grey" is a mere technicality. Effectively, the black market rate reflects the scarcity value of the dollar and the premium between this rate and the official one is an implicit tax on exports and a subsidy on permitted transactions, including authorized imports.

A dual exchange rate system is the consequence of quantitative exchange controls. These controls affect "non-essential" imports, including tourism abroad, and several categories of capital outflows, including offshore investments, profit remittances, and the simple hoarding of FX by local residents seeking to hedge against inflation or devaluation. Like any flexible exchange rate, the black market one is driven by market forces.

The Venezuelan dual exchange rate system predates the Argentinean one by more than a decade, a fact that bears testimony to the longevity that this kind of arrangements can have, despite the distortions they create, if the right conditions are met. We argue that Venezuela's larger current account surplus as proportion of GDP, tighter control of exports and imports by the government, and the introduction of SITME between 2010 and 2012 explain the longevity of its multiple exchange rate system despite the significant and growing premium observed though the years between the parallel/black market and the official one. We warn that, in Argentina, this is unlikely to be the case, hence a multiple exchange rate system, even if legal, is unsustainable.

In Argentina, the dual exchange rate system is a more recent phenomenon. It exists since October 31, 2011 when, to cope with an impending currency crisis, the government imposed tight controls on the buying and selling of foreign exchange by the public. A difference between the Argentine and Venezuelan dual systems is that, in Venezuela, the official rate is an adjustable peg whereas, in Argentina, it is a sliding or crawling peg. At present, the official USD rate is 5.05 ARS in Argentina and 6.3 VEF in Venezuela while the black market rate is around 8.0 and 25.0, respectively. It is worth noting that, in February, the rate of depreciation of the ARS in the official market reached 16% YoY against a "true" inflation rate (as measured by private consultants and opposition members of Congress) of around 25%.

Expectations of devaluation are part of the explanation of a high black market premium. The other part is massive injections of liquidity to finance fiscal deficits and monetize balance of payments surpluses. In this sense, reducing the black market premium while maintaining exchange controls will require a combination of both official devaluation and monetary and fiscal contraction in both countries.

Looking at what is happening with the foreign reserves in Argentina and Venezuela, it is easy to infer that their dual systems are unsustainable without a maxi-devaluation. Unless monetary contraction happens some time soon, which is unlikely due to the fiscal dependency of monetary policy in both cases, another maxi-devaluation in Venezuela and one in Argentina (the first since 2002) are almost sure bets.

Los Amigos de la Plata del Amigo que se Fue; oh, que tristeza, perder un amigo tan bueno (y tan rico...)

What’s left of the Latin left
By John Paul Rathbone
Financial Times, March 8, 2013 7:57 pm

As Chávez’s death focuses attention on the economic failings of radicals, pragmatists are proving more successful

Three weeks before Venezuelan President Hugo Chávez died on Tuesday, Yoani Sánchez, Cuba’s best-known pro-democracy blogger, landed in Brazil on a scheduled flight. Ms Sánchez had waited five years for permission to travel abroad and Brazil was an obvious first place to visit.

Latin America’s biggest economy shares a common heritage with Cuba, with their histories of slavery and sugar. Brazil is also governed by the leftwing Workers party, elected three times in a vibrant democracy – so unlike the Castro dictatorship at home.

Yet soon after the gangly 37-year- old writer arrived, she had an unwelcome reminder of the world she had left momentarily behind. At a São Paulo bookshop, about 200 young socialist activists burst into the room proclaiming her a CIA spy. One protester chanted: “Mercenary”. It was the same kind of invective that Chávez, Cuba’s closest ally, had levelled against Caracas’s middle class, which he condemned as los escuálidos or the “squalid ones”.

Ms Sánchez brushed it off. Yet many Brazilians were mortified. Ms Sánchez tweeted: “You know the phrase I’ve most heard in São Paulo? Yoani, please excuse these extremists. They don’t represent us.”

In some ways, though, they do. Ms Sánchez’s experience exposes a feature of Latin American politics that has been highlighted again this week by Chávez’s death. Both events show there are two strands of leftism in Latin America, the Brazilian kind and the Cuban/Venezuelan kind.

Both have very different origins – and prospects. Jorge Castañeda, a Mexican intellectual, identified their characteristics in a 2006 essay in Foreign Affairs. The first strand, a pragmatic left, today includes the governments in Brazil, Peru and Uruguay. They are “modern, open-minded, reformist and internationalist”.

The second strand, which includes Cuba, Venezuela, Ecuador, Bolivia and perhaps Argentina, “is born of the great tradition of Latin American populism, is nationalistic, strident and closed-minded”. While democratically elected, their autocratic style and length of tenure can also make their successions traumatic.

Chávez wanted to reign until 2030. Evo Morales, president of Bolivia since 2006, is running for a third term. Rafael Correa, into his second term, is Ecuador’s longest-serving president in more than 30 years.

Cristina Fernández, Argentine president, is in her second term, after one by her husband, and eyeing a third. The Castro brothers have ruled since 1959.

Chávez’s death raises questions about the future of this populist strand. That it is partly because his petrodollar diplomacy financed most of them, and partly because his tweak-the-nose attitude to enemies poisoned the region’s tone frequently during the past 14 years.

“Chávez was very amiguero, very approachable. He wasn’t white, which is important. And he set a new tone in the rhetorical scale. He said what the suits never dared to say,” says James Dunkerley at Queen Mary, University of London. “Whether that tone was useful or not is ambiguous.”

It was the “pink tide” which rose in Latin America after the Asian and Russian crises of 1997 that drew the world’s attention back to the continent. The region’s democratic transition in the 1980s first favoured centrist governments and the liberal economic policies of the “Washington consensus”.

But when Russia and the Asian economies crumpled, Latin America suffered a recession so deep it was called the lost half-decade. The region, since 1990 one of the world’s fastest-growing, began to look like a disaster. Poverty rose. The political pendulum swung to the left.

Chávez’s election in 1998, supported by the middle class, marked the first change. Ricardo Lagos followed in 2000 – as the first socialist president in Chile’s ruling coalition. Then came Brazil’s Luiz Inácio Lula da Silva in 2002. Bolivia, Paraguay and El Salvador followed. By 2009, 17 of Latin America’s 20 republics had left or centre-left governments, according to Victor Bulmer-Thomas, an economic historian.

Economically, the timing was brilliant. From 2003, the region began to ride a boom in commodity prices, which strengthened government finances and allowed large increases in social spending. But there were two distinct streams within the pink tide.

The pragmatic strand was composed of technocratic social democrats who prioritised social needs while maintaining economic stability. Its ideological origins lay in the Communist International, and followed a similar path to leftists elsewhere. After the fall of the Berlin Wall in 1989, it acknowledged its failures and reconstructed itself.

President Dilma Rousseff of Brazil, for example, grew up in guerrilla movements and studied Marxist texts. But she has also privatised airports to speed preparation of the infrastructure desperately needed for the 2014 World Cup and 2016 Olympic Games.

The second strand was rooted in Latin populism, placed Cuba’s Fidel Castro and Che Guevara in a pantheon of demigods, and were often poor or spendthrift, or both. “Venezuela just took the money and blew it,” says Eric Farnsworth, vice-president of the Council of the Americas and Americas Society.

Such spending was central to Chávez’s clientelist model. Closely advised by Havana and bolstered by high oil prices, he set his sights on a pan-American “Bolivarian revolution”.

He bought Argentine debt, gave aid to Bolivia and Nicaragua, and $6bn a year of cheap oil to Cuba in return for doctors, teachers and intelligence officials. At home, he funded social projects by draining PDVSA, the state oil company and nationalising private companies, sometimes on his television show, Aló Presidente, exclaiming: “Nationalise it!”

He was not alone. Ecuador defaulted on international bonds and gave refuge to Julian Assange, the WikiLeaks founder. Argentina nationalised YPF, the Spanish-controlled oil company. Evo Morales nationalised swaths of Bolivia’s energy sector including the local operations of Petrobras, the Brazilian oil company . The productivity of these nationalised businesses has since deteriorated.

. . .

This created a furore that echoed around the region. The noise it generated, though, was misleading because the economies of these maverick countries amount to just 17 per cent of Latin America’s US$6tn gross domestic product. It also obscured advances made by centrist democrats.

“People outside the region overestimate Chávez’s influence,” says Malcolm Deas, an Oxford-based historian of the Andes. “Mexico is not chavista, nor is Central America – Nicaragua apart. Nor are Chile, Peru or Colombia ever going to follow his example.”

