domingo, 15 de agosto de 2021

Os sete pecados capitais da diplomacia bolsolavista, um ano depois - Paulo Roberto de Almeida

 Um ano atrás eu publicava este artigo sobre os sete pecados capitais da diplomacia bolsolavista, no jornal Zero Hora (RS; 14/08/202). Está na hora de ver o que mudou e o que ficou. O guru presidencial e patrono do chanceler ocidental está no estaleiro e sua patética criatura submissa já se foi, para alivio dos diplomatas. Mas permanece o chefão ignaro, embora o seu próprio chefe já tenha sido defenestrado pelos eleitores americanos. Os sete pecados perderam muito da sua força, mas permanecem…

Reproduzo abaixo o texto original do artigo.

Paulo Roberto de Almeida 


 Sete pecados capitais da diplomacia bolsolavista

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata de carreira, professor.


 

A diplomacia bolsolavista, formulada em grande medida fora do Itamaraty e operada apenas formalmente por auxiliares da Casa, é feita de rupturas com respeito aos padrões históricos da política externa brasileira, que sempre foi tradicionalmente caracterizada pela busca de autonomia e comprometida, antes de mais nada, com o interesse nacional. Ela é tão bizarra no horizonte bissecular de nossa diplomacia que sequer pode ser assemelhada a uma espécie de desvio padrão numa linha de tendência da política externa nacional, pois ela se situa completamente fora do quadro. Observando-se cronologicamente seu desempenho em um ano e meio de esquisitices de inspiração bolsolavista, pode-se identificar os sete pecados capitais dessa diplomacia sui generis

1) Ignorância: não parece haver dúvidas de que os que conduzem, de fato, as relações exteriores do Brasil são profundamente ignorantes sobre as relações internacionais e sobre a própria política externa do Brasil. O filho 03 do presidente, que exerce esse papel, não tem a menor ideia de quem foi, nem nunca ouviu falar de Henry Kissinger.

2) Irrealismo: esses “decisores” começam partindo de uma fantasmagoria, o tal de globalismo – que nunca demonstram existir empiricamente – e passam daí a atacar o método por excelência da diplomacia contemporânea: o multilateralismo.

3) Arrogância: como a anterior tribo dos lulopetistas, eles acham que tudo o que existia antes deles foi errado; o chanceler acidental vive apontando distorções na política externa dos últimos 30 anos (falou até “depois de Rio Branco”), não mencionando que serviu de forma obediente todas essas distorções até com entusiasmo (existem provas disso). Ele fez uma completa reforma do Itamaraty sem jamais consultar seus colegas de carreira: por cima.

4) Servilismo: a frase símbolo desse alinhamento automático é o famoso “I love you Trump”, disparado pelo presidente a seu colega americano em setembro de 2019 na ONU. Teve início no primeiro dia de governo quando se ofereceu uma base militar americana no Brasil, prontamente rejeitada pelos ministros militares; mas tem muitos outros exemplos.

5) Miopia: já manifestada numa alegada “ameaça globalista”, tem recusado a cooperação multilateral no combate a um desconhecido, até aqui, “comunavirus”; ela se manifestou em especial na animosidade em relação à China e numa adesão unilateral ao governo de Israel, desconhecendo a complexidade dessas relações e ameaçando negócios e investimentos extremamente relevantes para o presente e o futuro do Brasil.

6) Grosseria: Ela se manifestou sobretudo em direção de líderes estrangeiros que não pensam como o presidente, com ofensas a estadistas europeus comprometidos com a defesa do meio ambiente e também a dirigentes vizinhos de outras correntes políticas.

7) Inconstitucionalidade: a primeira já está comprometida no servilismo, ou seja, a renúncia à independência nacional, para subordiná-la a um dirigente estrangeiro, mas também existe a intervenção nos assuntos internos de outros países; a mais grave é o desconhecimento do Direito Internacional, manifestado no apoio às sanções unilaterais do governo americano, o que pode concretizar-se inclusive contra o próprio Brasil, como no caso das salvaguardas abusivas (e ilegais) contra exportações brasileiras de aço e alumínio. 

Todos esses pecados se revelaram abertamente na recusa do multilateralismo, na negligência de normas consagradas do Direito Internacional, no abandono da formulação autônoma da política externa brasileira, na relativização da noção de interesse nacional, na substituição da diplomacia profissional pelos preconceitos de amadores ignorantes, assim como o desprezo pelos princípios constitucionais das relações internacionais. Dois exemplos, entre outros, da subordinação aos EUA: a aceitação do candidato americano à presidência do BID e a adesão ao veto de Trump à participação da empresa chinesa Huawei no leilão do 5G.

 

 

[Brasília, 3733, 12 de agosto de 2020]

 

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Presidente diz que tem certeza de apoio total das Forças Armadas - FSP

 O brochável se acredita invencível, e por isso vem recrudescendo a cada vez, mas será devidamente enquadrado pelo Judiciário e pelas próprias FFAA:


Presidente diz que tem certeza de apoio total das Forças Armadas

Folha de S.Paulo | Poder

13 de Agosto de 2021

Ricardo Delia Coletta, Marianna Holanda e Mateus Vargas

Brasília - O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a se referir às Forças Armadas como "poder moderador" e disse ter certeza do apoio dos militares às "decisões do presidente para o bem da nação".

As falas desta quinta-feira (12) ocorrem num momento de crise como Judiciário e em meio a críticas contra o presidente por tentativa de politizar as Forças Armadas.

"Nas mãos das Forças Armadas, o poder moderador. Nas mãos das Forças Armadas a certeza da garantia da nossa liberdade, da nossa democracia, e o apoio total às decisões do presidente para o bem da nação", disse, em cerimônia de cumprimento a oficiais promovidos.

O ato ocorreu no Palácio do Planalto. Também estiveram presentes o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e os comandantes do Exército, Paulo Sérgio, da Marinha, Almir Garnier, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista.

O evento inaugurou, oficialmente, o uso optativo da máscara no Planalto. A diretriz foi dada pelo locutor, que fez uma pausa antes de dizer que o item era "opcional". Na palco, Bolsonaro e os ministros Augusto Heleno (GS 1 ), Ciro Nogueira (Casa Civil) e Braga Netto ficaram sem máscara.

Apesar de o acessório ainda ser recomendado para locais fechados e aglomerações, nas cerimônias com o presidente não é indispensável. O próprio Bolsonaro não o usa em muitas ocasiões.

Mais cedo, Bolsonaro criticou o presidente do STF (Su premo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, por ter defendido seu colega Luís Roberto Barroso, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Em entrevista à Rádio Jovem Pande Maringá (PR), sugeriu "corporativismo" da corte. "O próprio ministro do Supremo Tribunal Federal, presidente Fux, na sua nota, disse que 'mexeu comum, mexeu com todos'. Não é assim."

"Se um militar aqui faz alguma coisa de errado, eu sou militar, o que nós fazemos? A gente investiga. Se tiver responsabilidade, vai pagar o preço. Altíssimo. Agora, não pode ter corporativismo nessas questões", acrescentou.

Na semana passada, a ameaça de Bolsonaro de usar armas "fora das quatro linhas da Constituição" irritou mi nistros do STF e levou Fux a fazer um discurso contundente. Ele disse que Bolsonaro não cumpre a própria pa lavra e cancelou reunião entre os chefes dos Três Poderes que havia convocado.

As novas declarações do presidente se somam a afirmações golpistas em que ele disse, até, que as eleições de 2022 podem não ocorrer caso não fosse instituído o voto impresso no país - na última terça-feira (10), PEC (proposta de emenda à Constituição) para obrigar a impressão do voto foi rejeitada pela Câmara.

Também na terça, antes da votação, Bolsonaro acompanhou, da rampa do Planalto, um desfile de blindados visto como uma tentativa de intimidação contra o Parlamento.

Em breve discurso, declarou que os militares têm compromisso de agir contra "ameaças externas e internas" sem detalhar sobre o que se referia.

"Obrigada por existirem [Forças Armadas], pela tradição e pelo compromisso de dar vida pela pátria, se precisofor. Quer sejam ameaças externas ou internas. Nós sabemos o que é bom e o que é justo para o nosso povo. A nossa liberdade não tem preço."

Não foi a primeira vez que Bolsonaro falou sobre um suposto papel decisório das Forças. Em janeiro, em meio ao debate sobre início da vacinação contra a Covid e as medidas de isolamento social, chegou a afirmar, em tom de ameaça que "quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as su as Forças Armadas".

Nesta quinta,à rádio, disse que iria reduzir a pressão pela adoção do voto impresso, mas voltou a insinuar, sem provas, que as eleições no Brasil não são seguras e ter "ouvido falar" sobre as suspeitas.

"Vou diminuíra pressão da minha parte, vou diminuir a pressão, sim, porque tem mui ta coisa para fazer pelo Brasil, mas não podemos esquecer, porque se esse pessoal conseguir, no ano que vem, não me cobrem nome do país, por favor, botar alguém sentado na minha cadeira presidencial mais simpático a outras ideologias."

O mandatário levantou ainda a possibilidade de eleições para governadores e senadores serem fraudadas no ano que vem. "Poderiam, não estou afirmando."

"Vamos conviver com essa sombra de dúvida. Não é sombra não, isso aí é tempo fechado."

Em determinado momento da entrevista, Bolsonaro também chegou a ironizar a decisão da CPI da Covid de sugerir indiciá-lo por charlatanismo e curandeirismo, por incentivar o uso de medicamentos sem eficácia comprovada. A informação foi antecipada na quarta-feira (11) pela coluna Mônica Bergamo, da Folha.

"Como não tem como me acusar, vão me denunciar por charlatanismo e curandeirismo", disse e soltou uma gargalhada, em seguida.


quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Milicos são todos iguais, alguns mais iguais que outros. Vejam do que eles gostam de brincar, americanos e russos...

 Continuando a torrar o dinheiro dos contribuintes: 


Airmen of Air Force Global Strike Command launched an unarmed Minuteman 3 intercontinental ballistic missile equipped with a test re-entry vehicle from Vandenberg Space Force Base, California, at 12:53 Pacific Time Wednesday morning, the Air Force said in a release. While stripped of its nuclear payload for the launch, the ICBM contained conventional explosives aboard a Hi-Fidelity Joint Test Assembly re-entry vehicle, which successfully detonated above the water’s surface near Kwajalein Atoll, Marshall Islands, some 4,200 miles from the launch site.

JAMES R. WEBB | MILITARY TIMES

The first regiment of strategic missile systems with the Avangard boost-glide vehicle will go on combat duty by the end of this year, 13th Missile Division Commander Major General Andrei Cherevko said on Tuesday. “Measures continue in the 13th missile division to rearm it with new strategic missile systems. The task set for 2021 stipulates completing procedures to place the first missile regiment with the Avangard missile systems on combat duty,” the commander reported to Russian Defense Minister Sergei Shoigu during the single military output acceptance day.
TASS

Um summit pela democracia, para a democracia, a convite dos EUA (que está com sua democracia meio deteriorada) - WP

 Opinion 

Biden will host an international summit on ‘democratic renewal.’ He should start at home

The State Department announced in a statement on Wednesday that the Biden administration will convene a virtual summit of democracies on Dec. 9, with the goal to “bring together leaders from government, civil society, and the private sector to set forth an affirmative agenda for democratic renewal and to tackle the greatest threats faced by democracies today through collective action.”

The summit will center on defending against authoritarianism, addressing and fighting corruption, and advancing respect for human rights. “We aim to show how democracies can deliver on the issues that matter most to people: strengthening accountable governance, expanding economic opportunities, protecting human rights and fundamental freedoms, and enabling lives of dignity,” the statement reads. “We also will show how open, rights-respecting societies can work together to effectively tackle the great challenges of our time, such as the COVID-19 pandemic, the climate crisis, and growing inequality.”

