...tem cem anos de perdão?
Calma, não estou acusando os nossos estimados russos atuais, pós-soviéticos (será mesmo?), de serem ladrões, longe disso.
Claro, sabemos de alguns poucos que insistem no capitalismo mafioso, na corrupção desenfreada, na promiscuidade entre bens públicos e propriedade privada, nos desvios de justiça, nas manipulações estatais sobre bens públicos e privados, enfim em tudo isso, mas eles são muito poucos, pouquíssimos e absolutamente não são representativos da sociedade e do Estado russo atuais, corretos, honestos, transparentes, todos eles engajados num sistema de mercado luzídio, aberto, concorrencial, limpíssimo. Não podemos confundir as maçãs podres com a caixa de frutas, sobretudo com aquelas que vão para a salada de frutas, apreciada das novas elites, que professam amizade eterna ao Ocidente e aos valores democráticos, que amam a OTAN e tudo o que sai do G7.
Estou me referindo aos bárbaros bolcheviques, que quase cem anos atrás decretaram o calote oficial da dívida externa, confiscaram a propriedade de estrangeiros, capitalistas exploradores e banqueiros sedentos de lucros extraordinários, enfim todos os exploradores capitalistas que foram, finalmente, expropriados pela gloriosa revolução de Outubro, o farol do proletariado que se levantou contra a burguesia, os kulaks e os imperialistas, no que fizeram muito bem.
Ops, parece que agora esses detestáveis personagens do capitalismo monopolista internacional, com a ajuda dos esbirros do FMI e dos seus asseclas colonizados de países dependentes, resolveram se vingar do roubo perpetrado em 1917, e pegaram os camaradas russos de supresa, confiscando todas as riquezas honestamente amealhadas em duas décadas de construção do capitalismo na Rússia.
Durma-se com um barulho desses...
Paulo Roberto de Almeida
Russian Leader Warns, “Get All Money Out Of Western Banks Now!”
CantonDailyLedger
22 Mar 2013
A Ministry of Foreign Affairs (MFA) “urgent bulletin” being sent to Embassies around the world today is advising both Russian citizens and companies to begin divesting their assets from Western banking and financial institutions “immediately” as Kremlin fears grow that both the European Union and United States are preparing for the largest theft of private wealth in modern history.
According to this “urgent bulletin,” this warning is being made at the behest of Prime Minister Medvedev who earlier today warned against the Western banking systems actions against EU Member Cyprus by stating:
“All possible mistakes that could be made have been made by them, the measure that was proposed is of a confiscation nature, and unprecedented in its character. I can’t compare it with anything but … decisions made by Soviet authorities … when they didn’t think much about the savings of their population. But we are living in the 21st century, under market economic conditions. Everybody has been insisting that ownership rights should be respected.”
Medvedev’s statements echo those of President Putin who, likewise, warned about the EU’s unprecedented private asset grab in Cyprus calling it “unjust, unprofessional, and dangerous.”
In our 17 March report “Europe Recoils In Shock After Bankster Raid, US Warned Is Next” we noted how Russian entities have €23-31 billion ($30-$40) in cross-border loans to Cypriot companies tied to Moscow, and €9 billion ($12 billion) on deposit with Cypriot banks [as compared to the €127 billion ($166 billion) being kept in similar circumstances by 60 of the United States largest corporations in offshore accounts to avoid paying American taxes] which are in danger of being confiscated by EU banksters.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
segunda-feira, 25 de março de 2013
Demagogia educacional e mediocridade universitaria: duas marcas registradas do...
... vocês sabem de quem. Diretamente do MECdinossauro, mas ele é o puro resultado da republiqueta dos companheiros, que promoveram um dos maiories idiotas do Brasil, Paulo Freire, a "patrono da educação brasileira". O resto foi feito por ideologia, máfias sindicais de professores e funcionários, militantismo pé de chinelo de ignorantes travestidos em universitários gramscianos, enfim, toda uma malta de promotores ativos da mediocridade universitária e da deterioração da qualidade do ensino, em todos os níveis, do kindergarten ao pós-doc...
O desastre é incommensurável, e o Brasil vai pagar um preço altíssimo por isso. A tendência é que tudo continue a piorar pelo futuro previsível. Se, e a partir de quando (o que é altamente improvável), houver uma correção de rumos, algo que julgo difícil de acontecer, ainda demoraria 10 ou 15 anos para começar a melhorar um pouqinho. Como isso não vai ocorrer em minha vida útil, só posso prenunciar a continuidade do desastre pelo fim dos tempos.
Não se conserta um pau torto facilmente. O mais sensato seria arrancá-lo e plantar outra árvore no lugar, mas parece que isso não vai ocorrer, conhecendo como funcionam as faculdades de pedagogia no Brasil, um viveiro de saúvas freireanas. Não tem jeito, ao que parece.
Se, em matéria de economia sou moderadamente pessimista (ou seja, acredito que o Brasil vai continuar exibindo taxas medíocres de crescimento, se arrastando penosamente em direção à modernidade), em matéria de educação sou absolutamente pessimista, acreditanto que o Brasil vai continuar aceleradamente seu itinerário para trás, destruindo tudo o que de positivo vinha sendo penosamente construído nas décadas anteriores.
Os militantes gramscianos da educação são como os bárbaros de Atila: onde passam semeiam a destruição.
Paulo Roberto de Almeida
Mesmo com cotas, universidades estaduais e federais têm queda de alunos de escolas públicas nos vestibulares. Sabem por quê? Porque o governo escolheu o caminho errado sob o aplauso dos demagogos e o silêncio dos covardes
Reinaldo Azevedo, 25/03/2013
Vejam que coisa! O cotismo não levou mais alunos das escolas estaduais e municipais para os vestibulares das universidades públicas. Não é espantoso? NÃO! É ATÉ BASTANTE ÓBVIO. Vamos a algumas considerações prévias para chegar ao “x” da questão.
Dei destaque ontem aqui a uma reportagem do Globo sobre a situação miserável da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e observei que se tratava de um sintoma apenas. A doença é bem mais grave. Nestes dez anos de governo do PT, a educação é a área em que se produziram mais farsas e mistificações. A pantomima na correção das redações do Enem ilustra de forma debochada e trágica a farsa. Dado o andar da carruagem, vai demorar até que se encontre o caminho — na hipótese de que seja encontrado… Qual é a questão central? Trocou-se a qualidade pela demagogia inclusiva. Os críticos da política oficial certamente não se surpreendem com as reiteradas evidências de baixa qualidade do ensino universitário no país. O que surpreende a todos, inclusive os críticos, é que as medidas ditas redentoras e igualitárias não conseguem ser… inclusivas! Você verão.
Quais são as críticas principais da maioria dos que se opõem às políticas de cotas, pouco importando a sua natureza? Em primeiro lugar, o cotismo nega o fundamento da igualdade consagrado na Carta Magna. Quando o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a medida, abriu as portas para o imponderável. Com apelos malparados a Rui Barbosa, afirmou-se que é preciso, em certas circunstâncias, tratar desigualmente os desiguais. Que seja! Mas isso só é aceitável no caso de se conferirem benefícios suplementares ao “desigual”.
Solapar direitos universais de uma parte dos brasileiros — e as cotas fazem isso à medida que impedem que todos concorram segundo as mesmas regras — para proteger outra parte é um absurdo em si. Se a história de cada um de seus respectivos familiares torna os homens diferentes e se se chega à conclusão de que essas diferenças são social e politicamente determinadas, então que se alterem essas condições. O que não é razoável é que o indivíduo “A” tenha solapado um direito em favor do indivíduo “B” para fazer reparação histórica. Ora, desde o direito romano, a dívida do pai não passa para o filho… Imaginem se faz sentido indivíduos pagarem “dívidas sociais” relacionadas à cor da pele ou à origem de classe. Isso é uma boçalidade e uma violência institucional. Se querem tratar desigualmente os desiguais, reitero, que se deem a esses desiguais benefícios suplementares. Mas esse é só o aspecto que diz respeito à lei. Há outro mais sério.
