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domingo, 20 de janeiro de 2019

A Diplomacia na Construcao da Nacao - Rubens Ricupero (Resenha: Osmar M. Visibelli)

RESENHA:
RICUPERO, Rubens: 
A diplomacia na construção do Brasil (1750-2016)
Rio de Janeiro, Versal, 2017. 


Osmar M. Visibelli
Revista de Economia Política e História Econômica
número 41, janeiro de 2019, pp. 231-239


O livro “A diplomacia na construção do Brasil: 1750 – 2016”, do diplomata Rubens Ricupero, publicado pela Versal Editores em 2017 contribui para a ampliação da bibliografia disponível em relação à história da diplomacia no Brasil, englobando desde 1750, período colonial no qual a diplomacia é ditada por Portugal, até o ano de 2016, no período imediatamente anterior ao impeachment de Dilma Rousseff. Segundo o autor, baseado em suas anotações e registros quando de sua atuação como professor da disciplina de História das Relações Diplomáticas do Brasil, a obra foi concebida para ampliar fonte de estudo sobre a evolução da política externa, agregada aos demais fatores políticos e econômicos ocorridos nos períodos analisados. 
Segundo o autor, as obras disponíveis sobre a história do Brasil tendem a dedicar sua atenção nos eventos internos do país, com relativo menor destaque aos eventos internacionais e da política externa, “como se a história de um país constituísse um todo suficiente e fechado em si mesmo...” (pg. 21). Em tais obras, a estrutura geral seria comprometida em sua coerência interna, pois a dispersão dos temas nacionais entre os elementos internos e externos geraria certa fragilidade para o conjunto do texto. 
Por outro lado, obras relativas à história diplomática, de acordo com Ricupero, incidem em erro oposto, ou seja, isolam a diplomacia dos fatores políticos, econômicos e sociais que a determinam, não reproduzem de forma adequada um processo que afinal é determinado em dois níveis distintos, interno e externo. 
Sua visão do mundo e dos eventos que relata não prescinde do rigor técnico necessário à elaboração do trabalho, enfatizando o uso de fontes nacionais e estrangeiras, sem o uso abusivo de cifras e estatísticas e texto que revela amplo domínio da norma culta da língua, sem a necessidade da linguagem acadêmica que, por vezes, em outras obras, apenas oculta a falta de conteúdo apreciável. São fontes nacionais para a diplomacia e política autores como Hélio Viana, Delgado de Carvalho, Renato de Almeida, Araújo Jorge, Ricardo Seitenfus, Amado Cervo, Clodoaldo Bueno. 
Já para a evolução da economia nacional, além das incontornáveis citações de Caio Pardo Júnior e de Celso Furtado, o autor destaca como referência a obra organizada por Marcelo Paiva de Abreu, A ordem do progresso: dois séculos de política econômica no Brasil, quer na edição de 1990, quer na de 2014. 
A intenção revelada pelo autor em relação à obra é a construção de diálogo com a academia e todos os demais interessados pelo tema relacionado à história diplomática nacional, independentemente de sua área específica de pesquisa. 
Não há nenhuma tese ou possível conclusão que deseje, segundo ele, provar ao leitor. Entretanto destaca-se, ao longo de todo o texto, o papel exercido pela política externa na construção de valores que, hoje, são comuns ao povo brasileiro, característica elaborada e construída especialmente pela gestão de José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco e a inspiração de Joaquim Nabuco, ambos egressos da escola política do Império. 
Com a publicação de sua obra, o autor pretende apresentar fonte de consulta que permita aos pesquisadores e interessados em história diplomática obter em um mesmo texto recursos que atendam à necessidade da compreensão de um quadro sistêmico, formado pelo conjunto do ambiente interno e externo à diplomacia, avaliando o processo decisório sob o enfoque de um jogo formado pelas pressões internas, formadas pelos diversos interesses em conflito e as diversas situações, oriundas do sistema internacional, identificando campos formados pelos aspectos econômicos e políticos dos agentes. 
A obra não exige do leitor conhecimentos prévios específicos de política externa, pois desenvolve com consistência e método o tema; ao mesmo tempo possui a densidade estrutural necessária para constituir-se em material de referência para pesquisa e utilização como bibliografia de suporte. As notas de rodapé e as obras sugeridas como complementares estão adequadas ao propósito da edição, com a inserção ao final de cada capítulo das referências bibliográficas nele contidas, facilitando o contato do leitor com as mesmas e, eventualmente pesquisa referencial. 
Não é necessário perfil acadêmico específico em Relações Internacionais para a leitura e desfrute da obra, que cumpre adequadamente também o papel de divulgação científica. Plenamente acessível a um amplo público poderá, eventualmente, até mesmo inspirar novas vocações junto ao Itamaraty. 
O tratamento dado ao tema constitui agradável leitura, amparada não apenas na ampla erudição do autor como da citação de fontes diversas que contribuirão para o interessado aprofundar-se nos temas tratados ao longo da obra, desde o Tratado de Madri até as políticas mais recentes adotadas pelos diferentes governos nacionais, respeitado o escopo temporal da obra. 
