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sábado, 23 de abril de 2011

A Arte da Resenha: para uso de aprendizes, neófitos e outros amantes de livros (PRA)

Este texto foi elaborado em 2006, e permaneceu relativamente desconhecido desde então. Creio que merece maior e melhor divulgação, em prol dos malucos por livros, como eu mesmo...
Paulo Roberto de Almeida

A arte da resenha
(para uso de aprendizes, neófitos e outros amantes de livros)

Paulo Roberto de Almeida
(um book-addicted e dependente livresco terminal...)

Não conheço as regras, se existem, que eventualmente se aplicariam à prática das resenhas literárias e confesso que nunca vi nenhum “manual do resenhista profissional” (creio que isso não existe, ainda que possa haver mercado para algum tipo de “How to do a perfect review” ou então “An Idiot’s Guide for Reviewing Books”). Em todo caso, não pretendo, no presente texto, ou em qualquer outro contexto, preencher essas lacunas ou responder a questões do tipo “tudo o que você sempre quis saber a respeito das resenhas de livros e nunca teve a quem perguntar”.
Meu propósito é mais modesto e totalmente auto-explicativo. Pretendo, apenas, delinear alguns princípios constitutivos do que poderia ser considerado uma resenha em moldes “normais”, uma vez que este gênero, em especial no Brasil, parece ter derivado para o equivalente das modernas guerras de religião, com trucidamentos impiedosos de um lado e excessos encomiásticos de outro. Sem pretender fazer um “Book review for beginners”, vejamos o que poderia ser dito de razoável neste campo da leitura crítica.

Como sou um book-lover irrecuperável, um leitor compulsivo e um anotador doentio – tendo já preenchido, desde a adolescência, vários cadernos de leituras, antes de passar às notas de computador –, pratico, desde o início desse meu não tão secreto vício da leitura contínua, o hábito dos resumos e das resenhas críticas. Faço-o por absoluto gosto da leitura anotada, e do debate crítico, ainda que unilateral e à distância, com o autor de cada um dos livros que leio. Antes – e durante certo tempo – tinha por hábito anotar à margem dos livros, o que só podia fazer, evidentemente, com aqueles que me pertenciam, sendo escusado fazê-lo, por respeito aos demais leitores e ao patrimônio bibliotecário, naqueles livros tomados de empréstimo, outro hábito secular meu, se ouso dizer, desde tempos imemoriais. Em todo caso, eu já freqüentava bibliotecas antes de aprender a ler, na “tardia” idade de sete anos. Creio que meu primeiro trabalho publicado, já na adolescência, foi uma resenha de um livro de Erich From – acho que foi Medo à Liberdade, versão brasileira, pela Zahar, de Escape From Freedom (1941) –, impresso em mimeógrafo a álcool num num jornalzinho do grêmio acadêmico do colegial e que caberia algum dia recuperar.
Essas anotações à margem – que aumentam o valor dos livros usados quando seu autor é algum personagem famoso, cuja biblioteca foi reciclada ou doada por herdeiros “desprezíveis” – são incômodas, posto que “telegráficas” e incompreensíveis, ademais de incompletas, fora do contexto em que foram feitas. Daí minha inclinação, desde muito cedo, pela anotação crítica dos pontos relevantes de cada obra e uma avaliação final sobre a contribuição daquele livro para o conhecimento de algum campo especializado. Sim, devo confessar também que, salvo em raras ocasiões, minhas resenhas críticas sempre se dirigiram a obras de não ficção, uma vez que me confesso, não um “objeccionista” de obras puramente literárias, mas um leitor relativamente incapaz de realizar análises de obras de literatura stricto sensu. Meu “pecado original” sempre foi, e permanecerá sendo, a resenha de obras de não ficção, em especial no campo das humanidades, o que inclui também a economia e algumas vertentes das ciências “duras”.

Dito isto, vejamos agora o que eu considero que deva ser, ou constituir, uma resenha. Talvez fosse o caso de começar por dizer o que NÃO deve ser uma resenha.
Seria preciso, em primeiro lugar, que haja um mínimo de empatia entre o autor e o objeto em questão, ou seja, algum vínculo de interesse mais forte entre o resenhista e a obra examinada. Ainda que se possa conceber um exercício de crítica implacável, ou a condenação sem apelo de uma obra resenhada, não conviria que o animus examinandi do resenhista fosse totalmente negativo em relação ao autor do livro ou a temática do próprio. Resenhas sob encomenda, ou como obrigação profissional, podem correr esse risco, ainda que seja concebível a existência – aliás reconhecida – de resenhistas profissionais, pagos pelos órgãos da imprensa, para fazer exatamente esse tipo de trabalho. Mas, seria importante que o resenhista disponha de certa liberdade na escolha dos livros a serem examinados, como forma de garantir a já referida empatia.
Em segundo lugar, uma resenha tampouco deveria tentar descobrir supostas motivações pessoais do autor do livro sob exame, idéias que não estão explícitas, de forma transparente, na obra em questão. O único critério válido é o exame da obra em si, seus argumentos intrínsecos e explícitos, não o que possa pensar o autor sobre assuntos da vida civil ou suas opiniões expressas em outras circunstâncias e ocasiões, a propósito de outros temas. O que autor pensa deve se esconder atrás da obra, cujo conteúdo deve permanecer como critério único e exclusivo da atenção do resenhista.
Uma resenha também NÃO deve servir como meio de vingança por querelas passadas ou diferenças políticas e ideológicas que possam até dividir os “interlocutores” na vida civil. Trata-se de prática bastante comum nos meios de comunicação fortemente partidarizados ou dominados por alguma personalidade identificada com determinadas causas políticas e sociais. Não se pode excluir, é verdade, a exposição e o exame das posições políticas do autor da obra, mas o próprio resenhista deveria tentar separar esse aspecto da avaliação da obra, a não ser que esse aspecto seja inerente à temática exposta.

Vejamos, agora, o que pode ser uma resenha. Ela pode, obviamente, ser muitas coisas, ao mesmo tempo ou alternativamente, mas tudo depende da finalidade ou destinação da resenha em causa. Não estou considerando aqui “press releases” das próprias editoras ou notas factuais com finalidades puramente comerciais ou de simples informação e registro. Uma resenha deve conter uma exposição do conteúdo do livro, uma observação sobre o eventual ineditismo ou caráter original das informações ou dados nele contidos e alguma apreciação crítica sobre seu valor enquanto obra literária (ou científica, no sentido amplo).
Quanto à forma das resenhas, não existem propriamente padrões fixos. Os modelos consagrados são os mais variados possíveis, indo das pequenas notas às resenhas quilométricas. Essas variedades tendem a distribuir-se segundo os meios de divulgação. Jornais e revistas de informação geral parecem reservar espaço para apenas dois tipos de “resenhas”: curtas notas de registro sobre a publicação das obras correntes, isto é, a produção comercial das editoras, e resenhas stricto sensu que informam sobre o conteúdo e discutem as principais idéias ou argumentos do autor. Já os veículos especialmente consagrados à discussão da produção literária – periódicos especializados e suplementos literários dos próprios jornais – costumam abrigar resenhas lato sensu, que soem ser de maior amplitude.
Confesso minha preferência pelos artigos-resenhas – ao estilo dos review-articles do quinzenal literário The New York Review of Books (não confundir com The New York Times Book Review, o suplemento literário dominical desse jornal) – pois neles é possível discutir um grande problema mediante a apresentação de um ou mais livros que tratem do assunto em pauta. Trata-se de um gênero de resenhas muito pouco cultivado no Brasil, praticamente sem espaço em nossa imprensa, pois mesmo as revistas que agora surgiram para tratar de livros – como a Entrelivros, por exemplo – não ostentam, a propriamente falar, essas resenhas-artigos que fazem a fama da NYRB (a Entrelivros, aliás, publica resenhas do NYTBR). Nem sempre se trata de livros – pode ser uma exposição, ou um filme –, mas sempre é uma peça literária no mais alto sentido intelectual da palavra.

A forma não é, contudo, o coração da resenha, uma vez que ela pode ser tão mutável ou inovadora quanto os gêneros literários. O essencial da resenha está naquilo que é transmitido ao leitor, seu espírito e seu discurso. Uma resenha deve conter, antes de mais nada, um resumo dos argumentos principais do livro sob exame, dispensável, na parte relevante, quando se trata de uma trama policial, quando sequer se sugere o famoso “whodunit”, mas podem ser dadas as circunstâncias do crime. A exposição honesta, concisa e objetiva do teor do livro é um elemento essencial da resenha bem conduzida, sem a qual ficam lacunares tanto a discussão dos argumentos ou idéias do autor do livro quanto a crítica que se pretende fazer deles.
Uma vez apresentado o livro, idealmente no primeiro terço da resenha, caberia ao comentarista agregar outros elementos que permitam situar o livro no seu contexto, um pouco como sua posição no “estado da arte” daquele campo do conhecimento, o que no caso dos romances representaria discutir o que ele traz de novo ou de original em relação ao gênero no qual ele se situa. Essa parte também pode vir ao início, se há espaço suficiente para o resenhista começar o exame de uma obra pela avaliação do campo mais vasto no qual ela se situa.
O terceiro elemento central de uma resenha, obviamente, é a avaliação crítica do resenhista, sua apreciação favorável ou a indicação das limitações da obra em exame. Este ponto é um componente indispensável de toda resenha, ainda que bastante flexível em relação às possibilidades abertas segundo o veículo ao qual a resenha se destina. Uma revista acadêmica tem padrões bastante rígidos para a elaboração desse tipo de nota crítica, ao passo que um pasquim literário oferece latitude para considerações de ordem mais subjetiva. A resenha verdadeira sempre termina por algum julgamento de valor, o que por vezes descamba para alguma condenação sem recurso, segundo as escolas e clãs em que se divide a chamada république des lettres. São raros, contudo, os casos nos quais a resenha nada mais representa do que uma estocada mortal nas pretensões do autor a uma brilhante carreira literária. No mais das vezes, os golpes são superficiais, apenas para não inflar por demais o ego do autor, quando se trata do pura literatura.
Nos campos das ciências humanas e da economia, que constituem meus terrenos de manobras favoritos, a seriedade é de rigor, mas também já assisti a descomposturas em regra, quando não a poderosos tiros de canhão, como acontece nas verdadeiras guerras de religião, que nestes casos separam a esquerda – dominante nos meios da academia – de uma suposta direita, sempre envergonhada e quase inexistente. O que ocorre, geralmente, é que uma ala ignora a outra, sendo que a esquerda faz resenhas favoráveis de sua tribo e os liberais só se interessam pelos livros que eles reputam ter qualidades suficientes para merecer uma avaliação crítica. Não vou listar os veículos preferidos de uma ou outra escola, mas no terreno universitário todas as revistas estabelecidas ostentam, por dever de ofício, seções de resenhas, nas quais os mestrandos e outros candidatos a títulos podem exercer seus talentos até serem chamados a assinar verdadeiros artigos “científicos”.

Resumindo, e dando as “palavras-chave”, eu diria que uma boa resenha deveria ser feita dos seguintes elementos:

(a) Objeto: apresentação resumida do livro, com suas partes ou seções constitutivas e algum destaque para o argumento principal;
(b) Desenvolvimento: discussão das idéias centrais do autor, sua coerência intrínseca, sua validade extrínseca e contexto mais amplo nas quais elas podem ser inseridas;
(c) Avaliação: apreciação crítica, tanto do ponto de vista do conteúdo quanto do método, se for o caso, com balanço da contribuição do autor para a área do conhecimento;
(d) Prolegômenos e derivações: havendo espaço e possibilidade, a resenha pode começar discutindo o próprio campo no qual se situa a obra, fazendo um balanço do “estado da arte” e antecipando seu possível impacto para os estudos futuros naquele campo.

Voilà, creio ter apresentado o meu “manual” da resenha honesta, mas na verdade devo confessar que sou muito pouco sistemático, no sentido dos pontos acima resumidos. O que acaba valendo, para mim, é, finalmente, a empatia para com o livro ou o autor, elementos centrais, senão essenciais, de toda boa resenha.
Vale!

Brasília, 24 de janeiro de 2006

O programa nuclear iraniano e o Brasil: um perito responde a questoes

Um alto funcionário do setor nuclear brasileiro revelou-me, no ano passado, o teor de suas respostas a consultas de um pesquisador brasileiro em relações internacionais, consultando-me sobre um ou outro ponto de seu interesse. Desconheço se suas respostas foram publicadas, onde o foram, se eventualmente o foram e quanto disso tornou-se público.
Como o assunto parece ter evoluído, e como o governo brasileiro atual parece ter assumido outras atitudes -- embora os envolvidos, do governo passado, ainda teimem em defender suas posições --, o funcionário em questão autorizou-me a publicar suas respostas, enviadas em confiança.
Creio que elas refletem um conhecimento mais técnico, mas também político, das implicações do envolvimento do governo anterior com o governo iraniano e permitem detectar certas contradições nas posições de analistas (jornalistas, acadêmicos), que continuam a manter ilusões sobre a natureza exata do chamado "acordo iraniano".