Indeed Peru is a telling example of this. In 2006, Ollanta Humala, a former army officer, ran for president espousing Chávez’s approach – and lost. In 2011, he ran again while embracing the pragmatic Brazilian model – and won. The pendulum has swung again.

Today, about half of the region’s 20 republics are centrist or centre-right. Not that this has diminished the importance of social progress everywhere. Caracas rightly boasts that it has halved poverty levels in Venezuela. Yet this performance has been repeated elsewhere, in Chile and Peru for example, without ransacking the economy as Chávez did.

The Chavista model is a busted flush but no leader in the region will publicly admit it. Nonetheless, tributes have flowed in all week. Dignitaries and world leaders, from Iran’s President Mahmoud Ahmadi-Nejad to the Prince of Asturias, have flown to Caracas to pay their respects. In Havana, the Castro government declared three days of mourning.

Much of the radical left’s grief is real, but so too is the self-interest. Because Chávez’s demise confronts it with a bind. The populist left is dominated by outsize personalities. With its most extravagant character gone, others are jostling for supremacy. That is as true inside Venezuela, where chavismo is riddled with factions, as outside.

“The space and rhetoric won’t change,” says Franklin Ramírez, a sociologist at the Latin American Faculty of Social Sciences in Quito. But the “map has been changing”. The main contenders for influence are two economic blocs: Brazil and its partners in the southern Mercosur trade pact, and its regional counterweight, the free-trading Pacific economies of Mexico, Colombia, Peru and Chile.

The second and bigger problem is that the radical economic model is unsustainable. Even with the largest oil reserves in the world, Venezuela has turned to China for $40bn of loans to keep itself going.

Economic decay may not matter to true populists. After all, “as well as handouts, their beneficiaries gained hope, a feeling of being listened to”, says Mr Farnsworth. “You can’t put a dollar figure on that. It is a revolution of the mind.”

It is an open question how long that revolution of the mind will continue if Caracas or other radical governments in the region cannot deliver their promises. That will better showcase the success of the region’s pragmatic centrists. But it will also leave the populist left struggling to stand for anything other than empty pledges and stale rhetoric.

Additional reporting by Andres Schipani in Bogotá

Stanley Fischer, o melhor banqueiro central do mundo, fala sobre economia brasileira

Interessante entrevista recente de Stanley Fischer no Brasil, onde veio para o 70. aniversário de Pedro Malan. Tudo o que ele disse sobre o Brasil, de maneira muito elegante, seria o que o governo deveria estar fazendo, e não está, ou está fazendo o contrário, exatamente.
Vale conferir:

Stanley Fischer explica o sucesso do Banco Central de Israel

http://globotv.globo.com/globo-news/conta-corrente/t/todos-os-videos/v/stanley-fischer-explica-o-sucesso-do-banco-central-de-israel/2451167/

No mês passado, o Washington Post fez uma imensa reportagem sobre ele, que já tinha postado aqui:

http://www.washingtonpost.com/blogs/wonkblog/wp/2013/02/15/stan-fischer-saved-israels-economy-can-he-save-americas/

Meus agradecimentos ao André Rozenbaum pelos dois envios.
Paulo Roberto de Almeida

Chavismo platino, patagonico, porteno, argentino... - Ediitorial OESP

Era esperado:  agora todo mundo que tem DNA autoritário vai querer imitar o caudilho do Caribe. Nada como subordinar todos os poderes a si proprio. Isso ainda vai dar ideias aos companheiros.
Depois de "democratizar a mídia" -- não vão conseguir, mas não deixarão de tentar -- vão querer também "democratizar a Justiça", o que aliás já tentaram, e tentam sempre, colocando seus servos, seus bonequinhos amestrados no STF, mas nunca dá certo inteiramente. Em todo caso, não somos imunes a esse virus totalitário...
Paulo Roberto de Almeida

A Justiça de Cristina

11 de março de 2013 | 2h 09
Editorial O Estado de S.Paulo
 
No hiperpresidencialismo de Cristina Kirchner, Justiça democrática é a que lhe diz amém. Assim é que, não obstante o governo argentino já dispor de influência decisiva no Conselho da Magistratura, órgão que supervisiona o Judiciário do país e tem a prerrogativa de destituir juízes, a presidente agora quer garantir que seus magistrados de estimação não sejam importunados. Para isso, começou a defender o que chamou de "democratização da Justiça", um eufemismo nada sutil para designar o desmonte de um importante órgão de fiscalização, deixando impunes os abusos cometidos por juízes comprometidos com o governo.
Seguindo o figurino de democracia plebiscitária tão ao gosto do chavismo, no qual o voto popular é transformado em chancela das decisões arbitrárias do governo, Cristina abriu o ano legislativo num discurso de três horas e meia defendendo que os integrantes do Conselho da Magistratura passassem a ser escolhidos diretamente pelos eleitores. Atualmente, o organismo é composto por três juízes, dois advogados, um acadêmico, seis parlamentares apontados pelo Congresso e um representante do governo. Os magistrados, o acadêmico e os advogados são escolhidos em votação interna. "Nem juízes nem advogados têm coroa para serem eleitos entre si!", escreveu Cristina no Twitter, com sua conhecida verve autoritária. O menosprezo pelas instituições republicanas é assumido sem-cerimônia, como se as urnas bastassem para regular as relações entre os Poderes e destes com a sociedade. No caso da proposta de "democratizar a Justiça", há ainda a agravante de que o atual sistema de escolha dos integrantes do Conselho da Magistratura está inscrito na Constituição, mas a oposição acredita que a presidente encontrará um jeito de distorcer a letra da lei para atender às suas necessidades - e embutir uma reforma que lhe permita, ademais, concorrer a um novo mandato.
A confusão entre soberania popular e funcionamento do Estado não é involuntária. Ao contrário: Cristina não se esforça para fazer segredo de que quer subordinar o Judiciário ao Executivo, sob o argumento de que só quem foi eleito - isto é, ela mesma - tem legitimidade. Não é por outra razão que a presidente argentina agora fala em constituir uma "Justiça legítima", pois a que está aí não lhe serve.
Não são poucos os exemplos de intervenção do kirchnerismo no Judiciário. Um caso representativo ocorreu em 2009, quando o juiz Norberto Oyarbide, em decisão sumária, inocentou os Kirchners da acusação de enriquecimento ilícito, apesar do escandaloso crescimento do patrimônio do casal. Processado no Conselho da Magistratura sob acusação de favorecer o casal presidencial, Oyarbide acabou absolvido graças à mobilização da maioria governista no órgão. Outro magistrado que atuou abertamente em favor dos Kirchners e envolveu-se em seguidos escândalos de corrupção, Federico Faggionato Márquez, só foi destituído em 2010 pelo Conselho da Magistratura porque o bloco kirchnerista estava ausente.
A hegemonia de Cristina no conselho, no entanto, não lhe parece suficiente. Tampouco lhe parece suficiente que ela e o falecido marido, Néstor, tenham nomeado a maioria dos atuais juízes da Suprema Corte e influenciado a nomeação da maioria dos magistrados do país nos últimos dez anos. Ela se queixa de que o Judiciário tem sido permeável às "grandes corporações" que, segundo diz, estão interessadas em desestabilizar seu governo. Ademais, e esta é uma questão central aqui, os governistas consideram que a Suprema Corte não é independente porque impõe obstáculos à plena execução do projeto que visa a limitar a propriedade de meios de comunicação, numa referência à disputa do governo contra o Grupo Clarín.
Em nome de sua guerra contra a imprensa que não lhe é subserviente e sempre tendo em perspectiva sua ânsia de permanecer no poder por mais tempo do que a Constituição permite, Cristina tudo fará para intimidar o Judiciário. É assim que o kirchnerismo vê a Justiça na Argentina: ela só será considerada "independente" caso se ajoelhe diante de Cristina.

