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terça-feira, 23 de abril de 2024

O Brasil tem 1/3 (ou mais) da população na assistência pública: nenhum país se desenvolve na base da assistência pública - Editorial Valor Econômico

 Desigualdade segue alta, apesar de renda maior e Bolsa Família

Valor Econômico, 23/04/2024

Dependência do Bolsa Família é enorme, sendo urgente complementar o programa com portas de saída

Os indicadores da Pnad Contínua: Rendimento de Todas as Fontes 2023, do IBGE, mostram que o presidente Lula não conseguiu, em seu primeiro ano de mandato, reduzir a desigualdade de renda, que ficou estagnada exatamente no patamar do fim do governo Bolsonaro. Um Bolsa Família turbinado e a recuperação do mercado de trabalho apenas evitaram que a desigualdade avançasse.

O estudo do IBGE constatou que a desigualdade de renda permanece elevada no Brasil, qualquer que seja o indicador utilizado. Os 10% mais ricos, com um rendimento médio domiciliar per capita de R$ 7.580, mantiveram dianteira, ganhando 14,4 vezes mais do que os 40% da população com rendimento menor, de R$ 527 em média. No topo da pirâmide, a vantagem é ainda maior. O 1% mais rico, com R$ 20.664 em média por pessoa por mês, ganha 39,2 vezes mais do que os 40% mais pobres.

Outro indicador tradicional, o índice de Gini, que mede a concentração da distribuição de renda em uma população, ficou estável em 0,518 em 2023, o mesmo patamar de 2022. O IBGE chamou a atenção para o fato de que o Índice de Gini do Brasil vem melhorando desde a década passada. O índice de 0,518 de 2022-2023 é o menor da série, mas alinha-se com países como Angola (0,513) e Moçambique (0,505).

A desigualdade somente não piorou no ano passado por conta do reforço do Bolsa Família e da recuperação do mercado de trabalho. O governo Lula retomou o Bolsa Família, cujo nome Bolsonaro havia mudado para Auxílio Brasil, e manteve o valor de R$ 600, que o ex-presidente havia elevado em plena campanha eleitoral de 2022 na esperança de angariar votos. Lula ainda criou benefícios complementares conforme o número e a idade das crianças das famílias beneficiadas. Desse modo, o valor médio do rendimento per capita nos domicílios que recebiam o Bolsa Família em 2023 cresceu 42,4% em comparação com 2022, para R$ 635. Nos domicílios que não recebiam o benefício o rendimento per capita aumentou 8,6%.

O número de domicílios beneficiados também foi ampliado, de 16,9% em 2022 para 19% em 2023, maior nível da série. Em termos absolutos, 14,7 milhões de domicílios, de um total de 77,7 milhões do país, tinham pessoas que recebiam o Bolsa Família em 2023. O benefício injeta no mercado ao redor de R$ 14 bilhões por mês ou perto de R$ 170 bilhões anuais.

O Bolsa Família passou a ser a fonte de renda de maior peso na conta de outros rendimentos, que inclui ainda o BCP/Loas, aplicações financeiras e bolsas de estudo. Para o IBGE, as transferências como o Bolsa Família contribuíram para elevar a renda de camadas mais pobres da população. Contrabalançaram ainda o efeito do mercado de trabalho, que acentuou a desigualdade ao favorecer o topo da pirâmide da população.

A expansão do mercado de trabalho garantiu emprego para mais 4 milhões de pessoas em 2023. A população com rendimento habitualmente recebido do trabalho passou de 44,5% (95,2 milhões de pessoas) em 2022 para 46% (99,2 milhões) em 2023. Com isso, a massa de rendimento mensal cresceu 11,7% em relação a 2022 e 8,8% em comparação com 2019, alcançando R$ 295,6 bilhões, o maior valor da série histórica da Pnad Contínua.

Nem todos saíram ganhando da mesma forma. A população de renda mais elevada conseguiu melhores salários, o que contribuiu para ampliar a desigualdade. A pesquisa do IBGE constatou que os trabalhadores de nível superior e os empregadores, especialmente os que realizam serviços mais sofisticados nos setores financeiro, de comunicação, informação e administrativo, que são mais bem remunerados, recuperaram o espaço que haviam perdido durante a pandemia. Já os trabalhadores menos escolarizados haviam conseguido retomar o mercado anteriormente e ficaram para trás em 2023. Assim, o rendimento do trabalho dos 10% mais ricos avançou 10,4%, enquanto os 10% com menor rendimento da população conseguiram apenas 1,8% a mais sobre o ano anterior, apesar do reajuste do salário mínimo.