The concern is that this event will be more than a dog and pony show, a conference with glossy programs but little in the way of substance. While the preview suggests this will be devoid of concrete agreements (the State Department describes it as “an opportunity to listen, learn, and engage”), there are a few things the administration can do to make the summit worthwhile.

First, Biden needs to be able to set an example and show how the United States is tackling issues such as corruption. While there are reforms contained in the For the People Act regarding “dark money” in our elections, there is much the administration can do without Congress to promote transparency and anti-corruption, such as filling all open inspectors general slots, expanding financial disclosure statements, beefing up the Office of Government Ethics and voluntarily including the president and vice president in the executive branch’s conflict of interest regulations. The administration can also speed up responses to Freedom of Information Act requests. These sort of reforms would help Biden cajole other democracies to eschew self-dealing and heighten transparency. It is always a good idea to put one’s own house in order before holding oneself as a model.

In that regard, it is essential that the United States addresses the deteriorating state of voting rights at home. Without this, the administration is in a poor position to talk about the threats to functional democracy. If by the time December rolls around and Congress has not passed significant voting reform — including protections against vote flipping and the politicization of election administration, increased access to the ballot box, and stiff penalties for threatening election workers — our defense of democracy will look hypocritical and empty.

Candidly, threats to democracies do not come solely from authoritarian regimes (although such regimes may help stir anti-democratic sentiments). Right now, the greatest threats to U.S. democracy are all internal — states that pass Jim Crow-style laws; a Supreme Court that eviscerates legal protection against voting discrimination; gerrymandering schemes that help shield incumbents from accountability; and, of course, a national party led by the former president who incited a violent insurrection.

Finally, the administration can emphasize disinformation as a topic for the summit, as it is a key tool that authoritarians employ to threaten democracy. The United States is awash in it — from anti-vaccine misinformation to ongoing attempts to incite another insurrection based on bizarre theories that the disgraced former president could somehow be “reinstated” later this month. Democratic governments that respect freedom of speech have few tools at their disposal to address this problem. However, transnational social media companies do — and they have failed to address the problem adequately and uniformly.

It may be time, if not to regulate these companies, then to apply public pressure on them to be transparent about their algorithms, to report on the full extent of disinformation spreading on their platforms and to create a body that would hold them accountable for enforcing their terms of service. In addition, there is a host of interesting ideas to improve the social media diet. The American Academy of Arts and Science has put out a detailed list of recommendations to do this, including creation of “civic media platforms”; exploring a “public-interest mandate” (as broadcast networks have) for Internet platforms protected from liability (in the United States, under Section 230); and research into the impact of social media on democracies.

There is no reason the summit has to be an empty exercise. If Biden can use the event to encourage meaningful voting reform and anti-corruption measures at home, and if it does meaningful work on the role of social media in attacks on democracy, it might be worth the time and effort it takes to put on such a gathering.

A “toca de coelho” das teorias conspiratórias - Marcos Rolim (Extraclasse)

 Marcos Rolim se pergunta, estarrecido: como foi possível, a tanta gente, nos EUA e no Brasil, chegar a esse estado de alienação completa, de total desvinculação da realidade? Trump, lá, Bolsovirus aqui, foram os grandes arautos das teorias conspiratórias, e com isso congregaram os doidos que antes estavam dispersos pela sociedade…

Paulo Roberto de Almeida 

OPINIÃO

A toca do coelho 

Alimentados por narrativas cada vez mais descompromissadas com a realidade, há centenas de milhares de bolsonaristas radicais para quem o mundo é uma grande armadilha
Por Marcos Rolim / Extraclasse, 12 de agosto de 2021 
 
 
 
 

“QAnon é o nome de uma teoria da conspiração da extrema-direita dos EUA,
que mobiliza milhões de pessoas em todo o mundo”

