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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 11 de setembro de 2021

Convite para número especial da Revista Locus: história recente da politica externa na AL

 Um convite que se destina a todos os interessados nesse campo relevante dos temas das relações exteriores e política internacional dos países da América Latina:

Caro Paulo:

Espero que se encontre muito bem.

Eu sou Diego Crescentino, professor da Universidade Autônoma de Madrid, e pesquisador do LABMUNDO, do IESP-UERJ. Eu tive a sorte de entrevistar você no Itamaraty há já dois anos. É um verdadeiro prazer para mim, escrever para convidar-lhe para publicar na chamada nº 28 (1) da LOCUS: Revista de História (2594-8296).

O objetivo principal desta edição é contribuir para a discussão sobre a história recente da política externa da América Latina, publicando pesquisas que busquem aprofundar na reflexão sobre os processos de democratização e elitização da política externa. Portanto, serão priorizados textos que abordam a história da política externa da América Latina, a partir de leituras histórico teórico críticas para uma discussão com foco regional ou transnacional, e que analisam, discutem e aprofundam sobre as narrativas em torno da política externa da América Latina; a instrumentalização do discurso da política externa em favor das elites; os fenômenos, interesses e consequências da diplomacia pública; os diferentes aportes teóricos na compreensão da política externa como como política pública; o papel da sociedade civil e as forças transnacionais na política externa; a relação entre política externa e modelos de desenvolvimento; as redes de crime organizado e política externa; e a influencia de outros atores e espaços alternativos na articulação da política externa. Para mais informações sobre a chamada de contribuições, você pode acessar o seguinte link: https://periodicos.ufjf.br/index.php/locus/announcement/view/456

O prazo para submissão de artigos é a data 31 de outubro de 2021, o que vai permitir que os artigos passem pelo processo editorial de revisão pares e edição. Por outro lado, o número será publicado ao longo do mês de maio de 2022. 

Teremos o maior prazer em receber uma contribuição sua. Agradeceríamos, também, se pudesse divulgar esta chamada a todos aqueles que, na sua opinião, possam ter interesse nela.

Gostaria de desejar-lhe o melhor nestes tempos de persistentes desafios e espero que o convite seja do seu interesse.

Cordialmente,

-- 
Diego S. Crescentino 
Docente - Investigador 
Editor-in-Chief de Relaciones Internacionales (1699-3950

Departamento de Historia Contemporánea 
Facultad de Filosofía y Letras 
Universidad Autónoma de Madrid 
Ciudad Universitaria de Cantoblanco · 28049 Madrid 

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Dossiê: História recente da política externa da América Latina: uma questão de elites? Vol 28, n. 1 (2022)

2021-01-22

O estudo da história recente das relações internacionais latino-americanas é essencial para explicar uma etapa histórica em que a integração regional e global se acelera - apesar dos sintomas atuais de um colapso da tendência regionalista em alguns estados da região. A importância desses estudos reside, portanto, na análise da multiplicidade de consequências que esses processos acarretam, tanto para os fenômenos nacionais internos quanto para as mudanças que ocorrem no cenário regional e global.

Nesse contexto, é imperativo olhar para os processos e dinâmicas históricas que, nas últimas décadas, cimentaram o cenário que moldou as principais características das relações externas latino-americanas. A sua característica principal corresponde a um sistema de gestão de poder político-econômico controlado e dirigido pelas elites nacionais, com sigilo significativo e uso do sistema para fins próprios. Essa situação resultou em uma patrimonialização - por essas elites - de espaços de decisão longe das realidades nacionais. Diante dessa situação, o papel da sociedade civil foi marginalizado, invisibilizado ou esquecido, tanto pelo controle efetivo do fenômeno por essas elites quanto por uma narrativa excessivamente propensa a conceber e representar a construção da política externa e da integração regional como um processo hierárquico, ou seja, de cima para baixo.

O debate ontológico em torno da política externa levou a várias leituras do conceito. Essas interpretações variaram desde um entendimento de que a política estatal está separada da política doméstica e que resulta de pouco interesse para os cidadãos, até a sua plena incorporação ao debate epistemológico em torno às políticas públicas, entendidas como resultado da negociação entre múltiplos atores e do enfrentamento de diversos interesses que intervêm na sua definição.

As possibilidades de abertura de espaços de participação para diferentes atores da sociedade civil levaram a um novo panorama. Os processos de transição democrática em vários países, os esforços contínuos para modernizar as instituições responsáveis pelo planejamento e execução da política externa, bem como o aumento da presença de discursos sobre a necessidade de prestação de contas e a incorporação de setores sociais marginalizados nas organizações e instituições políticas despertam um interesse renovado no que significa a política externa.

O objetivo principal desta edição da Revista LOCUS é contribuir para a discussão sobre a história recente da política externa da América Latina, publicando pesquisas que busquem aprofundar na reflexão sobre os processos de democratização e elitização da política externa. Portanto, serão priorizados textos que abordam a história da política externa da América Latina, a partir de leituras histórico-teórico críticas para uma discussão com foco regional ou transnacional -que excede a estrutura nacional-, e que analisam, discutem e aprofundam as seguintes dimensões, categorias e conceitos:

-           Processos de democratização e elitização da política externa

-           Narrativas em torno da política externa da América Latina

-           Instrumentalização do discurso da política externa em favor das elites

-           Influências extra regionais na política externa

-           Fenômenos, interesses e consequências da diplomacia pública

-           Multilateralismo e regionalismo na articulação da política externa

-           Teorias da política externa: política externa como política pública

-           Política externa comparada na América Latina

-           Influências ideológicas na definição de política externa

-           Sociedade civil e forças transnacionais na política externa

-           A relação entre política externa e modelos de desenvolvimento

-           Redes de crime organizado e política externa

-           Outros atores e espaços alternativos de articulação da política externa


José Jobim: o embaixador que sabia demais - André Bernardo

 José Jobim escrevendo

Quem é o embaixador José Jobim, assassinado na ditadura militar e homenageado por alunos do Instituto Rio Branco?

Era para ser uma formatura como outra qualquer. Dessas que o Instituto Rio Branco, criado em comemoração ao centenário de nascimento do Barão do Rio Branco (1845-1912), o patrono da diplomacia brasileira, organiza desde 1945. Mas, a escolha do embaixador José Pinheiro Jobim (1909-1979)– sequestrado, torturado e morto pela ditadura – como patrono da mais nova turma de alunos do Curso de Formação de Diplomatas reverteu as expectativas. O presidente da República, Jair Bolsonaro, não compareceu à cerimônia. Em vez disso, mandou um discurso gravado aos 20 novos diplomatas. Mais: a imprensa sequer foi credenciada para cobrir a formatura. “Fiquei feliz de ver que, no Itamaraty, há uma juventude que resiste”, afirma a jornalista e advogada Lygia Maria Jobim, de 71 anos. “Essa homenagem é a negação do negacionismo e da barbárie. Gestos como esse são fundamentais para que consigamos continuar a respirar enquanto atravessamos este mar de lama”. 

Em seu discurso, o chanceler Carlos França declarou que Jobim é “referência de diplomata e de dedicação ao Brasil”. Jobim também foi citado no discurso da embaixadora Maria Celina de Azevedo Rodrigues, a paraninfa da turma. “Espero que, como o patrono que escolheram, o embaixador José Jobim, se mantenham sempre fiéis aos seus princípios e valores”, declarou ela. “Não podemos nos deixar sufocar pela estupidez que este governo representa”, prossegue Lygia. “Temos que, sem violência, mas, com firmeza, colocá-los de volta no esgoto de onde saíram. São gestos como o desta turma que nos dão a certeza de que conseguiremos. Ainda há vida neste país”. 

Segundo a assessoria de imprensa do Ministério das Relações Exteriores (MRE), o Presidente da República não compareceu à cerimônia porque, no dia do evento, cumpria agenda fora de Brasília, mas enviou, por vídeo, a tradicional mensagem dirigida aos formandos. Ainda segundo o órgão, a escolha do embaixador José Jobim como homenageado da turma decorreu de deliberação dos formandos. “O Itamaraty não participa da decisão e, em respeito à vontade expressa pelos alunos, acolhe integralmente a eleição, sem emitir avaliação sobre o homenageado”, informou o ministério.  

Cerimônia de nomeação do Itamaraty com 23 participantes

Queima de arquivo

No dia 22 de março de 1979, pouco depois do almoço, José Jobim saiu de casa no Cosme Velho, Zona Sul do Rio, para visitar um amigo, o jornalista cearense Marcial Dias Pequeno (1908-1991), chefe de gabinete do governador Chagas Freitas (1914-1991), e não voltou mais. Segundo jornais da época, dois homens armados interceptaram seu carro a poucos metros de sua residência, na Rua Tobias do Amaral, sequestrado o embaixador e abandonado o veículo, um Corcel placa RM6072, numa ribanceira de Santa Teresa. “Meu marido não tem inimigos e está afastado da política. Não somos milionários, nem ostentamos riqueza. Por que, então, essa desgraça?”, indagou sua esposa, a embaixatriz Lygia Collor Jobim, ao jornal O Globo, de 24 de março de 1979. 

Na manhã do dia 23, segundo testemunhas, o embaixador foi até uma agência bancária na Barra da Tijuca, pediu uma folha de papel ao gerente, bateu um bilhete à máquina e saiu. Em seguida, dirigiu-se a uma farmácia, a poucos metros do banco, e entregou o bilhete à proprietária. Pediu a ela que, por gentileza, telefonasse para os números 205-1288 ou 226-9394 e falasse com Lygia (sua mulher), Lygia Maria (sua filha) ou Ênio (seu genro). Mais informações não poderia dar porque estava sendo vigiado. “Estou muito cansado, mas, até agora, nada me aconteceu de irreparável”, dizia o bilhete. Os supostos sequestradores não fizeram exigências ou pediram resgate. 

No dia 24 de março de 1979, por volta das sete da manhã, o corpo do embaixador foi encontrado morto por um gari na Barra da Tijuca. Estava pendurado numa árvore pelo pescoço, amarrado a um galho de árvore por uma corda de nylon. O local ficava a cerca de dois quilômetros da farmácia onde estivera no dia anterior. “Eu estava no terceiro mês de gravidez”, recorda Lygia Maria, então com 28 anos. “A primeira coisa que veio à mente é que tinha que cuidar da vida que carregava em mim e que era o/a neto/a dele. Fiquei em estado de choque, mas a informação de que ele havia aparecido numa árvore, com os joelhos dobrados e os pés no chão, me tirou da paralisia e me fez perceber, de imediato, que aquilo era uma farsa”. 

Segundo o médico legista Roberto Blanco dos Santos, do Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto, que realizou a necrópsia, o diplomata já estava morto, há pelo menos uma hora, quando foi pendurado na árvore. Descartada a hipótese de suicídio por enforcamento, a polícia investigava os crimes de latrocínio e envenenamento. “Horas depois, soube por meu marido, o editor Ênio Silveira (1925-1996), e Frei Betto, que o acompanhou para fazer o reconhecimento do corpo, que minha mãe e eu não o poderíamos ver, pois as marcas de tortura eram muitas”, relembra Lygia. O corpo do embaixador José Jobim foi sepultado no domingo, dia 25 de março, às 10h30, no Cemitério São João Batista, em Botafogo, na Zona Sul do Rio. 

Já no dia seguinte, porém, o caso sofreu uma reviravolta. Responsável pela investigação, o delegado Ruy Dourado, da 16ª DP (Barra da Tijuca), convocou uma coletiva de imprensa para declarar que não houve sequestro. O embaixador, afirmou Dourado, cometera suicídio. Para corroborar sua tese, o IML chegou a desmentir o que o legista dissera no dia anterior: que Jobim já estava morto, há pelo menos uma hora, quando foi pendurado na árvore. Três dias depois, outra coletiva. Dessa vez, seus filhos, Leopoldo e Lygia Jobim, contestaram a versão de suicídio. “Seu crime foi ter querido, através das memórias que estava escrevendo, denunciar a corrupção na construção de Itaipu”, esclarece Lygia. 

Uma semana antes de sua morte no Rio, o embaixador José Jobim estivera em Brasília. A convite do diplomata baiano Ramiro Saraiva Guerreiro (1918-2011), compareceu, no dia 15 de março de 1979, à posse do presidente da República, o general João Baptista de Oliveira Figueiredo (1918-1999), o quinto e último do regime militar. Guerreiro foi ministro das Relações Exteriores do Brasil entre 1979 e 1985. Durante a cerimônia, Jobim comentou com amigos que estava escrevendo sua autobiografia. Entre outros assuntos, revelaria detalhes do esquema de superfaturamento na construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Disse mais: a documentação que comprovava o que dizia estava em uma mala xadrez azul e branca, guardada em sua casa. Lá pelas tantas, o senador Gilberto Marinho (1909-1985) chamou Jobim num canto e pediu a ele que parasse de falar porque as pessoas que pretendia denunciar estavam todas ali, na recepção. 

Crime de Estado

Paulista de Ibitinga, a 360 quilômetros da capital, José Pinheiro Jobim ingressou no Itamaraty em 1938, por indicação do poeta e diplomata Raul Bopp (1898-1984), e se aposentou em 1975, quando estava à frente da representação brasileira no Marrocos. Antes de chegar a ministro de primeira classe, atuou em países como Japão, EUA, Argentina, Uruguai e Finlândia. Como embaixador, serviu no Equador (1959-1962), Colômbia e Jamaica(1965-1966), Argélia (1966-1968) e Vaticano (1968-1973). Em 18 de fevereiro de 1964, foi designado pelo presidente João Goulart (1919-1976) para conversar com autoridades paraguaias sobre o aproveitamento hidrelétrico do rio Paraná, na altura das Sete Quedas. Como resultado da missão, Jobim elaborou um relatório que recomendava a construção da usina. 