A dependência do Bolsa Família é enorme. Retirados os ganhos com o programa, a desigualdade voltou a piorar em 2023. Da mesma forma, ele foi fundamental para reduzir o número de pessoas na extrema pobreza no país. Sua extensão a mais 8 milhões de pessoas (21,1 milhões de pessoas), depois de duas décadas de sua existência, mostra que a pobreza continua avançando. Os recursos para o Bolsa Família triplicaram nos últimos dois anos, mas sua ampliação com recursos públicos será mais difícil pelos desequilíbrios fiscais que se avolumam.

Seria mais que urgente complementar o programa com portas de saídas, o que só se dará pela qualificação massiva que dê profissão, emprego ou uma fonte de renda autônoma para seus integrantes. Um crescimento robusto, distinto do medíocre dos últimos anos, seria essencial para fortalecer o mercado de trabalho e o ingresso de novos contingentes nele. Isso só será possível com políticas econômicas sensatas, especialmente no campo fiscal, que busquem ampliar a formação da mão de obra, o emprego e a produtividade. Deveria ser esse o rumo do governo.

segunda-feira, 17 de abril de 2023

Ucrânia: o Brasil se afasta da autonomia diplomática - Editorial Valor Econômico

 Lula se afasta do rumo do não alinhamento externo

Augusto de Franco

Editorial, Valor Econômico (17/04/2023)

O Brasil, que trilhava caminho próprio independente, está tentado, sob Lula, a escolher o lado do Sul global, que serve objetivamente aos interesses chineses

Com o primeiro conflito armado entre dois países em solo europeu desde a Segunda Guerra - a invasão da Ucrânia pela Rússia -, e o cisma cada vez mais profundo entre as duas maiores economias do mundo - Estados Unidos e China - a ordem política mundial está mudando e colocando enormes desafios para todos os países. O Brasil, uma potência média, sem poder para influir decisivamente nos dois conflitos, construiu posições temerárias em ambos.


O presidente Lula, antes e durante a viagem à China, deu declarações improvisadas que se chocam com a gravidade da situação geopolítica global. Às vésperas de embarcar para o encontro com o presidente Xi Jinping, Lula e depois de propor um “clube da paz” para mediar uma saída pacífica para o confronto entre Rússia e Ucrânia, Lula afirmou que o líder ucraniano Volodymyr Zelenski não poderia ter “tudo o que quer”. Zelenski quer, em primeiro lugar, que parte de seu território, invadido e arrasado pelas forças russas, lhe seja devolvido.


Hoje, Lula recebe Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores de Vladimir Putin, eterno mandatário da Rússia, que teve ordem de prisão expedida pelo Tribunal Penal Internacional. Celso Amorim, assessor especial de Lula, encontrou-se reservadamente com Putin, às voltas agora com a acusação de que envenena na prisão o mais famoso ativista da oposição, Alexei Navalny, detido por acusações forjadas, típicas de um regime governado por um ex-agente da KGB.


A proposta de “clube da paz” de Lula foi recebida com benevolência por Joe Biden e sem qualquer entusiasmo por Xi Jinping que, em comunicado conjunto da visita, incentivou o presidente brasileiro a continuar tentando - e não mais que isso. “A China recebeu positivamente os esforços do Brasil em prol da paz. As partes apelaram a que mais países desempenhem papel construtivo para a promoção da solução política da crise na Ucrânia”, registra o comunicado.


Ainda sobre a Ucrânia, em visita oficial a um país em litígio com os EUA, Lula disse que Washington e os líderes europeus não têm interesse na paz e fez menções positivas à iniciativa chinesa, que pede cessação das hostilidades, mas não a retirada das tropas russas. Utilizou a visita a uma instalação da gigante de tecnologia Huawei para criticar indiretamente o governo americano. “Queremos dizer ao mundo que não temos preconceito com o povo chinês. E que ninguém vai proibir que o Brasil aprimore sua relação com a China”, disse Lula. Os EUA alegam um problema de segurança nas relações com as empresas chinesas, sempre sob alcance da influência tentacular de Pequim, e não de preconceito contra o povo chinês.


Em cerimônia de posse de Dilma Rousseff no comando do Novo Banco de Desenvolvimento dos Brics, Lula entrou sem cerimônia por território alheio a seus conhecimentos. “Toda noite me pergunto por que todos os países precisam fazer seu comércio lastreado no dólar”, afirmou. É possível pregar com bons argumentos o uso de outras moedas para o comércio internacional, até mesmo que Brasil e China façam isso, mas não é possível ignorar que a moeda chinesa não é usada em trocas amplas internacionais porque a China é uma ditadura, com mercado fechado, que controla o câmbio e o leva para aonde ditar seus interesses econômicos. Por tudo isso, não é uma moeda confiável.


O objetivo claro de Lula é o de “ junto com a China (...) equilibrar a geopolítica mundial”. Os Brics são parte dessa tentativa, mas o bloco não é mais o mesmo de 2008 quando foi criado. A China pretende usá-lo de ariete na disputa com os EUA e quer ampliá-lo a mais países. China e Rússia tentam atrair o Brasil para o mesmo caminho, tornando-o um bloco ideológico com dinheiro suficiente para comprar lealdades.


Alinhar ideologicamente o Brasil aos interesses chineses, como faria o PT sem piscar os olhos, traria mais prejuízos que ganhos ao país. Em termos econômicos, seria quase a mesma coisa. O Brasil tem com a China relação semi-colonial: vende bens primários e compra bens industrializados. Europa e EUA são seu segundo e terceiro maiores parceiros comerciais e formam aliança instável contra Pequim. Nessa perigosa nova ordem em construção, a China sabe exatamente o que quer. O Brasil, que trilhava caminho próprio independente, está tentado, sob Lula, a escolher o lado do Sul global, que serve objetivamente aos interesses chineses.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Brasil volta à cena externa com diplomacia passadista - Editorial Valor Econômico

 Brasil volta à cena externa com diplomacia passadista


Os primeiros passos de Lula indicam mais do mesmo, da política externa “ativa e altiva”. O pragmatismo pode forçá-lo em outras direções

Valor Opinião, 27/01/2023


O presidente Lula escolheu os parceiros certos para dar início a suas viagens internacionais oficiais e imprimir uma marca distinta em relação à desastrosa diplomacia de seu antecessor.

Lula visitou a Argentina e o Uruguai e já tem agenda para próximos encontros com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da China, Xi Jinping. O vigor da retomada diplomática, porém, não parece até o momento se refletir no conteúdo das mensagens brasileiras, que deixam no ar a impressão de que se trata apenas de uma volta ao passado.

As relações com o Mercosul são prioritárias e Lula retomou os vínculos com a Argentina, rompidos por Jair Bolsonaro, uma ruptura que foi até recebida com alívio pelo presidente argentino, o peronista Alberto Fernandez. Mesmo no tempo em que os Kirchners governavam o país, o relacionamento do Brasil o país vizinho foi conflituoso. A economia argentina se dilacera de crise em crise e de novo não tem fontes de financiamento externo, sustentando-se apenas em um acordo com o FMI, com empréstimos com carência de US$ 45 bilhões - e criticado pela vice-presidente, Cristina Kirchner.

Com escassez de divisas, a Argentina argumenta com um motivo a mais para não abrir sua economia - o outro é a resistência ideológica dos peronistas em fazer isso. As reticências se refletem no acordo União Europeia-Mercosul, cujas negociações foram iniciadas no primeiro governo de Lula e só concluídas no governo Bolsonaro. AArgentina ainda quer negociar mudanças pois vê pontos negativos para sua indústria no acordo. A posição expressa por Lula é de fechar o acordo, embora sinais diplomáticos indiquem que o Brasil também gostaria de fazer reparos nele.

Como gesto de boa vontade, Lula acenou com medidas de efeito duvidoso. A primeira foi a moeda para transações comerciais externas, como forma de driblar a escassez de financiamento para o país vizinho. Deficitária na balança comercial com o Brasil, a Argentina tampouco tem reais para suprir diferenças da liquidação contábil. O Brasil propôs, além disso, financiamentos do Banco do Brasil, com base em um Fundo Garantidor. Não há mais detalhes sobre isso.

Problemático também foi a oferta de Lula de o BNDES financiar gasodutos para escoamento do gás de Vaca Muerta até o Brasil. No fim do governo Lula e princípio do de Dilma, o BNDES foi abarrotado de funding por transferências do Tesouro. Sem o Tesouro, os desembolsos do banco encolheram muito. O país vive uma penúria fiscal e há que escolher criteriosamente para aonde vão os recursos, já que são escassos internamente também. Vaca Muerta, além disso, é um pesadelo ecológico para ambientalistas, e seu gás cobriria primordialmente déficits de abastecimento da Argentina. Não seria vital para o Brasil, que desperdiça gás do pré-sal.

No Uruguai, Lula tentou apagar incêndios. O presidente Lacalle Pou, de centro-direita, abriu negociações com a China para ingressar na Parceria Transpacífico. O Uruguai tomou a atitude unilateralmente, o que fere o Tratado do Mercosul, que obriga à negociação conjunta. Lula argumentou que o Mercosul deveria se concentrar no acordo com a UE para depois tratar da China, que também ofereceu um acordo comercial com o Brasil, mas parece não ter convencido o parceiro uruguaio. Sem uma tarifa externa comum, o bloco se fragmentará.

No campo político, Lula propagandeou sua versão da história, ao mencionar o “golpe” de Estado que depôs Dilma e chamar o ex-presidente Michel Temer de “golpista”, passando por cima do fato de que o Congresso, com assistência do Judiciário, removeu Dilma do poder pelas pedaladas fiscais. Lula reatou laços com a Celac (Comunidade dos Estados LatinoAmericanos e do Caribe), com elogios à defesa que fizeram da democracia quando esteve ameaçada no Brasil. Da Celac fazem parte Venezuela, Cuba e Nicarágua, países que estão longe de ser democráticos. Coube a Lacalle Pou dizer na reunião que a defesa da democracia não era monopólio da esquerda, referindo-se aos três países, que o Brasil apoia, que não tem práticas democráticas.

A diplomacia sob Lula terá de se adaptar a um novo mundo, mais hostil. A opção pelas relações Sul-Sul pode se mostrar inviável diante da rivalidade aberta entre EUA e China, e da invasão da Ucrânia pela Rússia, dois parceiros do Brasil nos Brics, grupo que tende à implosão. Os primeiros passos de Lula indicam mais do mesmo, da política externa “ativa e altiva”. O pragmatismo pode forçá-lo em outras direções.


segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Petrobras: sua destruicao pela corrupcao e inepcia lulopetista e sua recapitalizacao - Editorial Valor Economico

O editorial do jornal Valor Econômico é leniente com o quadro terrível de saque, extorsão, assalto, roubo deliberado a que a Petrobras foi submetida pela gangue de mafiosos que domina o país desde 2003.
O jornal fala em equívocos de políticas do governo, que redundaram em grandes gastos com determinados projetos. ERRADO!
O que o jornal precisaria dizer é que esses "equívocos" -- Abreu e Lima, Pasadena, Comperj e muitos outros, no Brasil e no exteriro -- foram feitos deliberadamente para extorquir milhões de dólares da companhia e do governo, em desvios cientificamente calculados, planejados, executados criteriosamente para provocar as perdas e desvios BILIONÁRIOS que provocaram em favor da gangue de assaltantes, a pior corja que já assumiu responsanbilidades governativas no país e na companhia.
Certas coisas precisam ficar claras: crimes econômicos são todos crimes comuns na Petrobras e fora dela. Só sabemos uma pontinha do iceberg de corrupção e roubalheiras sistemáticas em todas as esferas públicas E PRIVADAS do Brasil. Infelizmente.
Paulo Roberto de Almeida

Capitalização da Petrobras se mostra inevitável

Editorial - Valor Econômico, 18 de Janeiro de 2016

Todos os sinais de alerta foram dados ao governo para a precária situação financeira da Petrobras. O quadro tomou cores ainda mais dramáticas com a queda do preço internacional do petróleo para o nível de 2003 e com a forte desvalorização do real nos últimos meses. Antes disso, no entanto, a principal empresa brasileira já estava em grandes apuros, afogada em dívidas que totalizam US$ 122 bilhões e em um escândalo de corrupção sem precedentes.