A questão do programa nuclear iraniano
Funcionário governamental brasileiro do setor nuclear

1) Quais são os pontos positivos do acordo assinado entre Brasil, Irã e Turquia? E os negativos?
Em primeiro lugar, é preciso que fique bem claro que não se trata de um acordo, como a imprensa vem falando (alguns até falaram de “tratado internacional”, numa incompreensão manifesta do que sejam acordos ou tratados internacionais). Formalmente, se trata de uma simples declaração, como aliás expressamente mencionado no ato assinado pelos três ministros das relações exteriores: “Tendo-se reunido em Teerã em 17 de maio, os mandatários abaixo assinados acordaram a seguinte Declaração”. É surpreendente, assim, que jornalistas e analistas políticos continuem a falar em acordo. Pela sua forma e, sobretudo, pelo seu teor trata-se, pura e simplesmente, de uma espécie de “nota trilateral unilateral”, entendendo-se por isso uma declaração que os três ministros oferecem ao mundo num gesto de boa vontade, que serve mais para enganar os incautos, e todos aqueles propensos a acreditar em tudo o que certos dirigentes proclamam, do que para resolver de fato a questão.
Como ponto positivo, não vejo absolutamente nenhum, pois para isso teria de ter havido progressos em relação aos entendimentos que os países 5+1 vinham mantendo desde muito tempo com o Irã, e até aqui sem qualquer resultado prático. A declaração – que diz claramente que se trata de um “ponto de partida”, mera peça de papel destinada a criar a “oportunidade de começar um processo prospectivo, que criará uma atmosfera positiva, construtiva, não-confrontacional” – representa, num certo sentido, um retrocesso, já que ela remete vagamente a novas etapas de consultas e negociações para o que é um processo já suficientemente mapeado em seus contornos básicos: a necessidade de o Irã submeter o seu programa nuclear, em sua integralidade, aos controles da AIEA. Ora, o pretenso “acordo”, de fato uma declaração puramente retórica, em nenhum momento toca nessa questão crucial.
A declaração apresenta, portanto, diversos pontos negativos; pode-se dizer que ela constitui uma completa e rotunda manifestação de fracasso: o Irã continua a tergiversar em torno de seu programa nuclear, e os dois países que desempenharam esse patético papel de patrocinadores de uma operação “engana-ingênuos” se prestaram a ser manipulados por um regime que vem se colocando, por suas próprias ações, à margem da comunidade internacional. O que é preciso acrescentar, também, é que jornalistas brasileiros não sabem ler declarações, e muito menos interpretá-las.

2) Como tal negociação se insere na política externa do governo Lula?
Falar de negociação seria dar muita relevância ao que constitui, tão simplesmente, mais uma operação de pirotecnia externa de um governo que tem uma necessidade obsessiva de buscar os holofotes da mídia mundial, tão somente para construir uma falsa imagem de líder internacional para o presidente Lula. Como no caso de outras operações do gênero, de tão triste registro nos anais da diplomacia brasileira, se trata de uma cortina de fumaça em torno do nada, pois nenhum resultado concreto foi obtido, a não ser a vaga promessa de troca de combustível por urânio enriquecido, a ser hipoteticamente detalhada em eventuais negociações ulteriores.
Assim ocorreu com outras proezas antecipadas por esse governo – ingresso do Brasil no Conselho de Segurança, integração da América do Sul e conclusão das negociações comerciais multilaterais – que da mesma forma redundaram no mais completo fracasso. É lamentável ver o Brasil democrático dar seu apoio a regimes autoritários na região, como o dos irmãos Castro (aliás, um dos últimos totalitarismos remanescentes no planeta), à ditadura nascente do bufão de Caracas, para nada dizer da inacreditável solidariedade com o personalismo caudilhista de Evo Morales, que expropria investimentos brasileiros na Bolívia e é pelo menos conivente com o envio de toneladas de coca de seu país ao Brasil; sem mencionar Sudão e Coréia do Norte.
De forma geral, este governo está pronto a dar sua aprovação a qualquer gesto gratuito de ofensa aos Estados Unidos por parte dos piores regimes do planeta, por que isto faz parte de sua natureza primária, de sua essência. Não se trata do antiamericanismo “normal” do Itamaraty, que sempre foi naturalmente antiamericano, mas moderadamente; se trata do antiamericanismo exacerbado do PT e de seus patéticos seguidores no Itamaraty. Tem sido assim na região, onde sistematicamente estão sendo criados organismos que excluem expressamente os EUA de qualquer papel significativo na cooperação regional; agora se pretende também estender as mesmas posições no plano universal, em iniciativas de tal dimensão megalomaníaca que não encontram paralelos na história precedente de nossa diplomacia.

3) Por que os EUA se mostraram insatisfeitos com tal acordo? Quais os interesses secundários por de trás?
Os Estados Unidos de Obama, depois de alguma ilusão com a retórica aparentemente amistosa do Itamaraty, se deram conta do verdadeiro sentido da ação diplomática do Brasil. Em primeiro lugar, não cabe falar de “acordo”, como já explicitado acima. A declaração de Teheran, imediatamente saudada pelos seus próprios promotores como uma vitória da diplomacia – e inacreditavelmente acolhida pela imprensa mundial como uma nova era nas relações mundiais de poder, como sendo a da emergência das potências médias – teve seu conteúdo corretamente avaliado pelas principais potências ocidentais, que focaram o que ficou obscurecido no pretenso “acordo”. O essencial do dossiê iraniano se refere ao programa nuclear desse país, que as principais potências garantidoras do TNP suspeitam de ter objetivos militares, questão ainda não suficientemente esclarecida. Mas o fato, corretamente percebido pelos EUA e demais países, é que o pretenso “acordo” de Teheran não toca absolutamente nesses aspectos, e não oferece nenhuma garantia quanto ao que essas potências garantidoras do TNP demandam desde o início: a supervisão integral das atividades de enriquecimento de urânio do Irã pela AIEA, de conformidade com as disposições aplicáveis em casos similares.
Se por “interesses secundários” se entende a preocupação dessas potências com a proliferação nuclear, pode-se dizer que, efetivamente, esses são os interesses por trás das pressões que são feitas desde muitos anos em relação às atividades nucleares do Irã. Conhecendo-se o perfil dos dirigentes políticos iranianos, pode-se dizer que esses interesses, primários, no caso, e essas preocupações são perfeitamente legítimos e justificados.

4) Não é legítimo o enriquecimento de urânio iraniana para fins pacíficos? Existem violações ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear para tamanho receio dos EUA e outros países?
Há uma pressuposição ingênua – aliás comprada pelo seu valor face pelo Brasil e por grande parte da imprensa brasileira – de que o programa iraniano se destina a fins inteiramente pacíficos. Se este é o caso, por que então o país persa se empenha, desde longos anos, num jogo de gato e rato com a AIEA? A violações começam justamente pela indisponibilidade de submeter o conjunto de suas instalações, equipamentos e estoques de material aos controles da AIEA. Não por outra razão o Conselho de Segurança da ONU já aprovou resoluções tendentes a enquadrar o Irã no regime normal de não-proliferação, mas o país se recusa a colaborar com os procedimentos aplicáveis ao caso. Atividades de enriquecimento legítimo não precisam recorrer aos subterfúgios que caracterizam o Irã.

5) Existem de fato duas linhas de política externa diferentes postas em contraposição? A do dá ou desce e a da negociação?
Os termos usados pelo presidente são tão vulgares, e chulos, que não merecem qualquer comentário. A única coisa que poderia ser dita, justamente, é que as potências garantidoras do TNP vêm tentando a via da negociação, até agora sem sucesso, desde o início desse processo. O entendimento primário que o presidente mantém sobre procedimentos de política externa o fazem interpretar o mundo com essa visão maniqueísta, que na verdade apenas revela o antiamericanismo elementar que caracteriza toda a sua diplomacia.

6) A imagem do Estado brasileiro realmente se desgastou com o episódio? A ONU não sinalizou que aprova a iniciativa trilateral?
Não propriamente a do Estado brasileiro, mas certamente a da diplomacia de Lula, crescentemente identificada com o apoio insensato a regimes pouco palatáveis em diversas regiões do globo. O ridículo ativismo bolivariano no caso patético de Honduras – onde rompemos diversas tradições de nossa diplomacia, a começar pelo princípio da não-intervenção – e a inaceitável solidariedade com a ditadura castrista – em face das flagrantes violações aos direitos humanos que ocorrem num dos dois últimos totalitarismos comunistas ainda remanescentes no mundo – são apenas dois exemplos de uma diplomacia deplorável para os padrões profissionais a que estávamos acostumados no Itamaraty. Isso é o resultado do seqüestro do Itamaraty pelos interesses partidários do PT e seus instintos primários, em nítida contradição com os interesses permanentes do Brasil.
Quanto à ONU, ela ainda não se pronunciou formalmente sobre o pretenso “acordo” de Teheran. O que ocorreu foi um apoio inicial do Secretário Geral da ONU, Ban Ki Moon, provavelmente mal assessorado, ao princípio das negociações com o Irã, o que aliás os países vem conduzindo desde o início, contra a manifesta má vontade do regime iraniano.

7) Não se está dando mais importância para os agentes envolvidos do que para o próprio teor do acordo? No que se refere ao conteúdo do documento: ele é eficiente tendo em vista que apenas uma quantidade limitada de urânio será enriquecida na Turquia? E o resto que continua no território iraniano?
Esse é um ponto importante, mas os observadores ainda não parecem ter se dado conta desse aspecto: está sendo mais importância à ação diplomática do Brasil e da Turquia – que são meros intermediários para uma determinada finalidade – do que o conteúdo mesmo do assunto em causa: o programa nuclear do Irã, que resta largamente obscurecido pelas suas manobras diversionistas e obstrucionistas. É inacreditável que a diplomacia brasileira tenha se prestado ao papel de linha auxiliar de um regime que já demonstrou seu nítido desprezo pelos direitos humanos, pelas liberdades democráticas e pelo cumprimento de suas obrigações internacionais.
Quanto à operação em si, é claro que desde a oferta feita em outubro de 2009, o Irã acumulou uma quantidade superior de material nuclear do que aquela que seria supostamente colocada sob a responsabilidade da Turquia, segundo modalidades pouco claras, aliás, o que permitiria ao Irã retroceder nos supostos compromissos assumidos ao abrigo de uma declaração vaga e desprovida de qualquer mecanismo de verificação. Toda a operação, aliás, revela um amadorismo diplomático que não combina absolutamente com as tradições diplomáticas do Brasil.

8) Quais são as perspectivas futuras desta questão geopolítica?
Difícil dizer, nesta fase, mas é evidente que o Irã construiu, para si mesmo, um difícil contencioso com a comunidade internacional que pode ter desdobramentos imprevisíveis nos meses à frente. De imediato, o Irã está encaminhando o Oriente Médio em direção de uma competição nuclear que é notoriamente prejudicial aos objetivos de paz e de segurança internacionais, que devem ser defendidos por todos os países comprometidos com princípios basilares da Carta da ONU. É lamentável que a diplomacia brasileira não esteja atentando para esses aspectos potencialmente desestabilizadores da aventura nuclear iraniana, e que ela continue a emprestar seu apoio a um regime problemático desse ponto de vista.

9) Israel atacou uma embarcação com fins humanitários em alto mar. Como isto se encaixa à discussão? Fala-se que Israel possuem diversas bombas atômicas. Por que também não passa pelas mesmas pressões que o Irã? Caso seja por que não assinou o Tratado de Não-Proliferação, o que ocorreria caso o Irã denunciasse este mesmo Tratado?
O infeliz episódio do ataque israelense a barcos de uma pretensa “flotilha da liberdade” – na verdade, de militantes pró-Hamas, ou manipulados por esse movimento terrorista – não tem nada a ver com o dossiê nuclear iraniano, a não ser muito indiretamente e circunstancialmente. Israel possui, obviamente, uma capacidade nuclear, ainda que seus contornos exatos permaneçam indefinidos. Não foi Israel, contudo, que prometeu obliterar do mapa do Oriente Médio um outro Estado e sim o regime iraniano. A capacitação nuclear israelense tem, nitidamente, propósitos dissuasivos e defensivos, e Israel jamais ameaçou qualquer país vizinho com uma guerra nuclear; apenas alertou que se defenderia por todos os meios disponíveis de um ataque que colocaria em risco sua existência como Estado independente e pacífico. Não sendo signatário do TNP, Israel não tem, formalmente, de cumprir com suas obrigações, às quais se obrigou o Irã (e não vem cumprindo).
O Irã, como qualquer outro Estado soberano da comunidade internacional, tem todo o direito de denunciar e de retirar-se de qualquer tratado a que tenha aposto sua assinatura, inclusive o TNP e seu estatuto de membro da AIEA. A Coréia do Norte fez justamente isso, e se transformou em pária da comunidade internacional. Com o Irã ocorreria provavelmente o mesmo, com o elemento adicional disso servir para deslanchar uma provável corrida armamentista na região, com possíveis desdobramentos nucleares (legais e ilegais), que não contribuiriam em nada para os objetivos de estabilidade e de paz na região e de segurança estratégica, num contexto mais amplo. Todos os Estados responsáveis e os países amantes da paz deveriam estar conscientes desse fato. É lamentável que a atual diplomacia partidária do Brasil não atente para esse lado da questão: ou é muita ingenuidade, ou é má-fé; em ambos os casos, é deplorável do ponto de vista de nossas tradições diplomáticas. Como diplomata profissional, tenho vergonha de nossa atual diplomacia; acho que ela vai deixar uma herança muito negativa nos anos à frente. Será muito difícil reconstruir a confiança nas características impecáveis de nossa diplomacia antes desse governo. Na prática, o PT, com a conivência de alguns chefes do Itamaraty, a colocou ao duplo serviço de seus obscuros interesses partidários e aos de uma ideologia anacrônica.

