sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Risco de isolamento na diplomacia - Eliane Cantanhede (OESP)

Eliane Cantanhede alerta para os riscos de isolamento do Brasil, eventualmente derivados de uma postura diplomática da nova administração excessivamente em oposição, ou muito alternativa, em relação às posições tradicionais do Itamaraty, ou em confronto com o que se fazia sob o chamado lulopetismo diplomático. Ela acha que o PT rachou o Itamaraty, e que o novo governo também poderá fazer o mesmo. Creio, pessoalmente, que pode ser um pouco diferente. Sob o lulopetismo, com exceção das bolivarianices conhecidas, e de uma secreta, clandestina mesmo, aderência aos interesses dos seus mestres cubanos, os companheiros preservaram aquilo que era o mainstream do Itamaraty tradicional: desenvolvimentismo, multilateralismo, terceiro-mundismo, antiamericanismo, anti-imperialismo, anti-hegemonismo, as tais de parcerias estratégicas com alguns atores do mundo não-hegemônico, atuação por meio do Grulac, do G-77 e outros grupos de "periféricos", integração regional, prioridades para a América do Sul, a Africa, defesa dos temas globais do politicamente correto e das causas progressistas, enfim, esse mundinho que o Itamaraty conhecia e conhece muito bem. O que se promete de janeiro em diante é bastante diferente, dai as advertências premonitórias de observadores, estudiosos, diplomatas, parceiros, enfim, tutti quanti circulam em torno da política externa e da diplomacia brasileira no último meio século. Será que vamos mudar tanto assim?
Paulo Roberto de Almeida

Brasil torce o nariz para o multilateralismo e aposta num nacionalismo arrogante
Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo 
14 Dezembro 2018 | 05h00

Se há três áreas em que o Brasil tem protagonismo consolidado nos foros internacionais, essas áreas são meio ambientedireitos humanos e migração. O temor é o Brasil encolher e retroceder justamente nas três, não só pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, mas também pelo futuro chanceler Ernesto Araújo e suas ideias extravagantes. 
Qualquer um que tenha participado de grandes encontros sobre meio ambiente sabe, viu, constatou como a voz do Brasil é relevante, não só pela Amazônia, mas pela grande biodiversidade brasileira. Como “Deus é brasileiro”, não temos tsunamis nem terremotos, mas, sim, sol o ano inteiro, água doce e salgada, florestas variadas, combustível fóssil e renovável, solo fértil, vento e chuva. E uma das leis mais modernas na área. 
O Brasil também pode se orgulhar de, depois de vinte anos, ter feito a transição do regime militar para a democracia sem um único tiro, uma única gota de sangue, e assim passou a ser uma voz ouvida e respeitada na área de direitos humanos – apesar de tudo, principalmente do horror medieval nas penitenciárias e cadeias comuns. 
Por fim, o povo brasileiro é uma síntese de todas as etnias e dos mais variados sobrenomes do mundo todo. O nosso País é lindamente multiétnico e acolhedor. Isso tem enorme valor, atrai respeito, admiração e espaço nos grandes debates sobre migração, como na construção do Pacto Global de Migração, que reúne 160 países. 
É surpreendente, portanto, a forma como o futuro chanceler (faltam alguns dias...) Ernesto Araújo puxou o tapete do atual, Aloysio Nunes Ferreira. Em Marrakesh, o ainda chanceler subscrevia o pacto em nome do Brasil. Em Brasília, seu quase sucessor anunciava, simultaneamente, que o Brasil vai sair do pacto. Nada poderia ser mais antidiplomático. 
“Foi mais do que surpreendente, foi chocante”, disse Nunes Ferreira por telefone, depois de ter reagido a Ernesto Araújo pelo mesmo veículo que ele usara para negar o pacto de migração: o Twitter. Novos tempos. 
São sinais preocupantes da política externa, já rechaçados pela China, pelo Egito, agora pela Alemanha, que põe o pé no freio no acordo União Europeia-Mercosul, e pela Liga Árabe, que acaba de entregar uma carta no Itamaraty questionando a mudança da embaixada brasileira, de Tel-Aviv para Jerusalém, o que agrada a Israel e irrita todo o mundo árabe. 
Essas manifestações e ações de Araújo – logo, de Bolsonaro – seguem um único mentor, Donald Trump, e uma ideologia, o antimultilateralismo. Sai a adesão aos órgãos multilaterais ou regionais, como ONU, OMC, Mercosul, e entra em cena um nacionalismo a la Trump: voltado para dentro, voluntarioso, arrogante, de confronto. 
Todas as sinalizações externas do governo Bolsonaro replicam, sem tirar nem por, as posições de Trump: contra o Acordo de Paris, contra o Pacto de Migração, beligerância com a China, alinhamento explícito a Israel, implicância com a ONU e a OMC... Só que, assim como o Brasil não são os EUA, Bolsonaro não é Trump. E nem tudo o que é bom para os EUA é bom para o Brasil.  
Se as exportações, a agricultura, a pecuária, os minérios e os programas de cooperação passarem a ser afetados, a coisa pode deixar de ser só pitoresca e ficar séria. Até por isso, já começa o recuo na resistência à China. 
Não falta quem questione o próprio papel do deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, e suas credenciais para ser a voz e a cara do Brasil no exterior. Sabatinar o futuro chanceler?! Falar pelo Brasil nos EUA sem passar pela embaixada ou pelos consulados?! 
Se o PT rachou o Itamaraty, essa postura e essas ingerências também vão rachar. A tendência é virar uma guerra e guerras nunca são boas.