Foto: Elvert Barnes/ Visualhunt.com

Alice entrou na toca atrás dele, sem ao menos pensar em como é que sairia dali depois. A toca do coelho, no começo, alongava-se como um túnel, mas, de repente, abria-se como um poço, tão de repente que Alice não teve um segundo sequer para pensar em parar, antes de se ver caindo no que parecia ser um buraco muito fundo

O maior massacre em escolas nos Estados Unidos ocorreu em 2018 na Marjory Stonemam Douglas High School, na cidade de Parkland, na Flórida. O atirador, um ex-aluno de 19 anos que havia sido expulso da escola, usou um fuzil Smith & Weston M&P15, arma com a qual disparou durante seis minutos matando 17 pessoas e ferindo com gravidade outras 15. Nas redes sociais, o jovem manifestava sua adoração por armas, se relacionava com grupos neonazistas e supremacistas brancos e defendia o assassinato de mexicanos, negros e homossexuais.

O massacre produziu a campanha Never Again MSD por uma política de controle de armas de fogo nos EUA, organizada pelos sobreviventes. A campanha chegou ao seu ápice com uma grande marcha (March for our lives), que reuniu entre 1,2 milhão a 2 milhões de pessoas, um dos maiores protestos da história do país.

Um dos meninos sobreviventes da tragédia revelou, recentemente, que uma das piores coisas que ocorreu com ele foi, depois de tudo pelo que passou, ouvir de seu pai a “avaliação” de que a história do massacre não passava de uma farsa. “O fato de meu pai achar que o inferno absoluto pelo qual passamos, onde nove das vítimas estavam em nossa classe, foi um embuste piorou muito a situação. (…) Eu sequer contei isso aos demais, porque essa é uma dor que não quero que eles sintam”, explicou.  “Acho que meu pai ficou louco. Ele sempre foi muito conservador, mas agora QAnon consumiu sua vida a ponto de despedaçar nossa família”, disse. QAnon é o nome de uma teoria da conspiração da extrema-direita dos EUA, que mobiliza milhões de pessoas em todo o mundo.

A questão é: o que pode fazer com que alguém se desvincule de forma tão radical da realidade a ponto de acusar o próprio filho, sobrevivente de um massacre, de participar de um embuste?

Muitos dos integrantes da turba que invadiu o Capitólio em janeiro deste ano para tentar impedir a proclamação dos resultados das eleições presidenciais nos EUA usavam camisetas com a marca “Q”, sinalizando sua confiança em uma das narrativas mais alucinadas já criadas. Segundo QAnon, há uma cabala secreta formada por adoradores de satanás, pedófilos e canibais, que governam o mundo. Eles matariam bebês para injetar seu sangue e rejuvenescer. Donald Trump estaria empenhado em acabar com essa turma, razão pela qual enfrentou tanta oposição do “sistema” ou daquilo que QAnon chama de Deep State  (Estado profundo). A cabala seria liderada pelos comunistas, pela ONU e pelos democratas americanos, claro. Segundo QAnon, os massacres em escolas americanas seriam fake news inventadas pela cabala com o objetivo de acabar com o direito à posse e ao porte de armas de fogo. Quem tiver interesse nessa loucura pode conferir uma série documental na HBO, chamada “Q: Into The Storm”.

As pessoas que mergulharam na narrativa QAnon se perderam. Muitas, talvez, para sempre. Para todos os efeitos, é como se elas tivessem entrado na toca do coelho criada por Lewis Carroll em Alice no País das Maravilhas. Com a diferença de que Alice nunca abdicou de pensar e que, por isso, procurou o caminho de volta ao mundo, cansada das irracionalidades do “País das Maravilhas”.