O golpe militar de 1964, porém, alterou o projeto original. As turbinas, em vez de serem importadas da extinta União Soviética, foram compradas de uma multinacional alemã. Resultado: a obra, orçada em US$ 1,3 bilhão no governo Jango, teria custado dez vezes mais, US$ 13 bilhões, no regime militar.“Existem evidências de que houve corrupção durante a ditadura. O cerceamento dos mecanismos de controle, a elevação do fundo público e o aparelhamento do Estado por agentes empresariais privados levou a uma elevação significativa dos desvios de recursos públicos, pagamentos de propina e outras formas de irregularidade”, afirma o historiador Pedro Henrique Pedreira Campos, Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), professor do Departamento de História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e autor do livro Estranhas Catedrais – As Empreiteiras Brasileiras e a Ditadura Civil-Militar (1964-1988) (2014). “No caso da Usina Hidrelétrica de Itaipu, existem acusações de que teria havido desvio na realização da obra, em particular no fornecimento das turbinas e dos equipamentos elétricos usados na obra. Não existe um número preciso sobre o custo da corrupção e a elevação de preço. Na época, não foi feita a apuração do caso, mas, tudo aponta que a obra custou mais caro devido à apropriação indevida de recursos”. Para piorar a situação, a tal mala xadrez, que guardava os documentos que comprovariam o esquema de corrupção, foi encontrada vazia por sua mulher e filha na casa do Cosme Velho. 

Indignada com a tese de suicídio, Lygia Jobim não se deu por vencida. Travou incontáveis batalhas para provar que seu pai não tirara a própria vida. Uma dessas batalhas foi vencida em dezembro de 2014 quando, por ocasião da publicação de seu relatório final, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) declarou que Jobim foi sequestrado, mantido em cativeiro por dois dias e meio, em local incerto, e interrogado sob tortura. “Suas características levam-nos a crer que se tenha tratado de um crime de Estado, consumado por motivação exclusivamente política”, concluiu o relatório. “Não nos surpreenderia que o sequestro, a tortura e o assassinato do embaixador José Pinheiro Jobim tivessem conexão com seu projeto de livro acerca da construção de Itaipu, cujo lançamento poderia suscitar amplo debate sobre o tema”. 

“A ditadura militar trouxe consigo um regime de terror. Agentes do Estado perpetraram graves violações de direitos humanos, protegidos pela impunidade. As vítimas nem sempre tinham relação direta com ações voltadas à derrubada da ditadura, mas eram atingidas pelo simples fato de suas condutas significarem alguma contestação aos governos militares”, contextualiza o advogado Pedro Dallari, ex-relator da Comissão Nacional da Verdade (CNV). “O assassinato da estilista Zuzu Angel (1921-1976) é demonstrativo desse regime de terror: sem ter militância política, ela foi morta em função de sua persistência na procura do filho Stuart Angel Jones (1946-1971), preso e executado pela ditadura e cujos restos mortais nunca foram localizados”. 

Outra vitória importante foi conquistada em setembro de 2018 quando, quase 40 anos depois da morte de Jobim, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos (MDH), determinou que sua certidão de óbito fosse retificada. A causa de sua morte, então, passou a constar como “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”. “O reconhecimento da responsabilidade do Estado foi, sem dúvida, importantíssimo. Mas, ainda tenho esperança de saber os nomes de seus torturadores e onde o mantiveram preso”, declara Lygia. “Além disso, não luto só por mim. Minha luta nunca chegará ao fim enquanto este país não tiver dignidade e não respeitar seus cidadãos. Enquanto outros sentirem a dor que, até hoje, eu sinto”. 

Quer conhecer mais sobre a história do Itamaraty? Confira o post sobre os 60 anos da nomeação do primeiro embaixador negro do Brasil.



André Bernardo
André Bernardo 

André Bernardo é jornalista. Aficcionado por cinema, literatura e música produziu conteúdo para mais de 80 jornais, como Zero Hora, Correio Braziliense e Diário de Pernambuco. Colabora para sites, como BBC Brasil, VICE e UOL, e revistas, como Superinteressante, MONET e Galileu. É autor do livro "A Seguir, Cenas do Próximo Capítulo (Panda Books)", sobre teledramaturgia brasileira.

A diáspora brasileira - Taísa Szabatura e Vinícius Mendes (IstoÉ)

 A diáspora brasileira

Nunca tantos brasileiros foram morar no exterior: são 4,2 milhões só na última década. E como expressão do desalento com o Brasil, a maioria deles não têm planos de voltar
Taísa Szabatura e Vinícius Mendes 
IstoÉ, 10/09/21 - 09h30 - Atualizado em 10/09/21 - 12h09

“Dificilmente voltaremos”, é a frase mais comum de se ouvir de famílias brasileiras morando fora do País. Ela tem sido dita também porque muitas delas engrossam um dado histórico: o número de brasileiros morando no exterior nunca foi tão alto como agora, segundo levantamento feito pelo Itamaraty. Até o fim de 2020, 4,21 milhões de pessoas haviam deixado o Brasil — um aumento de 35% em relação a 2010, quando este número era de 3,12 milhões. Foi o caso de Adriana Tanzi, de 49 anos: ela não pensava em morar fora até meados de 2019, mesmo possuindo cidadania europeia. No entanto, quando o orçamento doméstico caiu, em meio à crise econômica, ela e o marido, o soldador Edson Monteiro, de 54, resolveram partir junto com a filha, Vitória, de nove anos, para a Itália. “No começo foi difícil.Nós não falamos o idioma e ainda veio a pandemia”, relata. Hoje, um ano e meio depois, a situação é mais tranquila: vivendo em Mântua, na Lombardia, Edson voltou a trabalhar e Adriana já está no processo de validação de seu diploma.

A psicóloga Monise Valzacchi, de 32 anos, por sua vez, foi ao lado do namorado, o nutricionista Felipe Jorge Melo, de 31, para a Austrália em setembro de 2014, quando o Brasil já estava em crise. O objetivo inicial era estudar inglês, mas eles acabaram ficando em busca de uma residência permanente na cidade de Perth, uma das maiores do país. O processo demorou, mas saiu no começo desse ano, quando eles, enfim, compraram uma casa. Agora estão esperando a primeira filha, que vai nascer em novembro. “Nunca imaginamos que teríamos condições de comprar um imóvel como o nosso por aqui, mas deu certo”, diz Monise. Já o futuro pai, engenheiro, não quer deixar mais a vida australiana. “Mesmo na hipótese de que tudo desse errado, faríamos o possível para não voltar. Desde que nós chegamos, temos o mesmo pensamento: não estamos aqui para passear”.

Destinos brasileiros
Para o antropólogo Igor Renó Machado, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), o crescimento da presença brasileira no exterior se explica, principalmente, pela falta de perspectivas no País. Esse fenômeno tem se acentuado nos últimos anos. Pelo levantamento do Itamaraty, por exemplo, apenas entre 2018 e 2020, cerca de 625 mil pessoas deixaram o Brasil em direção a outros países — o que representa 14% do total de saídas nacionais em toda a década passada. “No início de 2010 havia até gente voltando. Mas, depois de 2016, quando as condições por aqui se deterioraram, começou uma saída violenta em busca de uma nova vida lá fora”, diz. Os Estados Unidos abrigam quase metade (42%) da população. Em números absolutos, trata-se de 1,77 milhão de pessoas.