Um presidenciavel que gosta de imigrantes - Jeb Bush goes to bookshops

Jeb Bush, ex-governador da Flórida, era, sempre foi, continua sendo muito melhor do que o idiota do irmão que foi presidente deste grande país, desta democracia bizarra. Até a mãe dos próprios, confessou candidamente, um dia, que tinha ficado surpreendida com a eleição do outro, o idiota: "Mas logo ele", disse ela, "ele não era exatamente quem eu esperava que fosse chegar lá...", deixando entender que esperava que Jeb, ele sim, merecia o posto que foi para o idiota do irmão.
Pois é, a democracia americana é mesmo bizarra...
Pois bem, o Jeb constitui aquilo que aqui se chama "presidential stuff", material presidenciável, e isso com razão: rapaz (maneira de dizer) cordato, sensato, inteligente, aberto aos imigrantes e dotado de ideias claras...
Não se sabe se por isso será eleito: ser a favor de imigrantes, neste país, pode tirar votos da direita raivosa, dos WASPs fundamentalistas, mas ele tem coragem e acaba de publicar um livro.
Está aí a resenha que acaba de aparecer no Wall Street Journal, o jornal mais desavergonhadamente capitalista que possa existir na face da terra (e embaixo dela e dos mares, também).
Vou ler o livro em livrarias, ainda que ele não seja tão caro; mas não tenho mais onde enfiar livros e não é exatamente a minha especialização acadêmica; se trata de um livro de ocasião, pois tampouco aprofunda o assunto.
Vale conferir.
Paulo Roberto de Almeida 

Give Me Your Skilled Workers

A call for real immigration reform, starting with a guest-worker program pegged to market demand and fewer family-reunification visas.

It would be no exaggeration to say that the Republican Party has been in a state of panic since the defeat of Mitt Romney, not least because the election highlighted America's demographic shifts and, relatedly, the party's failure to appeal to Hispanics, Asians, single women and young voters. Hence the Republican leadership's new willingness to pursue immigration reform, even if it angers the conservative base.
Before Republicans jump at whatever reform Democrats may offer up, they should read Jeb Bush and Clint Bolick's "Immigration Wars," about as sensible a look at immigration policy as one will find these days. Mr. Bush, the former Florida governor, and Mr. Bolick, a conservative legal activist, understand what so many Republicans don't: that the "comprehensive" immigration plans being bandied about today are anything but comprehensive.
The authors liken immigration policy to a hydroelectric dam that is "decrepit and crudely cemented over" (not exactly an elegant analogy); instead of patching it, they say, we need to replace it. Simply put: America's immigration laws need an overhaul, not piecemeal reform. The authors argue that adding a few more visas for high-skilled workers and passing the Dream Act—a proposed bill that aims to give eventual citizenship to illegal immigrants who arrived in the U.S. before the age of 16—will only temporarily mend a broken system.
Current immigration policy was created in 1965 to rectify the flaws of an older, discriminatory quota arrangement. The 1965 law was poorly constructed and had many unintended consequences. Under the law, more than two-thirds of legal immigrants to the U.S. receive the right to legal permanent residence because they are related to immigrants already in the country. "The eight-hundred-pound gorilla in immigration policy," Messrs. Bush and Bolick write, is "family reunification." Only about 20% of yearly visas are reserved for skilled workers. The rest go to refugees, asylum seekers and winners of the so-called diversity lottery, which rewards visas to people from countries that don't send many immigrants to America. If you don't qualify under one of these categories, it is difficult to immigrate legally to America.

Immigration Wars

By Jeb Bush and Clint Bolick
(Threshold, 274 pages, $27)
Instead, Messrs. Bush and Bolick call for a serious tightening of family reunification, limiting it to spouses and the minor children of U.S. citizens. (The current law allows visas for adult children of immigrants as well as siblings, a policy that, over time, widens out the kinship field considerably.) Second, they call for dramatic increases in visas for high-skilled workers and entrepreneurs. Third, they argue for a guest-worker program for lower-skilled workers pegged to market demand: Such a program would allow for a steady but regulated stream of seasonal workers. Fourth, they want to replace the diversity lottery with a "system for regular immigration," which would allow easier entry for those who don't qualify for family reunification or work visas.
As for illegal immigration, Messrs. Bush and Bolick call for a pathway to legalization but not to citizenship. To reward those who entered the country illegally with citizenship would be a blow to the rule of law, they say, but bestowing permanent resident status will at least bring people out from the shadows. As it happens, about half of illegal immigrants don't covertly cross the Mexican border but overstay their visas and remain in the country illegally. The authors would like to see stepped-up enforcement—including a biometric verification system for visa holders—but argue that the best way to crack down on illegal immigration is to increase work visas and lessen the temptation to enter illegally.
As good as "Immigration Wars" is, it isn't without problems. Messrs. Bush and Bolick call for increases in work-based immigration and for easing the flow of regular immigrants, yet they are hazy about caps or yearly quotas. Even a pro-immigration policy needs to have limits. Millions of people apply unsuccessfully each year for visas, yet the authors provide few clues about which criteria they would use to grant visas to some and not to others. In fact, the Bush-Bolick plan would substantially increase the number of legal immigrants entering the country.
The book's final chapter, "Prescription for Republicans," calls for the GOP to work harder to reach out to Hispanics, Asians and other minorities. Yet it repeats the standard line about Hispanics being natural Republican voters, ignoring the fact that Hispanics seem increasingly attracted to the Democratic Party's message of bigger government. That more than half of Hispanic births are to unmarried mothers is a reminder that the GOP's electoral troubles can't be solved by simply recasting its immigration position. Hispanics will obviously be a tougher sell on Republican economic programs than Messrs. Bush and Bolick would like to admit.
That fact leads to the ultimate irony of "Immigration Wars": Even if all of its proposals miraculously become law, Hispanics may well dislike the law itself. Limiting family reunification for the sake of more highly skilled workers will favor other groups over Hispanics and rile the immigration-rights lobby, which increasingly sees immigration as a civil right. The policy changes that Messrs. Bush and Bolick propose would undoubtedly serve the nation's economic needs better than the current law, but it is unclear whether Republicans would ever reap a political reward. Still, "Immigration Wars" contains a message that needs to be heard by members of both political parties. Unless we have a real overhaul of American immigration law—not just a cosmetic one driven by political pressures—the immigration wars will continue, and Americans will be fighting them for decades to come.

Mr. Cannato, who teaches history at the University of Massachusetts, Boston, is the author of "American Passage: The History of Ellis Island."
 
A version of this article appeared March 12, 2013, on page A15 in the U.S. edition of The Wall Street Journal, with the headline: Give Me Your Skilled Workers.

Determinismo geografico: uma nova enfermidade infantil da diplomacia companheira?

O mais recente artigo publicado:


1088. A política externa das relações Sul-Sul: um novo determinismo geográfico?”, Revista Espaço da Sophia (vol. 6, n. 47, janeiro-junho 2013, p. 163-188; ISSN versão online: 1981-318X; link: http://www.espacodasophia.com.br/revista/). Relação de Originais n. 2425.


Sindrome de transtorno bipolar (quem poderia ser?) - Fabio Giambiagi

Isso: quem mais poderia ser senão aquele partido esquizofrênico, que sempre teve uma política econômica esquizofrênica -- justamente por não dispor de outro tipo de "economistas" se não keynesianos de botequim -- e só acertou quando -- roubando uma frase de um economista tucano -- "roubou o software alheio", no caso deles próprios, tucanos.
Os equizofrênicos detestavam Palocci e sua política econômica neoliberal, e ficaram até contentes quando ele caiu fora por sair com meninas, complotar com lobistas pornográficos e mentir para todos, inclusive querendo desmentir um simples caseiro, o heroi sacrificado dessa história toda.
Pois os esquizofrênicos chegaram ao poder, e apresentam essas maravilhas de resultados econômicos que vocês estão constatando pelos indicadores do IBGE e da FGV.
Como digo no título do post, se trata de síndrome de transtorno bipolar, ou seja, uma doença que não se sabe se é curável, ou apenas controlável, e que deixa o sujeito assim meio doidinho, fazendo uma coisa e o seu contrário.
Esse é o partido dos companheiros: sintomático, não é?
Tudo menos sistemático, ou sistêmico, ou somático, o que vocês preferrirem...
Em todo caso, este artigo do Fabio Giambiagi relembra certos fatos indesmentíveis, e nos chama a atenção para vários aspectos da síndrome, ou da esquizofrenia, whatever...
Paulo Roberto de Almeida

ECONOMIA
Contra ou a favor?Fábio Giambiagi
O Globo, 11/03/2013

Na década passada, um conhecido músico fazia propaganda de cerveja para uma das grandes marcas de bebida, embora ele consumisse a cerveja do concorrente. Naqueles anos, o Governo administrava a economia sob a batuta de Palocci e Meirelles, apesar do que o PT sempre dava um jeito de falar mal da política econômica. Por isso, nas minhas palestras eu costumava me referir com o nome daquele cantor à síndrome do partido, uma vez que, da mesma forma que o artista fazia propaganda de uma cerveja, mas não era a que preferia beber, o partido do Governo parecia “ter uma política econômica, mas gostar de outra”.

Agora, repete-se o “script”. Vamos avaliar a situação. O investimento caiu 4 % em 2012 e o Governo começa a dar sinais de querer induzir o investimento privado em áreas essenciais para o potencial de crescimento do país, como portos, aeroportos, rodovias etc. Vamos chamar as coisas pelo seu nome: trata-se de privatizações. Na Presidência da República, na Casa Civil, nos ministérios setoriais, nas instituições financiadoras oficiais etc., há centenas de técnicos tentando destravar as amarras que pendem o país à “bola de ferro” da paralisia decisória, inibindo a realização dos investimentos. Não é fácil.

No país das “coalizões bloqueadoras”, onde o “lobby” de A apoia o “lobby” de B e vice-versa — com letras para todo o alfabeto —, tudo é complicado no Congresso. E o que faz o partido do Governo? Age como quem “bebe uma cerveja, mas gosta da outra” e divulga um texto onde dá mostras de que continua nutrindo a sua antiga ojeriza pela venda de ativos estatais.

De fato, no seu recente documento “O decênio que mudou o Brasil”, está escrito: “Por meio de privatizações sem critérios e decência administrativa, cerca de meio milhão de trabalhadores foram demitidos, com a transferência de quantia equivalente a 15 % do PIB constituídos por ativos do Estado para a iniciativa privada nacional e, sobretudo, estrangeira. Em grande medida, os setores privatizados foram agraciados por elevadas taxas de lucro patrocinadas por tarifas entre as mais altas do mundo e, praticamente, sem a contrapartida de novos investimentos necessários à retomada do crescimento sustentado.”

Como é que é? O grande problema desse tipo de postura — e que tem impacto sobre a situação atual — é que tal visão expressa diversos equívocos. As afirmações transmitem a ideia de que a riqueza foi “transferida”, o que omite o fato de que, se alguém vende, recebe recursos em troca. Transposta para a lógica individual, equivale a dizer que a pessoa que vende um apartamento “transfere” o imóvel, como se estivesse fazendo uma doação. Transfere coisa nenhuma: vende!

O fato é que as privatizações liberaram muitas empresas dos controles estatais, evitando que essas empresas continuassem a sofrer os malefícios do apadrinhamento político (já pensou o leitor o que seria a Vale fatiada entre 7 partidos?) e viabilizando um “boom” de investimentos, como os que ocorreram na mineração e na telefonia. Além disso, noves fora o fato de que Vale, Embraer, Oi, as siderúrgicas, as petroquímicas e outras empresas leiloadas na década de 90 são de capital privado nacional, a pergunta que cabe fazer é: qual é o problema de o Banespa ter sido vendido ao Santander ou de parte da Telebrás ter sido vendida à Vivo?

Hoje, é preciso adotar uma nova onda de privatizações. Nesse contexto, afinal, o PT é a favor ou contra as privatizações? Qual é o verdadeiro PT? O da presidente Dilma, que pretende vender os aeroportos para quem entende do assunto, ou o do texto do partido, que dá a entender que vender para estrangeiros é ruim? O do país que tenta se preparar para o século XXI ou o do manifesto que fala mal das taxas de lucros elevadas? Como fazer leilão de concessões quando o partido do Governo é contra as privatizações e fala contra o capital estrangeiro e contra o lucro elevado?

Recentemente, o sempre verborrágico Ciro Gomes criticou vários partidos por, na opinião dele, não terem propostas para o país. O PT, nesse caso, em matéria de privatização, inova: ele defende duas coisas antagônicas, agindo simultaneamente como Governo e oposição. Não é de estranhar que os empresários fiquem confusos nesse cenário, na hora de tomar suas decisões de investimento.

Fabio Giambiagi é economista

segunda-feira, 11 de março de 2013

Workshop on European Union Research - FGV-Rio

2nd Workshop on European Union Research
FGV - Praia de Botafogo, 190, sala 1407, Rio de Janeiro - 10/05/2013 - 09:00 - 12:00
As part of the activities organized to celebrate the Europe Day (May 9th), the Center for International Relations at FGV will host the 2nd Graduate Workshop on European Union Research: European Studies in Brazil - New Agendas of an Evolving Field.
This event will be held on May 10th, at FGV, Rio de Janeiro. During the workshop selected Master’s and PhD students, working on subjects related to the European Union, will have the opportunity to present and discuss their ongoing work with internationally renowned scholars in the field. The workshop will follow the EU Commission funded “PhD School” model, in which students are required to submit a chapter or article in advance and briefly present it during the workshop proceedings. Experts then present their comments, feedback and advice for the future academic development of the participants. The workshop will offer participants the unique opportunity to exchange views and discuss doubts regarding their work with specialists from major universities of the EU and US.
Application: The workshop on European Union Research is open to students enrolled in Master’s or PhD programs in Politics, International Relations, Law, Social Sciences, History or Economics and based in Brazil.
Interested students should send an abstract (500 words) of their research and a CV by March 15th. Applications should be sent to ri@fgv.br. Approved students will have to submit their piece – in English - until April 15th. We have limited slots for this workshop.
The Center for International Relations will provide some financial support to cover part of the travel costs for students coming from outside Rio de Janeiro. The amount will depend on the number of participants.

Amigos pero no mucho: Brasil-Venezuela - Paulo Sotero (FT)