3 de junho de 2010.

Politica Externa Brasileira: antecipando as mudancas (um texto de 2010)

O texto que segue abaixo foi elaborado em Shanghai, em setembro de 2010, sob solicitação externa, e nele tentei ser moderado em relação aos absurdos visíveis que se cometiam na política t do Brasil nessa época: amizades e intimidades com ditadores e violadores dos direitos humanos, intervenção nos assuntos internos de outros países, desejos megalomaníacos de grandeza, enfim, toda sorte de despautérios que necessitavam de correção.
Minha única virtude foi a de anunciar que essas mudanças viriam...
Paulo Roberto de Almeida

O legado de Lula em política externa: corrigir as amizades bizarras
Paulo Roberto de Almeida
Shanghai, 16 setembro 2010

Ao cabo dos dois mandatos de Lula, a posição do Brasil no cenário internacional se encontra realçada. Saber quanto desse prestígio é devido à sua diplomacia, qual é o efeito da ascensão geral dos emergentes, ou quanto pode ser atribuído ao próprio país, enquanto economia estabilizada com base na política econômica do governo anterior de FHC, são dúvidas legítimas na avaliação desse legado na frente externa.
Numa linguagem coloquial, pode-se dizer que a diplomacia de Lula teve bem mais transpiração do que inspiração, registrando-se a preeminência da forma – o hiperativismo presidencial, feito de incontáveis viagens ao exterior – sobre a substância, ou seja, resultados efetivos da agitação. Olhando-se por esse lado, a constatação que se faz é a de muitos dossiês abertos e poucos sucessos alcançados.
As prioridades externas de Lula podem ser alinhadas em três conjuntos de objetivos: (a) a conquista de um assento permanente para o Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas; (b) o reforço, a consolidação e ampliação do Mercosul; (c) a conclusão da Rodada Doha da OMC e a “correção de rumo” nas negociações do projeto americano da Alca.
Ora, com exceção da “implosão da Alca” – que era, digamos, uma meta “negativa” – nenhum dos demais objetivos foi alcançado, sequer de modo parcial. É certo que o prestígio internacional do Brasil e sua audiência internacional cresceram no período, mas isso se deu sobretudo em função da preservação da estabilidade macroeconômica e da ausência dos equívocos econômicos de tipo populista cometidos por outros governos na região.
Algo dos fracassos pode ser atribuído às concepções partidárias, equivocadas, do PT, e impostas ao Itamaraty, sobretudo no caso, inexplicável, dos recuos em direitos humanos, das estranhas amizades com personagens de regimes pouco freqüentáveis no plano internacional ou da prevalência de critérios ideológicos nas preferências políticas externas. Em diversas ocasiões, o próprio presidente manifestou seu apoio político a candidatos de esquerda em eleições na região, o que rompe com a tradição brasileira de não ingerência nos assuntos internos de outros países. Outra manifestação indevida da mesma tendência foi a clara tomada de posição no caso da crise política em Honduras, quando o Brasil ficou caudatário das posições chavistas no imbróglio. O próximo governo, qualquer que seja ele, precisaria restabelecer os fundamentos profissionais, e não partidários, da diplomacia brasileira.

Shanghai, 16 setembro 2010

Publicado como “Corrigir amizades bizarras internacionais é desafio”, no portal iG, Último Segundo, “Era Lula e os Desafios de Dilma” (2/12/2010; link: http://ultimosegundo.ig.com.br/governolula/artigo+corrigir+amizades+bizarras+internacionais+e+desafio/n1237826574910.html).

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Academicos escrevem sobre politica externa (grande bocejo...)

Sempre me pergunto o que pensam os acadêmicos. Acho que pensam muito e mas sua reflexão é sempre carente de algum elemento mais consistente. Aliás, como as próprias políticas brasileiras, internas e externa. Improvisação é o nosso forte, ao contrário do que pensam muitos vizinhos.
Não creio, por exemplo, que o Itamaraty está à deriva. O governo certamente sim, mas o Itamaraty é profissional. Apenas que ele necessita refletir os "impulsos" -- este é o conceito -- de um governo que não sabe bem o que quer, ou se sabe, não pensou ainda em como obter.
Nossos principais problemas estão aqui no Brasil, não lá fora. Mas isso, nem o governo, nem os acadêmicos parecem ter percebido.
Um dia chega, talvez tarde...
Paulo Roberto de Almeida

TENDÊNCIAS/DEBATES
Itamaraty não pode ficar à deriva
MARCELO COUTINHO
Folha de São Paulo, sexta-feira, 22 de abril de 2011

O Itamaraty já entendeu que estamos em uma transição de poder no mundo, mas se enganou quanto ao estágio dessa transição e seus efeitos

Virou lugar-comum no governo classificar a atual fase da política externa de "consolidação". Ideia sem sentido. Afinal, em matéria de direitos humanos houve sensíveis mudanças, felizmente para o bem.
O governo Lula aproximou-se de ditadores que Dilma agora censura.
Mesmo com essa modificação, parte do mundo passou a olhar com desconfiança para o Brasil nessa matéria, levando inclusive a OEA a interferir em assuntos internos, como a construção de Belo Monte, e com isso estabelecer uma crise.
Se, por um lado, o elemento de descontinuidade na diplomacia é motivo de comemoração, por outro, não apaga marcas e salienta um aspecto variável preocupante da política externa brasileira. Tais mudanças indicam que o Itamaraty nem sempre dispõe de bons cenários de referência.
No mundo árabe, por exemplo, o governo buscou identificação com velhos regimes autoritários. Investimos anos em relações acríticas, chegando mal a uma região em fim de ciclo político. Mais uma vez atrás dos acontecimentos, Brasília assistiu o desenrolar do maior processo histórico dos últimos 20 anos.
As alterações periódicas em nosso relacionamento internacional, mesmo as que corrigem erros, retiram força da política externa brasileira. Leva-se menos a sério um país que oscila a cada troca presidencial e apresenta uma política de interregno, ziguezagueando entre "realpolitik" e liberalismo.
O Itamaraty já entendeu que estamos em uma transição de poder no mundo. Mas se enganou quanto ao estágio dessa transição e seus efeitos. Além disso, confundiu uma interessante posição de centro flexível no espectro político com um vaivém improdutivo.
Estressamos relações com os EUA para apaziguá-las sobre bases indefinidas. A China é concorrente industrial e, simultaneamente, a maior parceira. Depois dos Rafales franceses, piscamos para os caças americanos, não nos dando conta de que ambos são da Otan, de cujas pretensões no Atlântico Sul o próprio governo suspeita. Os russos são dos Brics, mas, por algum motivo, não podemos cogitar seus aviões de combate.
Embora tenha perdido importância, a visita de Obama serviu para restabelecer um canal mais aberto de diálogo entre a Casa Branca e o Palácio do Planalto. Foi uma massagem ao ego brasileiro. Insuficiente, mas não desprezível.
Obama cedeu um meio apoio ao Brasil para a vaga fixa no Conselho de Segurança da ONU. Menos do que o necessário. "Apreço pela aspiração brasileira" pode significar apenas que os EUA admiram a vontade do país em assumir responsabilidades. O pronunciamento chinês de apoio foi quase tão vago.
Ninguém imagina que uma reforma que amplie o principal foro de decisões mundiais poderá deixar o Brasil de fora. A governança global precisará refletir o novo conjunto de forças internacionais também nas questões de guerra e paz.
Cabe a nós mantermos firmeza.
Sem maiores conflitos no Pacífico, Washington segue como ator-chave no sistema internacional.
Sua influência hemisférica é grande e representa, até certo ponto, desafio à ascensão brasileira, cuja perícia diplomática consistirá em abrir condições políticas à acomodação externa do nosso crescimento. Para o país que deseja ser tratado como igual pelos EUA, a inconstância não é bom negócio.
O Itamaraty vive pressões pendulares, ora para o Ocidente rico, ora para os países em desenvolvimento. Nós não podemos ficar à deriva, levados por correntes para o Norte e para o Sul.

MARCELO COUTINHO, professor de relações internacionais da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro ) e do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), é coordenador do Laboratório de Estudos da América Latina (Leal).

Terceira carta aos leitores do blog Diplomatizzando (uau: 355!)

Terceira carta aos leitores do blog Diplomatizzando
Paulo Roberto de Almeida

Meus caros leitores (agora em número de 355 seguidores),

Escrevo muito, eu sei. Nem sempre dirigido a alguém em particular, geralmente textos de caráter impessoal, de cunho acadêmico, de análises políticas ou econômicas, frequentemente críticas, algumas ácidas, em face do que observo no Brasil (e no resto do mundo). Sim, sou um leitor compulsivo, o que é um vício adquirido na primeira infância e do qual não consigo me redimir (nem quero). Sei que por vezes isto é um incômodo (quando estou dirigindo, por exemplo, fica difícil continuar as leituras, mas aí estou com as notícias no rádio), mas carrego esta sina com bom humor e ótima disposição.
Sempre estou pensando em algo (obviamente), quero dizer, em coisas novas, diferentes, sobretudo quanto não tenho nada para fazer, o que é raro, como vocês podem adivinhar, mas também acontece: quando estou embaixo da ducha (alguns minutos apenas, hélas, mas confesso que gostaria de ficar mais), quando estou passeando com os cachorros (quase uma hora, noite adentro), ou quando vou dormir (e o sono pode durar uma infinidade para me abater, dependendo justamente do que estou “pensando”, ou arquitetando).
Quando não estou lendo, me deslocando, trabalhando, fazendo compras, ou comendo, estou escrevendo, invariavelmente, ou num dos meus dois caderninhos de bolso (um pequeno para o bolso da camisa, outro médio, no bolso do paletó), ou num dos três ou quatro computadores nos quais trabalho alternadamente (sim, preciso reduzir o número, pois a bagunça nos arquivos tende a crescer). Depois que escrevo, publico, e cada vez mais – não por decisão minha, mas por demandas externas – publico sob encomenda, em colunas regulares, o que não é, esclareço, minha preferência pessoal (como não sei dizer não, acabam abusando da minha boa vontade). Gosto mesmo de escrever ao léu, por impulso do momento, os temas que decido, na perspectiva que prefiro, com os argumentos que defendo.

Como já escrevi em outros trabalhos, meu único critério na escrita, ou na argumentação oral, é o da honestidade intelectual, que significa mais ou menos o seguinte: procure coletar todas as fontes de informação sobre um determinado assunto a que você pode ter acesso pelas vias normais (e elas são infinitas, hoje em dia); leia tudo cuidadosamente; coloque todas essas informações nos seus devidos contextos (histórico, ambiental, geopolítico, econômico, relacional, etc.); reflita seriamente sobre as implicações de tudo isso para o Brasil, para o mundo, para você mesmo; ordene seus pensamentos segundo prioridades muito simples, que o ajudem a oferecer soluções para determinados problemas da sociedade, do Brasil e do mundo, em função daquilo que é relevante em nosso mundinho meio desconjuntado: economia de meios, boa relação de custos e benefícios, utilidade para o maior número, melhoria das condições de vida (material ou espiritual) das “populações” implicadas (que, por vezes, podem ser uma só pessoa); por fim, tente antecipar as consequências de seus atos, pois que sempre existem efeitos (por ação ou omissão) daquilo que fazemos ou deixamos de fazer.
Estes são meus critérios – aqui um pouco mais elaborados ou racionalizados do que o que de verdade acontece na vida prática, sempre mais bagunçada, claro – e é em função deles que escrevo e publico o que penso, sem pensar em agradar ninguém, e sem esconder de ninguém o que realmente penso. Confesso que tenho certa alergia à burrice – deve ser um defeito de quem leu muito e continua a ler exageradamente, e que acha que ninguém tem do direito de ser ignorante, já que as informações estão livremente disponíveis, mas também sei que a maior parte da humanidade tem preguiça e não lê quase nada, assumindo passivamente o que entra pela televisão aberta – mas confesso que também tenho, e em grau infinitamente maior, desprezo pela desonestidade intelectual, o que infelizmente encontro sempre pela frente: geralmente nos políticos, mas também entre colegas de academia, que não teriam o “direito” (penso eu) de ignorar os dados da realidade para defender ideias idiotas e propostas nocivas para a sociedade.
Sou intolerante, apenas nesses casos, tolerando na maior parte das vezes erros e equívocos que emergem da falta de estudos e de reflexões (já que, afinal de contas, ninguém tem a obrigação de ser intelectual). Mas, e aqui creio fazer a minha parte, sempre procuro diminuir o quantum de equívocos que existe na humanidade (e ele é enorme, obviamente), contribuindo da melhor forma possível para o que eu chamo de obra de “elevação espiritual da humanidade” – pelo menos neste cantinho de mundo que é o meu – escrevendo e divulgando o que é fruto de minhas leituras e experiências de vida. Este é o sentido deste blog e por isso creio que tenho o dever e prestar contas aos meus leitores, que são vocês aqui presentes, e aos quais sou grato pela vigilância demonstrada nos muitos comentários que recebi, direta e indiretamente (nem todos publicados), nos pedidos de ajuda para estudo ou trabalhos, nas simples mensagens de solidariedade, de cumprimentos, de críticas. Sem leitores, não existiriam escritores, e eu sou devedor, em primeiro lugar a todos os que me lêem.

