Assista no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=Heb66YWvo24
Ao ensejo da publicação da 2a. edição da obra do embaixador Carlos Henrique Cardim, permito-me reproduzir a resenha que fiz quando da publicação da 1a. edição. Farei nova quando receber o livro recentemente publicado, com acréscimos e atualizações:1849. “Rui Barbosa, diplomata”, Buenos Aires, 6 janeiro 2008, 3 p. Resenha do livro de Carlos Henrique Cardim: A Raiz das Coisas: Rui Barbosa, o Brasil no Mundo (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, 350 p.). Revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA, ano 5, n. 39, janeiro 2008, p. 62). Relação de Publicados n. 811.
Rui Barbosa, diplomata
Carlos Henrique Cardim
A Raiz das Coisas: Rui Barbosa, o Brasil no Mundo
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, 350 p.
O patrono incontestável da diplomacia brasileira é o “sacrossanto” Barão do Rio Branco, que deve figurar num pedestal do Itamaraty, à direita de Deus Pai, sem qualquer concorrente à sua esquerda (e nenhum iconoclasta se apresentou até hoje). No entanto, o famoso Juca Paranhos atingiu a categoria de mito, mais por ter protagonizado algumas bem-sucedidas negociações de fronteiras, numa fase de consolidação dos limites geográficos da pátria, do que por ter formulado, propriamente, as bases conceituais da moderna diplomacia brasileira. Por certo, ele sempre é referido quando se trata da escolha sábia de procurar manter boas relações com o gigante hemisférico, ao mesmo tempo em que se buscava cultivar, numa boa barganha de equilibrista, nossa interação com a Europa, de maneira a preservar o rico patrimônio histórico trazido pelos novos imigrantes da fase pós-escravidão. Isso tudo, alertava o Barão, sem alienar nosso capital de altos e baixos com a Argentina, que ele pretendia o mais alto possível, desde que garantida a “relação especial” com os EUA da era Teddy Roosevelt, o tal que recomendava falar macio, mas carregar um grande porrete para convencer os mais recalcitrantes. Rio Branco nunca o desaprovou, pelo menos explicitamente.
Poucos se dão conta de que Rui Barbosa, o primeiro ministro da Fazenda da República, deveria ser considerado o “pai intelectual” da moderna diplomacia brasileira: ele deixou um legado de posições, hoje devidamente constitucionalizadas nos primeiros artigos da Carta de 1988. Rui nunca foi um diplomata profissional, mas se o fosse, poderia ser facilmente acomodado, com sua figura esguia e franzina, à esquerda de Deus itamaratiano, como um legítimo complemento ao redondo Barão. Esta monografia do Embaixador Cardim comprova que Rui foi muito maior do que o registrado na literatura da nossa política externa, mesmo sem ter deixado alguma grande obra centrada nessa problemática das relações internacionais. Aliás, parece incrível, mas Rui não deixou nenhum livro publicado, sobre qualquer tema, a despeito de suas “obras completas” – na verdade, coletâneas de artigos e textos diversos – perfazerem 160 volumes, cuidadosamente compilados pela Fundação que leva no seu nome no Rio de Janeiro. Foi lá que Cardim mergulhou para escrever a mais completa obra sobre o “diplomata” Rui Barbosa, um orador exímio.
Sua obra de ativo “internacionalista” está dispersa em centenas de artigos, pareceres, discursos, orações e preleções jurídicas, tendo sido jurisconsulto, consultor e advogado das boas causas: defendeu, por exemplo, o direito da primeira mulher que passou no concurso do velho MRE a ingressar na carreira diplomática, numa fase de misoginia explícita contra as poucas e corajosas candidatas. Sua mais importante ação diplomática está contida em telegramas, na condição de chefe da delegação à segunda conferência internacional sobre a paz mundial, realizada na Haia em 1907. Ele fez uma “dobradinha” de alta qualidade com o Barão, que trocava freqüentes impressões com ele, em telegramas cifrados, sobre os rumos dessa conferência e as posições que o Brasil deveria mais convenientemente adotar, em face do verdadeiro monopólio que as grandes potências exerciam sobre a agenda internacional. Cardim selecionou os expedientes e organizou um dossiê abrangente sobre a atividade e o pensamento de Rui em temas internacionais, numa obra que já nasce clássica, se a distinção se aplica.