O destino de uma das maiores petroleiras do mundo, que chegou a valer US$ 270 bilhões no mercado e hoje vale em torno de US$ 25 bilhões, foi um dos assuntos abordados pela mídia no café da manhã que a presidente Dilma Rousseff teve, na sexta feira, com profissionais das agências de notícias, portais na internet e revistas semanais. "Não é só a Petrobras que tem que pensar no que vai fazer, mas todas (as empresas de petróleo do mundo). O governo sempre estará preocupado com a Petrobras, sobretudo se os fatores que a prejudicam são exógenos", disse Dilma, referindo-se à queda do preço da commoditie para um patamar de US$ 30,00 o barril no mercado internacional.

Não foram apenas "fatores exógenos", no entanto, que prejudicaram a Petrobrás, como mostram os relatos de desvios de recursos da empresa que estão sendo apurados pela Operação Lava-Jato. A empresa foi vítima de decisões equivocadas do governo federal. Seja pela execução de investimentos inadequados, como foi o caso das quatro refinarias que construiu - a Premium 1 e 2 (Maranhão e Ceará), a Abreu e Lima (Pernambuco) e o Comperj (Rio de Janeiro), ou pela prática do congelamento de preços dos combustíveis levada à cabo pelo governo do PT por tempo prolongado demais, quase quatro anos.

As motivações para a construção das refinarias a um custo de US$ 50 bilhões foram políticas e fundamentadas em projeções de produção da Petrobras que não se confirmaram. Os recursos gastos na Premium 1 e 2, em torno de US$ 3 bilhões, viraram prejuízo no balanço da estatal. As outras duas não geram receita alguma.

A empresa estatal foi usada como instrumento de política industrial - para refundar a indústria naval no país - cujos objetivos nem de longe foram alcançados. Deixou, ao final, sem chão uma empresa, a Sete Brasil, criada em 2010 para contratar a construção de 28 sondas para a exploração do pré-sal, em uma superestimativa da demanda por sondas que deverá ser reduzida a menos da metade. E como instrumento de controle da inflação, em um malfadado congelamento de preços dos combustíveis no país, subsidiando, assim, os proprietários de automóveis. Essa foi a cereja no bolo de desacertos consecutivos que levou a estatal à situação em que se encontra hoje.

Mesmo com as restrições ao aumento de sua receita, o governo impôs à Petrobrás um plano de investimento de proporções gigantescas, o que levou a empresa a um forte endividamento. Além disso, a Petrobras está submetida à Lei do Petróleo que a obriga a participar com 30%, no mínimo, dos investimentos na exploração de cada um dos campos de petróleo do pré-sal. Isso, sem falar nas exigencias de conteúdo nacional que o governo insiste em manter.

É claro que a queda vertiginosa do preço do petróleo e a desvalorização do real, para quem está tremendamente endividado em dólar, agravou a já delicada situação financeira da estatal. A própria presidente da República admitiu, na entrevista de sexta-feira, que é necessário avaliar a estratégia de investimentos da Petrobras caso o cenário de preços baixos do petróleo permaneça. Mas parece claro que não é apenas redução dos investimentos e a venda de ativos que resolverão os problemas.

A capitalização da empresa se mostra inevitável, embora a direção da companhia considere esta como sua última opção para saná-la. No ano passado chegou-se a examinar um socorro do governo, na forma de instrumento híbrido de capital e dívida (IHCD), mas a discussão não prosperou pelo impacto direto que teria na já elevada dívida bruta do setor público. O assunto ficou na gaveta, mas pode ser retomado a qualquer momento.

Estamos diante, portanto, de mais um evento que terá grande repercussão nas contas públicas. A eventual capitalização da Petrobras aumentará a dívida pública, qualquer que seja o instrumento a ser utilizado, e socializará o prejuízo.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Energia: as politicas equivocadas do governo - Editorial Valor Econômico

Energia: um novo esqueleto para o Tesouro?
Editorial Valor Econômico, 17/02/2014

Deu-se um importante passo na semana passada na discussão sobre as dificuldades que enfrenta o setor elétrico. Depois de insistir em negar o óbvio, o governo mudou o discurso e admite também o óbvio: se não chover, há risco de faltar energia no país. "Baixíssimo", segundo avaliam as autoridades federais, mas ainda assim, presente.

