Estamos não só com um homem totalmente despreparado para o exercício do cargo, sem qualquer noção de governança, mas igualmente com uma tropa de aloprados que pode representar décadas de atraso para o Brasil. Pode não: já está representando, dentro e fora do Executivo.
A classe média deve estar profundamente preocupada, com o impasse criado por essa tropa de malucos (os que não se enquadram na tribo lutam bravamente para manter o mínimo de racionalidade e de operacionalidade no governo). Não temos muita esperança de que a coisa melhora, pois segundo o dito popular, pau que nasce torto...
Não sou responsável pelo desastre, e tenho me esforçado para fazer alertas gerais contra as maiores loucuras e impropriedades. Sinto pelo país, passando vergonha aqui dentro e lá fora...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9 de junho de 2019
Bolsonaro e a égide do excesso
Inebriado de muitas vontades e pouco tutano nas ideias, o presidente proclama um futuro tão forte na realização atabalhoada quanto arriscado nas consequências
Veja, Kissinger cita outros tantos exemplos, inclusive do próprio Nixon, a quem serviu como ponte no restabelecimento das relações diplomáticas com a China. Mas as pretensões, se não tão claramente definidas para o próprio presidente, mas certamente por gente que o rodeia, acho que passeiam pelas inspirações possíveis acima mencionadas, nos termos gerais de reforma e cosmovisão. Isso para o pessoal que confunde política com RPG no Planalto. Sigamos.
A verdade, assinala o velho conselheiro de presidentes, é que poucos na história são capazes de feitos dessa magnitude. Quer dizer, de construir pontes com o porvir, de estabelecer, organizar e liderar hoje a construção de um legado.
Imaginemos que o presidente Jair Bolsonaro tenha em sua mente um panorama desse futuro para o Brasil e sabe exatamente como prepará-lo. Não é demais imaginar, pela atuação do governo nos últimos cinco meses, que o excesso é a égide desse futuro, a desmesura, o ímpeto aliado a escassez de reflexão.
A húbris bolsonarista se manifesta, por exemplo, quando o presidente vai até o Congresso despachar um projeto que abranda leis de trânsito — dando o fim ao exame toxicológico para motoristas profissionais (é a legalização do arrebite) e concedendo permissão de direção mesmo a motoristas que tenham atingido o limites de pontos na CNH — um ramo da vida moderna que ceifa, segundo dados do Ministério da Saúde de 2016, cerca de 40 mil vidas por ano no Brasil —, sem qualquer embasamento a não ser o desprezo pelos limites; Isso no mesmo dia em que caduca a medida provisória do marco regulatório do saneamento básico, essa sim, uma sinalização clara de compromisso com as gerações futuras. Quem disso usa, disso cuida. Dessa articulação pró-meio ambiente o governo resolveu largar mão.
Há uma bom exemplo desse pacto na previsão do Ministério dos Transportes de investir até R$ 100 bilhões nas rodovias nacionais nos próximos quatro anos. É uma notícia alvissareira para quem se arrisca dirigindo nesse país, como os caminhoneiros a quem volta e meia o governo recorre ou se acanha. A qualidade das estradas também concorre para a redução dos acidentes. Mas o que poderia ser o início de um círculo virtuoso foi atropelado pela presunção, pela vaidade de dar, a despeito do que preguem as estatísticas, "o prazer de dirigir" ao motorista brasileiro, esse monumento de responsabilidade e segurança. O argumento do presidente foi explanado numa de suas live, com estética pendida para anúncio da Al Qaeda, como "o cara não é imbecil" de entrar numa curva a oitenta por hora acima do permitido.
Se é verdade que a liderança inspira, como o "racheiro" que põe vidas em risco enquanto alimenta seu prazer de dirigir não vai se sentir premiado e representado por quem alarga os limites de pontos permitidos na CNH, permitindo que ele permaneça nas ruas afiando sua letalidade?
A mesma estratégia de confronto e terra arrasada tem sido executada no Ministério da Educação, de onde sai todo tipo de milacria autoritária e inoperância gerencial, mas nenhuma articulação ou satisfação a respeito do futuro do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), fundamental para o planejamento a longo prazo do MEC.
A força tem sido aplicada no desmonte, no deboche e no desprezo pelos focos de oposição, reais e imaginários, enquanto o que aponta para o futuro e é fundamental para o desenvolvimento social, como a aplicação da Política Nacional de Alfabetização, é deixado à margem. Política essa, aliás, que é lavra do atual governo, assinada em abril passado, e que se bem defendida e afinada junto à sociedade, pode ser um marco importante na educação. A soberba de subjugar os adversários, no entanto, é o que parece mover a instituição.
A tal húbris, coisa dos gregos, a que os romanos chamavam petulantia, com raras exceções não leva ao erro trágico. Dos poucos excessos aqui listados, por exemplo, podem sair aumento de mortes nas estradas, adiamento do processo de universalização do saneamento básico assim como da alfabetização, alicerces de futuros promissores.
Inebriado de muitas vontades e pouco tutano nas ideias, o presidente proclama um futuro tão forte na realização atabalhoada quanto arriscado nas consequências. Podia ouvir Clitemnestra, rainha de Agamemnon, tragédia de Ésquilo, quando recomendou que ‘dominem os conquistadores a soberba/ e não se deixem arrastar pela cobiça/ a temerárias, a sacrílegas pilhagens!/ A luta não termina com a vitória; falta/ a volta, que é metade de um longo caminho’. Como estaremos ao final deste, dirigidos por uma gente tão sem comedimento?
Nenhum comentário:
Postar um comentário