By Paulo Sotero of the Woodrow Wilson International Center
Brazilian president Dilma Rousseff declared three days of official mourning in honour of her late Venezuelan colleague Hugo Chávez Frias, who died on Tuesday in Caracas after a two-year public battle with cancer. “We recognize a great leader, an irreparable loss and above all a friend of Brazil, a friend of the Brazilian people,” she said before leading a minute of silence at a meeting with rural leaders in Brasília carried live on national television.
There was, however, an uncharacteristic twist in Rousseff’s expression of condolences. “On many occasions,” she noted, “the Brazilian government did not agree” with the policies of the Bolivarian leader. Insiders say this was not an extemporaneous remark, but a pre-planned statement calibrated for domestic and international consumption.
Rousseff also put some distance between her government and Venezuelan Bolivarians and their allies by returning to Brasília before the official funeral ceremony on Friday, attended by three dozen leaders, including Iran’s president, Mahmoud Ahmadinejad, and Cuba’s Raul Castro.
Rousseff’s predecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, who accompanied Rousseff to Chávez’s state funeral in Caracas, was similarly nuanced in an article on the Venezuelan leader in Wednesday’s New York Times.
Lula’s relationship with Chávez was not always as warm and friendly in private as their public abraços suggested. He felt betrayed and embarrassed in 2006 when Chávez masterminded with Fidel Castro and Evo Morales the nationalization of the Bolivian assets of Petrobras, Brazil’s state-controlled but publicly-traded oil and gas giant. In 2010, at a meeting of Unasur in Santiago, called in a hurry to defuse potentially explosive tensions between La Paz and states of the Bolivian Amazon governed by the opposition, Lula confronted Morales, in Chávez’s presence, with the choice of continuing on the Bolivarian path of confrontation that had led to the crisis, or negotiating with the governors, as Brazil and other neighbours advised him to do.
In his piece for the New York Times, Lula celebrated “Chávez’s boundless energy; his deep belief in the potential for the integration of the nations of Latin America; and his commitment to the social transformations needed to ameliorate the misery of his people.” Yet the former Brazilian leader, whose successful two terms in office offered a more moderate and effective path to development, social inclusion and regional integration than Chávez’s Bolivarian model, also called attention their differences.
“There is no denying that he was a controversial, often polarizing, figure, one who never fled from debate and for whom no topic was taboo,” Lula wrote. “I must admit I often felt that it would have been more prudent for Mr. Chávez not to have said all that he did. But this was a personal characteristic of his that should not, even from afar, discredit his qualities. One might also disagree with Mr. Chávez’s ideology, and a political style that his critics viewed as autocratic. He did not make easy political choices and he never wavered in his decisions.”
Most significantly, Lula downplayed the longevity of Chávez’s impact and called attention to the institutional void left by the passing of the self-absorbed Bolivarian leader. “Chávez’s legacy in the realm of ideas will need further work if they are to become a reality in the messy world of politics, where ideas are debated and contested,” Lula wrote. “A world without him will require other leaders to display the effort and force of will he did, so that his dreams will not be remembered only on paper.”
For the former Brazilian president, whose own legacy hinges on his successor’s efforts to revive a stalled economy and preserve the stability achieved by his predecessor, Fernando Henrique Cardoso, “Chávez’s sympathizers in Venezuela have much work ahead of them to construct and strengthen democratic institutions”. To maintain Chávez’s legacy, Lula wrote, “they will have to help make the political system more organic and transparent; to make political participation more accessible; to enhance dialogue with opposition parties; and to strengthen unions and civil society groups. Venezuelan unity, and the survival of Mr. Chávez’s hard-won achievements, will require this.”
Failure to do so would bring instability to Venezuela and its neighbors. This is an outcome Rousseff will want to work with Chávez’s successors to avoid. They were one target of the unusual reference to disagreements included in her statement of condolences.
One Chávez policy that Brazil vehemently disagreed with was a refusal by Caracas to come up with its 40 per cent share of investment in a major refinery Petrobrás and PDVSA, Venezuela’s oil company, agreed to build jointly in the Brazilian state of Pernambuco in the mid-2000s.
As minister of mines and energy and Lula’s chief of staff, Rousseff dealt repeatedly with the frustrations of the Abreu e Lima refinery, named after a Brazilian general from Pernambuco who fought beside Simón Bolivar in the wars of independence of Venezuela and Colombia. Estimated initially as an investment of $2.3bn, the supposedly bi-national refinery has become a headache for Brazil.
It will cost at least five times the initial estimated investment, with Petrobras bearing the cost alone to avoid further delays in the still incomplete project. According to media reports, PDVSA recently offered to pay its part in oil, which does not help the cash-strapped Petrobras. Brasília rejected the proposal, insisting it prefers to receive cash.
Another likely audience for Rousseff’s remarks is the Venezuelan opposition, which has developed a negative view of Brazil because of Lula’s expressions of public sympathy for the Bolivarian regime and Brasília’s silence about attacks on opponents and media outlets not aligned with Caracas. With more than $5bn in annual business by Brazilian companies at stake in a country facing the uncertainties of chavismo without Chávez, Rousseff is certainly interested in broadening Brazil’s connections with Venezuelan society.
According to press reports, in January, Rousseff reprimanded Marco Aurelio Garcia, her national security advisor and a Chávez sympathizer, for making public statements on how Venezuelans should interpret their own constitution regarding the succession process in Caracas.
She is also aware that most Brazilians do not share the affection held by militants of her Workers Party’s and others on the left for the late Venezuelan leader. During his long tenure in Caracas, Chávez remained rather unpopular in Brazil and was a constant source of concern for both the Cardoso and Lula governments. During the latter, Chávez was a subject of derision behind closed doors among officials close to Lula for his constant efforts to outshine the Brazilian superstar president, who enjoyed a benign international reputation.
In a telling statement on the value of pragmatism, on their way to Caracas this week Rousseff and Lula, both cancer survivors, lamented Chávez’s refusal of Brazil’s offer of treatment at the Syrian-Lebanese Hospital in São Paulo, where they were successfully treated. According to reporter Leonencio Nossa, from daily Estado de S.Paulo, Rousseff, Lula and influential members of the Workers Party believe that by opting to be treated in Cuba, “Chávez took an ideological and political decision” that may have shortened his life.
Paulo Sotero is director of the Brazil Institute at the Woodrow Wilson International Center for Scholars in Washington DC
Related reading:
What’s left of the Latin left? FT Analysis
After Chávez, will China still be financing chavismo? beyondbrics
Venezuela & Russia: ties that bind, beyondbrics

Cacete nao e' santo, mas costuma fazer milagres...

Autoridade é algo que se deve exercer, já que existe para isso mesmo. 
No Brasil, desde 2003, a autoridade deixou de ser exercida contra aqueles que desrespeitam a lei, destroem o patrimônio público, invadem propriedades privadas, danificam produção, enfim, agem criminosamente.
Volto a repetir: cacete não é santo, mas faz milagres.
Um bom cacete nos baderneiros e cadeia em seus líderes deveria diminuir o problema.
Paulo Roberto de Almeida 


Orlando Tambosi

Editorial do Estadão foi ao ponto, analisando as violentas ações dos bandoleiros do MST e assemelhados. Seus líderes já deveriam ter sido processados judicialmente há muito tempo (por onde andará o "comandante" João Pedro Stédile, o Pol Pot brasileiro?). Misturando Che, Fidel e Mao, esses movimentos tentam o impossível: fazer com que o Brasil regrida ao tempo da enxada. O Brasil de 2013 não é o Brasil de 1940.

Enfraquecido politicamente, pois não conta mais com a conivência e a tolerância ilimitadas do governo do PT, com um discurso ideológico cada vez mais vazio, mas mantendo algum grau de organização e, sobretudo, conservando seu aparentemente inesgotável vigor para praticar crimes, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) conseguiu realizar seu maior protesto contra o governo Dilma. Nos últimos dias, seus militantes, apoiados por organizações com características e objetivos assemelhados aos seus, invadiram fazendas, destruíram viveiros, sabotaram plantações, impediram o fluxo do tráfego em rodovias, depredaram patrimônio privado, invadiram prédios públicos, fizeram discursos, divulgaram documentos. Suas ações atingiram 22 Estados.

Tudo isso seria apenas mais uma repetição daquilo que o brasileiro responsável, cumpridor das obrigações e preocupado com seu futuro e do País cansou de ver no ambiente rural nos últimos anos se, desta vez, as manifestações desses grupos que agem cada vez mais à margem da lei não fossem particularmente patéticas. Além de agirem de maneira ilegal, sem que, na maior parte dos casos, sua ação fosse, como deveria ter sido, contida com energia pelas autoridades policiais - umas empurraram a competência para outras -, os organizadores fizeram discursos e distribuíram documentos que mostram seu afastamento cada vez maior da realidade.
Seu protesto, como ocorre há 15 anos, foi para lembrar o Dia Internacional da Mulher, e desta vez o alvo foi o agronegócio. Um dos principais atos do protesto foi a ocupação da Fazenda Aliança, no Tocantins, de propriedade da família da senadora Kátia Abreu (PSD-TO) - mulher e representante do agronegócio.
Cerca de 500 militantes ocuparam a propriedade, destruíram viveiros de mudas de eucalipto e mantiveram confinados trabalhadores e seguranças do local, que conseguiram evitar o conflito. "Eu, que sempre dormi sozinha na fazenda com meus filhos pequenos, sem nunca andar armada, agora não vou deixar meus filhos e meus funcionários correndo risco de vida", reagiu a senadora. "Imagine se resolvessem colocar fogo nas dezenas de máquinas que tenho lá."
Por cegueira ideológica, o MST e as demais organizações que o apoiam e os militantes desses movimentos não conseguiram até hoje entender a extraordinária transformação por que passou a atividade agrícola no País nos últimos anos. Ela alcançou níveis de eficiência e de competitividade que a colocam entre as mais desenvolvidas do mundo, o que permitiu ao País sobreviver sem grandes consequências aos efeitos das crises que conturbaram a economia mundial. Isso não afasta do meio rural os pequenos e médios produtores nem implica - como supõem o MST e seus militantes - o predomínio da monocultura. Há oportunidades para todos e espaço para as diversas culturas.
As desastrosas ações do MST no laboratório da Aracruz Celulose, em Barra do Ribeiro, no Rio Grande do Sul, em 2006, quando 2 mil mulheres destruíram anos de trabalho de pesquisa, revelaram uma das faces mais danosas para o País da violência dessas manifestações. Mas, por estreiteza política, o MST continua a recorrer à violência para, por meio dela, tentar defender suas bandeiras político-ideológicas, o que não consegue mais fazer com seu discurso. A cada ação desse tipo certamente corresponderá maior isolamento desses movimentos.
Parece que, felizmente, vai se transformando em mero registro histórico o gesto do ex-presidente Lula de colocar na cabeça o chapéu do MST, simbolizando seu apoio irrestrito à organização. A redução do número de assentamentos promovidos pelo Incra é consequência da mudança da política agrária no governo Dilma. Por entender que as distribuições de nada adiantam para o assentado e para o País se as terras não se transformarem em fonte de renda, o governo quer que os assentamentos sejam produtivos. Para isso vem dando apoio técnico e material aos assentados - e distribuindo cada vez menos terras.
A mudança pode ser fatal para o MST, cuja sobrevida depende justamente de aglutinar militantes com a promessa de distribuição de terra.

Argentina: desmantelando o Mercosul, alegremente...

