O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 19 de setembro de 2020

Mini-reflexão sobre a “ideologia” atualmente em construção no Itamaraty bolsolavista - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre a “ideologia” atualmente em construção no Itamaraty bolsolavista

Paulo Roberto de Almeida


Já estou no meu terceiro livro — Uma Certa Ideia do Itamaraty: a reconstrução da política externa e a restauração da diplomacia brasileira (2020) — de reflexões e provocações sobre o estado atual de “desinteligência” sobre o que vem se passando na área das relações internacionais do Brasil, e isso tanto num sentido prático (ou seja, do exercício concreto de nossas relações exteriores), quanto no sentido “ideológico”, isto é, das “ideias” (se por acaso existem) que possam estar atrás dessas ações.

Quando eu acrescentei, em meados de 2019, um subtítulo ao meu primeiro livro da era do bolsonarismo na esfera diplomática — cujo título, Miséria da diplomacia, era apenas uma provocação marxista contra a situação prevalecente na política externa do Brasil —, falando da destruição da inteligência no Itamaraty, isso tinha apenas um sentido metafórico, pois eu estava querendo alertar para esse desafio apresentado à nossa capacidade de sermos, os diplomatas profissionais, suficientemente resistentes ao besteirol dominante, expresso num sem número de declarações bizarras sobre nossa interface externa, emanadas tanto do presidente completamente ignorante nessa área, quanto de alguns conselheiros amadores metidos a “guardiões” da política externa oficial (entre eles o tosco filho 03 do presidente, que não tem ideia de quem seja Henry Kissinger, mas que ainda assim é tido como “chanceler de fato”), e de forma mais surpreendente ainda pelo próprio “chanceler acidental” (que tem, sim, alguma ideia do que seja política externa, mas que teve de construir uma falsa identidade artificial de “fiel olavista da tropa”, para ser aceito pelos donos do poder, mas que é apenas um terceiro ou quarto escalão no processo decisório em sua área ministerial).

Mas constato agora que não se trata apenas de palavras ao vento, de tentativas canhestras de legitimação ao que vem sendo praticado nas relações exteriores do Brasil, e que existe, sim, uma obra de destruição em curso, deliberada, sistemática, abrangente. 

Creio que, até mais do que às posturas do Brasil em matéria de política externa — que é, em parte, apenas uma reação à agenda existente das relações internacionais, que é objetiva, externa ao Brasil —, essa obra de destruição maciça de nossas tradições e padrões de trabalho do Itamaraty, se dirige diretamente às próprias mentalidades, às concepções dos diplomatas, a tudo aquilo que eles aprenderam ao longo de sua trajetória de estudos preparatórios para o concurso do Instituto Rio Branco, suas aulas outrora de boa qualidade naquela academia diplomática — que já foi de graduação, virou Mestrado em Diplomacia (entre 2001 e 2011), e que hoje não se sabe exatamente o que é —, assim como toda a experiência adquirida no exercício concreto da atividade diplomática, em instâncias bilaterais, em foros regionais e em organizações multilaterais (atualmente desprezadas por serem “globalistas”), tudo isso está sendo objeto da obra destruidora empreendida   no Brasil desde o início de 2019, aparentemente com grande “êxito” no Meio Ambiente, mas com igual furor na diplomacia e na política externa.

As “palestras” promovidas pela Funag, seus convidados “especiais”, os pronunciamentos patéticos do chanceler acidental, as invectivas ignorantes dos assessores ineptos do presidente despreparado em qualquer assunto internacional, tudo isso demonstra que existe, sim, cabalmente, um projeto deliberado de construir uma nova “ideologia” no Itamaraty, uma tentativa canhestra de moldar a mentalidade dos diplomatas no sentido apontado nas loucuras regularmente expelidas em vídeos e tuites aloprados do guru destrambelhado que serve de “conselheiro político superior” (?!?!) dos novos bárbaros que ocupam atualmente o poder no Brasil. 

Sim, estes são tempos de destruição insana de um grande patrimônio construído ao longo de quase 200 anos de história nacional, o que não se fará sem a minha resistência intelectual, sem a minha denúncia, sem a minha oposição à obra destruidora atualmente em curso.

Estou hoje (depois de treze anos e meio de ostracismo, sob aquilo que já chamei de “lulopetismo diplomático”) novamente reduzido ao meu “quilombo de resistência intelectual”, mas totalmente consciente de que muita gente, dentro e fora do Itamaraty, partilha de meu sentimento de horror e rejeição contra o que se passa atualmente no Itamaraty, temporariamente dominado pelos novos bárbaros da “diplomacia bolsolavista”. 

Reconstruiremos o Itamaraty e a política externa!


Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 19/09/2020

Nenhum comentário: