O Brasil é um fascinante, exasperante e bendito país!
Nasceu em casa. Conto uma historinha para ilustrar o que aconteceu pouco antes do golpe militar de 64. Um jantar na casa do meu pai com uns oito ou dez amigos dele e os caras dizendo: “Eu estou tirando o meu dinheiro do Brasil…”, “Estou vendendo a minha fábrica…”, “Vou voltar a viver na Europa…”. O tom era esse. Eu calado porque eram todos de outra geração. Então, meu pai disse: “Pois eu estou comprando uma nova rotativa que custa 5 milhões de dólares”. Os amigos reagiram: “Você está maluco?”, “O que é que deu em você, enlouqueceu?”, “Você não está vendo o que é que está acontecendo neste país? O Brasil vai virar comunista…”, “Acabou tudo e você está investindo…”. A resposta do meu pai foi: “Se tomarem a minha empresa, pelo menos vão tomá-la com uma gráfica decente… É melhor que fiquem com uma gráfica grande”.
É como dizem os hindus: a sorte é metade do sucesso. Mesmo assim, o que não falta é exasperação, certo? Era agosto de 1983. Eu dava uma palestra na Abril e dizia: “O Brasil está cansado e frustrado com a crise, com a corrupção, com a falta de perspectivas e com um governo que não governa”. Felizmente, concluí a palestra com uma nota otimista, e da qual muito me orgulho. Disse então: “Da mesma maneira que reencontramos os caminhos da democracia e soubemos mergulhar na abertura sem perder o equilíbrio, tenho a certeza de que — muito antes do que se possa imaginar — reencontraremos o caminho do crescimento econômico. Para isso, vai ser preciso repensar e mudar muitas coisas. Mas não tenho dúvida de que, juntos e com muita inteligência e ainda mais trabalho, saberemos fazê-lo”.
Sim. Eu a conheço e já registrei com o nome de A Fórmula Mágica da Sorte e do Sucesso (ou — pelo menos — da Sabedoria) em Alguns Minutos por Dia ou Seu Dinheiro de Volta.
Trata-se, muito simplesmente, de LER.
Verbo. Ler o quê? Tudo o que cair em suas mãos! Folhetos, folhetins, fascículos, panfletos e literatura de cordel. Jornais (grandes, pequenos, nanicos e alternativos), revistas (gerais, profissionais, técnicas… até da concorrência), boletins, fichas de receita, anúncios, embalagens, bulas, enciclopédias, circulares, relatórios, o manual de proprietário do seu carro, quadrinhos, dicionários, programas de teatro, discursos, cartas de amor e — se possível — até alguns livros… Em qualquer lugar. E especialmente no trânsito, no banheiro, no ônibus, no avião, na praia, no elevador, no metrô, no intervalo do jogo no Estádio do Morumbi e — naturalmente — na sala de espera do médico ou dentista. Onde quer que você esteja. Em qualquer momento disponível. Quando não conseguir dormir, quando se encontrar em qualquer fila, no café-da-manhã, na hora do almoço (ou — se estiver de regime — no lugar do almoço), entre duas partidas de tênis no clube, durante os comerciais… até em vez de assistir a uma novela! O importante é reservar tempo para ler. Escolha a hora que quiser. Acorde mais cedo. Durma mais tarde. Mude algum programa. Mas… leia!
A “fórmula mágica” deve ser testada ao longo de, digamos, 23 anos. Até lá não aceitamos reclamações. Falando sério, estou convencido de que a leitura é a receita mais simples para o conhecimento, a atualização permanente, o acesso ao mundo das idéias, a compreensão e a sabedoria. Quanto mais você ler, mais surpresas como estas terá: “Em vez de ser a condição natural do homem e da sociedade, a liberdade é algo que poucos alcançaram, em poucos lugares, através de esforço, dedicação, autodisciplina e engenhosidade social. A liberdade é a exceção da História, não a regra; é aquilo que os homens buscam, não o que possuem”. (Arthur Schlesinger) Ou, ainda, sobre liberdade: “Se uma nação espera ser ignorante e livre ao mesmo tempo, espera ser algo que nunca existiu e que nunca existirá”. (Thomas Jefferson) Ler não envolve apenas a busca de verdades eternas ou receitas universais. Ler é também diversão, entretenimento e bom humor. Alexandre Dumas escreveu sobre o matrimônio: “A cruz do casamento é tão pesada que são necessárias duas pessoas para carregá-la, às vezes três”. E, finalmente, um velho provérbio chinês, aplicável a todos os nossos planejamentos: “É muito difícil fazer profecias, principalmente com relação ao futuro”.
Se me permitirem acrescentar mais uma recomendação àquela básica, eu lhes diria: sempre que possível, leiam com um lápis ou caneta na mão. Marquem os trechos que acharem importantes. Recortem artigos de jornais e revistas. Colecionem as frases ou parágrafos de que gostarem, como outras pessoas colecionam selos, figurinhas, autógrafos, conchas ou chaveiros. Classifiquem seus achados, arquivem-nos, troquem-nos com seus amigos… E voltem, sempre, para saboreá-los. Descobrirão que a sua coleção através dos anos revelará muitas coisas importantes a respeito de si próprios. Bem, se isso não trouxer sorte e sucesso, garanto que — no mínimo — trará sabedoria e muita satisfação.
Podem porque elas são o mais seletivo, segmentado, regionalizado, brilhante, íntimo, aproveitável, portável, rasgável, eficiente, dramático, inteligente, lindo, duradouro e maravilhoso veículo de comunicação que existe.
A revolução iniciada por Gutenberg foi tão importante que ainda não terminou, já passados 500 anos. E, na essência, o que fazemos hoje em matéria de imprensa obedece aos mesmos propósitos que levaram o nosso patriarca a construir a sua primeira prensa: levar informação relevante (no caso dele, os ensinamentos da Bíblia) a um número maior de pessoas, por um custo mais acessível. Na Era da Informação — e apesar de tanta velocidade e diversidade — não podemos deixar de lado a fundamental importância da verdade, da honestidade, da objetividade, da solidariedade, e da “inteligência sensível”. Ou seja, daqueles princípios fundamentais que alicerçam a civilização desde os seus primórdios e sem os quais todo o resto será em vão.
O mundo das publicações está mudando muito rapidamente (e vai continuar mudando ainda mais rapidamente). E a Abril pretende não apenas acompanhar mas liderar essas mudanças.
Nossa credibilidade continua sendo nosso principal ativo. Daí a fundamental importância da rígida separação entre editorial e publicidade. É o certo a fazer, moral, ética e filosoficamente, como também (e felizmente) o que convém fazer pensando a longo prazo. É o que, afinal, transformou cada uma das nossas publicações na revista líder do seu setor. E é o que vai mantê-las nessa posição e fazê-las crescer e continuar contribuindo para o desenvolvimento do país no futuro.
Quanto mais reflito, e quanto mais tempo sou editor, mais me convenço de que jornalista não precisa de diploma de jornalista, mas sim de uma boa e sólida formação que começa em casa, passa pela escola básica, e pode até chegar à universidade. Um jornalista precisa de escolas, sim — escolas sem rótulos, que ensinem história, literatura, economia, ciência, filosofia, direito… o universo! Um jornalista precisa aprender a pensar, analisar, questionar, usar a cabeça. Um jornalista precisa ler muitos livros, precisa ser curioso, querer saber sempre o porquê das coisas, todas as coisas. E precisa gostar de contar o que descobre, de contar histórias…
Alguém com esse perfil acima vai ter apenas de aprender o ofício, a técnica, o “como fazer”. Eu não apenas acredito nisso, como pratico há mais de trinta anos.
Existem muitas variáveis, mas a infalível é quando os jornalistas de uma revista acreditam que o leitor é o seu verdadeiro patrão. Quando eles trabalham unicamente para atender às necessidades desses leitores, por meio de um jornalismo sério, bem pautado, bem apurado, bem escrito, bem editado — resultando em revistas honestas, bonitas, úteis e surpreendentes.
Imprecisão, arrogância parcialidade (decorrente da defesa de interesses próprios em detrimento do interesse público), desprezo pela privacidade, insensibilidade, glorificação do bizarro, trivial e banal são queixas mais ou menos comuns atribuídas à imprensa em todos os tempos. Mais do que um elenco de pecados capitais da nossa imprensa, esses itens constituem um roteiro dos males a evitar, um vade mecum do que não deve ser feito.
Primeiro, e principalmente, é preciso respeitar o público leitor. O público não é burro. No máximo ele é mal informado, ocupado com outras coisas, facilmente distraído, muitas vezes por culpa nossa. Os jornalistas devem conhecer melhor seu público. Temos a obrigação de entender que o processo de comunicação envolve não apenas transmitir mas também verificar o que foi captado e entendido do outro lado. E que a compreensão das notícias pelo público é parte essencial do processo. Ou seja, devemos prestar muita atenção no que nossos leitores pensam, acreditam, sentem, escrevem e dizem. Nesse contexto, vale a pena considerar a declaração de William Broyles Junior, ex-editor de Newsweek, quando disse: “Todo jornalista deveria ser entrevistado, analisado e dissecado por outros jornalistas durante certo tempo. Essa simples experiência contribuiria mais para melhorar o jornalismo do que todas as escolas de jornalismo juntas”.
Aos críticos, nunca é demais repetir: não criamos os fatos, não inventamos a natureza humana, não somos deuses com o poder de alterar o curso dos acontecimentos. Não podemos mudar por muito tempo a verdadeira imagem de personagens ou sufocar as naturais repercussões dos eventos. Não podemos passar as 24 horas do dia ao lado de todas as figuras importantes ou acompanhar a evolução de todos os eventos significativos e significantes; por isso, somos obrigados a selecionar e trabalhar esse material com uma lente de aumento. Nesse processo de seleção, síntese e magnificação, tornam-se mais gritantes certos traços que, de outra forma, ficariam diluídos se porventura tivéssemos o dom da onipresença, ubiqüidade e onisciência — e nossos leitores não fizessem outra coisa que não nos ler o dia inteiro. Nosso Rui Barbosa definiu bem a necessidade da imprensa ao afirmar que ela é “a vista da nação. Através dela a nação acompanha o que se passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam ou roubam, percebe onde lhe alvejam ou nodoam, mede o que lhe cerceiam ou destroem, vela pelo que lhe interessa e se acautela do que a ameaça”.
Quanto mais independente do governo, maior será a contribuição da imprensa e da livre-iniciativa ao desenvolvimento do país.
Um comentário:
Ler, ler e ler: cresci ouvindo sobre a importância de se ler.
Meu pai era o homem mais pão-duro que eu já conheci. Já imaginaram secar o pó de café usado para utilizá-lo novamente? Um horror, não é? O velho Waldemar se parecia com o pai da Eugènie Grandet, aquele avarento vinhateiro francês criado pela pena de Balzac.
Mas a pão-durice desaparecia quando o assunto era educação. Estudei em um colégio caro e ele pagava sem reclamar. Comprava todos os livros que eu pedia. Todinhos. "Faça a lista que eu compro no seu Van Damme depois que sair do consultório."
Um pai destes - apesar de ter sido um espanhol meio violento - foi um presente dos deuses.
E homens como o Civita são presentes para uma nação tão assolada por notícias tão vergonhosas.
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