No Brasil, estamos presenciando um fenômeno semelhante. Alimentados por narrativas cada vez mais descompromissadas com a realidade, há centenas de milhares de bolsonaristas radicais para quem o mundo é uma grande armadilha, em que poderosos interesses econômicos, alinhados com a “imprensa comunista”, com os políticos e o STF, impedem que o presidente governe. Para eles, a pandemia é um exagero, o coronavírus é uma estratégia da China para dominar o mundo, o aquecimento global é uma invenção da esquerda, as eleições em urna eletrônica – as mesmas que registram as eleições de Bolsonaro e de seus filhos há décadas – são fraudulentas; a ditadura militar não existiu, nem houve tortura, estupro de presas políticas, desaparecimento de cadáveres nos “anos de chumbo”. Para esses radicais, vacinas são um perigo e armas de fogo salvam vidas; a Amazônia não está em risco, racismo é “mimimi” e bandido bom é bandido do Centrão.

A partir desse lugar mágico em que confortam suas certezas, o núcleo mais duro do bolsonarismo se radicaliza crescentemente, inspirado por discursos fascistas disseminados pelas redes sociais, por aplicativos e nos “chans” (fóruns anônimos) na deep web, que estimulam a disseminação do ódio.

Uma das questões a resolver é: como desradicalizar pessoas? Temos algumas experiências internacionais, como o programa Exit Deutschland, liderado por Ingo Hasselbach, na Alemanha, inspirado em um programa sueco semelhante de desnazificação, além de metodologias que auxiliam pessoas envolvidas com violência política a deixarem suas organizações, como aquela proposta pela pesquisadora portuguesa Raquel da Silva, da Universidade de Birmingham (UK). O tema merece o estudo e, pela quantidade de pessoas que caíram “na toca do coelho”, teremos muito trabalho no Brasil.

PS – Agradeço à Sofia Rolim, minha filha, que me chamou atenção para a importância desse tema e me indicou a entrevista com o sobrevivente de Parkland.


Mini-reflexão sobre a perda de padrões civilizatórios condignos - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre a perda de padrões civilizatórios condignos

Paulo Roberto de Almeida

Certas nações, como o Afeganistão por exemplo, possuem um déficit civilizatório que é estrutural, ou seja, constitui parte componente indissociável de sua formação social e de toda a sua história. Torna-se, nesse caso, muito difícil superar tais constrangimentos derivados de suas forças profundas, para alçar-se, por seus próprios meios, a padrões civilizatórios que consideramos, de nossa perspectiva, como mais elevados no plano dos direitos humanos, das liberdades democráticas e da boa administração pública.


Outras nações, de seu lado — coloquemos aí o Brasil, apenas como exemplo —, que já alcançaram certo patamar de desenvolvimento humano e social, conseguem, por seus próprios meios e por decisões institucionais adotadas sem qualquer constrangimento externo, ou por ausência de pressões de sua própria sociedade, rebaixar e conspurcar padrões civilizatórios que elas já tinham alcançado graças a avanços conquistados por gerações anteriores. É o caso, por exemplo, quando suas próprias elites e seus círculos dirigentes se empenham em assaltar despudoradamente o seu próprio povo, arrancando dele recursos e riquezas obtidos por meio de atividades produtivas duramente amealhados por empresários e trabalhadores no plano individual e privado. 

Não se requer, como no caso histórico do Afeganistão, invasões estrangeiras ou exércitos de ocupação ilegítimos: tudo se faz na mais perfeita “legalidade” de medidas conscientemente iniciadas e adotadas pelos próprios poderes constituídos, atuando de forma refletida pelos meios institucionais disponíveis, ainda que com intenções e propósitos totalmente ilegítimos e indecentes.

Resumindo: é inaceitável o que os três poderes, com seus mandarins coligados no esforço de extorsão contínua, estão fazendo com o povo brasileiro. Em sua voracidade, elites e dirigentes estão dilapidando riquezas e recursos do povo trabalhador e rebaixando terrivelmente nossos padrões civilizatórios.

O “exército de ocupação” tem nome e endereço conhecidos: ele se chama Estado brasileiro e se apresenta sob a forma de governos democraticamente eleitos. 

Ou seja, o problema somos nós.