A nova geopolitica nas Americas - Rubens Barbosa (OESP)

A nova geopolítica nas Américas

Uma das dez maiores economias, o Brasil deve fazer política de sua 

circunstância geográfica


RUBENS BARBOSA*, O Estado de S.Paulo 
11 Dezembro 2018 | 03h00 

O pensamento mais moderno da geopolítica mostra a crescente importância do regionalismo, como evidenciado pelos acordos de integração na Europa, na América do Norte, na Ásia e agora na África. 
O continente americano passa por significativas transformações políticas e econômicas, que terão consequências na geopolítica regional. O governo de esquerda do México e as incertezas nas relações com o vizinho EUA, o governo de direita no Brasil e seus efeitos sobre o entorno geográfico, o novo governo de Cuba, a deterioração das instáveis Venezuela e Nicarágua, as dificuldades econômicas na Argentina, a persistente baixa prioridade da região para a política externa dos EUA são alguns dos principais elementos de uma gradual transformação das relações políticas, econômicas e comerciais entre os países das Américas e com o resto do mundo. Na América do Sul, a partir da década de 1990 oito dos dez países elegeram governos de centro-esquerda e de esquerda. Em 2019 oito dos dez países serão governados por presidentes de direita ou centro-direita. Ao mesmo tempo, em função do vazio criado pela baixa influência política e reduzida presença comercial dos EUA, além da falta de uma visão estratégica e de ações proativas da parte do Brasil, cresceu a presença da China e da Rússia. Agora até a Turquia amplia também sua atuação, a partir da Venezuela. 
No que toca ao Brasil, declarações do presidente eleito de que as relações com os EUA ganharão prioridade e de Eduardo Bolsonaro de que o Brasil está pronto para trabalhar com os EUA em todas as frentes, não por alinhamento automático, mas por convicção de que há grande convergência entre os objetivos e a visão de mundo das duas nações, abrem caminho para uma relação claramente afirmativa. O ministro das Relações Exteriores designado, Ernesto Araújo, diz que o céu é olimite na relação bilateral e que temos de pensar grande para dar um salto qualitativo na aproximação com Washington, o que permitirá fazermos coisas que seriam impensáveis, que se espera sejam mutuamente benéficas. 
Como desdobramento dessa nova realidade, não será surpresa se os EUA responderem positivamente aos acenas de aproximação de Brasília com Washington. Alto funcionário da administração Trump declarou que “há um esforço consciente do governo americano, vindo do topo da hierarquia, para uma aproximação com o Brasil”. A percepção é de que a eleição de Jair Bolsonaro traz alguém disposto a ser parceiro. A região não representa nenhuma ameaça à segurança nacional dos EUA. As questões de imigração, do tráfico de drogas e a trinca da tirania trumpiana (Venezuela, Nicarágua e Cuba) não chegam a tirar o sono dos formuladores da política externa e de defesa em Washington. Segurança, prosperidade e democracia são objetivos norte-americanos na região. Nos últimos dez anos os EUA foram excluídos das novas instituições que têm por atribuição acompanhar as relações entre os países da região, como a Unasul e a Celac, com todas as implicações políticas e diplomáticas que isso está acarretando. Washington pode perguntar como o Brasil e os EUA poderiam trabalhar juntos para tentar resolver algumas questões de interesse geral no relacionamento entre os paíes da região. 

