Trata-se, indiscutivelmente, de uma das medidas mais idiotas, imbecis, energúmenas, corporativas, indecentes e regressistas que se poderia esperar. Outras virão, sem dúvida, mas esta é uma das mais nefastas para o jornalismo e a inteligência nacional.
Paulo Roberto de Almeida
A volta do
diploma de jornalista
Editorial
O Estado de S.Paulo, 11 de agosto de 2012
Dois anos depois de o Supremo Tribunal Federal (STF)
ter revogado a obrigatoriedade de diploma de nível superior para o exercício do
jornalismo, sentenciando que a exigência era um "atentado contra a
liberdade de expressão e o direito à informação", o Senado aprovou, em
segundo turno, Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que restabelece essa
exigência. A iniciativa foi apoiada por várias entidades sindicais, das quais a
mais conhecida é a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) - a mesma que
propôs, há quase dez anos, a criação de um Conselho Federal de Jornalismo para
"fiscalizar" a profissão.
Ao justificar a decisão do Senado, o senador Antonio
Carlos Valadares (PSB-SE) alegou que a finalidade da PEC é enquadrar as
empresas de comunicação, impedindo-as de contratar profissionais não diplomados
em jornalismo por baixos salários. "É preconceito colocar uma profissão à
margem da lei", disse ele. "A obrigatoriedade do diploma é a garantia
de que o jornalista deve assumir responsabilidade profissional naquilo que é
específico do jornalismo. Assim como o que é específico da medicina tem de ser
realizado por um médico", afirmou o senador Wellington Dias (PT-PI).
A PEC, que já havia sido aprovada em primeiro turno no
final de 2011, será submetida à Câmara dos Deputados - e, para acelerar a
votação, seus defensores pretendem recorrer a dois expedientes. Um deles é
converter a PEC em substitutivo de um projeto semelhante que já passou por
todas as comissões técnicas e está pronto para ser levado a plenário. O outro
expediente é pedir que a PEC seja analisada por uma comissão especial,
dispensando seu exame pelas Comissões de Constituição e Justiça e de
Comunicação Social.
Como a vida política do País será dominada pela
campanha eleitoral municipal, os defensores da PEC acham que será possível
aprová-la sem maiores resistências políticas ainda neste semestre. Se tiverem
sucesso, a profissão de jornalista passará a constar da Constituição, o que é
um absurdo, pois a Carta Magna deve cuidar de liberdades públicas e direitos
fundamentais - e não garantir prerrogativas corporativas que, no passado, eram
concedidas por decreto.
Foi justamente o que ocorreu com o jornalismo. Para
atenuar a oposição do movimento estudantil, em 1969 a ditadura militar expandiu
o ensino superior criando cursos que não exigiam grandes investimentos em
laboratórios, bibliotecas e docentes qualificados, como comunicação social,
psicologia e sociologia. E, para assegurar emprego para os formandos desses
cursos, baixou um decreto impondo a exigência de diploma, para efeitos de
obtenção de registro profissional.
Além de demagógica, essa exigência era tão absurda, do
ponto de vista legal, que em 2009 o Supremo a considerou inconstitucional.
Nesse julgamento, a Corte lembrou que, na hierarquia legal, a regulamentação
das principais profissões - como engenharia, medicina e agronomia, por exemplo
- é feita por lei ordinária. "O Senado quer colocar, pela janela, uma
norma da ditadura que o STF expulsou pela porta. A PEC é uma aberração. Serve
apenas para atender os donos de faculdades de jornalismo ruins, arapucas que
não ensinam nada e vendem a ilusão de um futuro profissional, e para acolher as
pretensões políticas das lideranças sindicais dos jornalistas, as mesmas que
querem instituir o controle social da mídia", disse o senador Aloysio
Nunes (PSDB-SP) - o único a discursar contra a proposta defendida pela Fenaj.
Nos países desenvolvidos, o jornalismo é exercido por
quem se formou em qualquer área do conhecimento, não havendo necessidade de
diploma específico. Para o pessoal da Fenaj, os cursos de jornalismo garantem
"formação crítica" "credibilidade da informação" e
"disciplinamento ético". Na realidade, essas qualificações podem ser
supridas por qualquer curso universitário bem-feito, ou mesmo pelo esforço de
um autodidata. Converter em norma constitucional a obrigatoriedade do diploma
de jornalismo só atende a interesses ideológicos e corporativos. Também reforça
a triste tradição cartorial que prevalece no País.
Feche-se primeiro as faculdades de Jornalismo e de Comunicação Social e depois desregulamente-se a profissão, tornando-a acessível a todos os que quiserem exercê-la.
ResponderExcluirRicardo Vidal