No Canadá, a ida de brasileiros capacitados, em grande parte no setor de tecnologia, é até incentivada pelo governo. Foi esse chamado que atraiu o casal de desenvolvedores Bárbara Lourenço, de 28 anos, e Thiago de Lima Pacheco, de 27, por exemplo. Quando ele conseguiu um emprego na área em Montreal, no fim de 2019, os dois se casaram correndo para terem acesso ao visto canadense. Hoje, não querem voltar. “Aqui há segurança até para esperar um ônibus à noite”, justifica Bárbara. “Apesar disso, a saúde pública é mais burocrática. Eu prefiro o SUS”, confessa Thiago.

Mas o fenômeno ganhou mesmo força em Portugal. O país concedeu residência a 42,2 mil cidadãos do Brasil somente em 2020, segundo números oficiais. Hoje, 183,9 mil brasileiros — quase um terço do total de estrangeiros — vivem no país europeu. “O boom dessas chegadas aconteceu entre 2014 e 2018, quando elas triplicaram”, diz o advogado Felipe Tramujas, que, de Lisboa, ajuda brasileiros que buscam estabilidade em solo português. Neste período, porém, ele viu o perfil dos migrantes se transformar. “São pessoas já formadas e com filhos, sem contar o alto número de aposentados”, conta.

Um desses brasileiros é o executivo William Silva, de 33 anos. Ele mandou mais de 500 currículos até conseguir ser contratado por uma empresa em Lisboa, em 2019. “Eu vivia bem no Rio de Janeiro, mas a corrupção e a violência eram intransponíveis”, explica. A esposa, Bianca Costa, busca agora a revalidação do diploma, enquanto a filha, Júlia, de cinco anos, já está matriculada em uma escola pública. Nessa toada, o prefeito de Braga tem incentivado a migração brasileira como forma de lidar com o envelhecimento da população local. Logo após a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, ele escreveu um artigo que resumia esse acolhimento com um trocadilho: “Bem-vindos ao Braguil”.

https://istoe.com.br/a-diaspora-brasileira/


Uma confusão vista de fora - Duda Teixeira (Crusoe)

Uma confusão vista de fora

Como governos estrangeiros e players que costumam orientar investimentos no país enxergam o caótico cenário brasileiro
Duda Teixeira | 10 de setembro de 2021

O presidente Jair Bolsonaro está prestes a ingressar em seu último ano de mandato quase que totalmente isolado do resto do mundo . Com a chance de se reeleger em 2022, ele tem sido cada vez mais ignorado por outros chefes de governo, que mencionam o seu nome e passam longe dos aeroportos brasileiros. Nos atos antidemocráticos do 7 de Setembro não foi diferente. A imprensa estrangeira deu pouco destaque aos protestos e nenhum político de peso levou a sério, ao menos publicamente, conforme declaração golpista do presidente. Para eles, mais vale acompanhar o desenrolar dos acontecimentos à distância e aguardar até que o Bolsonaro deixe o poder. Investidores estrangeiros, por sua vez, já não se animam tanto com uma recuperação da economia e já começaram a fazer as contas de olho no que virá depois.

Os danos à imagem externa do Brasil durante o governo de Bolsonaro têm ocorrido de maneira progressiva e já têm três momentos capitais até agora. O primeiro foi em 2019, ainda no primeiro ano de mandato, quando as queimadas na Amazônia e no Pantanal alcançaram números recordes. A destruição da floresta virou assunto em reunião do G7 e a chanceler alemã Angela Merkel foi flagrada dizendo que ligaria depois para o presidente. Dos Estados Unidos, Donald Trump telefonou para Bolsonaro e disse que seu país estava “pronto para ajudar”. O francês Emmanuel Macron quis conversar pessoalmente com o brasileiro em uma reunião do G20, em Osaka, para discutir a Amazônia. Ainda não há nenhuma esperança de envolver Brasília em questões globais. O Brasil era chamado para ajudar em crises regionais, como a Venezuela, e integrantes do governo eram convocados para reuniões na Casa Branca.

O segundo momento em que a imagem do país foi arranhada se deu em maio do ano passado. Com o número de mortes diárias por Covid ultrapassando o dos Estados Unidos, o Brasil apareceu em manchetes do mundo todo. O país ganhou, assim, o título de “epicentro da pandemia”. Como todos os governantes estavam preocupados com seus problemas próprios, as críticas à forma como Bolsonaro lidou com a Covid partiram principalmente dos brasileiros. O terceiro grande momento aflorou agora, com o presidente incitando uma ruptura democrática. Mas,  diferente dos dois anteriores, ele foi ignorado. Diplomatas de países que antes eram considerados aliados do governo brasileiro foram convidados a participar dos atos de 7 de Setembro, mas preferiram ficar em casa. Sem poder contar com Donald Trump, dos Estados Unidos, e Benjamin Netanyahu, de Israel, o Brasil ficou sozinho.

Ao calcular como devem lidar com um presidente em confronto direto com o Judiciário e a imprensa, os mandatários estrangeiros têm optado pelo menor vínculo possível. A falta de iniciativas na política externa, com um governo atolado na crise doméstica, contribui para que os contatos sejam ainda menos frequentes. O Brasil foi escanteado, por exemplo, das negociações entre a ditadura venezuelana e a oposição, e tem recebido atenção ínfima do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

Desde que Biden tomou posse, em janeiro, notas e os comunicados do Departamento de Estado americano sobre o Brasil evitam menções ao presidente ou ao seu governo. Ao mesmo tempo, mensagens enfatizam que os americanos valorizam a democracia, o que é uma forma de dizer que não apoiam uma ruptura da ordem. Em resposta enviada a Crusoé sobre se o Brasil seria convidado para a Cúpula pela Democracia, em dezembro, o Departamento de Estado deixou a questão no ar, e afirmou que os EUA pedem que os países “mostrem compromissos que promovam a democracia, combatam a corrupção e incentivo o respeito pelos direitos humanos”. No 7 de Setembro, outra nota defendeu a liberdade para reunir e protestar pacificamente, mas afirmava que, “como fazemos com todas as democracias, esperamos que o governo brasileiro e as instituições respeitem totalmente suas leis”.

Com quase três anos do mandato de Bolsonaro, os líderes mundiais já não acreditam que seja possível convencer o presidente brasileiro de alguma coisa - e não consideram que valha a pena citá-lo. “O presidente brasileiro segue o mesmo roteiro dos populistas de direita com inclinações e ambições autoritárias. Ele sabe que o meio que tem de conseguir seguidores e retê-los é polarizando o país, espalhando o medo e mobilizando uma base própria ”, diz o sociólogo americano Larry Diamond, professor da Universidade Stanford e especialista em democracia. Mas a atenção limitada que o resto do mundo está dando ao Brasil também tem outro motivo. Ainda que as declarações do presidente assustem, acadêmicos e analistas entendem que as instituições nacionais estão em condições de resistência. “No geral, há uma expectativa de que as instituições irão prevalecer no Brasil, que tem muita força em sua sociedade civil, no Judiciário e na imprensa independente ”, diz Diamond.

Essa visão é compartilhada pelo instituto sueco V-Dem, que monitora o estado da democracia em vários países. Nos últimos seis anos, o V-Dem incluiu o Brasil no grupo com democracias em declínio, ao lado de Hungria, Tailândia, Bolívia, Venezuela, Bielo-Rússia e Polônia. Mas, em comparação, o Brasil se sai melhor em alguns pontos importantes. “Notamos que a capacidade de o Legislativo brasileiro conter o Executivo diminuiu um pouco. Mas o Brasil segue com um Judiciário forte e, principalmente, com uma nota muito boa no seu sistema eleitoral. Com essas qualidades ainda presentes, o risco para a democracia brasileira é baixo”, diz a pesquisadora Yuko Sato. “Se as alterações ocorrerem normalmente em 2022 e o poder passar para o vencedor do pleito, como é esperado, todos ficarão bem menos preocupados com o Brasil”.

Em relatório para clientes de dentro e fora do Brasil, a consultoria Eurasia disse que existem poucos perigos para a eleição do ano que vem. Para os analistas, o resultado da próxima eleição presidencial será respeitado pelo Congresso, pelos tribunais, pela imprensa e pelos militares, independentemente de quem for o vencedor. “Quando os clientes nos perguntam sobre a possibilidade de uma ruptura democrática, nós respondemos que os índices são baixos. Os atritos recentes ocorrem justamente porque as instituições brasileiras estão resistindo. Os freios e contrapesos estão funcionando. Além disso, Jair Bolsonaro não tem apoio popular suficiente para fazer uma grande mudança”, diz Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da consultoria.

O problema é que a crise política contaminou o setor econômico. Investidores que estavam pensando em uma possível retomada, com o fim da pandemia no ano que vem, estão reticentes. “Até a eleição de 2022, tudo indica que teremos Bolsonaro encurralado, brigando com as instituições e aumento a polarização. Esse conflito tem alimentado muitas incertezas, como a situação fiscal do país, o pagamento de 00precatórios, a inflação elevada e a crise hídrica. Há um pessimismo grande com a economia brasileira atualmente, e isso não vai se dissipar tão cedo”, diz Garman.

A partir de 2023, o consultor afirma que o próximo presidente terá de governar em um ambiente difícil. A situação fiscal não possibilita muita folga para gastos, em um momento em que a população, principalmente a classe média, pode externar inquietações represadas durante uma pandemia. Além disso, o descontentamento com as instituições, o sentimento que origina a eleger Bolsonaro e que depois foi estimulado por ele, seguirá em alta em grande parte da população. “A principal missão do presidente, a partir de 2023, será devolver a legitimidade às instituições democráticas brasileiras”, afirma o diretor-executivo da Eurasia. Será difícil para o país vencer, tão cedo, uma condição de pária internacional.

https://crusoe.com.br/edicoes/176/a-confusao-vista-de-fora

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Colonial Legacies in the Luso-Brazilian World - Newberry Library, Chicago

Newberry Library, Chicago:

Colonial Legacies in the Luso-Brazilian World

Cartes marines: a la svbstitvtion dv Valdec proche Solevre en Svisse, MDCCXXVII

Symposium in Partnership with the Consulate General of Brazil in Chicago
Friday, September 10, 2021

2-5:15 pm CDT

Virtual event with in-person audience.

Q&A available for in-person and virtual attendees.

Please register below to attend in person or virtually.

This symposium will be available in English and Portuguese with simultaneous interpretation.

Open to the Public

Opening Ceremony

2-2:15 pm Central Time

Daniel Greene, President and Librarian, Newberry Library

Benoni Belli, Consul General of Brazil

Introduction to the Brazilian Collection and Symposium

2:15-2:30 pm Central Time

Will Hansen, Curator of Americana and Director of Reader Services, Newberry Library

Panel One: “Ruptures, Continuity, and Identity”

2:30-3:20 pm Central Time

The Impact and Legacies of Brazilian Independence in Portugal (c. 1825-50), Gabriel Paquette, University of Oregon 

Historians have long recognized how the formal achievement of independence in Brazil and Spanish America meant neither that the legacies of colonialism had been extirpated nor that the newly won sovereignty was unencumbered. The colonial inheritance was ubiquitous and often pernicious (e.g., the persistence of indigenous tribute and taxation labor regimes such as slavery; legal codes; the unfavorable position of the post-colonial polity in the world economy), as scholars working in the Dependency Theory, Informal Empire, and World Systems intellectual traditions have demonstrated.

Many connections between Europe and Latin America survived the disintegration of the Ibero-Atlantic empires. New links, both overtly coercive and less so, proliferated, too. The severance of the formal imperial relationship produced lingering effects on individuals, institutions, and states. Portugal’s situation in the decades following formal recognition of Brazilian independence in 1825 is an ideal case study. Portuguese statesmen grappled with numerous pressing and significant dilemmas generated by the sudden deprivation of Brazil, including those related to political organization and overseas empire, which are addressed in this paper. Brazil’s independence, then, cast a long shadow on Portugal’s subsequent political, economic, and cultural development.

From colony to nation: political identities before, during, and after the Independence of Brazil, João Paulo Pimenta, Universidade de São Paulo

This paper will present a panoramic perspective of the history of political identities in Brazil in the transformation from a colonial world to a national one. In this history, the process of the independence of Brazil in relation to Portugal played a central role, since out this emerged the contours of a Brazilian identity which did not exist previously. Finally, the continued relevance of the question will be discussed, to the extent that the history discussed here is still present in Brazilian identarian dynamics of the twenty-first century.

Moderator: Elisa Frühauf Garcia, Universidade Federal Fluminense

Break

3:20-3:40 pm Central Time

Panel Two: Portuguese Authority, Republicanism, and Rebellion

3:40-4:45 pm Central Time

Republican Ideas in the age of Independence, Heloisa Starling, Universidade Federal de Minas Gerais

Retrace how a republican language was formed in Brazil between the Conspiracy of Minas, in 1789, and the Revolution of 1817, in Pernambuco. This language sustained an alternative project of Independence and established a connection, in the domain of ideas, with the American Revolution.

An Atlantic History: Brazil, France, and the United States of America (1776-1792), Kenneth Maxwell, Historian

A discussion of the impact of the “Recueil des Loix Constitutives des Colonies Anglois, confédérées sous la dénomination D’Etats-Unis de l’Amérique Septentrional,” a Collection of the Constitutional laws of the United States of North America confederated under the title of the United States of North America - published in France in 1778. It was from France that two copies of this book reached Minas Gerais in 1788 and was the basis of discussions among the Minas conspirators who between late 1788 and early 1789 planned to overthrow Portugues rule in an armed uprising and establish a constitutional republic on the North American model.

The paper discusses the role of Benjamin Franklin, the American envoy in Paris, in collecting the translations and encouraging the publication of this collection of key American constitutional documents in France in 1778, as part of his effort to gain French military and political support for the American cause. It also follows the secret meeting in Nimes in Southern France in 1787 between Thomas Jefferson, who had succeeded Franklin as the American envoy in Paris, and a young Brazilian revolutionary who was a postgraduate student at the University of Montpellier. At Nimes the two men discussed details of the proposed revolt in Brazil and the possibility of support from the United States.

Moderator: Elisa Frühauf Garcia, Universidade Federal Fluminense

Closing Remarks with Daniel Greene and Benoni Belli

4:45-5 pm Central Time

Cost and Registration Information 

This event is free, but all participants must register in advance and space is limited.

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Isolado, Bolsonaro recua em sua política externa e cede à China - Jamil Chade (UOL)

 Isolado, Bolsonaro recua em sua política externa e cede à China

UOL
Jamil Chade
19/09/2021, 04:00

Evitado pelos principais líderes democráticos, denunciado por crimes, alvo de chacota nos corredores da diplomacia internacional, isolado, sem conseguir sua sonhada adesão à OCDE e pressionado, o presidente Jair Bolsonaro cede - sem alarde - sobre alguns dos pilares de sua política externa.

Declarações e pronunciamentos feitos durante a reunião de cúpula dos Brics consolidaram o posicionamento da China em relação à pandemia da covid-19, obrigando o governo brasileiro a recuar no tom usado sobre a origem do vírus, acesso às vacinas e apoio ao sistema multilateral. Sinais apontando nessa mesma direção já tinham sido identificados nos encontros ministeriais do G-20, nos debates na OMS e mesmo no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

 

Mas a mudança ficou escancarada no encontro dos Brics que ocorreu, nesta quinta-feira, de forma virtual e foi marcada por um discurso público por parte do presidente brasileiro de elogios aos chineses por seu papel no combate ao vírus e no fornecimento de vacinas.

Bolsonaro usou um tom conciliador, em franco contraste com as críticas que ele e seus aliados fizeram por meses contra Pequim. Sem o respaldo de Donald Trump, com uma Europa que se afasta de qualquer envolvimento com sua presidência, com acordos comerciais que não conseguem ser fechados, com a adesão à OCDE ainda indefinida e com a ONU proliferando denúncias contra Bolsonaro, o presidente usou o encontro dos Brics para sair em busca de costurar alianças, mesmo com um regime comunista.

Mas o posicionamento de recuo do brasileiro não se limitou ao discurso. Na declaração final aprovada pelos líderes, também prevaleceu a postura diplomática da China nos principais debates sobre a pandemia.

Um deles se refere à pressão para que Pequim aceite a visita de uma missão internacional para investigar a origem do vírus. Nas últimas semanas, governos como o dos EUA, Alemanha ou Reino Unido têm insistido na necessidade de que os chineses abram seu laboratório de Wuhan para que inspetores internacionais possam avaliar se a covid-19 surgiu no local.

A China rejeita a ofensiva, alertando que não tem motivos para dar acesso ao seu laboratório e que a manobra representaria uma politização do debate sobre a pandemia. O temor de Pequim é de que a questão seja usada para enfraquecer ou culpar a China por conta da pandemia.

Nos bastidores, o Brasil também passou a pressionar nessa direção dos demais países do Ocidente. Em maio de 2021, o próprio Bolsonaro chegou a insinuar que a China poderia ter manipulado o vírus.

«É um vírus novo, ninguém sabe se nasceu em laboratório ou nasceu por algum ser humano ingerir um animal inadequado. Mas está aí. Os militares sabem o que é guerra química, bacteriológica e radiológica. Será que não estamos enfrentando uma nova guerra?", questionou o presidente, de forma retórica.

Bolsonaro então emendou. "Qual o país que mais cresceu o seu PIB? Não vou dizer para vocês. Que que está acontecendo com o mundo todo, o seu povo, com sua gente, com nosso Brasil?", acrescentou.

Mas, na declaração final dos Brics, foi a postura de Pequim que vingou nas negociações. O texto não faz um chamado para que uma missão internacional visite o laboratório e insiste na necessidade de que não se politize o debate, uma exigência da China.

"Observamos que a cooperação no estudo das origens da SRA-COV-2 é um aspecto importante da luta contra a pandemia da COVID-19", diz o texto.

"Apoiamos processos baseados na ciência, incluindo ampla experiência, transparentes e oportunos, livres de politização ou interferência, para fortalecer a capacidade internacional de compreender melhor o surgimento de novos patógenos e para ajudar a prevenir futuras pandemias", insiste.

Na tradução dos termos diplomáticos para a realidade, a China rejeita qualquer interferência em seu país e alerta que apenas haverá um trabalho de investigação com sua chancela.

Defesa da ONU e do multilateralismo

Outra concessão do governo brasileiro se refere ao reconhecimento explícito no documento dos líderes sobre a posição central da ONU e da necessidade de um fortalecimento do multilateralismo, principalmente para dar uma resposta à pandemia.

Se essa era uma tradicional postura do Brasil por décadas, a diplomacia do governo brasileiro sob Ernesto Araújo havia optado por questionar o sistema, rebater qualquer ideia de ampliar a influência dos organismos internacionais e via órgãos estrangeiros como veículo para uma suposta manipulação por parte da China ou de forças de esquerda.

Araújo chegou a fazer referências ao fato de que, se o Brasil tivesse de ser considerado um pária, ele estaria disposto, em nome de uma nova postura polêmica. Internamente, chegou-se a vetar palavras e referências nos textos lidos pelos diplomatas brasileiros pelo mundo que tivessem uma relação com uma suposta redução da soberania nacional.

Muitos dentro do Itamaraty apontam que o início da transformação no vocabulário da chancelaria se deu quando, de forma surpreendente, o Itamaraty renomeou seus departamentos. Um deles ganhou o nome de Secretaria de Assuntos de Soberania Nacional, o que agrupa as divisões que estavam antes sob a Subsecretaria de Política Multilateral.

Sob o termo "soberania" estavam temas como direitos humanos e outros aspectos sociais. Entre parte dos diplomatas, a mudança foi interpretada como um sinal de que, nos fóruns multilaterais, o foco do Brasil seria o da defesa do interesse nacional e da soberania. E não dos desafios globais.

A mudança não ficou apenas na placa da porta do gabinete dentro do palácio do Itamaraty. Aos poucos, essa mudança foi se transformando em um novo comportamento do governo em reuniões.

Uma das consequências foi a decisão de se evitar a palavra "global" em textos oficiais, em resoluções e em discursos em nome do Brasil. Sua eliminação dependeria do contexto. Numa das resoluções sob debate na ONU, o termo "desafios globais" seria trocado por "desafios em comum".

A ideia é que não existem realidades globais, mas apenas desafios que seriam comuns a todos. Na prática, o Brasil mantém seu espaço soberano e evita aderir a princípios e padrões universais

Tampouco o Itamaraty gostou da ideia de que os discursos de seus diplomatas trouxessem o termo "sistema internacional". Sempre que possível, os representantes nacionais teriam de dar um enfoque no papel dos Estados soberanos. Portanto, "sistema internacional" se transformaria em "sistema de nações" ou simplesmente "Estados-membros".

Ao longo dos primeiros anos do governo, Araújo chegou a usar encontros internacionais para alertar que o "multilateralismo" seria uma ideologia, enquanto o próprio Bolsonaro subiu na tribuna da ONU para mandar mensagens contrárias ao maior fortalecimento da entidade.

Observadores internos no governo apontam que, em parte, a mudança de postura ocorre por conta de uma estratégia do novo chanceler, Carlos França, de retomar a ideia de um país que mantém relações com todos e que aposta no multilateralismo.

Mas parte da mudança de postura tem uma relação direta com o isolamento internacional do Brasil, escancarado inclusive pela ausência de visitas de chefes-de-estado de peso ao país.

No texto final da declaração dos Brics, portanto, o que vingou não foi a postura do bolsonarismo. A mensagem vai exatamente no sentido contrário de tudo o que o Itamaraty defendeu durante mais de um ano da covid-19.

"A pandemia reforçou nossa crença de que o multilateralismo eficaz e representativo é essencial para construir resistência contra os desafios globais atuais e futuros, promovendo o bem-estar de nosso povo e construindo um futuro sustentável para o planeta", diz.

Na declaração, os Brics ainda se comprometem em "fortalecer e reformar o sistema multilateral para tornar a governança global mais ágil e ágil, eficaz, transparente, democrática, representativa e responsável perante os Estados Membros, ao mesmo tempo em que reiteramos nosso compromisso com a defesa do direito internacional, incluindo os propósitos e princípios consagrados na Carta das Nações Unidas como sua pedra angular indispensável, e com o papel central das Nações Unidas no sistema internacional".

Sem garantias para Conselho de Segurança

Apesar do reconhecimento do papel central da ONU, o Brasil não conseguiu do Brics uma chancela para sua candidatura para um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Na declaração, o bloco "reafirma a necessidade de uma reforma abrangente da ONU, incluindo seu Conselho de Segurança, com o objetivo de torná-la mais representativa, eficaz e eficiente, e de aumentar a representação dos países em desenvolvimento para que possam responder adequadamente aos desafios globais".

Mas não há um endosso explícito do pleito brasileiro. Moscou e Pequim, que fazem parte do Conselho, apenas apoiam um maior papel do país no organismo internacional, sem dar detalhes.

"China e Rússia reiteram a importância que atribuem ao status e ao papel do Brasil, Índia e África do Sul nos assuntos internacionais e apoiam sua aspiração de desempenhar um papel maior na ONU", completa.

https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2021/09/10/isolado-bolsonaro-recua-em-sua-politica-externa-e-cede-a-china.htm


Barrosinho responde ao verme que envergonha o Brasil - Luiz Roberto Barroso (TSE)

 Para registro histórico:


PRONUNCIAMENTO DO MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO 

Abertura da sessão de 09/09/2021 do Tribunal Superior Eleitoral


A propósito dos eventos e pronunciamentos do último dia 7 de setembro, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Luiz Fux, já se manifestou com relação aos ataques àquele Tribunal, seus Ministros e às instituições, com o vigor que se impunha.

A mim, como Presidente do Tribunal Superior Eleitoral cabe apenas rebater o que se disse de inverídico em relação à Justiça Eleitoral. Faço isso em nome dos milhares de juízes e servidores que servem ao Brasil com patriotismo – não o da retórica de palanque, mas o do trabalho duro e dedicado –, e que não devem ficar indefesos diante da linguagem abusiva e da mentira.

Já começa a ficar cansativo, no Brasil, ter que repetidamente desmentir falsidades, para que não sejamos dominados pela pós-verdade, pelos fatos alternativos, para que a repetição da mentira não crie a impressão de que ela se tornou verdade. É muito triste o ponto a que chegamos.

Antes de responder objetivamente a tudo o que precisa ser respondido, faço uma breve reflexão sobre o mundo em que estamos vivendo e as provações pelas quais têm passado as democracias contemporâneas. É preciso entender o que está acontecendo para resistir adequadamente.

A democracia vive um momento delicado em diferentes partes do mundo, em um processo que tem sido batizado como recessão democrática, retrocesso democrático, constitucionalismo abusivo, democracias iliberais ou legalismo autocrático. Os exemplos foram se acumulando ao longo dos anos: Hungria, Polônia, Turquia, Rússia, Geórgia, Ucrânia, Filipinas, Venezuela, Nicarágua e El Salvador, entre outros. É nesse clube que muitos gostariam que nós entrássemos.

Em todos esses casos, a erosão da democracia não se deu por golpe de Estado, sob as armas de algum general e seus comandados. Nos exemplos acima, o processo de subversão democrática se deu pelas mãos de presidentes e primeiros-ministros devidamente eleitos pelo voto popular. Em seguida, paulatinamente, vêm as medidas que desconstroem os pilares da democracia e pavimentam o caminho para o autoritarismo.

Há três fenômenos distintos em curso em países diversos: a) o populismo; b) o extremismo e c) o autoritarismo. Eles não se confundem entre si, mas quando se manifestam simultaneamente – o que tem sido frequente – trazem graves problemas para a democracia.

O populismo tem lugar quando líderes carismáticos manipulam as necessidades e os medos da população, apresentando-se como anti-establishment, diferentes “de tudo o que está aí” e prometendo soluções simples e erradas, que frequentemente cobram um preço alto no futuro.

Quando o fracasso inevitável bate à porta – porque esse é o destino do populismo –, é preciso encontrar culpados, bodes expiatórios. O populismo vive de arrumar inimigos para justificar o seu fiasco. Pode ser o comunismo, a imprensa ou os tribunais.

As estratégias mais comuns são conhecidas: a) uso das mídias sociais, estabelecendo uma comunicação direta com as massas, para procurar inflamá-las; b) a desvalorização ou cooptação das instituições de mediação da vontade popular, como o Legislativo, a imprensa e as entidades da sociedade civil; e c) ataque às supremas cortes, que têm o papel de, em nome da Constituição, limitar e controlar o poder.

O extremismo se manifesta pela intolerância, agressividade e ataque a instituições e pessoas. É a não aceitação do outro, o esforço para desqualificar ou destruir os que pensam diferente. Cultiva-se o conflito do nós contra eles. O extremismo tem se valido de campanhas de ódio, desinformação, meias verdades e teorias conspiratórias, que visam enfraquecer os fundamentos da democracia representativa. Manifestação emblemática dessa disfunção foi a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, após a derrota de Donald Trump nas eleições presidenciais. Por aqui, não faltou quem pregasse invadir o Congresso e o Supremo.

O autoritarismo, por sua vez, é um fenômeno que sempre assombrou diferentes continentes – América Latina, Ásia, África e mesmo partes da Europa –, sendo permanente tentação daqueles que chegam ao poder.

Em democracias recentes, parte das novas gerações já não tem na memória o registro dos desmandos das ditaduras, com seu cortejo de intolerância, violência e perseguições. Por isso mesmo, são presas mais fáceis dos discursos autoritários.