Escrevi uma primeira carta aos leitores deste blog em Shanghai, em setembro de 2010, quando eles eram apenas pouco mais de duas centenas, para dizer-lhes, justamente, de meus deveres para com eles (vejam aqui, neste link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/09/aos-leitores-deste-blog-conversa-tete.html). Pouco depois, em Kyoto, em outubro do mesmo ano, eu dava continuidade ao diálogo com os seguidores e leitores deste blog, discutindo as reações de alguns comentaristas, e prometendo escrever mais (vejam este link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/10/segunda-carta-aos-leitores-do-blog.html). Não o fiz, pois viajei, me reinstalei, e só agora acabei recebendo minha mudança da China – duas enormes burocracias no meio – e pude retomar algumas leituras interrompidas então.

Enfim, esta terceira carta não tem muito a ver com as duas primeiras, embora represente uma continuidade do diálogo, num momento em que “meus” leitores aparentemente chegaram à marca dos 355 seguidores (talvez mais, talvez menos, dependendo de quem acesso, quem repassa, quem lê e como lê). Não creio que eles me devam qualquer explicação sobre os motivos pelos quais seguem este blog (alguns por razões talvez inconfessáveis, a maior parte por real interesse, suponho), mas esse simples fato, objetivo, me faz refletir que também tenho certas responsabilidades para com todos esses leitores, curiosos, passantes, navegantes, interessados e críticos de ocasião.
A minha primeira responsabilidade seria a de não decepcionar os leitores, entregando-lhes gato por lebre, como se diz. A segunda é a de preservar o padrão e os princípios que me motivam a ler, estudar, refletir, escrever e publicar, entre esses princípios o primordial e já referido da honestidade intelectual. O blog representa para mim uma espécie de divertissement intelectual, ou seja, nada de muito sério que me distrai de minhas ocupações principais – no plano profissional e acadêmico – e que se refletem em meus trabalhos mais “sérios” – geralmente coletados em meu site pessoal, www.pralmeida.org, salvo copyright de algum editor comercial – mas ainda assim material sério de informação e alguma coisa para divertir, no meio de tanta tragédia e misérias humanas.
Como disse, leio muito – praticamente todos os grandes jornais diários de maior importância internacional, as principais revistas, e dezenas de outros sites, blogs e arquivos que, remetidos por entidades ou correspondentes pessoais, ocorrem de cair sob a minha lupa implacável – e procuro socializar minhas leituras mais interessantes (algum besteirol também, que ninguém é de ferro) com meus leitores e passantes ocasionais. O resultado deve ser satisfatório, pois o número de “assinantes” deste serviço não pago (mas que me dá muito trabalho) tem aumentado regularmente. Amigos já me recomendaram deixar tudo isto de lado, para me concentrar no que é essencial: terminar dois ou três livros de pesquisa que estão no meu pipeline há algum tempo, e fazer coisas mais sérias do que responder a aluninhos em busca de alguma “facilidade universitária”.
Talvez faça isso, no que certamente vou decepcionar alguns leitores, mas de fato preciso me concentrar no que é essencial, e naquilo que apenas eu poderia fazer, que é produzir trabalhos originais com a profundidade que meus estudos e pesquisas me permitem fazer, exclusivamente. Fazer blog, divulgar matérias de imprensa, precedidos, ou não, de comentários inteligentes, isso qualquer um pode fazer, o que me leva às recomendações smithnianas sobre a divisão social do trabalho: eu deveria me concentrar naquilo que apenas eu posso fazer, usando todas as minhas vantagens absolutas e relativas, estas ricardianas...
Que seja!

Em todo caso, gostaria de desejar boa Páscoa a todos os meus leitores – uma oportunidade para se empanturrar de chocolate e para mergulhar em mais leituras e escritos – e dizer que vou tentar moderar minha frequência neste espaço, para liberar mais tempo para coisas um pouco mais profundas e que exigem maior dedicação e empenho redacional.
Quero agradecer a todos e a cada um pela confiança demonstrada – que se revela nos comentários publicados – e dizer-lhes que tentarei cumprir meus objetivos de vida, sempre de forma honesta e dedicada: ler com paixão, escrever com reflexão, viver a vida com emoção, sempre distribuindo o que temos de melhor a oferecer aos que nos cercam e um pouco a todos os demais membros da imensa família humana. O mundo ainda é o que é, e que todos reconhecemos não ser o ideal – muito menos o Brasil – mas já melhoramos bastante em relação a um passado não muito distante (a geração de meus pais e avós, por exemplo, atravessou duas guerras devastadoras, e outras catástrofes “magníficas”), e esperamos melhorar ainda mais nos anos à frente.
Espero continuar dando minha contribuição para esses pequenos progressos da humanidade em direção a melhores materiais e elevação espiritual.
Vale.

Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 22 de abril de 2011)


Cartas anteriores:

2194. “Aos leitores deste blog Diplomatizzando”, Shanghai, 28 setembro 2010, 2 p. Conversa com os seguidores do blog, e seus leitores eventuais, em torno do espírito do blog, seus objetivos e as responsabilidades e princípios do autor. Postado no blog (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/09/aos-leitores-deste-blog-conversa-tete.html).

2209. “Segunda carta aos leitores do blog Diplomatizzando”, Kyoto, 22 outubro 2010, 2 p. Continuidade do trabalho 2194, sob a forma de diálogo com os seguidores e leitores do blog, discutindo as reações de alguns comentaristas. Postado no blog (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/10/segunda-carta-aos-leitores-do-blog.html).

Diplomacia lulista: desenterrando velhos escritos... (PRA)

Parece incrível, mas acontece.
Escrevo tanto (deve ser uma mania, talvez uma compulsão, mais provavelmente um vício e uma loucura terminal, mas que ainda não me matou...), e publico tanto (e nem sempre me avisam quando alguma coisa minha saiu em algum lugar), que por vezes me escapa um artigo ou outro publicado em algum veículo menos relevante.
Mas, neste caso, não se trata de um veículo "irrelevante" e sim da revista da qual sou editor adjunto, para a qual faço pareceres (rigorosos, como devem ser) e com a qual colaboro desde seu segundo nascimento em Brasília, em 1993 (um renascimento ou uma reencarnação que tem muito a ver com meu ativismo acadêmico).
Pois bem, acabei não registrando a publicação do artigo abaixo, o que só vim a constatar porque um amigo me mandou um trabalho sobre temas relativamente similares, quais sejam: as interpretações sobre a diplomacia do "nunca antes" (e espera-se que "nunca mais", ou em todo caso, "não mais agora, ou daqui por diante"). Acabei me lembrando deste, fui buscar e, êpa!, ai aparece este arquivo de um texto publicado, mas não devidamente registrado.
Agora corrigi minha lista de publicados, incluindo a posteriori o registro abaixo, e deixo o artigo à disposição dos eventuais interessados. Esclareço que ele foi foi concebido no final de 2005 e preparado e elaborado no começo de 2006, com os registros de publicações até os primeiros meses desse último ano. Minha bibliografia -- sobretudo de artigos de imprensa -- era muito maior, mas tive de deixar de lado por imposições de espaço editorial.
Creio que caberia uma atualização, ou um novo artigo, enfatizando talvez novas tendências entre apoiadores e críticos da diplomacia lulista e fazendo um balanço de seus resultados (if any). Aliás, já fiz isso em outros escritos. Vou preparar uma lista atualizada desses trabalhos sobre diplomacia brasileira e política externa do governo Lula (não são a mesma coisa, para os entendidos).
Por enquanto fiquem com este registro:

Uma nova ‘arquitetura’ diplomática?: Interpretações divergentes sobre a política externa do Governo Lula (2003-2006)
Brasília, 19 maio 2006, 24 p. Artigo de revisão bibliográfica sobre a diplomacia do governo Lula. Relação de Originais n. 1603; Publicados n. 739bis.
Revista Brasileira de Política Internacional (ano 49, n. 1, 2006, ISSN 003U-7329; p. 95-116; link: http://www.scielo.br/pdf/rbpi/v49n1/a05v49n1.pdf).

E por falar em balanço dos resultados, deixo este registro de um artigo ainda não suficientemente divulgado, mas que está em Francês:

La diplomatie de Lula (2003-2010): une analyse des résultats
In: Denis Rolland, Antonio Carlos Lessa (coords.), Relations Internationales du Brésil: Les Chemins de La Puissance; Brazil’s International Relations: Paths to Power (Paris: L’Harmattan, 2010, 2 vols; vol. I: Représentations Globales – Global Representations, p. 249-259; ISBN: 978-2-296-13543-7).
Postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/10/relations-internationales-du-bresil.html).
Relação de Originais n. 2184; Publicados n. 998.

Preciso colocar em ordem meus escritos, meus arquivos inacabados, meus livros, minhas bibliotecas, minha vida...
Ufa!

Siglas: do BRIC ao BRICS, ao BRIS, a BRISA: volare... dipinto di blu...

Quando se usam siglas emprestadas, e quando se bota tudo num caldeirão, ou num moedor de carne, para atender a desejos inconfessáveis e a ambições não reveladas, corre-se o risco de ver emergir siglas ainda mais confusas, e situações curiosas, no limite do risível.

Pois este parece o destino do novo animal político na fauna geopolítica planetária: o BRIC, ou BRICS, ou talvez BRIS, quem sabe BRISA, como acaba de sugerir um leitor deste blog, e que pode acabar em alguma outra coisa ainda não definida.

Vejam o que me escreveu um correspondente a propósito deste meu post:

Dos BRICS ao BRIS?: ilusoes anti-hegemonicas (inclusive do Brasil)
(21 de Abril de 2011)

Anônimo disse...
Sugerimos no lugar de BRICS o acrônimo BRISA!(...se a intenção é viver dela..!)
Vale!

Sexta-feira, Abril 22, 2011 10:24:00 AM

Concordo inteiramente. O BRIC surgiu porque a Rússia se sentia desconfortável no G8 (que na verdade continuava a se reunir sob o formato de G7 para as questões "sérias", como as financeiras, e guardava para o formato G8 apenas as questões amenas, suscetíveis de acomodar as posições de uma ex-superpotência em declínio) e porque o Brasil, ou melhor, certo presidente queria porque queria aparecer na liga das grandes potências, na companhia dos grandes, enfim essas megalomanias de declinantes e ascendentes, muito comuns em adolescentes e senis...
A inclusão (indesejada para os demais) da África do Sul pelas mãos da China não parece ter resolvido muitos dos problemas internos do grupo (ou bloco, ou fórum, whatever...) e deve complicar ainda mais as suas possibilidades de coerência e de coordenação internas, para uma instância que já não tinha muitos pontos em comum de uma agenda que era mais do contra do que a favor de algo: contra a arrogância imperial, contra o unilateralismo, contra o congelamento do poder mundial, etc., etc., etc...

De fato, como sugere meu anônimo correspondente, o nome BRISA é muito mais condizente com o espírito e a letra desse grupo que carrega nas tintas para não precisar explicar substância, e pode ir assim levando na maciota dos ventos alísios, até surgirem desafios reais (que, espera-se, eles resolvam).
A questão da Líbia, por exemplo, era uma excelente oportunidade para uma postura conjunta dos BRICS, ou da BRISA: eles resolveram se abster, o que pode até ser considerado uma posição: uma posição pela não posição, pelo atentismo, pela lavagem de mãos, pelo muro...

Boa sorte ao BRISA... ou ao BRICS, whoever, whatever...

Paulo Roberto de Almeida

Pausa para... alguns pensamentos cristaos a proposito da Pascoa

Não tenho certeza de que tudo esteja conforme ao original, já que recebi por uma dessas infindáveis correntes de internet, na qual tudo se transforma, nada se mantém igual, e tudo é reciclado (sem pagar os devidos direitos autorais ao autor).
Publico como recebi, creditando a autoria do texto a Luiz Fernando Veríssimo, que já foi mais engraçado, quando ele não apoiava ditaduras como a de Fidel Castro -- o que suponho que só faça por anti-imperialismo primário e anti-americanismo infantil -- e quando ele não apoiava governos corruptos e mistificadores como o que acaba de passar.
Não que tudo isso mude minha opinião positiva sobre este texto deveras engraçado, mas pelo menos me oferece a oportunidade de manifestar minha opinião sobre um dos nossos melhores escritores (e humorista eventual). Mesmo os melhores escritores (como Saramago, por exemplo) podem ser singularmente idiotas quando se trata de questões políticas e econômicas.
Deixando de lado esta longa (e chata) introdução, vamos ao que interessa.
Paulo Roberto de Almeida

Por favor resolva essa confusão

-Papai, o que é Páscoa?
-Ora, Páscoa é... bem... é uma festa religiosa!