Argentina rejeita livre mercado para veículos
Valor, 11/03/2013

O governo argentino decidiu rever o acordo automotivo com o Brasil para eliminar o dispositivo que prevê o livre comércio de carros, partes e peças a partir do segundo semestre. Além disso, quer obrigar as montadoras instaladas no Brasil a localizar parte de seu processo produtivo na Argentina. Esse é um dos pontos de atrito entre os dois países que seria tratado na reunião da semana passada entre as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner, cancelada com a morte do presidente Hugo Chávez.

A possível paralisação dos investimentos da Vale na Argentina é outro ponto de atrito entre os dois países, elevado pelo governo Kirchner a assunto de Estado. A Vale deve decidir hoje, em reunião do conselho de administração, se mantém o projeto que prevê investimentos de US$ 6 bilhões em uma mina de potássio na Argentina. A tendência da diretoria é paralisar o projeto. Os argentinos ameaçam retaliar desapropriando a mina, onde a empresa já investiu US$ 1 bilhão aproximadamente. Tanto no caso da Vale como na discussão do regime automotivo, chama atenção a falta de uma proposta clara do governo argentino.

Argentina: um país dividido (Ariel Palacios)

Trecho de entrevista de Ariel Palacios ao Congresso em Foco, sobre a divisão politica do país, que ele analisa em seu livro Os Argentinos (Editora Contexto):

Quando Palacios e sua família querem chamar amigos para jantarem, têm de colocar na mesma reunião ou só apoiadores do governo, ou só opositores do governo. Senão, é briga certa. “Agora a coisa piorou tanto que temos que fazer três reuniões, porque os neutros começaram a ser criticados pelos outros dois grupos”, revela o correspondente.

Aqui a entrevista que ele concedeu:

Ariel Palacios: “Argentina terá futuro de altos e baixos”

Correspondente brasileiro na Argentina desde 1995 afirma que a instabilidade político-econômica ainda é um fantasma. Leia a íntegra da entrevista concedida pelo jornalista nascido em Buenos Aires, mas criado no Brasil, ao Congresso em Foco
Argentina, por Ariel Palacios: um país “atravancado”
Congresso em Foco – Você diz que seu livro não tem clichês. O que as pessoas não vão encontrar no seu livro?
Ariel Palacios – Não vai encontrar estereótipo, de piada. Não é que seja livro sisudo. É bem humorado, mas tratando com muito respeito a Argentina e os argentinos, explicando todas as peculiaridades deste país, os fatos históricos, a vida cotidiana, a gastronomia, os costumes, o esporte, a relação com o Brasil, se há a rivalidade ou não com o Brasil, a economia, que é bastante esquizofrênica se comparada com a brasileira. A economia brasileira é um mar de rosas comparada com o que foi a argentina nos últimos 40 anos. Não vai encontrar uma frase do tipo “os argentinos são ‘dois pontos’”, aquela coisa de bater o martelo. O livro é uma tentativa de entender a Argentina, até porque os próprios argentinos dizem que não entendem, especialmente na área política e econômica. Se eles próprios não entendem, imagina um olhar de fora. Os clichês vendem mais, por ser a coisa mais fácil de compreender. Mas nunca gostei deles, e é isso que tento explicar no livro, como a rivalidade Brasil-Argentina.
Os clichês são verdadeiros ou falsos?
Falsos. Um deles é que acham que os argentinos odeiam o Brasil. Existe muito na cabeça dos mais velhos. É uma coisa que talvez acontecia há 80 anos, quando os dois países eram rivais militares, na Segunda Guerra Mundial, nos anos 50. Mas isso desapareceu. Os argentinos adoram o Brasil. Vêm passar a férias no Brasil, consomem quantidades colossais de música brasileira, desde música mais popular como Michel Teló, até música mais elaborada como Tom Zé ou João Gilberto. É um clichê que ainda existe, mas os fatos mostram o contrário.
Eles nos odeiam no futebol?
Eles detestavam antigamente, até que surgiu um novo inimigo, a Inglaterra. Por uma questão geopolítica, por causa [da guerra] das Malvinas, em 1982. Eles agora preferem derrotar a Inglaterra nos campos do que o Brasil.
Isso é uma decepção para o Galvão Bueno e mais da metade do Brasil.
Comentei isso com vários amigos. Houve um momento, na Copa do Japão e da Coreia do Sul, em 2002. A Argentina estava desclassificada e o Brasil enfrentava a Inglaterra [nas oitavas de final, quando a seleção brasileira ganhou por 2 a 1 de virada]. Os argentinos torciam contra a Inglaterra. Não é questão de solidariedade com sul-americano, é que eles queriam ver derrotada a Inglaterra. Isso importava muito mais. Quando eu comentava isso com os amigos no Brasil, notava que o pessoal ficava frustrado, algo equivalente ao amor não correspondido, o ódio não correspondido 100%. “Mas como? Se a gente quer derrotar os caras, por que os caras não querem derrotar a gente?”, me diziam. Bom, eles querem derrotar também, mas não é o principal objetivo. O foco está na Inglaterra. Bem… pode ser frustrante pra muitas pessoas, mas é a realidade. Fazer o quê? Não posso dourar a pílula. Eles querem derrotar o Brasil, mas o principal é a Inglaterra.
É uma coisa de gerações também. Acho que as novas gerações no Brasil enxergam a Argentina de forma diferente. Senão, não iriam de férias pra lá. Um milhão de brasileiros foi de férias pra Argentina no ano passado. No ano anterior, foram quase um milhão. Agora tem um fluxo interessante. Desde 1978, vêm um milhão, em média, de argentinos para o Brasil por ano. Os turistas brasileiros eram muito poucos. Nos anos 80, eram 80 mil, 50 mil por ano. Isso foi crescendo nos anos 90 devagarzinho, nos últimos dez anos cresceu muito mesmo. Quando você viaja, conhece e tem uma percepção diferente do país.
Os argentinos continuam vindo ao Brasil nessa proporção?
Sim, apesar do câmbio desfavorável. Uma coisa interessante é que, nesse últimos 40 anos, não é apenas a classe média alta que vem ao Brasil, mas também a classe média baixa. O motorista de ônibus, a manicure, o bancário foram de férias. Os caras vêm modestamente, de ônibus ou de carro, ficam nas praias mais baratas como Camboriú (SC). Quando você vem num ano, passa duas semanas, volta no ano seguinte, passa 20 anos indo de férias todo ano, óbvio que você conhece o Brasil. Nesses 40 anos de fluxo intenso, os argentinos levaram para a Argentina várias gírias brasileiras, que eles adaptaram lá, palavras que não eram da gíria portenha, mas que foram importadas. O consumo de música é enorme.
Qual gíria?
Uma gíria é “curtir”. E a outra é “transar”. Mas foram levadas pra lá com certas modificações. O “transar” não é o ato sexual em si, a cópula, o coito. O “transar” na Argentina é o amasso, as carícias, as preliminares. Se você está transando com alguém, você está saindo com alguém, mas como no preliminar, não é a transa como o Brasil. O “curtir” é o contrário. O “curtir” passou a ser: “Ele está transando com ela” no sentindo brasileiro. As palavras acabam sendo importadas e tendo pequenas nuances.  E há frases que são ditas lá, puramente em português, com sotaque portenho, mas ditas em português em tradução alguma, com o mesmo sentido do Brasil. Os argentinos acham que essas são expressões sonoras que representam muito o que querem dizer. Por exemplo: você chega na casa de alguém e a pessoa fala em português, mas com sotaque: “Adiante!”. Quer dizer: “Entra!”. Com alegria, assim como “bem-vindo”.
“Adiante” não existe no espanhol?
Não, não existe. É uma palavra estrangeira. É dito como se fosse “Adiantchi”, com “tchi”. A outra é uma expressão quando eles querem dizer que algo é o máximo. Eles falam em português, mas falam ‘errado’: “Ah, Militão, isso daí é o mais grande”. [“Más grande” em espanhol significa “maior”]. E eles falam meio rebolando, tentando imitar o jeito… como se a gente, quando falasse, rebolasse. Eu já expliquei pra eles que a gente não rebola quando fala. Então fica: “O mais grande do mundo”, como se fosse “grandgi”, com “dgi” no final. Está ‘errado’, é o ‘maior’, mas não adianta explicar. Eles continuam falando. A presidente Cristina Kirchner falou isso há uns três anos na frente do Lula, uma das últimas visitas dele à Argetina. Ela falou uma frase como “Eu admiro muito os brasileiros porque os brasileiros sempre pensam muito positivamente sobre o Brasil, porque o Brasil, ora, é ‘o mais grande do mundu’”. Ela falou assim: “du mundu”, com “u”. É uma expressão totalmente incorporada. Quando você quer dizer que alguém é o melhor jogador, o melhor diretor de cinema, quando algo é muito especial, você fala: “o mais grande” em português com sotaque. É uma expressão importada com erro gramatical incluído.
O ‘erro’ é uma adaptação argentina, não?
Exatamente, exatamente.
Por que a economia da Argentina é esquizofrênica?
Ela tem tido infelizmente um período muito longo de esquizofrenia. É um termo psicológico, não econômico, mas e aplica muito, porque ela tem tido altos e baixos, uma idas e vindas que qualquer coisa na política econômica brasileira vai parecer um mar de rosas perto daqui. É um país que, desde 1975, teve sete graves crises econômicas. Graves crises, não estou falando de médias ou pequenas. Teve estatizações, privatizações, reestatizações ou expropriações. Teve hiper-inflações pesadas. A hiper-inflação da época do [José] Sarney [1985-1989] é nada perto daquilo. A inflação do Sarney não chegou a 1.000% ao ano.
A do Sarney? E a inflação do Collor?
Isso. Também a do Collor. Se você fala pra um argentino que já sofreu com inflação, ele vai olhar: “Vocês? Hiper-inflação?”. Na época do [Raúl] Alfonsín [1983-1989], chegou a mais de 5 mil por cento por ano. Isso, sim, é hiper-inflação. Depois, o [Carlos] Menem [1989-1999] teve uma inflação de 3 mil por cento e outra de 1.300 por cento ao ano. Houve confiscos bancários, falências de bancos… Então, as pessoas, nessa esquizofrenia, buscam refúgio no dólar, por exemplo. Há 40 anos, elas buscam refúgio no dólar [Ainda existem empresas na Argentina que só aceitam pagamentos em dólar, como alguns hotéis].
Existiu um período em que as pessoas usavam várias moedas.
Isso aí foi na época da crise [2001-2003], quando as províncias estavam falidas e não tinham dinheiro, tiveram que recorrer a uma medida desesperada de emitir bônus provinciais. Eram como títulos da dívida, mas foram mais além e começaram a ser usados como notas, como se fosse dinheiro. É o que chamam de moedas paralelas. Isso durou uns dois ou três anos. Mais ou menos metade das [23] províncias argentinas tiveram que recorrer a isso, de emitir bônus, inclusive sem lastro algum.
Nem todos os “estados” tinham como pagar esses títulos?
Não. Depois, foram pagando lentamente. A crise pegou o final do Fernando De La Rúa e terminou no Eduardo Duhalde. Essas moedas foram eliminadas já no começo do governo do Nestor Kirchner, gradualmente.  Na crise, em três anos, de De La Rúa a Dualde, houve cinco presidentes. É como aconteceu em Brasília, quando o governador José Roberto Arruda (ex-DEM) foi preso e cassado em 2009. Era um escândalo de corrupção… Claro, aí você não afeta o resto do país. E essa foi uma crise política. A troca de governadores não afetou a economia do estado, né? Na Argentina, a economia está muito vinculada à política. Qualquer solavanco da política altera as coisas.
Você falou que, no futebol, o rival maior é a Inglaterra por causa das Malvinas. O argentino é mais politizado que o brasileiro?
De forma geral, sim. Houve um período de altíssima politização, dos anos 40 até os 80. A ditadura atingiu muito isso, mas era um período de altíssima politização. Houve um desinteresse crescente pela política nos anos 90 e na crise de 2001, 2002. E esse interesse voltou a crescer – não é que havia sumido, foi menor o interesse, mas sempre maior que no Brasil. Mas a discussão política é muito forte. É politizado? Sim, é. Mas está altissimamente polarizado, ultra-polarizado. Sumiu praticamente do dicionário político argentino o diálogo. As pessoas têm posições políticas, mas elas não dialogam de jeito nenhum. Há uma situação muito tensa na sociedade. As pessoas discutem e não topam ouvir o outro. Isso é uma coisa que ficou muito intensa nos últimos anos. Muito intensa a ponto de não se poder mais reunir amigos de diferentes ideias, porque senão dá briga, de as reuniões familiares terminarem em discussão brava ou, pior ainda, de as pessoas não falarem em política pra evitar problema. Você já sabe que vai dar problema, você omite o assunto. Aí você tem que começar buscar assunto totalmente diferente pra não criar problemas. É impressionante.
Então, é comum terem brigas em família por causa de política?
Sim. Aconteceu nos anos 40 e 50 e voltou agora com muita força mesmo. Nós mesmos antes reuníamos todos os amigos. E, depois, há uns três anos, começamos a fazer duas reuniões diferentes. Os governistas de um lado e o antigovernistas por outro. Meu aniversário e o da Miriam [esposa de Palacios] são muito próximas. Às vezes fazíamos uma reunião grande com os amigos para comer algo em casa, uma pizza, umas empanadas e tal. Reuníamos dez, doze pessoas, que tinham posições ideológicas totalmente diferentes. Agora não dá mais pra fazer isso. Agora, num sábado você chama os kirchneristas e no domingo, os anti-kirchnerista. E os neutros a gente distribuía nos dois grupos. Só que agora a coisa piorou tanto que a gente tem que fazer três reuniões. Os neutros começaram a ser criticados pelos outros dois grupos. “Como é que você não tem uma posição? Você fica neutro? Traidor da pátria!” e aquelas coisas todas. Aí a gente teve que salvar os neutros e botar eles no terceiro dia. Isso porque a gente é muito diplomático.
Com esses solavancos na economia, essa polarização radical da política, qual é o futuro da Argentina em paralelo com o Brasil? O Brasil é um país em que, diz-se, está melhorando suas condições de vida aos poucos. E a Argentina?
O Brasil sempre foi pra frente. Aquela coisa de dar um passo gradual, mas ir avançando. E feito basicamente tudo no consenso. Essa é uma marca da política brasileira. Conseguir consenso é difícil, mas, quando se consegue, estabelece-se alvo e avança. Escuta, faz consenso, avança outro passo. Na Argentina, não. A Argentina é sempre a política do antagonismo. Você dá dois passos pra frente, volta três, avança dois, volta quatro, dá um pulo de dez, volta cinco. É um mistério o que pode ser a Argentina. Tem uma excelente base de educação, que não é como era há 20 anos, porque degradou muito. Você tem um fluxo de profissionais que foram embora do país e nunca mais voltaram. E de novo você tem um fluxo de pessoas que foram embora da Argentina, procurando melhores lugares no exterior. E, quando falo isso, não é o operário, é o profissional técnico. Não dá para saber. Não é um país que tem futuro bastante garantido como é o caso o Brasil. Acho que a Argentina terá um futuro de idas e vindas, de altos e baixos. Até porque tem a questão do diálogo da classe política. Nem o governo nem a oposição são civilizados a ponto de poderem dialogar. Nos dois lados, há uma falta total de vontade de diálogo. Então, não tem como, né? Os próprios governantes tomam medidas contraditórias. O governo diz: “Vamos restringir a compra de dólares por parte da população”. Daí, a própria presidente, a Cristina, tinha 3 milhões de dólares em aplicações financeiras nos bancos, em dólares. Uma pessoa faz uma cruzada anti-dólar e você diz: “Peraí, como pode ser?”. Quando o negócio ficou meio escandaloso, ela decidiu pesificar esses investimentos, passar dos dólares para os pesos. É um país que, de tão acostumado com as crises, investe pouco. O brasileiro é mais arrojado, é mais confiante no futuro, tem menos medo, às vezes meio ingênuo nesse aspecto, pois se arrisca demais. O argentino não se arrisca tanto porque tem medo de alguma crise, algum erro. Outro caso de economia pessoal. A presidente Cristina – além de [ter tido] investimentos em dólares – fala muito em investimento produtivo, na aposta pela indústria, mais até do que na agricultura. A presidente Cristina tem 17, 19 milhões de dólares, uma fortuna, a segunda presidente mais rica da América Latina, depois do [Sebastián] Piñera [presidente do Chile]. Mas o Piñera é bilionário, aí é outra história. Mas, no segundo lugar, não muito mais embaixo está a Cristina. Quais são os investimentos da Cristina? Você nota bem como pensa um político olhando quais os investimentos que ele tem. Imóveis! Ou seja, um investimento assegurado, sem risco algum, que não tem produtividade nenhuma. Imóveis! Compra de casas e apartamentos, e o aluguel dessas casas e apartamentos. Isso é o investimento da Cristina. E tem dois hotéis – serviços. Nada. Nem uma coisa, uma fábrica de autopeças, nada em qualquer de investigação científica. Nada! Então, você nota que, se a presidente pensa assim… E, se ela tinha dólares até pouco tempo atrás, é porque não confiava no peso. A população não confia na economia e a classe política tampouco confia. Uma coisa é o discurso e outra é a realidade que você vê.
O futuro da Argentina é obscuro?
Não diria que é obscuro. Há um grau alto de incertezas, pela classe política que tem na oposição e no governo. Até porque a Argentina tem uma grande sorte, ter vizinhos que são prósperos. A sorte da Argentina é ter vizinhos prósperos. Se você tem um vizinho que está bem, acaba pegando uma carona nessa onda boa. Brasil, Uruguai, Chile… O próprio Paraguai cresceu muitíssimo nos últimos anos, coincidentemente durante o governo [Fernando] Lugo, tudo bem que basicamente graças à soja. Mas o Paraguai melhorou muito do que era há uns seis, sete, oito anos. Há uma certa prosperidade na região – ou uma grande prosperidade se comparando com a Europa – e a Argentina tem essa vantagem, estar numa vizinhança que está indo bem. Se a vizinhança está indo bem, você pega uma carona nisso. Se for pelos vizinhos, acho que a Argentina está em boa companhia.
Mas, de todo modo, é como você diz: há um grau alto de incerteza.
Há um grau alto de incertezas por causa da classe política, de todo os partidos, que não apostam sério no país e isso fica claro pelos próprios investimentos pessoais desses políticos. O dia que aparecer um político que me diga “Eu tenho um investimento aqui porque tenho uma fabriqueta de autopeças” ou “Eu produzo seringas descartáveis” e o cara não tenha só aplicações financeiras em imóveis, aí eu vou dizer: “Esse aí é um cara sério, que está se arriscando e apostando”. Mas quando os caras vivem de renda, nem os próprios políticos apostam.
Você vê um bom futuro para a Argentina?
Não, eu vejo um futuro incerto. Não sei se é bom ou ruim. No momento, vejo que o país está atravancado. A curto prazo não vejo nada bom. Não vejo nada catastrófico, tampouco vejo alguma crise. Algumas pessoas me dizem: “A Argentina está indo de novo para o caminho de 2001, quando colapsou”. Não, longe disso. A situação é totalmente diferente, até porque as reservas do Banco Central não são minúsculas como naquela época. Todo cenário é diferente. Para ter uma crise como aquela, não seria algo imediato. Precisaria muito mais tempo de mancadas. Mas, a curto ou médio prazo, seria impossível uma crise como aquela. Mas não um futuro complicado ou catastrófico pela frente. Isso não tem. Também não é nenhum futuro excelente que vejo. É uma incógnita, não é ruim, nem catastrófico, nem excelente. Tá ali no meio, mas não sei em que grau ali no meio está.
Qual o PIB Argentino em 2012? Foi 0,9% também?
Segundo o governo, 3% e pouco. Mas os economistas dizem que é menos, 1% por aí. Não lembro o número exato.
O Juan Perón morreu, mas o peronismo não. Vai haver chavismo depois da morte de Hugo Chávez na Venezuela?
Eu acho que sim. Continua. Há várias nuances. A sociedade argentina não é como a venezuelana. É muito diferente. A proporção de classe média quando o Perón estava vivo não se compara com a Venezuela chavista. Segundo, o Perón vivo ficou mais tempo no comando do peronismo – não necessariamente no poder, mas no comando do peronismo, quando estava no exílio – mais tempo que o Chávez. O Perón chegou ao poder em 1945 e morreu em 1974, quase 30 anos. E o Chávez são 14 anos mais um ou dois anos antes como oposição. O Perón ficou mais tempo no comando do peronismo que o Chávez no chavismo. São duas sociedades muito diferentes. A economia venezuelana depende altissimamente do petróleo. A Argentina não era nada disso. Há muitos pontos similares, mas não totalmente intransferíveis. Sem a figura do líder, quem vai assumir o comando? Se bem que ele deixou um herdeiro [Nicolás Maduro, vice-presidente da Venezuela]. U herdeiro que é mais moderado que o Chávez, aliás o Chávez estava mais moderado nos últimos anos. Tem que ver como ficam as brigas internas dentro do chavismo. Ou se vai acontecer algo semelhante ao peronismo. O próprio Perón era muito ambíguo. Fazia coisas que eram mais pra esquerda e coisas que eram muito pra direita. Tem que ser os chavistas vão se dividir em radicais e moderados. Acho que vai aparecer uma multiplicidade de chavismos. Vai depender se vão conseguir manter a coesão durante muito tempo ou se vão depois de subdividir e fazer partidos diferentes, cada um sempre dizendo que está representando a vontade do líder defunto. Esse é um clássico na Argentina com o peronismo. O peronista de esquerda e o peronista de direita dizem que ele é quem está seguindo o que o Perón havia mandado. Tudo mundo usa a imagem dele dizendo que ele tinha dito que fazer tal coisa, interpretando do jeito que quer. O Perón é um cara que criou um monte de estatais, mas o Menem dizia que ele, nos últimos anos de vida já falava em privatizações. O que é verdade, não é mentira. O fato que cada um usa o morto do jeito que quer. O morto não está aí para dizer o que acha, até porque talvez, quando o morto estava vivo, não deixava muito claras as coisas. O Chávez criticava os Estados Unidos, mas continuava vendendo petróleo para eles. O Chávez fazia pose de progressista, mas era homofóbico e contra o aborto. Ao contrário do Uruguai, um país de vanguarda mesmo.