Uma das estratégias do autoritarismo, dos que anseiam a ditadura, é criar um ambiente de mentiras, no qual as pessoas já não divergem apenas quanto às suas opiniões, mas também quanto aos próprios fatos. Pós-verdade e fatos alternativos são palavras que ingressaram no vocabulário contemporâneo e identificam essa distopia em que muitos países estão vivendo.

Uma das manifestações do autoritarismo pelo mundo afora é a tentativa de desacreditar o processo eleitoral para, em caso de derrota, poder alegar fraude e deslegitimar o vencedor.

Visto o cenário mundial, falo brevemente sobre o Brasil e os ataques sofridos pela Justiça Eleitoral.

No tom, com o vocabulário e a sintaxe que é capaz de manejar, o Presidente da República fez os seguintes comentários que dizem respeito à Justiça Eleitoral e que passo a responder.

“A alma da democracia é o voto”.

De fato, o voto é elemento essencial da democracia representativa.

Outro elemento igualmente fundamental é o debate público permanente e de qualidade, que permite que todos os cidadãos recebam informações corretas, formem sua opinião e apresentem seus argumentos.

Quando esse debate é contaminado por discursos de ódio, campanhas de desinformação e teorias conspiratórias infundadas, a democracia é aviltada. O slogan para o momento brasileiro, ao contrário do propalado, parece ser: “Conhecerás a mentira e a mentira te aprisionará”.

“Não podemos admitir um sistema eleitoral que não fornece qualquer segurança”

As urnas eletrônicas brasileiras são totalmente seguras. Em primeiro lugar, elas não entram em rede e não são passíveis de acesso remoto. Podem tentar invadir os computadores do TSE (e obter alguns dados cadastrais irrelevantes), podem fazer ataques de negação de serviço aos nossos sistemas, nada disso é capaz de comprometer o resultado da eleição. A própria urna é que imprime os resultados e os divulga.

Os programas que processam as eleições têm o seu código fonte aberto à inspeção de todos os partidos, da Polícia Federal, do Ministério Público e da OAB um ano antes das eleições. Estará à disposição dessas entidades a partir de 4 de outubro próximo. Inúmeros observadores internacionais examinaram o sistema com seus técnicos e atestaram a sua integridade.

Ainda hoje, daqui a pouco, anunciarei os integrantes da Comissão de Transparência das Eleições, que vão acompanhar cada passo do processo eleitoral. Nunca se documentou qualquer episódio de fraude.

O sistema é certamente inseguro para quem acha que o único resultado possível é a própria vitória. Como já disse antes, para maus perdedores não há remédio na farmacologia jurídica.

“Nós queremos eleições limpas, democráticas, com voto auditável e contagem pública de votos”

As eleições brasileiras são totalmente limpas, democráticas e auditáveis. Eu não vou repetir uma vez mais que nunca se documentou fraude, que por esse sistema foram eleitos FHC, Lula, Dilma e Bolsonaro e que há 10 (dez) camadas de auditoria no sistema.

Agora: contagem pública manual de votos é como abandonar o computador e regredir, não à máquina de escrever, mas à caneta tinteiro. Seria um retorno ao tempo da fraude e da manipulação. Se tentam invadir o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, imagine-se o que não fariam com as seções eleitorais!

As eleições brasileiras são limpas, democráticas e auditáveis. Nessa vida, porém, o que existe está nos olhos do que vê.

“Não podemos ter eleições onde (sic) pairem dúvidas sobre os eleitores”

Depois de quase três anos de campanha diuturna e insidiosa contra as urnas eletrônicas, por parte de ninguém menos do que o Presidente da República, uma minoria de eleitores passou a ter dúvida sobre a segurança do processo eleitoral. Dúvida criada artificialmente por uma máquina governamental de propaganda. Assim que pararem de circular as mentiras, as dúvidas se dissiparão.

“Não posso participar de uma farsa como essa patrocinada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral”

O Presidente da República repetiu, incessantemente, que teria havido fraude na eleição na qual se elegeu. Disse eu, então, à época, que ele tinha o dever moral de apresentar as provas. Não apresentou.

Continuou a repetir a acusação falsa e prometeu apresentar as provas. Após uma live que deverá figurar em qualquer futura antologia de eventos bizarros, foi intimado pelo TSE para cumprir o dever jurídico de apresentar as provas, se as tivesse. Não apresentou.

É tudo retórica vazia. Hoje em dia, salvo os fanáticos (que são cegos pelo radicalismo) e os mercenários (que são cegos pela monetização da mentira), todas as pessoas de bem sabem que não houve fraude e quem é o farsante nessa história.

“Não é uma pessoa no Tribunal Superior Eleitoral que vai nos dizer que esse processo é seguro e confiável”.

Não sou eu que digo isso. Todos os ex-Presidentes do TSE no pós-88 – 15 Ministros e ex-Ministros do STF – atestam isso. Mas, na verdade, quem decidiu que não haveria voto impresso foi o Congresso Nacional, não foi o TSE.

A esse propósito, eu compareci à Câmara dos Deputados após três convites: da autora da proposta, do Presidente da Comissão Especial e um convite pessoal do Presidente daquela Casa. Não fiz ativismo legislativo. Fui insistentemente convidado.

Lá expus as razões do TSE. Não tenho verbas, não tenho tropas, não troco votos. Só trabalho com a verdade e a boa fé. São forças poderosas. São as grandes forças do universo. A verdade realmente liberta. Mas só àqueles que a praticam.

Foi o Congresso Nacional – não o TSE – que recusou o voto impresso. E fez muito bem. O Presidente da Câmara afirmou que após a votação da Proposta, o assunto estaria encerrado. Cumpriu a palavra. O Presidente do Senado afirmou que após a votação da Proposta, o assunto estaria encerrado. Cumpriu a palavra. O Presidente da República, como ontem lembrou o Presidente da Câmara, afirmou que após a votação da proposta o assunto estaria encerrado. Não cumpriu a palavra.

Seja como for, é uma covardia atacar a Justiça Eleitoral por falta de coragem de atacar o Congresso Nacional, que é quem decide a matéria.

Insulto não é argumento. Ofensa não é coragem. A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo. A marca Brasil sofre, nesse momento, uma desvalorização global. Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial.

Um desprestígio maior do que a inflação, do que o desemprego, do que a queda de renda, do que a alta do dólar, do que a queda da bolsa, do que o desmatamento da Amazônia, do que o número de mortos pela pandemia, do que a fuga de cérebros e de investimentos. Mas, pior que tudo, nos diminui perante nós mesmos. Não podemos permitir a destruição das instituições para encobrir o fracasso econômico, social e moral que estamos vivendo.

A democracia tem lugar para conservadores, liberais e progressistas. O que nos une na diferença é o respeito à Constituição, aos valores comuns que compartilhamos e que estão nela inscritos. A democracia só não tem lugar para quem pretenda destruí-la.

Com a bênção de Deus – o Deus do bem, do amor e do respeito ao próximo – e a proteção das instituições, um Presidente eleito democraticamente pelo voto popular tomará posse no dia 1º de janeiro de 2023.

Luís Roberto Barroso, presidente do TSE