-Igual ao Natal?
-É parecido. Só que no Natal comemora-se o nascimento de Jesus, e na Páscoa, se não me engano, comemora-se a sua ressureição.

-Ressurreição?
-É, ressurreição. Marta , vem cá !

-Sim?
-Explica pra esse garoto o que é ressurreição pra eu poder ler o meu jornal.

-Bom, meu filho, ressurreição é tornar a viver após ter morrido. Foi o que aconteceu com Jesus, três dias depois de ter sido crucificado. Ele ressuscitou e subiu aos céus. Entendeu ?

-Mais ou menos... Mamãe, Jesus era um coelho?
-O que é isso menino? Não me fale uma bobagem dessas! Coelho! Jesus Cristo é o Papai do Céu! Nem parece que esse menino foi batizado! Jorge, esse menino não pode crescer desse jeito, sem ir numa missa pelo menos aos domingos.

Até parece que não lhe demos uma educação cristã ! Já pensou se ele solta uma besteira dessas na escola ? Deus me perdoe ! Amanhã mesmo vou matricular esse moleque no catecismo!

-Mamãe, mas o Papai do Céu não é Deus ?
-É filho, Jesus e Deus são a mesma coisa. Você vai estudar isso no catecismo. É a Trindade. Deus é Pai, Filho e Espírito Santo.

-O Espírito Santo também é Deus?
-É sim.

-E Minas Gerais?
-Sacrilégio!!!

-É por isso que a ilha de Trindade fica perto do Espírito Santo?
-Não é o Estado do Espírito Santo que compõe a Trindade, meu filho, é o Espírito Santo de Deus. É um negócio meio complicado, nem a mamãe entende direito. Mas se você perguntar no catecismo a
professora explica tudinho!

-Bom, se Jesus não é um coelho, quem é o coelho da Páscoa ?
-Eu sei lá ! É uma tradição. É igual a Papai Noel, só que ao invés de presente ele traz ovinhos.

-Coelho bota ovo ?
-Chega ! Deixa eu ir fazer o almoço que eu ganho mais !

- Papai, não era melhor que fosse galinha da Páscoa ?
-Era... era melhor,sim... ou então urubu.

-Papai, Jesus nasceu no dia 25 de dezembro, né ? Que dia ele morreu ?
-Isso eu sei: na Sexta-feira Santa.

-Que dia e que mês?
- (???) Sabe que eu nunca pensei nisso ? Eu só aprendi que ele morreu na Sexta-feira Santa e ressucitou três dias depois, no Sabado de Aleluia.

-Um dia depois!
-Não três dias depois.

-Então morreu na Quarta-feira.
-Não, morreu na Sexta-feira Santa... ou terá sido na Quarta-feira de Cinzas ? Ah, garoto, vê se não me confunde ! Morreu na Sexta mesmo e ressuscitou no sábado, três dias depois!

-Como ?
- Pergunte à sua professora de catecismo!

-Papai, porque amarraram um monte de bonecos de pano lá na rua ?
-É que hoje é Sabado de Aleluia, e o pessoal vai fazer a malhação do Judas. Judas foi o apóstolo que traiu Jesus.

-O Judas traiu Jesus no Sábado ?
-Claro que não ! Se Jesus morreu na Sexta !!!

-Então por que eles não malham o Judas no dia certo ?
-Ai...

-Papai, qual era o sobrenome de Jesus?
-Cristo. Jesus Cristo.

-Só ?
-Que eu saiba sim, por quê?

-Não sei não, mas tenho um palpite de que o nome dele era Jesus Cristo Coelho. Só assim esse negócio de coelho da Páscoa faz sentido, não acha?

-Ai coitada!
-Coitada de quem?

-Da sua professora de catecismo!

Texto de Luiz Fernando Verissimo

Diplomatizzando: Dos BRICS ao BRIS?: ilusoes anti-hegemonicas (inclusive do Brasil)

Diplomatizzando: Dos BRICS ao BRIS?: ilusoes anti-hegemonicas (inclusive do Brasil)

Paraninfo nao apareceu na formatura: ficou constrangido pelos direitos humanos?

Gesto incompreensível esse de, sendo paraninfo escolhido pela turma de formandos, sequer aparecer para cumprimentar os diplomados, limitando-se a enviar uma mensagem (certamente preparada por outros), dizendo o que pensa de si mesmo...
Deve ser constrangimento pelas diferenças apontadas pela imprensa -- aliás constatadas por todos os que lêem -- no sentido de haver uma diferença marcante entre sua política externa -- de amizade com ditadores e violadores dos direitos humanos -- e a da sua sucessora, de comprometimento firme com a defesa dos direitos humanos.
Paulo Roberto de Almeida

Dilma atrela diplomacia a direitos humanos
Lisandra Paraguassu
O Estado de S. Paulo, 20 de abril de 2011

Em discurso no Itamaraty, presidente diz que tema será defendido ‘sem concessões’

BRASÍLIA - Em contraste com o tom contemporizador com países violadores dos direitos humanos adotado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a presidente Dilma Rousseff mostrou nesta quarta-feira, 20, que o tema está no centro da política externa brasileira.

Apesar das preocupações com as reformas das instituições internacionais, como a Organização das Nações Unidas, ou com a sempre presente necessidade de atrair investimento e tecnologia para o País, Dilma declarou, no primeiro discurso sobre relações internacionais de seu governo, que o tema será promovido e defendido "em todas as instâncias internacionais sem concessões, sem discriminações e sem seletividade".

O discurso foi dirigido a uma plateia de formandos do Instituto Rio Branco e diplomatas, na cerimônia de conclusão de curso da turma de 2010 do instituto. Pela primeira vez, a presidente falou claramente sobre o que considera objetivos da política externa brasileira no seu governo. E afirmou que, apesar de ver a preocupação com os direitos humanos como algo que já existia no governo Lula, o assunto será, "mais ainda agora", uma preocupação do governo brasileiro.

Lula, escolhido paraninfo da turma, mandou um texto de apenas uma página, que foi lido pelo assessor para Assuntos Internacionais do Planalto, Marco Aurélio Garcia. Nele, o ex-presidente louvou as ações do Itamaraty durante seus dois mandatos e definiu como mera "continuidade" de seu governo a gestão Dilma no campo da política externa.

A presidente deixou clara, também, a importância que dá à reforma das Nações Unidas, especialmente ao seu Conselho de Segurança - tema de interesse especial do Brasil, que espera, com essa reforma, obter uma vaga permanente no conselho. "No momento em que debatemos como serão a economia, o clima e a política internacional no século 21, fica patente também que, do ponto de vista da segurança, a ONU também envelheceu", sustentou a presidente.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Sera que o Brasil aguenta mais 4 ou 8 anos de Republica Sindical?

Não sei se aguenta, provavelmente sim, embora tenha de locupletar a chamada "nova burguesia do capital alheio". Mas assim vai crescer pouco e continuar a ser arrastar penosamente em direção à modernidade.
Do que eu tenho certeza é de uma coisa: a mediocridade intelectual continuará pujante e desfilando nos salões da República com cada vez mais vigor.
Avançando para trás, parece ser o destino do Brasil nos próximos anos.
Paulo Roberto de Almeida

Companheiro de toga
DIEGO ESCOSTEGUY E MURILO RAMOS
Revista Época, 21/04/201

O governo nomeia para o STJ Antônio Ferreira, advogado sem currículo – mas ligado ao PT

APARELHAMENTO
A carreira de Antônio Carlos Ferreira, advogado próximo ao PT e ao Sindicato dos Bancários, deslanchou quando Lula assumiu a Presidência. Agora, essa proximidade o levou ao STJ
O advogado Antônio Carlos Ferreira formou-se numa faculdade que nem sequer consta da lista das 87 recomendadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não fez mestrado. Em 30 anos de carreira, nunca publicou um artigo jurídico. Só teve um grande cliente: a Caixa Econômica Federal, onde entrou há mais de 25 anos. Nas poucas e magras linhas de seu currículo oficial, porém, não há menção ao dado mais relevante de sua trajetória: desde 1989, ele é filiado ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, entidade alinhada com o Partido dos Trabalhadores. Militante informal do partido, Antônio Carlos fez carreira na Caixa com a ajuda dos companheiros. Em 2000, a pedido do atual tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, tornou-se chefe do setor jurídico do banco no Estado de São Paulo. Quando Lula assumiu a Presidência, três anos depois, o PT emplacou Antônio Carlos no comando da Diretoria Jurídica da Caixa – uma posição para lá de poderosa, da qual dependem todos os grandes negócios do banco.

Antônio Carlos, um companheiro discreto e disciplinado, nunca criou problemas para o partido. Deu aval a contratos tidos como ilícitos pelo Ministério Público Federal, como no caso da multinacional de loterias Gtech, e testemunhou silenciosamente ações ilegais, como a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo. No caso da Gtech, acusada pelo MP de pagar propina ao PT para renovar por R$ 650 milhões um contrato com a Caixa, Antônio Carlos e sua equipe mudaram o entendimento jurídico sobre o assunto – o que permitiu a renovação exatamente nos termos pedidos pela multinacional, ainda no começo do governo Lula.

Anos depois, em 2006, ele jantava com o então presidente da Caixa, Jorge Mattoso, quando um assessor do banco entregou a Mattoso um envelope com os extratos bancários do caseiro que denunciara malfeitorias do ministro Antonio Palocci. O misterioso perdão milionário concedido pela Caixa ao grupo Bozano e ao Banco Santander, revelado por ÉPOCA na semana passada, também passou, sem nenhum questionamento, pelo crivo da turma de Antônio Carlos. (Por meio de sua assessoria, ele negou participação nos casos que passaram por sua área e disse não ter visto o conteúdo do envelope com os extratos bancários do caseiro.)

Antônio Carlos permaneceu na diretoria da Caixa até agosto do ano passado. Na última terça-feira, a presidente Dilma Rousseff o nomeou para uma vaga no Superior Tribunal de Justiça, o STJ, a segunda corte mais importante do país. Para ocupar esse cargo, a Constituição exige que o candidato detenha “notório saber jurídico” e “reputação ilibada”. Caberá agora ao Senado sabatiná-lo. A reputação foi colocada em xeque por sua atuação na Caixa. Com relação ao notório saber jurídico, é difícil encontrar lentes para enxergar esse atributo em Antônio Carlos – a não ser lentes vermelhas, partidariamente embaçadas.

Na Caixa, o novo ministro do STJ aprovou contratos irregulares, como o da multinacional Gtech
Ao comparar-se seu currículo ao dos demais 29 ministros da corte ou aos de seus concorrentes ao posto, as credenciais de Antônio Carlos parecem frágeis. Todos exibem cursos de pós-graduação ou, no mínimo, longa carreira no Judiciário. Foi, portanto, preciso muito lobby para que o nome de Antônio Carlos chegasse à mesa da presidente Dilma – lobby do PT e de ministros que foram ligados ao partido, como Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF). Foi uma espécie de retribuição. Como sempre tratou muito bem o poder, pelo poder também foi muito bem tratado. Quando Antônio Carlos era diretor jurídico da Caixa, o banco concedia generosos patrocínios para eventos do Judiciário. O banco deu R$ 40 mil para financiar a festa promovida para Dias Toffoli, quando ele conseguiu ser nomeado para o STF, em outubro de 2009. Antônio Carlos foi à festa, claro.

A indicação de Antônio Carlos veio de uma lista sêxtupla da OAB. Na votação entre seus pares, ele ficou em sexto. Encaminhou-se essa lista ao STJ. Antônio Carlos pulou para o primeiro lugar na lista enviada ao governo. Os dois competidores finais de Antônio Carlos apresentavam cursos de pós-graduação – mas pouca simpatia político-partidária. Em Brasília, é essa a linha que conta mais no currículo.

Cuba: tentando renovar o socialismo com "jovens" de 80 anos...

Maravilha de renovação: o dirigente que acaba de ser nomeado tem 84 anos...
Mais vigor impossível...
Interessante que o novo dirigente, que tem 80, disse que o socialismo vai continuar, que capitalismo nunca voltará a Cuba.
Assim seja...
Paulo Roberto de Almeida

Cuba muda para ficar igual
Editorial - O Estado de S.Paulo
21 de abril de 2011

Uma economia tentando sobreviver - ou melhor, existir - mediante lenta e limitada abertura para o mercado - que, por sinal, não existe - sob o comando da mão de ferro da velha-guarda de Sierra Maestra. Na política, nenhuma perspectiva imediata de liberalização. Esta é a Cuba que emerge do 6.º Congresso do Partido Comunista Cubano (PCC), encerrado na terça-feira em Havana, que aprovou um documento programático, Linhas da Política Econômica e Social, contendo mais de 300 pontos que deverão orientar os ajustes a serem feitos no modelo econômico da ilha que nunca funcionou.

