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segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Cacofonia na política externa: militares devem arbitrar

Diplomacia. Uma política em disputa
Luana Barros
O Povo, 27/01/2019 

Às vésperas de completar 30 dias na Presidência da República, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) ainda não estabeleceu os rumos para onde a diplomacia brasileira deve seguir nos próximos quatro anos. Sem definições, atores políticos que circundam Jair Bolsonaro iniciam uma "queda de braço", como caracteriza o professor da FGV/SP e cientista político, Guilherme Casarões, para guiar a política externa brasileira. 
O desencontro entre diferentes grupos do governo Bolsonaro ganha destaque dentro das falas do próprio presidente, que recuou mais de uma vez em decisões quanto a temas internacionais. Na última semana, ficaram evidentes as contradições entre o alto escalão do governo quando declarações do vice-presidente Hamilton Mourão, que assumiu interinamente a presidência durante a viagem de Jair Bolsonaro para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, divergiram de afirmativas tanto do próprio presidente como de outros políticos que estão próximos a Bolsonaro.
Entre as discordâncias, está o posicionamento quanto a crise na Venezuela. O Brasil reconheceu o opositor de Nicolás Maduro, Juan Guaidó, como presidente interino do país, na última quarta-feira, 23. O filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, deu indicativos de que o Brasil poderia apoiar uma intervenção militar na Venezuela, enquanto Mourão foi contundente ao dizer que "o Brasil não participa de intervenção". O presidente Bolsonaro acabou seguindo o vice.

Temas anteriores também causaram impasses dentro de setores do governo.  
A transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, uma das promessas de campanha, foi contestada por setores da agropecuária após ameaças de retaliação dos países árabes, apoiadores da Palestina e grandes exportadores de carnes bovina e de frango brasileiras. Desde a posse, não houve anúncio oficial sobre o tema.

A possibilidade de saída do Brasil do Acordo de Paris também ocasionou idas e vindas. Enquanto o chanceler Ernesto Araújo e aliados pretendem que o país abandone o tratado que rege medidas de redução da emissão de gases que aumentam a temperatura do planeta, outros grupos se preocupam com os impactos nas relações comerciais brasileiras que essa saída pode ocasionar.  
Em Davos, Jair Bolsonaro afirmou que o Brasil, "por ora", não sairá do acordo.
"(Há o problema do) Excesso de agentes 'credenciados' a dar opiniões sobre a política exterior de Bolsonaro. Além do chanceler, vários ministros (Moro, Guedes, Heleno), o vice-presidente, o assessor para assuntos internacionais, o filho do presidente, dentre outros, têm opinado sobre as pautas", avalia Dawisson Belém Lopes.
Professor de Política Internacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Lopes estabelece hipótese na qual a decisão sobre a política externa brasileira partiria de três núcleos: o nacionalista-religioso, representado pelo chanceler Ernesto Araújo; o neoliberal, liderado pelo ministro Paulo Guedes; e o militar, comandado pelo vice-presidente, general Mourão. "Se avaliarmos com cuidado as credenciais e alavancas de poder dos agentes em questão, logo notamos uma assimetria considerável. Os grupos capitaneados por Araújo e Guedes não têm coesão interna e coerência nos seus movimentos, ao contrário do núcleo militar, mais orgânico e institucionalizado", argumenta Lopes.
Guilherme Casarões explica a disputa por esse domínio nos temas internacionais também pela divisão interna em grupos. O cientista político elenca cinco: os ruralistas, os evangélicos, os militares, os liberais e os olavistas - pautados principalmente pelo chamado "antiglobalismo". Segundo Casarões, os grupos mais pragmáticos seriam os liberais, capitaneados por Guedes, e os militares. Contudo, os olavistas, onde se incluem Araújo e os filhos de Jair Bolsonaro - principalmente Eduardo Bolsonaro - teriam como vantagem a proximidade com o presidente.
Ele aponta que os ruralistas ainda estão como coadjuvantes, embora já tenham demonstrado que não irão se omitir caso seus interesses sejam prejudicados. Já os evangélicos teriam, dentro da pauta internacional, objetivos específicos. "Cada um falando uma coisa e não conseguem se acertar como parte de um projeto comum", resume Casarões.
Os dois pesquisadores, contudo, concordam na importância dos militares nessas decisões e do lugar central que Mourão assume neste contexto. "Enquanto está a meninada no playground falando um monte de bobagem, os militares são aqueles que estão segurando a narrativa e atuando de maneira mais pé no chão", ilustra Casarões. Lopes acrescenta que não há dúvida de que "essa turma entrará para 'desequilibrar o jogo', sob a liderança de Hamilton Mourão". 
Professor de Relações Internacionais e presidente do Instituto Brasil África, Bosco Monte, critica a atuação de Mourão nessa área. "É perigoso quando o presidente em exercício diz que o Estado não fará isso, (porque) ele não representa o Estado, quem representa o Estado é o titular", defende. Para ele, é necessário um maior controle do Bolsonaro sobre esse número de interferências na política externa.

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