Tendo sido embaixador nos EUA por quase cinco anos, seguindo orientação dos governos FHC e no primeiro mandato de Lula, procurei desenvolver ações que resultassem em maior aproximação entre os dois países. Em termos de comércio, de investimentos e mesmo no cenário internacional, o Brasil só teria a ganhar com uma relação mais próxima da única superpotência global. A condição para tanto será definir muito claramente nossos objetivos e nossa agenda nos entendimentos bilaterais. As assimetrias em todos os setores entre o Brasil e os EUA tornam difícil aceitar que os objetivos globais e a visão de mundo das duas nações sejam comuns, especialmente com as políticas norte-americanas em relação à China, à Síria e ao conflito Israel-palestinos, por exemplo. As prioridades regionais, sim, são coincidentes. 

A nova geopolítica na região oferece uma oportunidade única – que não existiu para os governos anteriores – de o Brasil, a partir da definição de seus interesses, acima de países, grupos, partidos e ideologias, desenvolver uma relação sem alinhamentos automáticos com os EUA. Interessa ao Brasil o encaminhamento de uma solução negociada para o restabelecimento da democracia e da estabilidade econômica que traga de volta o crescimento e a pacificação política na Venezuela. Interessa ao Brasil a ampliação do mercado regional, que em 2019 deve constituir-se num área de livre-comércio. A ação do Brasil para a consolidação da democracia, de defesa e de segurança poderia ser complementada com o melhor aproveitamento dos recursos financeiros do Novo Banco de Desenvolvimento do Brics para projetos de integração física na América do Sul, o que propiciaria o aumento do intercâmbio comercial de todos os países da região. 

Uma das dez maiores economias do mundo, o Brasil deve fazer política de sua circunstância geográfica. Com uma estratégia externa, anunciada como mais assertiva e com objetivos claramente definidos, a cooperação franca e direta entre Washington e Brasília poderá ampliar as oportunidades bilaterais de comércio e de investimentos e projetar o Brasil como o verdadeiro motor da região. Com isso, a voz do País no cenário internacional ficará reforçada e poderá abrir a possibilidade de maior presença brasileira nos foros multilaterais, inclusive na reforma do ONU, quando o assunto voltar a ser tratado seriamente. 

Se as reformas estruturais, como a da Previdência Social, a tributária e a do Estado, forem aprovadas, a rápida recuperação da economia brasileira poderá respaldar iniciativas mais ousadas na política externa do País que levarão ao fortalecimento do regionalismo. 
* RUBENS BARBOSA É PRESIDENTE DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E COMÉRCIO EXTERIOR (IRICE)

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Ricardo Bergamini sobre o AI-5: 13/12/1968; o endurecimento do regime militar no Brasil

No Palácio Laranjeiras, Costa e Silva assina o AI-5 e endurece o regime
Ato dá poderes para fechar Congresso, cassar mandatos e suspender habeas corpus
Fonte: Acervo O Globo 
No dia 13 de dezembro de 1968, no Palácio Laranjeiras, é editado pelo então presidente Costa e Silva o Ato Institucional nº 5. Com o AI-5, o regime militar passava a ter o poder de fechar o Congresso, cassar mandatos eletivos, suspender o habeas corpus para crimes políticos e confiscar bens. Começava aí o período mais duro da ditadura militar, que se estenderia por dez anos.

A decisão de endurecer o regime veio justamente no fim do “ano que não acabou”. No Brasil e no mundo, 1968 foi marcado pelos protestos dos jovens contra a política tradicional e por mais liberdade. “É proibido proibir” funcionava como uma espécie de mote para a garotada que ocupava as ruas pedindo o fim da ditadura.

Ao longo do ano, a Igreja também começava a se articular na defesa dos direitos humanos e líderes políticos cassados se associavam em busca de formas de voltar à política e combater a ditadura. Antigos rivais, Carlos Lacerda, Juscelino Kubitschek e João Goulart organizaram a Frente Ampla, iniciada em 1967 e proibida em abril de 1968.