O 6.º Congresso do PCC, convocado depois de 14 anos, também elegeu oficialmente Raúl Castro para as funções que já vinha exercendo desde 2006, de secretário-geral do Comitê Central do partido. Contrariando a expectativa de que a oportunidade poderia ser aproveitada para iniciar a renovação do comando do país, para a segunda secretaria, antes ocupada por Raúl, foi nomeado o general José Ramon Machado, de 84 anos, que também é o primeiro vice-presidente. No mesmo dia foi divulgado documento por meio do qual o ex-presidente Fidel Castro renunciou formalmente à chefia suprema do PCC - da qual estava afastado, bem como da presidência, por motivos de saúde, desde 2006 -, anunciou que não mais ocupará cargos no partido ou no governo e conclamou a juventude cubana a continuar "construindo o socialismo".

Desde que substituiu o irmão, Raúl Castro tem anunciado medidas destinadas a enfrentar o estado de catalepsia econômica, em que o país mergulhou desde que, com o fim da União Soviética, 20 anos atrás, Havana parou de receber regularmente os generosos recursos com que Moscou mantinha sua cabeça de ponte comunista na América Latina. Mas, mais uma vez se evidencia que, pelo menos enquanto os Castros e a velha-guarda de 1959 continuarem no poder, o que certamente acontecerá enquanto viverem, está afastada qualquer possibilidade de uma economia de mercado na ilha. Raúl Castro foi categórico em seu pronunciamento no encerramento do congresso: "Assumo minha última tarefa com a firme convicção e compromisso de honra, que o primeiro-secretário do comitê central do Partido Comunista de Cuba tem como sua principal missão defender, preservar e prosseguir aperfeiçoando o socialismo e não permitir jamais o retorno do regime capitalista". Assim, o sistema econômico cubano continuará se baseando na planificação e "na propriedade socialista dos meios fundamentais de produção", mesmo que se venha a levar em conta "as tendências do mercado". O que se pode esperar, segundo o presidente, é a "atualização do modelo" com maior autonomia às empresas estatais e maior estímulo à entrada de capital estrangeiro no país.

O isolamento de Cuba pós-URSS ajuda a entender, mas não é suficiente para explicar a paralisia econômica das duas últimas décadas. O maior problema é que a radicalização do modelo comunista, durante os mais de 30 anos em que o que restou da diáspora da economia cubana para a Flórida após a vitória da revolução sobreviveu praticamente às expensas de Moscou, acabou deixando o país inabilitado para a tarefa de produzir ele próprio a riqueza de que necessita para prosperar. Ainda hoje, a maior parte dos bens de produção e de consumo, principalmente alimentos, de que a ilha necessita é importada.

Não obstante, timidamente, Havana começa a adotar medidas liberalizantes elementares como a permissão para que a população compre e venda imóveis residenciais, da mesma forma como foi autorizada, há pouco tempo, a adquirir telefones celulares e computadores pessoais, etc. Resta saber com o que os cubanos, que ganham em média, US$ 20 por mês, poderão comprar mais do que podem comprar hoje.

Além do mais, esse "poder de compra" ainda será afetado pelas medidas de contenção de despesas que o governo já anunciou, como a demissão de 500 mil funcionários públicos ociosos ou a distribuição dos cartões de racionamento apenas para os mais necessitados. Sem falar, é claro, num mínimo de liberdade política, de respeito aos direitos humanos. Tudo isso certamente terá que esperar pela era pós-Castros.

Argentina: ditadura economica a caminho

Argentina's economy
Lies and Argentine statistics
Stalinist practices in Buenos Aires

The Economist, April 20th 2011

MOST Argentines reacted with a shrug when their government began doctoring its consumer-price index in 2007. Cooking the books cost holders of the country’s inflation-linked bonds at least $2.3 billion last year. But anyone else who needed to know the true inflation rate simply turned to a clutch of private economists who drew on their own price surveys, data from provincial governments and other official statistics. They reckon that inflation is now running at about 25%. That is far above the 10% reported by INDEC, the government statistics agency, but less than the 30% wage increases public employees have received in recent years.

A presidential election looms in October and inflation, and the government’s denial of it, is perhaps the biggest threat to the prospect of President Cristina Fernández winning a second term. That may be why Guillermo Moreno, the thuggish commerce secretary, is moving to stamp out the unofficial, but widely trusted, price indices. To do so he has dusted off a decree, penalising misleading advertising, approved by a military dictatorship in 1983. In February he sent letters to 12 economists and consultants ordering them to reveal their methodology, on the grounds that erroneous figures could mislead consumers.

Some of Mr Moreno’s targets refused; the rest were analysed by INDEC, which predictably found their methods flawed. Seven of them were then ordered to pay the maximum fine of $123,000 (all have appealed). The financial threat is especially serious for Graciela Bevacqua, who lost her job as head of INDEC in 2007 for refusing to tamper with the price index. She now publishes her own inflation estimate with the help of a business partner and former students.

“The others are companies or foundations,” she says, “but we don’t have clients or assets. The only thing I own is my house where I live with my children. They’ll take it away if they continue with this.” Only one firm has stopped publishing its inflation estimate. So far Mr Moreno has merely succeeded in drawing attention to his own mendacity.

Ilusoes estatisticas: comparacoes economicas internacionais - Roberto Macedo

Um artigo simples, mas que coloca em correta perspectiva a comparação de dados em escala mundial.

''Ingana'' que engana
Roberto Macedo
O Estado de S.Paulo, 21 de abril de 2011

Quando países são comparados economicamente, um procedimento muito usado toma em cada caso, como porcentagem do PIB, algum montante de interesse. Como, por exemplo, o da carga tributária e o dos gastos públicos em saúde.

A interpretação dos resultados precisa ser cuidadosa, para evitar equívocos como o que apontarei mais adiante. De início vale lembrar que essas porcentagens nada dizem sobre quem e quantos, no mesmo exemplo, pagaram a conta dos impostos ou se beneficiaram dos referidos gastos. Em particular, elas não informam sobre o nível de renda ou de PIB por habitante de países comparados, às vezes levando a interpretações equivocadas e também a conclusões mal sustentadas ou mesmo injustificáveis.

Um caso de conclusões desse tipo ocorre frequentemente no Brasil, na comparação de sua carga tributária com a de outros países, sempre como porcentagem dos respectivos PIBs. Dessa comparação vêm conclusões nada lisonjeiras sobre as características dos serviços públicos no Brasil.

Assim, quem no Google buscar textos que simultaneamente se refiram à carga tributária e aos serviços públicos encontrará várias referências a um enganoso paradoxo assim formulado: como porcentagem do PIB o Brasil tem carga tributária alta e típica de países europeus, mas seus serviços públicos são comparáveis aos de países africanos.

Tal paradoxo costuma ser resumido mediante atribuição ao Brasil de características de um país imaginário de nome "Ingana", com carga tributária em porcentagem do PIB próxima à da Inglaterra e serviços públicos similares aos de Gana.

"Ingana" é um termo atribuído ao economista e professor Delfim Netto. Deve ter vindo de uma de suas espirituosas tiradas, pois acredito que saiba muito bem do que estarei afirmando em seguida, e não tem culpa se tanta gente está por aí como papagaio a repetir "Ingana", sem refletir sobre seu significado.

Para mostrar que é enganoso tomarei como similares as cargas tributárias do Brasil e da Inglaterra como porcentagens dos seus PIBs, porém qualificando-as em cada caso pelo valor do mesmo PIB, mas por habitante, também bem próximo do nível de renda médio de sua população. O resultado conclui que é melhor parar com essa repetição, pois "Ingana" não tem sustentação factual.

Recorrerei a dados de 2009 da Divisão de Estatísticas das Nações Unidas e, no caso da Inglaterra, tomados os do Reino Unido (RU), do qual faz parte. Nesse ano o Brasil mostrou um PIB de US$ 1,6 trilhão e o RU, um de valor não muito maior, de US$ 2,2 trilhões. Supondo, para simplificar, a mesma carga tributária, de 35% do PIB nos dois países, o valor da arrecadação total de impostos não mostraria também uma grande diferença. Esta, entretanto, torna-se evidente no fato de que no mesmo ano o RU aparece com 61,6 milhões de habitantes e o Brasil, com mais que o triplo disso, 193,7 milhões. Com isso, o PIB por habitante nos dois países ficou em US$ 35,2 mil e US$ 8,1 mil, respectivamente. Ou seja, dada a sua população bem menor e uma economia um tanto maior, no RU o PIB por habitante alcançou cerca de quatro vezes o do Brasil, revelando assim a maior diferença entre os dois países nesses dados.

Ora, calculando também a arrecadação tributária por habitante, no RU ela alcançou US$ 12,3 mil, enquanto no Brasil foi de apenas US$ 2,8 mil. Portanto, a conclusão inescapável é que, dada essa enorme diferença, não haveria como oferecer aos habitantes do Brasil, em quantidade e qualidade, os mesmos serviços públicos que o RU tem condições de oferecer. Aliás, no caso da saúde, pude conhecê-los quando na Inglaterra nasceu uma de minhas filhas. Quase tudo foi gratuito, tanto no parto como no pré e pós-natal, e de melhor qualidade que a de serviços privados pelos quais paguei em ocasião similar no Brasil.

E como Gana entrou nessa história? Entrou, como se diz, "de alegre", mas seus dados são muito tristes. Com um PIB per capita de apenas US$ 627, mesmo que arrecadasse os mesmos 35% do PIB - e deve estar muito longe disso -, teria apenas US$ 219 a gastar por habitante. O Brasil, como mostrado acima, teve mais de dez vezes esse valor em 2009.

Nunca fui a Gana, nem sei de outra forma sobre seus serviços públicos, mas apenas por esses números não vejo nenhum risco em concluir que devem ser muito piores que os do Brasil. Quanto a esses serviços o Brasil está num meio-termo e, felizmente, mais distante de Gana que do Reino Unido.

Fico por aqui nas comparações internacionais. Nessa discussão seria melhor se olhássemos nosso próprio umbigo. Então perceberíamos que uma das dificuldades é que aqui quase metade da carga tributária praticamente não esquenta nas mãos do governo, pois logo sai de seu caixa para os enormes pagamentos que faz de juros da dívida pública (cerca de 5% (!) do PIB) e gastos previdenciários (perto de 11% (!) do PIB). Além disso, na área federal gasta demais com deputados, senadores e funcionários dos três Poderes - e a presidente Dilma acaba de criar o 38.º (!) Ministério -, pagando salários e aposentadorias que mais lembram o que se ganha em países ricos do que o recebido aqui pelos que pagam essa conta.

Com tudo isso, não sobra muito para os serviços públicos em geral, que, vale repetir, não são os de Gana, mas tampouco podem ser os do Reino Unido. Talvez a minha filha que lá nasceu possa num futuro ainda distante recebê-los de forma similar aqui, no Brasil. Mas só se nosso país tomar juízo e perceber que isso só virá de um maior crescimento do PIB e de um melhor uso dos recursos governamentais. E certamente não virá de uma carga tributária ainda maior, pois já chegou a um ponto em que prejudica o próprio avanço da economia.

ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), SÓCIO DAS CONSULTORIAS MGSP E WEBSETORIAL, É PROFESSOR ASSOCIADO À FAAP

Ilusoes cubanas: modelo chines so na ditadura do partido

Analyse
A Cuba, Raul Castro et l'armée maîtres du jeu et de l'économie
Le Monde, 20.04.2011

Le congrès du Parti communiste de Cuba (PCC), achevé mardi 19 avril, n'a pas dérogé aux rituels qui caractérisent les grands-messes des partis uniques. A en croire la propagande, 8 913 838 personnes auraient participé aux débats préparatoires... sur 11 millions d'habitants ! Ce congrès avait été repoussé à plusieurs reprises depuis 1997, sans doute faute d'accord sur la façon de sortir de la crise, après la fin des subsides soviétiques qui maintenaient artificiellement à flot l'économie de l'île.

Depuis l'annonce de la maladie de Fidel Castro, en juillet 2006, il a fallu près de cinq ans pour que son frère cadet, Raul Castro, s'empare de toutes les commandes. Il n'a pourtant pas perdu de temps : les équipes ont été rénovées au plus haut niveau, les fidèles du frère aîné ont été limogés sans ménagement, les forces armées ont élargi leur emprise sur les noyaux durs de l'économie. Les militaires et le général Raul Castro, leur ministre depuis 1959, sont désormais maîtres du jeu.

Derrière la langue de bois du congrès se dessinent une privatisation partielle de l'appareil productif et la consolidation d'une économie mixte, avec deux domaines très différents. L'un, rentable, mise sur l'avenir. Il regroupe le tourisme, le nickel, demain le pétrole, une partie de l'agriculture. C'est le seul qui compte vraiment pour les militaires et leurs manageurs. Leur grand espoir, c'est le pétrole en eaux profondes - mais on en est encore à la phase exploratoire. Autre objectif : après le tourisme de masse, il s'agit d'attirer des vacanciers haut de gamme, en leur proposant des infrastructures de luxe. L'avenir passe aussi par les travaux en cours au port de Mariel, avec l'aide des Brésiliens, et la perspective d'une normalisation des relations avec les Etats-Unis.