Os críticos das cotas, raciais ou sociais, sustentam o óbvio, o elementar: é preciso qualificar os ensino fundamental e médio públicos. O cotismo, infelizmente, concorre para fazer o contrário: à medida que as vagas estão “garantidas”, é evidente que diminui a pressão sobre a escola pública e seus agentes. “Ah, mas melhorar a escola púbica vai levar muito tempo…” Bem, quanto mais tarde começar, pior. De resto, o fato de uma ação correta não ter um efeito imediato não confere licença para se fazer a coisa errada.
Cotas irrelevantes
Leiam o que informa Erika Fraga, na Folha desta segunda (em vermelho):
Entre dez universidades que enviaram dados à Folha, USP e Unicamp (São Paulo), UERJ (Rio de Janeiro) e UFMG (Minas Gerais) registraram queda no percentual de vestibulandos formados na rede pública de ensino. Em outras três universidades, a fatia se alterou pouco. Os alunos das públicas ainda são minoria na maior parte dos vestibulares das instituições públicas, embora representem 85% dos que concluem o ensino médio no país, percentual que aumentou na última década. As universidades federais de Santa Catarina (UFSC) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) estão entre as que tiveram aumento de alunos das escolas públicas em seus vestibulares.
Ainda assim, Júlio Felipe Szeremeta, presidente da comissão de vestibular da UFSC, diz que “não houve o boom esperado”. Em 2012, o percentual de vestibulandos de escolas públicas atingiu 37,5% na UFSC. “Imaginávamos que o percentual de vestibulandos de escola pública já teria chegado a 50%.” Já na Universidade Federal da Bahia (UFBA) houve queda no número de inscritos no vestibular saídos de escolas públicas após a adoção do regime de cotas em 2005. A tendência só foi revertida a partir de 2010, depois de um aumento no número de cursos noturnos de 1 para 33.
(…)
Voltei
Notem que não só não houve aumento como pode ainda haver queda, como no caso da UFBA — só se conseguiu reverter a tendência com cursos noturnos. Isso tudo faz sentido? Faz um brutal sentido! O próprio aluno oriundo do ensino médio público sabe que, na maioria das vezes, está despreparado para enfrentar alguns desafios. Sabe a escola em que estudou; conhece todos os seus defeitos.
Houve crescimento do número de universitários do país? Houve, sim, embora tenham ficado muito abaixo da meta. Em 2001, havia 3 milhões de estudantes matriculados nas universidades do país (públicas e privadas); no fim de 2010, eram 6,37 milhões, segundo o Censo Universitário do MEC. Mas calma!!! Nada menos de 14,7% desse total (quase um milhão) está matriculado na modalidade “ensino a distância” Com raras exceções, esse troço virou, no Brasil, um caça-níqueis ainda mais vantajoso do que instituições de ensino meia-bomba que vendem suas vagas para o ProUni. Não passa de picaretagem! A meta do Plano Nacional de Educação, estabelecida em 2000, era chegar a 2010 com 33% dos jovens de 18 a 24 anos na universidade. Segundo o Censo, o governo do Apedeuta ficou bem longe disso: apenas 17,4%. E está nesse patamar até hoje.
Como se explica?
O crescimento está abaixo da meta, mas cresceu. Para onde foram os alunos? Para as instituições privadas, boa parte deles financiada pelo ProUni. É claro que existem instituições qualificadas. Infelizmente, não é a regra, e parcela considerável dos estudantes que buscam essas instituições quer um curso à altura do ensino fundamental e médio que teve — sendo ainda mais claro: prefere uma universidade privada e ruim (o ProUni pagará a conta) a uma pública e com mais qualidade (escrever “boa” talvez seja exagero). Voltamos, então, o “x” da questão. Desde sempre, o grande desafio é qualificar o ensino fundamental e médio públicos.
E que se observe: é mentira que não haja alunos de escolas públicas nas instituições universitárias também públicas. Há, sim! A questão é saber onde estão. Não tenho os números aqui, mas estou certo de que são mais presentes em cursos como pedagogia, história, geografia, letras, sociologia e filosofia, para citar alguns… E raros em engenharia, medicina e odontologia. De toda sorte, os números estão a indicar que as cotas não causaram uma elevação da demanda nas universidades públicas nem naquelas carreiras que não requerem tempo integral. São as instituições privadas, por conta do ProUni, que abrigam a massa de estudantes pobres.
Reserva de vagas
Por força de lei, as universidades federais terão de reservar 50% de suas vagas a alunos das escolas públicas em todos os cursos, obedecendo depois a critérios de cor de pele. É o “jeitinho PT” de fazer as coisas. Como se considera, no fim das contas, que o problema do ensino fundamental e médio públicos é mesmo insanável, busca-se “fazer justiça” na ponta, lá na universidade — que é feita para os mais aptos em qualquer país do mundo, nos EUA, na China ou em Cuba…
Quando estiver em pleno funcionamento, haverá o risco de sobrar vagas daquela metade reservada aos alunos da escola pública. Hoje, como mostra o levantamento, eles já poderiam ser mais presentes nas universidades federais e estaduais, mas, tudo indica, têm preferido as instituições privadas por intermédio do ProUni porque, com alguma frequência, esses cursos se transformaram numa espécie de cartório. Um cartório que custa caro!
É evidente que aqueles que criticam as cotas e pedem a elevação da qualidade do ensino público estão certos. É claro que não é fácil. Para tanto, precisávamos ter governos comprometidos com a educação, não com a demagogia eleitoreira. Sim, demoraria um pouquinho, eu sei. Mas esse é “pouquinho” é nada quando confrontado com a danação eterna a que está hoje condenada a educação.
O desastre é incommensurável, e o Brasil vai pagar um preço altíssimo por isso. A tendência é que tudo continue a piorar pelo futuro previsível. Se, e a partir de quando (o que é altamente improvável), houver uma correção de rumos, algo que julgo difícil de acontecer, ainda demoraria 10 ou 15 anos para começar a melhorar um pouqinho. Como isso não vai ocorrer em minha vida útil, só posso prenunciar a continuidade do desastre pelo fim dos tempos.
Não se conserta um pau torto facilmente. O mais sensato seria arrancá-lo e plantar outra árvore no lugar, mas parece que isso não vai ocorrer, conhecendo como funcionam as faculdades de pedagogia no Brasil, um viveiro de saúvas freireanas. Não tem jeito, ao que parece.
Se, em matéria de economia sou moderadamente pessimista (ou seja, acredito que o Brasil vai continuar exibindo taxas medíocres de crescimento, se arrastando penosamente em direção à modernidade), em matéria de educação sou absolutamente pessimista, acreditanto que o Brasil vai continuar aceleradamente seu itinerário para trás, destruindo tudo o que de positivo vinha sendo penosamente construído nas décadas anteriores.
Os militantes gramscianos da educação são como os bárbaros de Atila: onde passam semeiam a destruição.
Paulo Roberto de Almeida
Mesmo com cotas, universidades estaduais e federais têm queda de alunos de escolas públicas nos vestibulares. Sabem por quê? Porque o governo escolheu o caminho errado sob o aplauso dos demagogos e o silêncio dos covardes
Reinaldo Azevedo, 25/03/2013
Vejam que coisa! O cotismo não levou mais alunos das escolas estaduais e municipais para os vestibulares das universidades públicas. Não é espantoso? NÃO! É ATÉ BASTANTE ÓBVIO. Vamos a algumas considerações prévias para chegar ao “x” da questão.
Dei destaque ontem aqui a uma reportagem do Globo sobre a situação miserável da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e observei que se tratava de um sintoma apenas. A doença é bem mais grave. Nestes dez anos de governo do PT, a educação é a área em que se produziram mais farsas e mistificações. A pantomima na correção das redações do Enem ilustra de forma debochada e trágica a farsa. Dado o andar da carruagem, vai demorar até que se encontre o caminho — na hipótese de que seja encontrado… Qual é a questão central? Trocou-se a qualidade pela demagogia inclusiva. Os críticos da política oficial certamente não se surpreendem com as reiteradas evidências de baixa qualidade do ensino universitário no país. O que surpreende a todos, inclusive os críticos, é que as medidas ditas redentoras e igualitárias não conseguem ser… inclusivas! Você verão.