Em meados do ano, os metalúrgicos de Osasco entram em greve - a primeira desde o início da ditadura. A linha mais radical do governo se agitava, providenciando ações mais rigorosas contra a oposição e pedindo medidas enérgicas contra manifestações populares de descontentamento.

Neste cenário, nos dias 2 e 3 de setembro, o deputado Márcio Moreira Alves, do MDB - o partido de oposição à legenda oficial da ditadura, a Arena -, ocupa a tribuna para pedir ao povo que não participasse dos desfiles militares do 7 de Setembro. Também apela as moças, "ardentes de liberdade", que não saíssem com oficiais das Forças Armadas. Outro deputado do MDB, Hermano Alves, publica uma série de artigos no "Correio da Manhã”, considerados provocações no meio militar.

O governo pede então a cassação dos dois deputados. Mas em 12 de dezembro, a Câmara recusou, por uma diferença de 75 votos, o pedido de licença para processar Moreira Alves. E houve até colaboração da própria Arena, o partido do "amém" do sistema bipartidário no regime militar. No dia seguinte foi baixado o AI-5. Também foi decretado o recesso do Congresso Nacional por tempo indeterminado. Só seria reaberto em outubro de 1969, para referendar a escolha do general Emílio Garrastazu Médici para a Presidência da República.

Com o AI-5, Marcio Moreira Alves e Hermano Alves foram cassados, numa lista inicial de 11 parlamentares que perderam seus mandatos.

Ricardo Bergamini

Carne fraca, carne podre, carne corrupta: Brasil perde espaço no mercado mundial de carnes

Brasil perde fatia no mercado mundial de carnes

Participação recuou de 23,5% para 17,4% em dez anos; País deixou de ganhar US$ 30 bilhões

Márcia De Chiara, O Estado de S.Paulo 
13 Dezembro 2018 | 04h00

Apesar de recordes sucessivos anunciados nas exportações de carnes, o Brasil perdeu participação no mercado mundial nos últimos dez anos. Em 2007, o País detinha 23,5% das exportações globais com vendas de US$ 11,1 bilhões de carnes bovinas, suínas e aves, liderando o ranking de exportadores. Dez anos depois, essa fatia caiu para 17,4% e o Brasil para a segunda posição, atrás dos Estados Unidos. As vendas somaram US$ 15,3 bilhões no ano passado. Entre 2007 e 2017, as exportações brasileiras avançaram 38% enquanto o comércio global de carnes cresceu 86,4%. 
Isso é o que revela um levantamento feito pelo vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Pedro de Camargo Neto, com informações do International Trade Centre (ITC), agência conjunta da Organização Mundial do Comércio e das Nações Unidas. 
O levantamento mostra que EUA e União Europeia (UE) avançaram, mas quem mais cresceu foram países com volume de exportação menor, como a Índia, e outros que não são identificados no estudo. 
Nas contas de Camargo Neto, se o Brasil tivesse mantido a sua fatia de mercado, poderia ter embolsado US$ 30 bilhões a mais no período de dez anos com receita de exportação. 
“Os dados mostram que o que a gente fez não foi tão bonito assim”, diz o vice-presidente da SRB. Em dez anos, as importações mundiais de carnes deram um salto, somavam US$ 47,3 bilhões em 2007 e atingiram US$ 88,1 bilhões em 2017. O Brasil teve um papel importante, mas o mundo cresceu muito mais, observa.

1968-2018: 50 anos do AI-5: como impactou o Itamaraty - Paulo Roberto de Almeida

Dez anos atrás, aos 40 anos do Ato Institucional, fui convidado a escrever um capítulo sobre o AI-5 e seu impacto no Itamaraty. Ao princípio recusei-me, pois não sou da geração impactada por esse Ato da ditadura militar, e na verdade eu estava na oposição ao regime, e por isso passei sete anos num exílio voluntário, a partir de 1970, para ingressar no Itamaraty em 1977, ainda na oposição ao regime militar. Eu não tinha a memória daqueles anos, inclusive porque era muito jovem e não havia ainda ingressado num curso universitário, o que faria no mesmo ano do AI-5. Aliás, eu resolvi deixar o Brasil, logo em seguida, por que o AI-5 do regime militar cassou metade dos meus professores do curso de Ciências Sociais da USP.
Acabei fazendo esse texto porque NENHUM dos diplomatas seniores, da época, que eu contatei, se ofereceu para faze-lo. Fiz uma pesquisa bibliográfica e documental, além de falar com vários dos diplomatas contemporâneos daqueles anos de chumbo.
O resultado está aqui:


O texto completo encontra-se disponível, em princípio, na plataforma Academia.edu:

https://www.academia.edu/5794095/066_Do_alinhamento_recalcitrante_à_colaboração_relutante_o_Itamaraty_em_tempos_de_AI-5_2008_

Se não estiver disponível, podem me pedir, pelo número do trabalho: 1847.

Aqui o sumário e os agradecimentos devidos aos diplomatas que colaboraram com sua redação:

Do alinhamento recalcitrante à colaboração relutante:
o Itamaraty em tempos de AI-5


Paulo Roberto de Almeida 
In: Oswaldo Munteal Filho, Adriano de Freixo e Jacqueline Ventapane Freitas (orgs.),
'Tempo Negro, temperatura sufocante': Estado e Sociedade no Brasil do AI-5
(Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio, Contraponto, 2008; 396 p.;
ISBN 978-85-7866-002-4; p. 65-89). 

Sumário:
1. Introdução: uma Casa conservadora, dotada de pensamento avançado
2. Pré-história: o Itamaraty nos tempos da Guerra Fria
3. Política Externa Independente: uma vocação recorrente
4. O realinhamento de 1964 a 1967: um interregno incômodo
5. Revolução na revolução: o Itamaraty na tormenta
6. Segurança e desenvolvimento: colaboração, ainda que relutante
7. Pós-história: os efeitos de longo prazo 
Referências bibliográficas


[As opiniões expressas neste ensaio são de exclusiva responsabilidade do autor, não representando posições ou políticas das entidades às quais o autor se encontra vinculado. Agradecimentos especiais são devidos aos diplomatas Amaury Banhos Porto de Oliveira, Claudio Sotero Caio, Flavio Marega,Geraldo Egidio da Costa Holanda Cavalcanti, Gonçalo de Barros Carvalho e Mello Mourão, Guilherme Luiz Leite Ribeiro, Marcelo Raffaelli, Márcio Dias, Rubens Ricupero, Sebastião do Rego Barros e Sérgio Bath, pelos seus comentários, correções e sugestões a uma primeira versão deste texto, sem que eles obviamente respondam pelos argumentos desenvolvidos neste ensaio.]


1. Introdução: uma Casa conservadora, dotada de pensamento avançado
As desventuras do Itamaraty e de seus diplomatas com o instrumento por excelência da ditadura militar, o AI-5, representam apenas um curto capítulo – talvez não o mais importante – na trajetória moderna desse órgão de Estado, de uma longa história de confrontos de idéias e de acomodações pragmáticas entre os partidários de diferentes correntes de opinião que perpassam e dividem a agência diplomática, como de resto sempre foi o caso com diversas outras instituições do Estado e com a própria sociedade brasileira. A luta de idéias sempre esteve presente em várias épocas de debate nacional: escravistas e abolicionistas, metalistas e papelistas, industrializantes e agraristas, liberais e protecionistas, estruturalistas e monetaristas, interdependentes (conhecidos também como “associados” ou “entreguistas”) e nacionalistas e outras combinações ocasionais. Embates dicotômicos não foram raros na moderna história brasileira, colocando pessoas e grupos que defendiam posições antagônicas na agenda política em confronto direto, redistribuindo cartas nos jogos de poder que inevitavelmente acompanham esses enfrentamentos e provocando cisões na elite – e apenas na elite – como resultado desses confrontos, de resto mais ruidosos do que verdadeiramente ruinosos, mais ideológicos do que materiais, num país bem mais propenso à conciliação do que à ruptura, na interpretação de historiadores como José Honório Rodrigues.
Com o AI-5 foi talvez diferente, na medida em que se tratou não de um debate no seio da sociedade, mas de uma imposição vinda do alto, de uma cisão no próprio grupo de poder, que provocou profunda rejeição na elite ilustrada que sempre esteve envolvida com a política exterior do Estado, como é o caso do Itamaraty e da comunidade de política externa. Havia, obviamente, uma divisão subjacente na política externa e no corpo funcional do Itamaraty entre, de um lado, os partidários (dentro e fora do Itamaraty) da orientação alinhada e anticomunista da política internacional do Brasil e, de outro lado, os propugnadores de uma nova postura, não alinhada, independente e progressista, para as relações exteriores do país. Os fatos mais relevantes, em termos de seleção de “alvos esquerdistas” no Itamaraty, precederam, na verdade, a “edição” do AI-5, que não trouxe, a rigor, consequências de maior relevo para o ministério ou para seu corpo funcional. As consequências mais importantes, talvez, foram as que incidiram sobre a própria política externa, mas ainda aqui o profissionalismo do Itamaraty atuou para reduzir ao mínimo os “ruídos” e interferências sobre a diplomacia profissional. No âmbito geográfico específico do imediato entorno regional, poder-se-ia talvez falar, nesses anos, de uma “diplomacia militar”, em certo sentido mais importante do que a sua versão tradicional, mais bem comportada, pelo menos no que se refere à colaboração informal com as demais ditaduras militares.