Quant à l'autre domaine (tout ce qui reste), peu importe son évolution : les usines et les entreprises peuvent devenir des coopératives, être privatisées voire fermées si elles s'avèrent improductives. Impuissant à prolonger le dogme socialiste du plein-emploi, l'Etat patron se défausse sur les individus, sans aucun filet de sécurité. Travailler à son propre compte devrait être le débouché des 1,3 million de Cubains dont les emplois sont désormais considérés comme superflus. Malgré les contorsions rhétoriques, la propriété privée est rétablie, à condition de ne pas dépasser une certaine "concentration", qui reste à définir.

Toutefois, Raul Castro l'a dit au congrès, "il n'y aura pas de thérapie de choc". "Personne de sain d'esprit" à la direction cubaine ne songerait, par exemple, à éliminer d'un coup le carnet de rationnement, symbole de "l'égalitarisme", devenu une notion "nocive" pour le successeur de Fidel Castro. Alors qu'il pourfend la "mentalité d'inertie" et "l'immobilisme ", Raul Castro est obligé d'adapter le rythme des changements aux résistances de la société et des institutions. Il faudra cinq ans encore, prédit-il. Au congrès, il a annoncé pour bientôt la liberté de vente et d'achat des logements et des véhicules, l'extension des terres non cultivées proposées en usufruit et des crédits pour les travailleurs indépendants.

La politique de La Havane équivaut à une "perestroïka" sans "glasnost", commente le philosophe cubain Alexis Jardines, c'est-à-dire une restructuration de l'économie sans transparence ni ouverture politique. La comparaison avec le Vietnam ou la Chine vaut surtout pour le verrouillage institutionnel, symbolisé par le parti unique, car économiquement, les Cubains sont moins audacieux que leurs amis d'Hanoï ou de Pékin. Le virage économique comble les investisseurs étrangers déjà présents, européens ou canadiens, et aiguise l'impatience des Américains, freinés par leur propre embargo.

Cuba est un cas d'école, au moment où les révoltes arabes amènent l'Union européenne à s'interroger sur la relation entre diplomatie et droits de l'homme. En dépit de la libération de plus d'une centaine de prisonniers politiques (presque tous conduits à s'exiler), les libertés fondamentales ne sont pas respectées : ni la liberté d'expression, ni celle d'association, ni celle de manifestation, ni celle d'aller et venir. Le gouvernement détient le monopole des médias, qui ne font pas de l'information, mais de la propagande, et verrouille l'accès à Internet. Il conserve le monopole de l'éducation. Le Parlement est une chambre d'enregistrement, la justice est inféodée au pouvoir, le code pénal permet d'emprisonner quiconque pour sa "dangerosité" présumée ou des liens avec l'étranger.

Les investisseurs n'y voient là aucun défaut mais au contraire la garantie d'une paix sociale, avec des bas salaires défiant toute concurrence. La renégociation de la dette cubaine avec un petit nombre de pays (dont la France) en vue de nouveaux investissements montre l'intérêt que suscite La Havane. Les travailleurs indépendants et les petits entrepreneurs ne peuvent, eux, en faire autant avec les ressources de la diaspora cubaine (2 millions de personnes), contrairement aux Chinois et Vietnamiens, qui ont su profiter de l'épargne de leurs expatriés pour développer leurs propres projets et gagner de nouveaux marchés.

Paulo A. Paranagua (Service International)
Article paru dans l'édition du 21.04.11

Ilusoes brasileiras: a parceria estrategica com a China...

Nunca me canso de me surpreender com o amadorismo de certos "dirigentes", com as ilusões mantidas por esses preclaros líderes da política nacional. Pergunto-me sempre o que faz alguém ser ingênuo: seria falta de instrução, de educação, de reflexão, de simples informação?
Essa gente acredita em qualquer coisa, até em transferência de tecnologia...
Será que essas pessoas não conseguem ler jornais, observar o mundo e tirar suas conclusões?
Será que elas vão continuar ingênuas e equivocadas a vida inteira?
Ou será que estou cansando de continuar a ser dirigido por néscios e ignorantes?
Enfim, seja qual for a razão, a resposta, a explicação, aqui vai mais uma demonstração de suprema ingenuidade, de amadorismo e de auto-ilusão...
Paulo Roberto de Almeida

Dilma quer produção binacional com a China
Vera Rosa - BRASÍLIA
O Estado de S.Paulo, 21 de abril de 2011

Presidente pediu que sejam identificadas áreas em que a associação do Brasil a empresas chinesas vá além da simples transferência de tecnologia

A presidente Dilma Rousseff encomendou a ministros que a acompanharam na viagem à China, na semana passada, a identificação de áreas nas quais o Brasil possa se associar com empresas do país asiático. Dilma quer que a parceria comercial passe agora pela produção de manufaturas binacionais e vai insistir no projeto ao receber, em maio, o ministro do Comércio da China, Chen Deming.

O ministro chefiará uma missão de empresários chineses que virão ao Brasil para "prospectar" negócios. A ideia é adotar o exemplo da TV digital - acordo que prevê o uso de tecnologia japonesa, com a incorporação de inovações desenvolvidas no Brasil - como modelo para convencer a China sobre a importância dessas parcerias.

"Queremos adotar projetos comuns com a China, como os feitos com os japoneses com a TV digital", afirmou Marco Aurélio Garcia, assessor especial de Dilma para Assuntos Internacionais. "Não se trata simplesmente de transferência de tecnologia, mas de uma espécie de recriação de produtos." O Brasil ainda faz estudos sobre associações, joint ventures ou acordos tecnológicos que possam gerar dividendos para os dois países.

Na prática, está de olho em parcerias binacionais que não se restrinjam ao programa aeroespacial sino-brasileiro, responsável pela fabricação de dois satélites e já na fase de pesquisa para a produção de outros dois.

Garcia deu pistas sobre os interesses brasileiros, embora as negociações não tenham começado. "Na conversa com a Foxconn, a ideia foi a de avançar na produção de produtos de nova geração lá", afirmou o assessor, numa referência ao encontro entre Dilma e o dono da Foxconn, Terry Gou, em Pequim. A maior fabricante de produtos eletrônicos do mundo, de capital taiwanês, anunciou a intenção de investir US$ 12 bilhões no Brasil, nos próximos cinco anos, para produzir displays.

Os exemplos citados por Garcia não pararam por aí. "A indústria automobilística chinesa quer entrar no Brasil? Então, por que não produzir um carro sino-brasileiro?", sugeriu ele.

Relatório produzido pelo Conselho Empresarial Brasil-China indica que três das maiores montadoras chinesas de veículos (JAC, Chery e Dongfeng) já anunciaram investimentos da ordem de US$ 420 milhões no Brasil. "Nós queremos que a China venha participar do nosso mercado, mas produzindo aqui, trabalhando no mesmo ambiente de negócios que as empresas brasileiras trabalham e apoiando a construção de uma infraestrutura no Brasil", disse o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade.

Chefe da missão que levou 307 empresários à China, na semana passada, Andrade apontou como complicador nas negociações com os chineses o fato de as empresas privadas também terem participação do Estado. "Na China, a gente não sabe qual é empresa de governo, qual é empresa privada", insistiu o presidente da CNI.

Mais otimista, o governo avalia que a visita de Dilma resultará em acordos para além das fronteiras das matérias-primas. Atualmente, a pauta do comércio bilateral - mesmo com superávit favorável ao Brasil, na casa dos US$ 5,2 bilhões - é dominada por commodities, como petróleo, minério de ferro e soja.

Pelos cálculos do ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, o preço médio de uma tonelada vendida ao Brasil pela China é superior a US$ 3.000. Na outra ponta, a tonelada exportada pelo Brasil não passa de US$ 163. "Nós precisamos, agora, criar a Embrapa da indústria", resumiu Mercadante, numa alusão à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.

Novo modelo
MARCO AURÉLIO GARCIA, ASSESSOR ESPECIAL PARA ASSUNTOS INTERNACIONAIS:
"A indústria automobilística chinesa quer entrar no Brasil? Então, por que não produzir um carro sino-brasileiro?"

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Último comentário. Tem gente que ainda acha que basta uma "Embrapa da indústria" para tornar o Brasil competitivo. Os industriais da área já esfregam as mãos com gosto, na perspectiva de ganhar mais algum dinheiro público (ou seja, nosso).
Até quando vou ter de aguentar essas bobagens?
Paulo Roberto de Almeida

Global Player ou Vira-Latas?: o Brasil quer ser os dois ao mesmo tempo...

Os psiquiatras, como já escrevi antes, diriam que se trata do conhecido transtorno bipolar, essa mania de querer ser uma coisa e outra ao mesmo tempo.

Um leitor, Anônimo, mas que sempre termina pela saudação "Vale!" (o que o identifica, talvez, como um colega de profissão), escreveu-me isto a propósito de um post meu:

Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Brasil: querendo ser grande, mas desejando ficar pequeno":

Talvez seja útil baixarmos o tom ufanista do discurso de "global player" nas tratativas comerciais e nos valermos do velho e sagaz "complexo de vira-latas"!
Vale!


Comento (PRA):
De fato é assim. Queremos ser grandes, mas não queremos assumir responsabilidade por este fato singelo da vida: um dia ficar grande, belo e forte. Não tenho certeza quanto ao belo e forte (e nem menos sobre ser rico, de verdade), mas ser grande é uma fatalidade que acontece ou pelo crescimento, ou pelo tamanho natural, o que o Brasil tem, dos dois lados.
Então, queremos entrar no CSNU, mas não queremos assumir responsabilidade por ter, de vez em quando, de baixar o cacete em algum desses nasty dictators que se alegram em massacrar o seu próprio povo. Sempre preferimos o diálogo, dizendo mais ou menos o seguinte:

" -- Olha, minha gente, não vamos baixar o cacete pois pode atingir alguns inocentes, civis incautos, simples passantes. Seria horrível contemplar esses corpos atingidos por 'bombas humanitárias'. Vamos sentar com esse ditador e tentar solucionar a questão pacificamente. Através do diálogo, da invocação dos princípios do direito humanitário, vamos convencer esse líder a não continuar massacrando o seu povo..."

Posso estar exagerando, mas é mais ou menos assim, tirando o bullshit diplomático, que nos comportamos nas instâncias internacionais.

Algo semelhante ocorre nas instâncias econômicas. Queremos mais poder decisório, queremos mais abertura de mercados (preferencialmente dos outros, não os nossos), queremos ser respeitados, por sermos grandes, ricos (êpa!), belos e fortes, mas estamos sempre pedindo tratamento especial e mais favorável, mais ou menos assim:

-- Olha, minha gente, vamos liberalizar, vamos abrir mercados, mas como somos ainda pobrezinhos, com empresas fracas e operários ganhando pouco, não podemos abrir muito nossos mercados, temos nossos industriais (protecionistas) coitadinhos, que não conseguem sobreviver sem alguma ajuda estatal e, sobretudo, somos menos competitivos que vocês, assim que precisamos ainda desse SGP, dessas tarifas preferenciais, sem as quais vamos perder mercados..."

Não temos nada a dizer sobre nossa carga de impostos, sobre nossas mazelas burocráticas, sobre nossas ineficiências de infra-estrutura, nada. Tudo é culpa do protecionismo europeu e americano.
Isso se chama, como disse meu anônimo correspondente, complexo de vira-latas.
Mas também deve ser transtorno bipolar...

Paulo Roberto de Almeida

Dos BRICS ao BRIS?: ilusoes anti-hegemonicas (inclusive do Brasil)

Sem o C, o grupo artificial chamado BRIC, agora BRICS, por injunção do C, justamente, ou seja, da China, perde muito do seu sentido e do seu "poder", seja lá o que representa esse "poder".
A China, sozinha, é maior e mais importante do que todos os demais países membros juntos.
Mas tem gente que gosta de viver de ilusões...
Paulo Roberto de Almeida

I.H.T. OP-ED CONTRIBUTOR
A Gathering of BRICS
By PHILIP BOWRING
The New York Times, April 20, 2011

HONG KONG — The so-called BRICS group of nations (Brazil, Russia, India, China and South Africa) held their third summit meeting in Hainan, China, last week, promoting themselves as the key “emerging nations” to challenge the longtime dominance of the West.

Coined a few years ago by Goldman Sachs to indicate the four leading emerging markets on the international investment scene, “BRICS” (adding South Africa to the original members) has since acquired a political dimension.

For sure, the original four have made huge advances in the past 20 years. But it is worth remembering that the concept was not invented by Goldman Sachs but by President Sukarno of Indonesia a half century earlier when he coined the term the “New Emerging Forces.”

Indeed, in 1963 Indonesia organized a sports tournament it called the Games of the New Emerging Forces in Jakarta, largely paid for by China. Significantly, Indonesia was not even present in Hainan, despite its progress since 1963.