Não se deve desprezar o sinal vindo do governo. Qualquer sistema baseado em hidrelétricas, como é o caso do Brasil onde 75% da energia depende da água, terá risco aumentado com a falta de chuvas. Como bem disse o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, "um avião não é feito para cair, mas ele sazonalmente cai. O que não se pode dizer é que ele todo ano tem que cair. Assim é o sistema elétrico brasileiro". É, sem dúvida, um avanço no debate.

Falta ao governo, no entanto, reconhecer os outros riscos que o modelo atual de gerenciamento do sistema elétrico pode trazer para a economia brasileira, especialmente para a contas fiscais.

A exemplo do que fez com a Petrobras e o preço dos combustíveis, as decisões recentes do governo têm jogado para um futuro incerto a definição de como será paga a conta de evitar um apagão às custas da geração de energia térmica. No ano passado, o Tesouro Nacional gastou R$ 9,8 bilhões. Esse ano, o setor privado estima o gasto em R$ 18 bilhões. Isso sem falar nas indenizações e subsídios que o governo se comprometeu a pagar a partir do fim de 2012, quando renovou antecipadamente as concessões das geradoras de energia para reduzir a tarifa em 20% aos consumidores.

As usinas termelétricas têm um custo de operação muito mais elevado que as hidrelétricas. O desenho do sistema elétrico brasileiro, feito a partir do racionamento de 2001, se baseia na ideia de que as térmicas serão uma espécie de backup, para enfrentar situações conjunturais no mercado de energia. O que se tem visto, no entanto, é a exceção virar regra e o que era conjuntural se transformar em uma saída estrutural. As térmicas, que são usinas caras e poluentes, foram ligadas no fim de 2012, funcionaram a pleno vapor em 2013 e prosseguem ligadas em 2014.

De acordo com o último relatório do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) as térmicas geraram 13,166 MW, o equivalente a 17,92% de toda a energia do sistema.

Essa realidade se transforma em custo mais elevado da energia no mercado de curto prazo e desequilibra as contas das distribuidoras. A regra em vigor estabelece que esse aumento seja repassado às tarifas cobradas dos consumidores. É assim que o modelo, desenhado pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff e aprovado pelo governo Lula, prevê lidar com o problema. Foi assim que funcionou até o ano passado.

Em 2013, o governo decidiu mudar a regra. O reajuste nas tarifas seria de tal magnitude que, somado à inflação já elevada, fez o governo assumir a despesa. Mas o Tesouro Nacional avisou que começaria a repassar o gasto adicional aos consumidores nas contas de 2014. Na semana passada a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) oficializou o adiamento da cobrança e disse, inclusive, que o governo estuda "isentar" os consumidores desse pagamento. Não se sabe como a conta de R$ 9,8 bilhões será paga.

Esse ano entrariam em vigor as "bandeiras tarifárias" para que os aumentos no custo de energia fossem repassados aos consumidores no mês seguinte ao ocorrido. A inflação ainda elevada de 2014, jogou a medida para o frente. A Aneel fala em 2015 e o governo voltou a falar em usar recursos do Tesouro Nacional para cobrir a conta das térmicas esse ano.

Além da operação corrente do sistema, há custos sobre os quais não se tem ainda clareza do valor. Um deles é a renovação das concessões das transmissoras de energia elétrica. A Aneel definiu a metodologia no início do ano e as empresas ainda preparam os cálculos. A estimativa feita pelo próprio governo é de R$ 10 bilhões. As geradoras ainda têm a receber recursos não calculados relativos às indenizações por investimentos feitos antes de 2000. Até o fim do ano, o governo terá quitado R$ 16,3 bilhões dos ressarcimentos devido pela renovação antecipada dessas concessões. Faltam ainda R$ 3,7 bilhões.

Num cálculo rápido, são R$ 41,5 bilhões em despesas já contratadas, suficiente para produzir um apagão fiscal.


Melhor seria seguir as regras já estabelecidas nos prazos combinados do que gerar um novo esqueleto fiscal