(...)

Ler a íntegra nos links acima...

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Index of Human Freedom 2018: Brasil perde da China em liberdade economica - Cato Institute

Human Freedom Index

The Human Freedom Index presents the state of human freedom in the world based on a broad measure that encompasses personal, civil, and economic freedom. Human freedom is a social concept that recognizes the dignity of individuals and is defined here as negative liberty or the absence of coercive constraint. Because freedom is inherently valuable and plays a role in human progress, it is worth measuring carefully. The Human Freedom Index is a resource that can help to more objectively observe relationships between freedom and other social and economic phenomena, as well as the ways in which the various dimensions of freedom interact with one another.
The report is co-published by the Cato Institute, the Fraser Institute, and the Liberales Institut at the Friedrich Naumann Foundation for Freedom.

The Human Freedom Index - 2018


O Brasil aparece num vergonhoso lugar 123, sobre 162, ou seja, no meio da segunda metade, com um índice geral de liberdade humana de 6,21 (sobre 10), sendo 6,67 nas liberdades individuais (lugar 94 sobre 162), mas apenas 5,75 nas liberdades econômicas (um alarmante lugar 144 sobre 162).
Na verdade, segundo se pode ver na evolução anual, as liberdades humanas e econômicas no Brasil vieram caminhando para trás, ou seja, retrocedendo de 2008 a 2016, o que é propriamente lamentável. 
Em outros termos: os governos lulopetistas fizeram o Brasil retroceder no índice de liberdades humanas e de liberdades econômicas, o que combina com o espírito totalitário da organização criminosa que presidiu aos destinos do país nesse período (confiram essa evolução negativa na p. 93 do relatório).

Agora vejam o caso da China, uma autocracia semitotalitária, que justificadamente encontra-se atrás do Brasil no ranking geral das liberdades humanas, em lugar 135 sobre 162, mas no campo das liberdades econômicas a China é mais livre do que o Brasil, por incrível que pareça (mas eu considero isso normal, conhecendo a China).
Seu índice de liberdade econômica é de 6,46 (contra apenas 5,75 no Brasil), o que a coloca num lugar 108 (contra 144 para o Brasil).

Mas o relatório é implacável com a falta de liberdades humanas na China, como se pode constatar por estes comentários, logo na Introdução (Foreword): 

"Another power is a far greater threat to freedom—and that is China. The Chinese Communist Party has grown increasingly despotic and imperialistic in recent years; it brutally enforces its model of totalitarianism at home and seeks to spread it globally. It employs a nasty array of mili- tary aggression, intimidation, imprisonment, and execu- tion of opponents domestically, with increasingly blatant use of those tools against external opponents. Its econom- ic clout is used to bribe, corrupt, intimidate, and indebt nations around the world.
The range of China’s efforts to suppress freedom do- mestically and internationally is breathtaking, so only a sampling is in order here. Actions that are generally known include its anti-Taiwan activity, its militarization of the South China Sea in an attempt to gain a chokehold on the world’s most important trade corridors, its intellectual property theft, its vast increases in military power and spending, its global propaganda, and, most horrifying, its brutal suppression of Muslim Uighurs. Yet the extent of China’s malicious threats and activities is little understood.
(...)
Religious persecution is endemic."