So are these current “emerging nations” a real gang of five, or just a list of nations with no common agenda other than a shared resentment of the United States — albeit for sometimes contradictory reasons — that want to devise an antidote to Western power? Does this group have any credibility other than as a source of rhetoric and photo opportunities?

The most obvious common denominator of four of the member countries is that they are major suppliers of commodities to the fifth — China.

All now see China as a huge and rapidly growing market for their coal, iron ore, gas, soybeans, etc. All recognize that Chinese demand has been the main driver of the commodity boom of the past seven years, from which they have all benefited enormously.

Being part of the group makes good business sense — it’s a handy forum for pleading for more investment from Beijing and more exports to China, and provides opportunities for Brazil and South Africa in particular to raise their international profiles.

China’s role establishes it as undisputed leader of these “emerging forces.” However, the other members might do well to pause to consider the nature of their relationship with China.

For Russia, there is the poignant realization that a former superpower now plays second fiddle to China in an “emerging” group. For all four nations, it’s a reminder that they mainly sell raw commodities to China while China sells them manufactured goods.

Despite the boom in commodity prices, China enjoys trade surpluses with all of them except Brazil. India in particular is embarrassed that it mainly sells iron ore to China while seeing Chinese goods make huge inroads into India’s markets. India’s trade deficit with China is running at $25 billion annually.

The five BRICS make common cause complaining about the volatility of commodity and currency markets and the perils of too-open capital markets. That seems fair enough, until one notes that Brazil, India and South Africa have all suffered from undervaluation of the Chinese currency, the renminbi, while their own currencies have been appreciating.

The political goal of appearing united prevents these countries from being as outspoken as they need to be on currency issues. A proposal to settle bilateral trade in their own currencies rather than in U.S. dollars is mostly illusory. Likewise, the complaints about speculative activity in commodity markets are at odds with the fact that China has some of the world’s most active and volatile commodity markets.

Inclusion of South Africa in the group is unlikely to add to its influence. This addition has been seen as a diplomatic coup for China, which wanted an African member — just as Sukarno wanted Egypt in his Asia-Africa-Latin America grouping. But South Africa has a fraction of the economic weight of the other members, and its presence in this select company has been duly noted by excluded countries like Indonesia, Turkey, South Korea or Mexico.

The truth is that the interests of “emerging forces” are far more comprehensively represented by their members in the Group of 20 than by the BRICS. This was a summit meeting the emerging world does not need.

A version of this op-ed appeared in print on April 21, 2011, in The International Herald Tribune with the headline: A Gathering of BRICS.

Primazia dos EUA: as (falsas) raizes militares - Marcos Guterman vs Paulo R. Almeida

Leiam primeiro esta nota, no blog de um jornalista geralmente arguto e bem informado:

O tamanho do abismo entre EUA e China
por Marcos Guterman
Blog Estadão, 20.abril.2011

Muito se diz sobre o novo poder chinês e seu triunfante avanço para destruir a hegemonia dos EUA. O siteChina-US Focus procurou comparar os números dos dois países no que diz respeito a um dos elementos essenciais da equação que resulta numa superpotência efetiva: o investimento militar. O resultado mostra que há um abismo entre chineses e americanos que nenhuma retórica antiamericana é capaz de superar. A seguir, as principais conclusões.
1) O orçamento militar chinês é de US$ 91,5 bilhões. O dos EUA é de US$ 663,8 bilhões. O orçamento militar americano é maior do que o orçamento militar combinado de China, Reino Unido, Alemanha, França, Japão, Rússia, Índia e Brasil.
2) Na defesa de seus habitantes, a China gasta US$ 70 per capita; os EUA gastam US$ 2.119 per capita.
3) A economia dos EUA é de US$ 14,6 trilhões, contra US$ 5,75 trilhões da China. Os EUA gastam 4,7% do PIB na área militar, enquanto a China gasta 1,4%.
4) A China tem 2.285.000 soldados, enquanto os EUA têm 1.580.255. Isso significa que a China tem o maior Exército do mundo, mas só em números absolutos. Em relação à população que deve ser protegida, a China tem 1 soldado para cada 585 cidadãos, enquanto os EUA têm 1 para 198.
5) A China gasta em média US$ 40,04 por soldado. Já os EUA gastam US$ 420,05.

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Meus comentários [PRA]:

Creio que esse tipo de comparacao é falho metodologicamente, e é falho historicamente.
Gastar mais não significa gastar bem, e sobretudo não garante supremacia no longo prazo.
Os EUA dispõem, hoje, e nas últimas seis ou sete décadas, da supremacia incontestável sobre o mundo, sendo o único país, repito, o único, capaz de projetar poder em dois ou três cenários de guerra simultaneamente, e de manter confrontos simultâneos com grandes poderes durante certo tempo. Isso não lhes assegura a primazia absoluta durante algum tempo, mas mesmo isso não seria uma garantia contra uma coalizão unida de outros grandes poderes atacando simultaneamente os EUA em diversas frentes.
O gênio da política americana, o seu sentido aroniano profundo, é o de manter divididos seus eventuais oponentes, e esforçar-se para que uma tal coalizão não se forme, o que era, aliás, o que fazia a Grã-Bretanha em relação à Europa durante a maior parte do seu predomínio econômico e militar "indisputável" (durou cem anos talvez, do final das guerras napoleônicas até a Primeira Guerra Mundial).
Mas se enganam aqueles que acreditam que a primazia americana se deve ao poderio militar, e ao gasto militar por soldado ou por habitante.
Os EUA são ricos e poderosos A DESPEITO do Pentágono, não por causa dele. Sua primazia tem muito mais a ver com a "professorinha de aldeia" do que com os supostos "gênios militares" do Pentágono, que, como os políticos em geral, são pagos para gastar o dinheiro do cidadão (geralmente mal).
Os que querem descobrir as raízes do predomínio americano tem de buscar outras origens, não o gasto militar, que é apenas o reflexo (enganoso) dessa primazia.
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Paulo Roberto de Almeida

Rodada Doha: apostas brasileiras caem no vazio...

Mas atenção, o Brasil não pode ser considerado uma vítima inocente, pois tendo sido também muito influente no processo, carrega uma parte da culpa pelo impasse e bloqueio completo das negociações, junto com todos os demais protagonistas (EUA, UE, India, China, Argentina, etc...).
O G20 referido aqui é o financeiro, não tem nada a ver com o G20 comercial que o Lula e o Amorim achavam que iria revolucionar o mundo: seria preciso primeiro começar por resolver suas contradições internas, com membros exportadores agrícolas competitivos (Brasil e Argentina, por exemplo) e subvencionistas-protecionistas esquizofrênicos (China e India, justamente).
Acabou-se a grande ilusão brasileira de liderar os oprimidos periféricos contra os imperialistas arrogantes.
Paulo Roberto de Almeida

Para OMC, diferenças entre países na Rodada Doha são insuperáveis
JAMIL CHADE, DE GENEBRA
O Estado de S.Paulo, 21/04.2011

Documento de mais de 600 páginas escancara crise e mostra ruptura entre os EUA e emergentes

Dez anos de negociações, milhares de horas de reuniões, milhões de dólares gastos para promover reuniões e viagens de diplomatas, discursos e, finalmente, uma constatação alarmante: hoje, as diferenças em muitas das posição entre os países na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) são "insuperáveis" e o processo está "seriamente ameaçado". Pior: ninguém sabe o que fazer diante da situação que escancara a crise no sistema multilateral.

Nesta quinta-feira, 21, o diretor da entidade, Pascal Lamy, publicou o que seria um rascunho do acordo comercial mais ambicioso da história, com mais de 600 páginas. Mas no lugar de apontar um potencial entendimento, o documento revelou a profunda fratura existente entre Estados Unidos, de um lado, e Brasil, China e Índia de outro. Isso mesmo diante das repetidas declarações do G-20 pedindo a conclusão da rodada em 2011.

Para experiente diplomatas em Genebra, a crise é um reflexo da transição a um novo equilíbrio de poder que se estabelece no mundo, com os países emergentes passando a assumir um novo papel. Em Doha, há dez anos, essa realidade ainda não estava clara. Hoje, a China é o maior exportador do planeta, a Índia potencialmente o maior mercado e o Brasil o terceiro maior exportador agrícola do mundo.

Americanos e europeus querem que os três emergentes deixem de ser tratados como países pobres e façam concessões comerciais, abrindo seus mercados. Lamy, em seu texto, indica que Washington e Bruxelas consideram a atual negociação como "a última chance de equiparar" as tarifas de importação cobradas pelos emergentes e os ricos. Só no caso do Brasil, isso significaria levar a zero mais de 3 mil tarifas.

De outro, China, Brasil e Índia se recusam a aceitar as exigências impostas principalmente pelos Estados Unidos, alegando que ainda tem desafios de desenvolvimento importantes e não podem ser tratados da mesma forma. "Acredito que estamos sendo confrontados com uma clara fratura política ", disse Lamy. " A partir do que eu escutei nas minhas consultas, essa fratura não é superável hoje ", completou.

A Rodada foi lançada em 2001 e deveria ter sido concluída em 2005. Agora, a tentativa era de que um pré-acordo baseado nos textos apresentados nesta quinta fosse fechado para que a Rodada pudesse ser concluída até o final do ano. Mas Lamy indicou a diversos países que não sabe mais o que fazer e pede para que todos, até o final de abril, reflitam com seus chefes de governo o que fazer de agora em diante.

Para muitos em Genebra, essa é a crise mais profunda já vivida pela OMC. Não porque a diferença de posição foi explicitada. Mas porque ninguém sabe qual o caminho a ser tomado a partir de agora. Lamy insistiu aos governos que não tratem a atual crise apenas como mais um impasse na história da OMC. Mas alerta que recomeçar do zero as negociações também não seria a solução.

Entre os governos, já há quem fale sobre a ideia de um enterro digno para a OMC. Um dos cenários desenhados pelo Canadá seria a de começar a programar um " desfecho organizado " para a Rodada, congelando o pacote e esperando por melhores momentos nos próximos anos. Algumas delegações, porém, temem que nem isso consiga ser alvo de um acordo e o temor é de que haja uma "aterrissagem descontrolada ".

Outros insistem que não se pode desistir de tudo, depois de dez anos de reuniões. Politicamente, nenhum país quer pagar o ônus de declarar a morte da Rodada. Mas, por enquanto, a ordem é de que todos voltem a suas capitais e pensem sobre o que fazer com a rodada comercial mais ambiciosa já lançada pela comunidade internacional. "Usem os próximos dias para refletir sobre nossa situação. Pensem sobre as consequências de jogar fora dez anos de trabalho ", afirmou Lamy aos governos.

"Essa é uma situação grave para a Rodada. Mas é nossa realidade e precisamos encará-la", completou. Hoje, o pacote teria um impacto modesto na economia mundial. Mas abandonar o processo poderia, segundo muitos na OMC, ter um alto custo político para o sistema multilateral. Para Lamy, há ganhos econômicos e jogo. "Mas, acima de tudo, significaria que o espírito da cooperação global comercial ainda está vivo ", completou.

Brasilianistas: uma homenagem simples, mas sincera...

Tenho alguns nomes na cabeça, como merecedores desse tipo de homenagem, mas ainda vou refletir mais um pouco antes de fazer a minha sugestão...

LIFETIME CONTRIBUTION AWARD CALL FOR NOMINATIONS
Dear Colleague:

I am pleased to announce the call for nominations for the BRASA Lifetime Contribution Award. This letter is an invitation to the members of the Brazilian studies community to submit their nominations for the fourth recipient of this prestigious award, which will be presented at the BRASA XI International Congress, to be held at University of Illinois at Urbana-Champagne, September 8 and 9, 2012.

Reflecting the primary mission of BRASA, the goal of this award is to recognize an individual with both a record of outstanding scholarly achievement and significant contributions to the promotion of Brazilian studies in the United States. The BRASA Executive Committee especially wishes to emphasize the criterion of lifetime contributions.

Nominees can be from any discipline or nationality but must have spent the greater part of their career involved in U.S.-based Brazilian studies activities. Nominees need not be members of BRASA.

Nominations will be reviewed by a four-member BRASA award committee and voted on by the BRASA Executive Committee. The recipient will be announced before BRASA XI in 2012.

During a ceremony at the BRASA XI Congress, two individuals of the award recipient’s choosing – preferably one U.S.-based and the other Brazil-based – will give personal testimony to the recipient’s achievements. The recipient will also be invited to address the Congress. The BRASA vice president will then present the recipient with a plaque of appreciation.

Nominations should consist of one substantial letter of recommendation outlining the accomplishments and contributions of the individual; a CV; and a list of five references prepared to provide additional letters, if necessary. Materials can be either in English or Portuguese. One nomination per individual is sufficient. No self-nominations or posthumous nominees will be accepted.

The deadline for nominations is July 15, 2011. Nominations and questions should be e-mailed to me at jfrench@richmond.edu.

Sincerely,
Jan Hoffman French
Vice President, BRASA
Chair, BRASA Lifetime Contribution Award Committ