Quais são as críticas principais da maioria dos que se opõem às políticas de cotas, pouco importando a sua natureza? Em primeiro lugar, o cotismo nega o fundamento da igualdade consagrado na Carta Magna. Quando o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a medida, abriu as portas para o imponderável. Com apelos malparados a Rui Barbosa, afirmou-se que é preciso, em certas circunstâncias, tratar desigualmente os desiguais. Que seja! Mas isso só é aceitável no caso de se conferirem benefícios suplementares ao “desigual”.
Solapar direitos universais de uma parte dos brasileiros — e as cotas fazem isso à medida que impedem que todos concorram segundo as mesmas regras — para proteger outra parte é um absurdo em si. Se a história de cada um de seus respectivos familiares torna os homens diferentes e se se chega à conclusão de que essas diferenças são social e politicamente determinadas, então que se alterem essas condições. O que não é razoável é que o indivíduo “A” tenha solapado um direito em favor do indivíduo “B” para fazer reparação histórica. Ora, desde o direito romano, a dívida do pai não passa para o filho… Imaginem se faz sentido indivíduos pagarem “dívidas sociais” relacionadas à cor da pele ou à origem de classe. Isso é uma boçalidade e uma violência institucional. Se querem tratar desigualmente os desiguais, reitero, que se deem a esses desiguais benefícios suplementares. Mas esse é só o aspecto que diz respeito à lei. Há outro mais sério.
Os críticos das cotas, raciais ou sociais, sustentam o óbvio, o elementar: é preciso qualificar os ensino fundamental e médio públicos. O cotismo, infelizmente, concorre para fazer o contrário: à medida que as vagas estão “garantidas”, é evidente que diminui a pressão sobre a escola pública e seus agentes. “Ah, mas melhorar a escola púbica vai levar muito tempo…” Bem, quanto mais tarde começar, pior. De resto, o fato de uma ação correta não ter um efeito imediato não confere licença para se fazer a coisa errada.
Cotas irrelevantes
Leiam o que informa Erika Fraga, na Folha desta segunda (em vermelho):
Entre dez universidades que enviaram dados à Folha, USP e Unicamp (São Paulo), UERJ (Rio de Janeiro) e UFMG (Minas Gerais) registraram queda no percentual de vestibulandos formados na rede pública de ensino. Em outras três universidades, a fatia se alterou pouco. Os alunos das públicas ainda são minoria na maior parte dos vestibulares das instituições públicas, embora representem 85% dos que concluem o ensino médio no país, percentual que aumentou na última década. As universidades federais de Santa Catarina (UFSC) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) estão entre as que tiveram aumento de alunos das escolas públicas em seus vestibulares.
Ainda assim, Júlio Felipe Szeremeta, presidente da comissão de vestibular da UFSC, diz que “não houve o boom esperado”. Em 2012, o percentual de vestibulandos de escolas públicas atingiu 37,5% na UFSC. “Imaginávamos que o percentual de vestibulandos de escola pública já teria chegado a 50%.” Já na Universidade Federal da Bahia (UFBA) houve queda no número de inscritos no vestibular saídos de escolas públicas após a adoção do regime de cotas em 2005. A tendência só foi revertida a partir de 2010, depois de um aumento no número de cursos noturnos de 1 para 33.
(…)
Voltei
Notem que não só não houve aumento como pode ainda haver queda, como no caso da UFBA — só se conseguiu reverter a tendência com cursos noturnos. Isso tudo faz sentido? Faz um brutal sentido! O próprio aluno oriundo do ensino médio público sabe que, na maioria das vezes, está despreparado para enfrentar alguns desafios. Sabe a escola em que estudou; conhece todos os seus defeitos.
Houve crescimento do número de universitários do país? Houve, sim, embora tenham ficado muito abaixo da meta. Em 2001, havia 3 milhões de estudantes matriculados nas universidades do país (públicas e privadas); no fim de 2010, eram 6,37 milhões, segundo o Censo Universitário do MEC. Mas calma!!! Nada menos de 14,7% desse total (quase um milhão) está matriculado na modalidade “ensino a distância” Com raras exceções, esse troço virou, no Brasil, um caça-níqueis ainda mais vantajoso do que instituições de ensino meia-bomba que vendem suas vagas para o ProUni. Não passa de picaretagem! A meta do Plano Nacional de Educação, estabelecida em 2000, era chegar a 2010 com 33% dos jovens de 18 a 24 anos na universidade. Segundo o Censo, o governo do Apedeuta ficou bem longe disso: apenas 17,4%. E está nesse patamar até hoje.
Como se explica?
O crescimento está abaixo da meta, mas cresceu. Para onde foram os alunos? Para as instituições privadas, boa parte deles financiada pelo ProUni. É claro que existem instituições qualificadas. Infelizmente, não é a regra, e parcela considerável dos estudantes que buscam essas instituições quer um curso à altura do ensino fundamental e médio que teve — sendo ainda mais claro: prefere uma universidade privada e ruim (o ProUni pagará a conta) a uma pública e com mais qualidade (escrever “boa” talvez seja exagero). Voltamos, então, o “x” da questão. Desde sempre, o grande desafio é qualificar o ensino fundamental e médio públicos.
E que se observe: é mentira que não haja alunos de escolas públicas nas instituições universitárias também públicas. Há, sim! A questão é saber onde estão. Não tenho os números aqui, mas estou certo de que são mais presentes em cursos como pedagogia, história, geografia, letras, sociologia e filosofia, para citar alguns… E raros em engenharia, medicina e odontologia. De toda sorte, os números estão a indicar que as cotas não causaram uma elevação da demanda nas universidades públicas nem naquelas carreiras que não requerem tempo integral. São as instituições privadas, por conta do ProUni, que abrigam a massa de estudantes pobres.
Reserva de vagas
Por força de lei, as universidades federais terão de reservar 50% de suas vagas a alunos das escolas públicas em todos os cursos, obedecendo depois a critérios de cor de pele. É o “jeitinho PT” de fazer as coisas. Como se considera, no fim das contas, que o problema do ensino fundamental e médio públicos é mesmo insanável, busca-se “fazer justiça” na ponta, lá na universidade — que é feita para os mais aptos em qualquer país do mundo, nos EUA, na China ou em Cuba…
Quando estiver em pleno funcionamento, haverá o risco de sobrar vagas daquela metade reservada aos alunos da escola pública. Hoje, como mostra o levantamento, eles já poderiam ser mais presentes nas universidades federais e estaduais, mas, tudo indica, têm preferido as instituições privadas por intermédio do ProUni porque, com alguma frequência, esses cursos se transformaram numa espécie de cartório. Um cartório que custa caro!
É evidente que aqueles que criticam as cotas e pedem a elevação da qualidade do ensino público estão certos. É claro que não é fácil. Para tanto, precisávamos ter governos comprometidos com a educação, não com a demagogia eleitoreira. Sim, demoraria um pouquinho, eu sei. Mas esse é “pouquinho” é nada quando confrontado com a danação eterna a que está hoje condenada a educação.
O fascismo em construcao no Brasil: o Estado administra a sua vida...
Este é mais um aspecto do fascismo em construção no Brasil, que vem sendo aceito passivamente pela sociedade. Além de termos um Estado babá, que pretende nos resguardar de certos perigos, para o nosso prórpio bem, temos o Estado feitor, que pretende ditar condutas e nos obrigar a certas coisas, contra nossa própria vontade.
Mentalidades fascistas acham que podem controlar o que fazemos. E conseguem, em certa medida. Depois vão querer controlar o que pensamos...
Paulo Roberto de Almeida
Aparentemente,
o título deste artigo não faria nenhum sentido, considerando a época em
que vivemos, na qual a pesquisa científica goza de uma ampla liberdade,
garantida por universidades e institutos de pesquisa. Vai longe o tempo
em que Giordano Bruno e Galileu foram condenados à morte, no caso do
primeiro, com requintes da fogueira pública.
No entanto, a liberdade de que goza a pesquisa científica vem tendo um contraponto na utilização pelo Estado dos produtos dessa mesma pesquisa. Isso é particularmente visível no uso da ciência por políticas públicas de saúde, como se a certeza do conhecimento devesse traduzir-se por um controle "científico" do comportamento humano. Resultados de pesquisas ou, muitas vezes, meras hipóteses não verificadas são utilizados como instrumentos de ações governamentais, como se assim estivessem justificados.
Tais ações públicas estão particularmente presentes nas políticas conduzidas contra alimentos gordurosos, bebidas açucaradas, bebidas alcoólicas ou cultivo e consumo de tabaco. Governos arrogam-se direitos de intervenção na vida dos cidadãos, supostamente amparados no conhecimento científico. A justificação da restrição das liberdades não seria, então, arbitrária, mas científica. A dominação mudou de nome.
É próprio do progresso científico que seus resultados sejam tornados públicos, vindo a balizar, no caso, a vida das pessoas se elas optarem por seguir esse conhecimento adquirido. Se elas optarem, não se trata, ou não deveria tratar-se, de uma obrigação imposta pelo Estado.
A diferença é de monta. Uma coisa é as pessoas, de posse de certos conhecimentos, optarem por não consumir determinado produto por considerá-lo prejudicial à sua saúde. Nesse sentido, seria função do Estado informar os cidadãos sobre malefícios reais ou prováveis à saúde das pessoas do consumo de tais produtos. Outra, muito diferente, é o Estado impor determinadas condutas restritivas da liberdade de escolha, em nome de um conhecimento científico apropriado pelo governo com vista a seus fins específicos. Os cidadãos seriam despojados de sua liberdade de escolha.
Consequentemente, estaríamos diante de algo extremamente perigoso, a saber, a administração da vida. Pior ainda, a administração "científica" da vida. Cidadãos tutelados são cidadãos administrados, incapazes de discernir por si mesmos o que é "bom" para eles.
A pior administração é a que se diz "verdadeira", "científica", como se coubesse ao Estado optar no lugar dos cidadãos. Cidadãos administrados cientificamente tendem a se tornar servos do Estado. A eles é reservado um lugar específico, o de serem destituídos do conhecimento "verdadeiro", esse que lhes é imposto à sua revelia.
A comunidade científica, à medida que avança no terreno do político, começa a abandonar o seu terreno próprio, vindo a se tornar uma parte do problema, em vez de poder ser um elemento de sua solução. No momento em que entra na seara da política, ela corre o risco de colocar o seu próprio trabalho sub judice.
Melhor fariam os cientistas em avançar em suas pesquisas, mostrando, por exemplo, os elementos e produtos eventualmente prejudiciais à saúde dos indivíduos. Não lhes compete uma conduta de "cruzados" pelo controle "científico" dos cidadãos. Cidadãos devem ser informados, não tutelados. A sua liberdade de escolha deve ser, antes de tudo, preservada, tratando-se de um direito fundamental do ser humano.
A ideia de que caberia ao Estado simplesmente administrar a vida dos cidadãos segundo critérios "verdadeiros" não é nova, tendo produzido historicamente resultados catastróficos. Está amparada numa concepção de que o Estado, graças à sua "sapiência", sabe o que é melhor para os cidadãos, que não têm o alcance desse discernimento.
Em sua forma extrema, ela foi concebida e levada a efeito na extinta União Soviética, que sucumbiu, aliás, ao seu excesso de "verdade" e de "conhecimento". Bukharin, dileto discípulo de Lenin e destacado teórico bolchevique, chegou a escrever que num Estado de uma sociedade sem classes - logo, o Estado "bom" e "verdadeiro" - a sua função essencial seria somente "administrar" a sociedade e os cidadãos.
Tal administração seria, então, conduzida por burocratas "sapientes", "científicos", convenientemente doutrinados, que saberiam impor aos cidadãos o que seria melhor para eles. E não apenas a contragosto, mas pelo uso da força e da imposição, se necessário.
O direito de ser obeso é um direito fundamental, se assim a pessoa optar. Não se trata de impor aos que estão acima do peso considerado normal determinada conduta, que termina, ademais, atingindo todos os cidadãos. Em nome da suposta saúde dos obesos, todos os cidadãos, magros ou não, seriam obrigados a não mais consumir certos produtos.
O direito de beber, mesmo até a embriaguez, se ela não perturbar o próximo, é também um direito fundamental, o exercício que qualquer cidadão faz do seu gosto, sem nenhuma restrição. Cabe, evidentemente, ao Estado informar os cidadãos sobre os malefícios do seu consumo excessivo.
O direito de fumar - assim como a produção de tabaco é um direito proveniente da livre-iniciativa econômica, garantida, aliás, pela Constituição federal - é igualmente um direito fundamental. Proveniente que é da liberdade de escolha, pode ou não ser exercido pelos cidadãos que encontram prazer em fazê-lo. Evidentemente, fumantes não devem importunar o próximo, pois violariam a liberdade deste.
A fogueira, simbolicamente falando, está voltando em algo que se está tornando uma espécie de guerra contra alimentos gordurosos, bebidas alcoólicas, refrigerantes e tabaco. São os novos bodes expiatórios dos que temem a liberdade de escolha. Não nos enganemos: por meio desses produtos e suas proibições, são as liberdades individuais e de escolha que são visadas.
Mentalidades fascistas acham que podem controlar o que fazemos. E conseguem, em certa medida. Depois vão querer controlar o que pensamos...
Paulo Roberto de Almeida
Ciência e liberdades
o Estado de S.Paulo, 25 de março de 2013
Denis Lerrer Rosenfield *
No entanto, a liberdade de que goza a pesquisa científica vem tendo um contraponto na utilização pelo Estado dos produtos dessa mesma pesquisa. Isso é particularmente visível no uso da ciência por políticas públicas de saúde, como se a certeza do conhecimento devesse traduzir-se por um controle "científico" do comportamento humano. Resultados de pesquisas ou, muitas vezes, meras hipóteses não verificadas são utilizados como instrumentos de ações governamentais, como se assim estivessem justificados.
Tais ações públicas estão particularmente presentes nas políticas conduzidas contra alimentos gordurosos, bebidas açucaradas, bebidas alcoólicas ou cultivo e consumo de tabaco. Governos arrogam-se direitos de intervenção na vida dos cidadãos, supostamente amparados no conhecimento científico. A justificação da restrição das liberdades não seria, então, arbitrária, mas científica. A dominação mudou de nome.
É próprio do progresso científico que seus resultados sejam tornados públicos, vindo a balizar, no caso, a vida das pessoas se elas optarem por seguir esse conhecimento adquirido. Se elas optarem, não se trata, ou não deveria tratar-se, de uma obrigação imposta pelo Estado.
A diferença é de monta. Uma coisa é as pessoas, de posse de certos conhecimentos, optarem por não consumir determinado produto por considerá-lo prejudicial à sua saúde. Nesse sentido, seria função do Estado informar os cidadãos sobre malefícios reais ou prováveis à saúde das pessoas do consumo de tais produtos. Outra, muito diferente, é o Estado impor determinadas condutas restritivas da liberdade de escolha, em nome de um conhecimento científico apropriado pelo governo com vista a seus fins específicos. Os cidadãos seriam despojados de sua liberdade de escolha.
Consequentemente, estaríamos diante de algo extremamente perigoso, a saber, a administração da vida. Pior ainda, a administração "científica" da vida. Cidadãos tutelados são cidadãos administrados, incapazes de discernir por si mesmos o que é "bom" para eles.
A pior administração é a que se diz "verdadeira", "científica", como se coubesse ao Estado optar no lugar dos cidadãos. Cidadãos administrados cientificamente tendem a se tornar servos do Estado. A eles é reservado um lugar específico, o de serem destituídos do conhecimento "verdadeiro", esse que lhes é imposto à sua revelia.
A comunidade científica, à medida que avança no terreno do político, começa a abandonar o seu terreno próprio, vindo a se tornar uma parte do problema, em vez de poder ser um elemento de sua solução. No momento em que entra na seara da política, ela corre o risco de colocar o seu próprio trabalho sub judice.