O brasileiro come melhor ou pior que o argentino?
Você tem uma carne com melhor qualidade na Argentina e uma gastronomia italiana muito forte, porque o volume de italianos é bestial na proporção do país. Isso não acontece em outro país do mundo, porque mais de 50% da população tem um ancestral italiano. No Brasil em geral, isso não acontece. Vice pode encontrar em São Paulo, mas você não tem uma proporção enorme de italianos no Acre ou na Paraíba ou em Minas. Na Argentina, o peso italiano é descomunal. Você tem uma pasta muito bem elaborada. Mas, ao mesmo tempo, tem uma pouca variedade gastronômica. No Brasil existe mais variedade, mais opções. A gastronomia argentina tem menores opções. São boas, mas muito menores. Menos frutas, menos pratos com verduras, pouquíssimo peixe, apesar da costa, quase nada de peixe. É uma gastronomia muito gostosa, mas bem menos variada.
Carnes e massas.
É o cotidiano. Tem pratos elaborados como o locro, o equivalente mais ou menos à feijoada. Mas o locro as pessoas comem uma vez por ano, em ocasiões especiais. Mas quantas pessoas comem feijoada todo dia? Não conheço ninguém.
A cultura argentina é bem mais que tango e Jorge Luís Borges, né? Mas o tango ainda é vivo?
Sim, eu comento no livro que o tango representa 25% do consumo cultural. Não é tão presente como antes, quando era ouvido pela maioria da população, mas ele tem 25% do mercado. O mercado se diversificou, o que é bom. Você tem um grande grupo que ouve rock argentino e um que ouve música folclórica argentina, como Mercedes Sosa [1935-2009] ou sucessores dela. Tem uma diversificação grande, mas os próprios argentinos dizem que o tango é a música que os representa no exterior.

Vinte e cinco por cento não é pouco.
Não é pouco, mas não é mais da metade.
É como se você no Brasil forró, sertanejo, samba e pagode?
Seria. É o símbolo do país no exterior.
E na literatura, o que há além do Borges (1899-1986)?
Há grandes escritores, como Adolfo Bioy Casares [1914-1999], o Ernesto Sábato [1911-2011], Júlio Cortázar – no ano que vem é o centenário de nascimento dele. Há poucas semanas se completaram os 50 anos de “O jogo da amarelinha”, o livro do Cortázar. Não tem grandes figuras nos últimos anos, algumas estão aparecendo, mas ninguém muito consolidado por enquanto na literatura. Ir mais além daquele patamar de Borges, Casares e Cortázar é muito difícil. Não é bolinho pra um escritor fincar o pé nesse território, mas existem escritores muito legais que estão aparecendo, caras jovens, de 30 e poucos anos.
Quem são?
Uma delas é genial. Foi traduzida no Brasil no finalzinho do ano passado, a Samanta Schweblin [autora de “Pássaros na boca”]. Escreve contos, que era o forte do Borges. Mora em Buenos Aires, mas agora está fazendo uma bolsa em Berlim este ano.
Veja ainda:
Argentina, por Ariel Palacios: um país “atravancado”