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 12/08/2021

A RPC, a Lituânia e o problema de Taiwan - opinião da CGTN

 O nacionalismo chinês — aqui expresso pela CGTN — se opõe à “ideologia ocidental” que pretende separar Taiwan da integridade de sua jurisdição soberana, como pretende fazer a “política externa baseada em valores” da Lituânia. O problema de Taiwan é, provavelmente, o mais grave na agenda de política externa da RPC.

Paulo Roberto de Almeida 

Lithuania courting danger with 'values-based foreign policy'
First Voice

Editor's note: CGTN's First Voice provides instant commentary on breaking stories. The daily column clarifies emerging issues and better defines the news agenda, offering a Chinese perspective on the latest global events. 

Lithuania's provocative move to allow the opening of a "representative office" under the name of "Taiwan" threatens a permanent rift in the relationship between Lithuania and China. It also shows the insidious threat of so-called values-based diplomacy to international peace and stability.

After a shift in government in October 2020, Lithuania adopted an outspoken, hostile attitude toward China. There are several reasons behind this abrupt change in policy, driven by domestic political imperatives.

The most obvious is that the new center-right coalition is driven by Western ideology. The main coalition partner, the Homeland Union, was a key backer of the discredited austerity measures put in place after the global financial crisis. It seeks closer economic ties with Washington and a stronger EU.

The Homeland Union was formed to challenge the Communist Party of Lithuania after the breakup of the Soviet Union and has defined itself by strongly supporting nationalism. Today's Homeland Union leaders have drawn a historically inaccurate but emotionally powerful parallel between Lithuania's decision to claim independence and separatist movements in Taiwan.

Although this false comparison falls apart when looking at the concrete specifics of the historical situations, it has emotionally resonated with the public and been a savvy political maneuver. For this reason, defending Taiwan separatism makes for good domestic politics.

But most importantly, the provocative move is designed to curry favor with the Biden administration, which Lithuania relies on for its security.

The Lithuanian coalition government has pledged to follow a "values-based foreign policy," the same language used by U.S. President Joe Biden as he attempts to form an anti-China coalition, cajoling countries into choosing between Washington and Beijing.

U.S. President Joe Biden walks to the Oval Office of the White House after arriving on Marine One in Washington, D.C., U.S., Aug. 10, 2021. /Getty

It may have a principled ring to it. But, in practice, the term "values-based foreign policy" means rejecting any political, judicial or economic system that doesn't mimic one of those in the Western countries. It comes from the assumption that there are universally applicable standards for all political, economic and social development when, in fact, every country has its own tradition and development path.

Any effort to impose an alien system of government at gunpoint is doomed to fail, as have been seen with the U.S.' futile attempts. It is arrogant and unrealistic.

Politics has made it advantageous for Lithuania's ruling coalition to lash out at China. But the decision to play domestic politics by encouraging Taiwan separatism is destabilizing and irresponsible.

For Lithuania and the rest of the "values-based" coalition against China President Biden is attempting to form, Taiwan may just be a piece in a giant chess game to contain China's rise. But this is not how China views the matter. The bedrock of China's ties with any country and the United Nations is the one-China policy, which acknowledges that Taiwan is part of China. It is the cornerstone of China's international relationships and the basis for mutual trust. Any efforts to undermine China's sovereignty on this issue are extremely dangerous. 

Supporting Taiwan separatism to obtain a domestic political advantage or pressure China will not only fail but could trigger a chain of events that could lead to wholly unnecessary conflicts.

For reasons that may have to do with nostalgic colonial arrogance or a racist tendency to consistently underestimate the Chinese people's ability and resolve, the West seems unable to process the fact China will not accept meddling in its domestic affairs and challenges to its territorial integrity. Moves such as Lithuania's are simply encouraging a downward spiral that leads to a dead end.

And the U.S.' open support of Lithuania on the Taiwan matter just shows the world how far-reaching and dangerous this "value-based foreign policy" is turning out to be.

(If you want to contribute and have specific expertise, please contact us at opinions@cgtn.com.)

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...