Melhor fariam os cientistas em avançar em suas pesquisas, mostrando, por exemplo, os elementos e produtos eventualmente prejudiciais à saúde dos indivíduos. Não lhes compete uma conduta de "cruzados" pelo controle "científico" dos cidadãos. Cidadãos devem ser informados, não tutelados. A sua liberdade de escolha deve ser, antes de tudo, preservada, tratando-se de um direito fundamental do ser humano.
A ideia de que caberia ao Estado simplesmente administrar a vida dos cidadãos segundo critérios "verdadeiros" não é nova, tendo produzido historicamente resultados catastróficos. Está amparada numa concepção de que o Estado, graças à sua "sapiência", sabe o que é melhor para os cidadãos, que não têm o alcance desse discernimento.
Em sua forma extrema, ela foi concebida e levada a efeito na extinta União Soviética, que sucumbiu, aliás, ao seu excesso de "verdade" e de "conhecimento". Bukharin, dileto discípulo de Lenin e destacado teórico bolchevique, chegou a escrever que num Estado de uma sociedade sem classes - logo, o Estado "bom" e "verdadeiro" - a sua função essencial seria somente "administrar" a sociedade e os cidadãos.
Tal administração seria, então, conduzida por burocratas "sapientes", "científicos", convenientemente doutrinados, que saberiam impor aos cidadãos o que seria melhor para eles. E não apenas a contragosto, mas pelo uso da força e da imposição, se necessário.
O direito de ser obeso é um direito fundamental, se assim a pessoa optar. Não se trata de impor aos que estão acima do peso considerado normal determinada conduta, que termina, ademais, atingindo todos os cidadãos. Em nome da suposta saúde dos obesos, todos os cidadãos, magros ou não, seriam obrigados a não mais consumir certos produtos.
O direito de beber, mesmo até a embriaguez, se ela não perturbar o próximo, é também um direito fundamental, o exercício que qualquer cidadão faz do seu gosto, sem nenhuma restrição. Cabe, evidentemente, ao Estado informar os cidadãos sobre os malefícios do seu consumo excessivo.
O direito de fumar - assim como a produção de tabaco é um direito proveniente da livre-iniciativa econômica, garantida, aliás, pela Constituição federal - é igualmente um direito fundamental. Proveniente que é da liberdade de escolha, pode ou não ser exercido pelos cidadãos que encontram prazer em fazê-lo. Evidentemente, fumantes não devem importunar o próximo, pois violariam a liberdade deste.
A fogueira, simbolicamente falando, está voltando em algo que se está tornando uma espécie de guerra contra alimentos gordurosos, bebidas alcoólicas, refrigerantes e tabaco. São os novos bodes expiatórios dos que temem a liberdade de escolha. Não nos enganemos: por meio desses produtos e suas proibições, são as liberdades individuais e de escolha que são visadas.
* Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na UFRGS. E-mail: denisrosenfield@terra.com.br.
Como se criam mafias sindicais - Almir Pazzianotto
Governos e sindicatos, relações bastardas
O Estado de S.Paulo, 25 de março de 2013
Almir Pazzianotto Pinto *
A aproximação entre Vargas e Jango iniciou-se no final de 1945, quando o presidente, deposto no dia 29 de outubro pelos generais, foi confinado na estância de Itu, no município de São Borja (RS), vizinha da propriedade da família Goulart. Partiu daí a transformação do jovem criador de gado em político do PTB gaúcho, pelo qual se tornou deputado estadual em 1947, deputado federal em 1950, presidente nacional do partido em 1952 e ministro do Trabalho em 1953.
Convocado por Vargas - que voltara ao Catete eleito presidente da República em 1951- para fortalecer vínculos com o movimento sindical, Jango "tornou-se figura de destaque e árbitro dos conflitos entre os trabalhistas, ao mesmo tempo que, em estreita ligação com Vargas, passava a controlar os principais cargos de chefia na Previdência Social". Simultaneamente, empenhava-se na tarefa de atribuir importância nacional às organizações sindicais, "de forma a constituir uma força que pudesse dar respaldo ao presidente, atingido, no segundo ano do governo, pelos efeitos da crise política, latente desde o período eleitoral" (Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, volume III).
Desde a Carta Constitucional de 1937, sob a qual foi redigida a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), governo e sindicatos cultivam relações bastardas. Relata João Pinheiro Neto, no livro Jango, um Depoimento Pessoal (Ed. Record), que, quando ministro do Trabalho, várias vezes Goulart lhe disse: "Tu, que és menino inteligente, diga a esses homens (referia-se às lideranças sindicais) que não forcem demais, que me deixem um pouco tranquilo". E acrescentava: "Podes anotar: se me apertarem demais e eu cair, virá por aí uma ditadura militar que vai durar vinte anos. E, quando isso acontecer, os nossos líderes sindicais não poderão andar nem na rua..." O temor de quem se sentia acossado, e não dispunha de força para resistir ao assédio sindical, era profético. E seria confirmado pelos fatos.
A promiscuidade com o peleguismo foi obra de Vargas, exímio na arte de manipulá-lo. Jango não aprendeu com o mestre e (na Presidência da República) se deixou envolver por dirigentes ambiciosos, que imaginavam assumir o domínio do País a partir de movimentos grevistas, como o deflagrado em outubro de 1963 por 77 sindicatos e quatro federações estaduais, representantes de metalúrgicos, têxteis, gráficos, marceneiros, químicos-farmacêuticos, liderados pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), controlada por aliança entre PTB e PCB.
Apoiada abertamente por Jango e Amaury Silva, ministro do Trabalho, a "greve dos 700 mil" não resistiu à intervenção do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, acionado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Mas eliminou a escassa confiança do setor patronal no propalado espírito cordato e conciliador do presidente.
O golpe de 31 de março de 1964 provocou total desarticulação do sindicalismo comuno-petebista. Entre os primeiros cem cujos direitos políticos foram suspensos por dez anos pelo Ato Institucional n.º 1 (de 9/4/64) do Comando Supremo da Revolução, 40 eram sindicalistas, entre os quais Clodesmith Riani, Dante Pellacani e Hércules Corrêa, diretores da CNTI e líderes do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT). Para ocupar os postos deixados pelos cassados o governo nomeou interventores como Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzão, que seria presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo.
A truculência do governo militar provocou a substituição dos protagonistas da promiscuidade. Em vez de sindicalistas ligados à denominada esquerda progressista, o que se observou foi a brusca ascensão de elementos das oposições na chefia de sindicatos, federações e confederações, em íntima colaboração com o Ministério do Trabalho, que lhes garantia sucessivas reeleições e os alimentava com o Imposto Sindical.
Em 1946 e 1988 perderam-se duas excelentes oportunidades de moralização do movimento sindical. O artigo 8.º (da Constituição de 88), o pior texto da história nessa matéria, afastou o poder de intervenção direta do Estado, mas conservou o sistema confederativo, a divisão de empregadores e empregados em categorias, o monopólio de representação, a contribuição sindical obrigatória para não associados, o registro no Ministério do Trabalho.
Governo e sindicatos cultivam relações bastardas. O primeiro, porque lhe dão tranquilidade, capacidade de controle e apoio eleitoral. Quanto aos segundos, tiram o máximo proveito da promiscuidade: recebem polpudas ajudas em dinheiro público, gozam de prestígio político, interferem na escolha de ministros, têm livre acesso a palácios e ministérios. Ser dirigente sindical próximo do governo é a melhor posição que alguém pode almejar, por trazer vantagens sem gerar preocupações.
A presidente Dilma Rousseff havia adotado postura austera e firme diante das centrais. Buscou, aparentemente, fazer que entendessem haver larga distância entre interesses pessoais de dirigentes, ávidos de dinheiro ou de ascensão política, e relevantes projetos nacionais, como tornar a economia competitiva no mundo globalizado, começando pela reforma dos portos e aeroportos. Mas, aconselhada pelo ex-presidente Lula, deu um passo atrás e as reconduziu a lugar de honra no Planalto. O primeiro fruto da reaproximação consiste na atitude da Força Sindical, autora de manifestações contra a privatização de terminais portuários, prevista na Medida Provisória 595, em tramitação no Poder Legislativo.
S. Exa. poderia dedicar algumas horas à história do trabalhismo janguista, e certamente concluirá que relações incestuosas, com o peleguismo, jamais trarão resultados benéficos ao País.