Em conclusão, se o Brasil se aproximasse das liberdades econômicas da China, sem imitar a sua execrável autocracia política, teríamos um enorme progresso para fazer avançar a criação de riqueza no Brasil.

A pré-história da "Grande Divergência": a tradução da Bíblia em vernáculo - Delanceyplace

Houve um momento, se não fosse por todas as demais circunstâncias históricas – invasão dos normandos, Magna Carta no começo do século XIII, democracia na base dos primeiros saxões, revolução científica no século XVII, Iluminismo escocês e britânico, liberalismo econômico, leis da navegação e disputa comercial e guerra com os holandeses, decapitação de um rei, expulsão de outro, importação de uma nova família real e estabelecimento da predominância do Parlamento, Bill of Rights, etc. – em que os anglosaxões, e os povos da Europa setentrional em geral, nos ultrapassariam (a nós latinos), e começaria a Grande Divergência, bem antes da primeira revolução industrial.
Esse momento foi a reforma protestante do século XVI, e a tradução da Bíblia em vernáculo, na Inglaterra e na Alemanha.
Isso fez a educação do povo, enquanto a gente ficava com a Contra-Reforma, a Inquisição, o obscurantismo religioso e anticientífico, a deseducação do povo, essas coisas que nos legaram miséria e subdesenvolvimento, além de tiranias, ditaduras, patrimonialismo, etc...
Azar nosso, que não tivemos Bíblia em português e em espanhol, não tivemos nada na verdade...
Paulo Roberto de Almeida

from Tudors by Peter Ackroyd - Delanceyplace

Sometimes circumstances can change rapidly. In the 1520s, an English translation of the Bible by William Tyndale had been deemed heresy. But by the late 1530s, with King Henry VIII's cataclysmic split from the Catholic church, having an English translation of the Bible became not only desirable but mandatory. Its introduction helped usher in a fertile period of English literature, with such luminaries as John Milton, John Bunyan, William Blake, Alfred Tennyson, and eventually William Shakespeare, and also helped fuse the English identity with the Protestant faith:
"In a set of injunctions, published in the following year, an English Bible was introduced to the people. [The King's chief minister] Thomas Cromwell decreed that within a period of two years every church must possess and display a copy of the Bible in the native tongue; it was to be chained in an open place, where anyone could consult it. The edition used was that of Miles Coverdale, published in 1535 and essentially a reworking of Tyndale's original. Thus the man who had been denounced as a heretic, and whose translation had been burned by royal decree eleven years before, was now the un­heralded and unsung scribe of the new English faith. It was also ordered that one book comprising the Pater Noster, the Ave Maria, the Creed and the Ten Commandments was to be set upon a table in the church where all might read it; this also was to be in the English tongue.

"The translation has been described as one of the most signifi­cant moments in the history of reformation. It immediately identi­fied the English Bible with the movement of religious change, and thus helped to associate what would become the Protestant faith with the English identity. In the seventeenth century, in particular, cultural history also became religious history. ... The translated Bible also introduced into England a biblical culture of the word, as opposed to the predominantly visual culture of the later medieval world; this refashioned culture was then to find its fruits in Milton and in Bunyan, in Blake and in Tennyson. The English Bible also helped to fashion a language of devotion. Coverdale was the first to introduce such phrases as 'loving kindness' and 'tender mercy'. A tract of the time declared that 'Englishmen have now in hand, in every church and place, the Holy Bible in their mother tongue'. It was said that the voice of God was English. A seventeenth-century historian, William Strype, wrote that 'everybody that could bought the book, or busily read it, or got others to read it to them'. It was read aloud, in St Paul's Cathedral, to crowds who had gathered to listen. The king's men also hoped that the reading of the Bible would inculcate obedience to the lawful authorities, except that obedience was now to the king rather than to the pope. ...

"Cromwell also ordered the clergy to keep silent on matters of biblical interpretation, not to be 'babblers nor praters, arguers nor disputers thereof, nor to presume that they know therein that they know not'. It was of the utmost importance to be quiet on matters of doctrine for fear of provoking more discord and discontent in a country that had narrowly avoided a damaging religious war."
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Tudors: The History of England from Henry VIII to Elizabeth I
Author: Peter Ackroyd
Publisher: Macmillan
Copyright 2012 by Macmillan
Pages: 131-132

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...