Sua importância não parece ter sido reconhecida na diplomacia brasileira até recentemente, quando uma sala, com o seu nome, foi inaugurada no novo palácio dos Arcos em Brasília, bem mais conhecido como Itamaraty. Curioso que, a despeito da preeminência do Barão nos anais da Casa, nenhuma de duas pesquisas recentes sobre as grandes personalidades da história brasileira colocou Juca Paranhos entre os cinco primeiros. Em ambas, figura Rui; numa delas em primeiro lugar, um justo reconhecimento pelo seu mérito de verdadeiro modernizador do Brasil, desde cedo um opositor da tutela militar que insistiu em preservar o poder moderador durante a maior parte da República. Cardim nos traz aqui não exatamente o tribuno civilista e defensor da legalidade democrática, mas o defensor da igualdade soberana das nações, que ocupa lugar de destaque na moderna diplomacia brasileira. Poucos são os textos conhecidos dessa vertente diplomática do famoso jurista baiano, que aqui aparecem pela primeira vez resumidos e interpretados por um diplomata bibliófilo, que também é um acadêmico exemplar e um dos grandes editores de livros acadêmicos já conhecidos na história editorial brasileira.
O livro ainda traz belas imagens de época – fotos e uma saborosa iconografia com charges dos mais famosos humoristas brasileiros de um século atrás – e anuncia, além de tudo, novos volumes sobre Rui Barbosa, internacionalista brasileiro, que a Fundação que leva o seu nome publicará. Mas este, já é um livro de coleção...
Paulo Roberto de Almeida
[Buenos Aires, 6 de janeiro de 2008]
Revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA, ano 5, n. 39, janeiro 2008, p. 62). Relação de Publicados n. 811.
===============
Cardim também foi o coordenador da reprodução do intercâmbio telegráfico entre Rui e o Barão do Rio Branco quando da segunda Conferência da Paz da Haia, em 1907, sobre a qual também fiz uma pequena nota:
Centro de História e Documentação Diplomática: II Conferência da Paz, Haia, 1907: a correspondência telegráfica entre o Barão do Rio Branco e Rui Barbosa (Brasília: FUNAG, 2014, 272 p.):
Carlos Henrique Cardim, que apresentou tese e tem livro publicado sobre Rui diplomata, assina um prefácio de 18 páginas para introduzir o intercâmbio mantido a propósito do que ele chama de “estreia do Brasil no mundo”, consubstanciada na defesa da “dignidade da nação”, nas palavras de Rio Branco, que Rui interpretou como defesa intransigente da igualdade soberana das nações, entrando por isso em choque com as posições das nações mais poderosas. Seguem 240 páginas de telegramas entre os dois homens, desde 13 de março, ainda no Brasil, até 26 de dezembro, no Recife, a caminho do Rio, depois dos meses passados em Scheveningen, com trocas diárias de mensagens, informações e impressões de ambos sobre as posições dos demais participantes e sobre a que convinha ao país adotar. Matéria prima indispensável para os estudiosos.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 15 de fevereiro de 2015
Sumário
Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior
Prefácio
Arnaldo Godoy, 11
Apresentação
Nos ombros dos verdadeiros estadistas, Paulo Roberto de Almeida, 19
Introdução
Da construção do Estado à construção da Democracia, 25
Primeira parte: a construção do Estado
O Estado antes da Ordem e da própria Nação, 35
1. As vantagens comparativas de José da Silva Lisboa (Cairu), 43
2. Por uma monarquia constitucional liberal: Hipólito da Costa, 52
3. Civilizar os índios, eliminar o tráfico: José Bonifácio de Andrada e Silva, 66
4. Um Memorial para reformar a nação: Francisco Adolfo de Varnhagen, 77
Segunda parte: a construção da Ordem
Uma Ordem patrimonialista e oligárquica, 97
5. Os liberais conservadores: Bernardo, Paulino e Paranhos, 99
6. Um aristocrata radical: Joaquim Nabuco, 111
7. Bases conceituais da diplomacia: o paradigma Rio Branco, 119
8. O defensor do Estado de Direito: Rui Barbosa, 128
Terceira parte: a construção do Progresso
O Progresso pelo Estado, com o Estado, para o Estado, 141
9. Um empreendedor liberal numa terra de estatistas: Mauá, 150
10. Um inglês imaginário e o nacionalista do petróleo: Monteiro Lobato, 158
11. O revolucionário modernizador: Oswaldo Aranha, 170
12. Duas almas pouco gêmeas: Roberto Simonsen e Eugenio Gudin, 181
Quarta parte: a construção da Democracia
A Democracia carente de união nacional, 193
13. Em busca de uma esquerda democrática: San Tiago Dantas, 196
14. O militante do parlamentarismo: Afonso Arinos de Melo Franco, 209
15. As oportunidades perdidas do Brasil: Roberto Campos, 219
16. O liberalismo social de José Guilherme Merquior, 230
A construção da Nação: um itinerário de 200 anos de história, 253
Posfácio
O que a intelligentsia brasileira construiu em dois séculos de ideias e ações? 261
Referências Bibliográficas para os Construtores da Nação, 269
Nota sobre o autor, 301
Nenhum comentário:
Postar um comentário