* Almir Pazzianotto Pinto é advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho.
O ogro famelico perde uma sobremesa: PIS-Cofins sobre importados
Desde 2004, quando foi instituído esse tributo, eu, que não sou nem tributarista e sequer advogado, sem entender nada de leis ou do irracional sistema tributário brasileiro, me posicionava contra essa exorbitância do Executivo, ao pretender cobrar Pis-Cofins sobre produtos importados, a pretexto (algo ainda mais absurdo) de "isonomia com a produção nacional".
Continuo não entendendo nada do que existe, mas meu raciocínio é muito simples, e segue a lógica elementar dos meios e fins: se o PIS-Cofins foi instituído para o financiamento da seguridade social no Brasil, como cobrar algo que JAMAIS será usado em benefício dos supostos produtores e trabalhadores que "colaboraram" na confecção do produto em si, que no caso foi produzido externamente. A menos que o Brasil pretendesse redistribuir o imposto aos produtores originais, para que estes financiassem os gastos de seus governos com a infraestrutura e logística da produção estrangeira, não havia sentido, e era claramente ilegal, e inconstitucional, tal cobrança.
A "isonomia" solicitada era um escárnio, já que os produtores nacionais podem ser solicitados a pagar, sobre seus produtos e serviços colocados no mercado, novos impostos sobre quaisquer supostos serviços que o Estado promete oferecer à cidadania -- por exemplo, passar a oferecer internet grátis a todo e qualquer passante -- e assim se achar no direito de cobrar mais alguma taxa por esse "serviço" oferecido ao distinto público (supondo-se que ele não estivesse já incluído em algum imposto anterior existente). Então, os produtos importados teriam também, para fins de "isonomia" passar a ser taxados como os nacionais? Os absurdos nacionais têm de ser repassados aos estrangeiros?
O manicômio tributário brasileiro ainda não foi abalado, sequer arranhado, mas um dia os brasileiros vão descobrir que o ogro famélico avança cada vez mais sobre seu dinheiro, independentemente da criação de novos e engenhosos tributos. Por exemplo: sobre uma conta de eletricidade de menos de 50 reais, eu -- num apartamento entre 35 outros, num prédio coletivo -- pagava cerca de 16 reais de "iluminação pública", perfazendo um total de 150 reais de conta de eletricidade, num roubo explícito e vergonhoso sobre os serviços efetivamente prestados.
Uma pequena lição ao ogro famélico, que agora vai tentar outros caminhos para recompor seu assalto aos nossos ativos.
Paulo Roberto de Almeida
Continuo não entendendo nada do que existe, mas meu raciocínio é muito simples, e segue a lógica elementar dos meios e fins: se o PIS-Cofins foi instituído para o financiamento da seguridade social no Brasil, como cobrar algo que JAMAIS será usado em benefício dos supostos produtores e trabalhadores que "colaboraram" na confecção do produto em si, que no caso foi produzido externamente. A menos que o Brasil pretendesse redistribuir o imposto aos produtores originais, para que estes financiassem os gastos de seus governos com a infraestrutura e logística da produção estrangeira, não havia sentido, e era claramente ilegal, e inconstitucional, tal cobrança.
A "isonomia" solicitada era um escárnio, já que os produtores nacionais podem ser solicitados a pagar, sobre seus produtos e serviços colocados no mercado, novos impostos sobre quaisquer supostos serviços que o Estado promete oferecer à cidadania -- por exemplo, passar a oferecer internet grátis a todo e qualquer passante -- e assim se achar no direito de cobrar mais alguma taxa por esse "serviço" oferecido ao distinto público (supondo-se que ele não estivesse já incluído em algum imposto anterior existente). Então, os produtos importados teriam também, para fins de "isonomia" passar a ser taxados como os nacionais? Os absurdos nacionais têm de ser repassados aos estrangeiros?
O manicômio tributário brasileiro ainda não foi abalado, sequer arranhado, mas um dia os brasileiros vão descobrir que o ogro famélico avança cada vez mais sobre seu dinheiro, independentemente da criação de novos e engenhosos tributos. Por exemplo: sobre uma conta de eletricidade de menos de 50 reais, eu -- num apartamento entre 35 outros, num prédio coletivo -- pagava cerca de 16 reais de "iluminação pública", perfazendo um total de 150 reais de conta de eletricidade, num roubo explícito e vergonhoso sobre os serviços efetivamente prestados.
Uma pequena lição ao ogro famélico, que agora vai tentar outros caminhos para recompor seu assalto aos nossos ativos.
Paulo Roberto de Almeida
Vitória do contribuinte
25 de março de 2013 | 2h 09
Editorial O Estado de S.Paulo
Redução dos preços dos produtos importados e maior
segurança jurídica no campo tributário serão algumas consequências
práticas imediatas e benéficas para a economia da decisão do Supremo
Tribunal Federal (STF) de considerar inconstitucional a incidência do
PIS/Cofins sobre o ICMS cobrado nas importações e também sobre o próprio
PIS/Cofins, por meio de uma complexa fórmula matemática. A decisão
representa uma vitória do contribuinte e teve características incomuns,
pois foi tomada por unanimidade, o que é raro quando o STF analisa
questões tributárias, e em sessão que durou apenas 25 minutos.
O governo, que vinha se beneficiando da fórmula instituída em 2004 e agora declarada inconstitucional, alega que deixará de arrecadar cerca de R$ 6,8 bilhões por ano, pois, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o PIS/Cofins assim cobrado somou R$ 34 bilhões entre 2006 e 2010. É mais uma forte razão para que, ainda que tardiamente, o governo Dilma inicie o necessário ajuste de suas contas, especialmente pelo corte de suas despesas.
A cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS e sobre o próprio PIS/Cofins das importações foi instituída no governo Lula, pela Lei n.º 10.865, de 2004, mas vinha sendo contestada na Justiça pelas empresas. Estima-se que haja cerca de 2,2 mil ações nos tribunais questionando essa fórmula de cálculo. Já houve decisões em alguns tribunais, umas contra a cobrança, outras a favor.
A União apresentou ao STF um recurso extraordinário questionando decisão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região que considerara inconstitucional essa forma de tributação. Em 2010, ao negar provimento ao recurso, a ministra Ellen Gracie (aposentada) contestou o argumento da União de que a incidência de tributo sobre tributos no caso dos importados destinava-se a estabelecer isonomia entre as empresas importadoras e as que estão sujeitas a essa forma de cobrança nas operações internas.
Segundo a ministra, as situações são distintas e o tratamento tributário isonômico não levaria em consideração as diferenças entre elas. A ministra observou também que a Constituição é clara ao estabelecer que a base de cálculo para as contribuições sociais, como o PIS/Cofins, é o "valor aduaneiro" do bem importado, e esse valor inclui frete, tributos como o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante e IOF, além de encargos como seguro e outros.
O pedido de vista do ministro Dias Toffoli interrompeu o julgamento do recurso da União, que só foi retomado, e concluído, na sessão plenária do STF de quarta-feira (20/3). Toffoli acompanhou o voto da ministra Ellen Gracie, como fizeram os ministros que votaram em seguida.
A redução dos preços das importações deve ser de pelo menos 5%, de acordo com estimativa da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que, desde a instituição da fórmula de cobrança do PIS/Cofins, agora derrubada pelo STF, advertia que a medida era inconstitucional. Advogados tributaristas, no entanto, preveem redução menor, de 2% a 3%. A diminuição depende da alíquota do ICMS, que varia de Estado para Estado.
O STF não definiu a data em que sua decisão passará a ter efeito. Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional disse que a devolução dos valores recolhidos a mais será feita caso a caso, "para as partes que requereram em juízo". Anunciou também que vai recorrer da decisão, por meio de embargos de declaração, nos quais poderá defender a aplicação da decisão somente em operações futuras.
Eliminada dos produtos importados, a cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS, sob outra forma, ainda aguarda julgamento do STF, numa ação de maior impacto financeiro do que a que foi julgada. Em 2007, a União propôs uma ação declaratória de constitucionalidade da cobrança do PIS/Cofins sobre a receita bruta das empresas, o que inclui o resultado da venda de mercadorias e serviços, sobre a qual incidiu o ICMS. A União estima que essa cobrança lhe propiciou uma receita de R$ 89,4 bilhões entre 2003 e 2008.
O advogado-geral da União que propôs a ação era o hoje ministro do STF Dias Toffoli, que, no caso das importações, votou a favor dos contribuintes.
O governo, que vinha se beneficiando da fórmula instituída em 2004 e agora declarada inconstitucional, alega que deixará de arrecadar cerca de R$ 6,8 bilhões por ano, pois, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o PIS/Cofins assim cobrado somou R$ 34 bilhões entre 2006 e 2010. É mais uma forte razão para que, ainda que tardiamente, o governo Dilma inicie o necessário ajuste de suas contas, especialmente pelo corte de suas despesas.
A cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS e sobre o próprio PIS/Cofins das importações foi instituída no governo Lula, pela Lei n.º 10.865, de 2004, mas vinha sendo contestada na Justiça pelas empresas. Estima-se que haja cerca de 2,2 mil ações nos tribunais questionando essa fórmula de cálculo. Já houve decisões em alguns tribunais, umas contra a cobrança, outras a favor.
A União apresentou ao STF um recurso extraordinário questionando decisão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região que considerara inconstitucional essa forma de tributação. Em 2010, ao negar provimento ao recurso, a ministra Ellen Gracie (aposentada) contestou o argumento da União de que a incidência de tributo sobre tributos no caso dos importados destinava-se a estabelecer isonomia entre as empresas importadoras e as que estão sujeitas a essa forma de cobrança nas operações internas.
Segundo a ministra, as situações são distintas e o tratamento tributário isonômico não levaria em consideração as diferenças entre elas. A ministra observou também que a Constituição é clara ao estabelecer que a base de cálculo para as contribuições sociais, como o PIS/Cofins, é o "valor aduaneiro" do bem importado, e esse valor inclui frete, tributos como o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante e IOF, além de encargos como seguro e outros.
O pedido de vista do ministro Dias Toffoli interrompeu o julgamento do recurso da União, que só foi retomado, e concluído, na sessão plenária do STF de quarta-feira (20/3). Toffoli acompanhou o voto da ministra Ellen Gracie, como fizeram os ministros que votaram em seguida.
A redução dos preços das importações deve ser de pelo menos 5%, de acordo com estimativa da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que, desde a instituição da fórmula de cobrança do PIS/Cofins, agora derrubada pelo STF, advertia que a medida era inconstitucional. Advogados tributaristas, no entanto, preveem redução menor, de 2% a 3%. A diminuição depende da alíquota do ICMS, que varia de Estado para Estado.
O STF não definiu a data em que sua decisão passará a ter efeito. Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional disse que a devolução dos valores recolhidos a mais será feita caso a caso, "para as partes que requereram em juízo". Anunciou também que vai recorrer da decisão, por meio de embargos de declaração, nos quais poderá defender a aplicação da decisão somente em operações futuras.
Eliminada dos produtos importados, a cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS, sob outra forma, ainda aguarda julgamento do STF, numa ação de maior impacto financeiro do que a que foi julgada. Em 2007, a União propôs uma ação declaratória de constitucionalidade da cobrança do PIS/Cofins sobre a receita bruta das empresas, o que inclui o resultado da venda de mercadorias e serviços, sobre a qual incidiu o ICMS. A União estima que essa cobrança lhe propiciou uma receita de R$ 89,4 bilhões entre 2003 e 2008.
O advogado-geral da União que propôs a ação era o hoje ministro do STF Dias Toffoli, que, no caso das importações, votou a favor dos contribuintes.
O Mercosul aos 22 anos: algo a comemorar? - Paulo Roberto de Almeida
O
Mercosul aos 22 anos: algo a comemorar?
Paulo Roberto de Almeida
Professor do Uniceub (Brasília) e diplomata.
O Mercosul – ou mercado comum do sul – registra, em março de 2013, o
22o. ano de sua existência formal, num clima que poderia ser
caracterizado como de relativa indiferença, por parte de seus protagonistas
principais, e de quase desconhecimento, da maior parte do público em geral.
Aparentemente, ele já não desperta mais reações favoráveis ou desfavoráveis no
seio da sociedade, tendo deixado de ser o centro das preocupações prioritárias
dos responsáveis políticos, mesmo se os discursos oficiais continuam a
proclamar seu papel estratégico nas relações regionais. Um ano após sua
maioridade formal, o bloco não parece ter, efetivamente, motivos para comemorações,
com a suspensão de um de seus membros originais – o Paraguai – e o ingresso em
condições altamente controversas de um novo, a Venezuela. Cabe, no entanto, um
pequeno resumo de sua trajetória e uma reflexão sobre o seu futuro.
O processo de integração começou sua trajetória institucional a
partir de 1985, com os esquemas bilaterais entre a Argentina e o Brasil. Um tratado
bilateral de integração, em 1988, prometia o estabelecimento de um mercado
comum em dez anos, por meio de protocolos setoriais de integração, numa visão de
complementaridade das duas economias. Em 1990, os presidentes Carlos Menem e
Fernando Collor decidiram acelerar o processo, com posterior adesão do Paraguai
e do Uruguai: o novo esquema de liberalização, consagrado no tratado de
Assunção (de 26 de março de 1991), passou a ser automático, geral e de
características fundamentalmente livre-cambistas. Os novos prazos de integração
foram reduzidos pela metade e o “mercado comum” deveria ter sido alcançado até
o início de 1995. Não é preciso dizer que tal não ocorreu.
A despeito de graves problemas de estabilização macroeconômica no
Brasil e na Argentina, em meados daquela década, a liberalização comercial caminhou
de forma mais ou menos rápida, abrindo espaço para o aumento do comércio intrarregional.
Não obstante a expansão de comércio, dentro e fora do bloco, não foram criadas
as condições estruturais para que os dois principais países – Brasil e
Argentina – realizassem uma das premissas do tratado constitutivo, qual seja, a
da abertura econômica continuada e a inserção de ambos na economia mundial. Ocorreu,
contraditoriamente às expectativas dos primeiros anos, uma introversão do
comércio, configurando aquela consequência nefasta dos
processos de integração, que os economistas chamam de “desvio de comércio” (e
de investimentos). Foi registrada uma espécie de “Brasil-dependência” na
Argentina, uma vez que esta tinha no seu maior vizinho o destino para mais de
um terço de suas exportações totais e um volume praticamente similar nas
importações. O Brasil, embora menos dependente do comércio regional, também
construiu para si uma espécie de “reserva de mercado ampliada”, o que pode ter
arrefecido a busca de novos mercados.
O protocolo de Ouro Preto, assinado no final de 1994 para
“completar” o tratado de Assunção, não criou instituições novas (com exceção de
uma Comissão de Comércio que jamais conseguiu aprovar um código aduaneiro
efetivo), nem estabeleceu mecanismos para facilitar a coordenação das políticas
macroeconômicas dos países membros. Não obstante os avanços, não se chegou ao prometido
“mercado comum” ou mesmo à união aduaneira completa, mantendo-se várias
exceções à Tarifa Externa Comum. Muitos produtos continuaram fora da zona de
livre-comércio, como açúcar e automóveis, por exemplo. Na verdade, depois da
fase de transição, as orientações de política comerciais dos principais
protagonistas jamais voltaram a se guiar pelas promessas de abertura e
liberalização, caminhando no sentido contrário ao esperado.
Em 1996, Chile e Bolívia tornaram-se parceiros da “zona de
livre-comércio”, mas a associação ao Mercosul dos demais parceiros do Grupo
Andino teve de aguardar até os anos 2003-2005. A “ameaça” da Alca – projeto dos
EUA para unificar numa mesma zona de livre-comércio todos os países do
hemisfério – fez com que o Mercosul desenvolvesse uma estratégia comercial defensiva
da qual ele jamais se separaria nos dez anos que se seguiram de processo
negociador.
A desvalorização da moeda brasileira em 1999 representou um choque
para a Argentina e o início de uma fase crítica para o Mercosul, que se
prolongou até os nossos dias. A Argentina entrou em crise no final de 2001, o
que coincidiu com o decréscimo nos fluxos de comércio: ela começou a recorrer,
de modo frequente, a mecanismos de defesa comercial (salvaguardas unilaterais).
A despeito da retomada do crescimento do comércio intrarregional a partir de
2003 permaneceram os desequilíbrios, motivando demandas de proteção por parte
da União Industrial Argentina; o processo foi levado a extremos, com recurso a
medidas claramente ilegais no âmbito do bloco e até mesmo do ponto de vista do
sistema multilateral de comércio. Deve-se reconhecer que a atitude do governo
brasileiro revelou-se estranhamente compreensiva com as infrações regulares às
normas do bloco.
Em 2004 a Argentina começou a pressionar pela adoção de um
instrumento de salvaguardas automáticas, eufemisticamente caracterizado como
sendo um “mecanismo de adaptação competitiva”, que ela pretendia implementar de
maneira unilateral. Antes, ela já tinha insistido num “gatilho cambial”, o que
foi abandonado, em vista da persistente valorização da moeda brasileira a
partir de 2003. No início de 2006, os dois países adotaram o projeto argentino para
salvaguardas setoriais, recebido com reclamos por parte da indústria
brasileira. No plano político, houve a criação de um fundo corretor de
assimetrias estruturais – a ser utilizado sobretudo pelos dois sócios menores,
mas com maior volume de financiamento por parte do Brasil – e a instituição de
um “parlamento” do Mercosul, considerado um aperfeiçoamento institucional. Nem
um, nem outro instrumento tocaram, de fato, nas pendências comerciais ou
permitiram superar os obstáculos políticos à realização das metas inscritas do
tratado de Assunção.
Assistiu-se, retoricamente, a demandas recorrentes pelo
estabelecimento de “cadeias produtivas setoriais conjuntas”, iniciativas
inviabilizadas na prática pela incapacidade dos governos de cada um dos países
de prestar assistência financeira ou empreender investimentos em base a
recursos públicos. Mas voltou-se a dar ênfase, naquele período, sobretudo sob
impulso político do governo brasileiro, aos projetos de integração física
continental, intenção consagrada na criação da “Comunidade Sul-Americana de
Nações” (dezembro de 2004), depois convertida em União, pela ação do governo
“socialista” da Venezuela.
A Venezuela, justamente, foi admitida “politicamente” no Mercosul,
em dezembro de 2005, tendo os termos de sua incorporação comercial sido consagrados
no protocolo de adesão de 2006; ela nunca chegou a completar, porém, os
requerimentos estabelecidos neste e em outros instrumentos do Mercosul. Com a
diluição da “ameaça” da Alca – inclusive a partir de sua virtual paralisação na
terceira cúpula hemisférica, em Mar del Plata, no final de 2005, por atuação
conjunta da Argentina, do Brasil e da Venezuela –, os países sul-americanos
passaram a construir, com estratégias e objetivos muito diversos, uma nova
agenda integracionista para a região, menos voltada para a liberalização
comercial e mais orientada para a cooperação política e o estabelecimento de
ligações físicas. Esse esforço redundou na Unasul e em diversos outros
mecanismos (Calc, e depois Celac, ademais de um conselho de defesa), de
importância mais retórica do que efetiva: para todos os efeitos práticos, a
América Latina encontra-se fragmentada em diferentes esquemas de integração,
indo do livre-comércio ampliado a um retorno do nacionalismo estatizante, o que
também diluiu a importância do Mercosul na região.
Com a crescente importância econômica da Ásia Pacífico, alguns
países da região – notadamente México, Colômbia, Peru e Chile – voltam-se para
diferentes iniciativas voltadas para essa grande bacia oceânica, num cenário
que também se caracteriza pela existência de acordos bilaterais de livre
comércio entre esses países e os Estados Unidos. Os países do Mercosul parecem
ter se conformado a um papel menor nesses grandes desenvolvimentos da economia
regional e mundial.
Na verdade, o bloco atravessou sua maioridade formal enfrentando a
maior crise de sua história. Em 2012, usando como pretexto o afastamento do
presidente eleito do Paraguai numa crise política puramente interna, Argentina
e Brasil suspenderam a participação do país nas reuniões do bloco e procederam
à admissão irregular da Venezuela, num gesto altamente controverso, tanto no
plano do direito internacional como no das regras próprias do bloco. Permanecem
indefinidas as condições sob as quais a Venezuela poderá cumprir os requisitos
formais de sua adesão ao bloco, processo não concluído nos quatro anos
estabelecidos no protocolo de 2006, quando as condições econômicas no país bolivariano
não se tinham deteriorado como na atualidade. De fato, não há muito o que
comemorar neste início de segunda década do Mercosul: o bloco ainda não
conseguiu retomar sua agenda de integração regional e de inserção na economia
mundial.
Hartford,
24 de março de 2013
Russia invade Chipre para recuperar seu capital
Brincadeira antecipada de Primeiro de Abril, claro, mas parece que seria a única maneira de os grandes correntistas russos, indignados com o sequestro de todo aquele dinheiro honesto adquirido com os ingentes esforços do capitalismo russo para contribuir ao desenvolvimento cipriota, tentarem recuperar pelo menos parte do investimento feito naqueles bancos cipriotas que perguntavam pouco e prometiam muito.
Paulo Roberto de Almeida
Cyprus Bailout Agrees Large Losses on Uninsured Depositors.
Citi Research, 25/03/2013
Deal consists of €10bn financial assistance envelope to be disbursed via the ESM, with some contributions possibly from IMF and Russia. In exchange, Cyprus agreed to resolve its second largest bank, Popular Bank of Cyprus (Laiki), merging its “good” assets and insured depositors into Bank of Cyprus. Insured deposits (below €100k) in both banks are safeguarded. Equity shareholders and all bondholders in both banks will be fully bailed in. Uninsured deposits in Laiki will be fully bailed in, while uninsured deposits in Bank of Cyprus will be converted into equity and suffer major losses targeted to ensure that the bank capital ratio ultimately is brought to 9%. Uninsured deposits in Bank of Cyprus will be frozen during the process and major liquidity restrictions and capital controls are being put in place. Legislation on a bank resolution regime was already approved by Cypriot parliament, allowing government to implement decisions taken last night without further parliamentary approval. Comment: The deal is a much more straightforward way of dealing with insolvent banks, rather than spreading the costs throughout the whole banking system. The deal removes to a large extent short-term uncertainty and the risk of uncontrolled bank bankruptcies which might possibly have led to Cyprus exiting EMU. However, with confidence in the Cyprus banking sector severely hit by developments of the past week, the risk of major deposit outflows occurring when capital controls are eventually removed (or softened) remains significant, in our view.
Paulo Roberto de Almeida
Cyprus Bailout Agrees Large Losses on Uninsured Depositors.
Citi Research, 25/03/2013
Deal consists of €10bn financial assistance envelope to be disbursed via the ESM, with some contributions possibly from IMF and Russia. In exchange, Cyprus agreed to resolve its second largest bank, Popular Bank of Cyprus (Laiki), merging its “good” assets and insured depositors into Bank of Cyprus. Insured deposits (below €100k) in both banks are safeguarded. Equity shareholders and all bondholders in both banks will be fully bailed in. Uninsured deposits in Laiki will be fully bailed in, while uninsured deposits in Bank of Cyprus will be converted into equity and suffer major losses targeted to ensure that the bank capital ratio ultimately is brought to 9%. Uninsured deposits in Bank of Cyprus will be frozen during the process and major liquidity restrictions and capital controls are being put in place. Legislation on a bank resolution regime was already approved by Cypriot parliament, allowing government to implement decisions taken last night without further parliamentary approval. Comment: The deal is a much more straightforward way of dealing with insolvent banks, rather than spreading the costs throughout the whole banking system. The deal removes to a large extent short-term uncertainty and the risk of uncontrolled bank bankruptcies which might possibly have led to Cyprus exiting EMU. However, with confidence in the Cyprus banking sector severely hit by developments of the past week, the risk of major deposit outflows occurring when capital controls are eventually removed (or softened) remains significant, in our view.
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