O conjunto de ilustrações – mapas, quadros e fotografias – mereceria maior amplitude, especialmente o quanto ao primeiro item, uma vez que a evolução das fronteiras brasileiras toma especial grandeza, não apenas da obra, mas da construção da imagem nacional perante o sistema internacional e no imaginário coletivo brasileiro. Nada que comprometa a qualidade do trabalho. 
Quadros e fotografias também poderiam ser inseridos como anexos interessantes, permitindo ao leitor um imediato contato com imagens que o remetam ao momento histórico descrito em cada um dos distintos períodos. Certamente o uso intensivo de meios eletrônicos pode preencher tal lacuna, imagens e mesmo vídeos podem ser encontrados com facilidade, contudo creio que uma obra impressa possui não apenas um interesse diferenciado, constitui-se um registro diferenciado. 
O cuidado editorial é perceptível ao primeiro contato. A edição conta com um primeiro lote com acabamento diferenciado, utilizando capa dura; os lotes seguintes, segundo a editora, serão disponibilizados com capa mole. Impresso em papel Pólen e com diagramação bem realizada, a obra terá longo prazo de vida útil, ainda que intensivamente manuseada. 
Certamente o leitor poderá aliar o prazer da aquisição do conhecimento com o lúdico manuseio da obra, tanto o leitor que busca informações gerais e curiosas, como o pesquisador especializado, que poderá usufruir das fontes abundantemente citadas ao longo da obra. 
Contribuindo para a leitura e análise da obra, destaco que o autor não está limitado a explorar exclusivamente os aspectos da política externa. Enfatizando a relação desta com o ambiente interno do país, o texto navega com grande familiaridade, amparado por pesquisa fundamentada em amplas referências bibliográficas, nas questões políticas e econômicas de cada momento, como comentado nos registros a seguir. 
A obra apresenta a história diplomática dividida entre períodos identificados como Colônia, Império e República, esta última identificando separadamente a política externa adotada nos diferentes momentos: Primeira República, a Revolução de 1093 e a ditadura varguista, a República Populista, o período Militar e a Redemocratização, com ênfase especial em temas específicos a cada um dos momentos históricos. 
O autor justifica a inclusão do período colonial - o qual, a princípio não registra a existência de um Estado brasileiro e, por consequência, uma política externa nacional - face à grande importância dos tratados de definição de fronteiras assinados entre as Coroas espanhole e portuguesa: o tratado de Madri (1750) e o de Santo Idelfonso (1777). Segundo Ricupero, a importância do fenômeno do bandeirantismo foi responsável pela implementação do conceito luso/brasileiro de que a posse física do terreno justificava a delimitação fronteiriça, conceito que mais tarde embasará a política de definição de fronteira implementado pelo Barão do Rio Branco no início do século XX. Ainda para o período colonial, a obra destaca a interessante política externa portuguesa, que face à sua fraqueza em relação aos instrumentos de poder, utiliza com eficiência estratégia baseada em aliança política e militar desigual com a Inglaterra, ao mesmo tempo que explora ao máximo as possibilidades de postergar decisões, amparada pelas dificuldades logísticas de comunicação. Como maior exemplo deste conjunto de ações, destaca-se a negociação entre o regente Dom João, Napoleão e Canning. Já com a corte portuguesa sediada no Rio de Janeiro, Ricupero destaca a continuidade do confronto luso/espanhol na Bacia do Prata, que será herdado pelo Império. 
A política externa do Império recebe atenção do autor, focando os recorrentes atritos e intervenções na Bacia do Prata, culminando com a Guerra do Paraguai, bem como os atritos com a Inglaterra devido à questão Christie, na qual o Império utiliza da estratégia portuguesa de força moral ante um poder muito maior, para obter ressarcimento político onde a força favorável ao lado britânico. A questão da escravatura e das alternativas políticas empregadas pelos estadistas imperiais para retardar a abolição, frente às crescentes pressões externas inglesas, recebe também a atenção do autor. 
A República, com o golpe de Estado de Deodoro, surge da convulsão jacobina dos quartéis e de sua aliança com os grupos republicanos civis, inaugurando a participação do chamado partido fardado – conforme Oliveiros Ferreira – na história política do país. 
Em seus passos iniciais, a política externa republicana é focada em negociação financeiras com a banca inglesa para o novo regime, bem como solucionar as pendências fronteiriças. Neste último caso, destaca-se inicialmente a confusa gestão Quintino Bocaiúva, como ministro das Relações Exteriores da República frente à questão do território de Palmas, em litígio com a Argentina. 
Como não poderia deixar de ser em qualquer análise ou descrição sobre o período da Primeira República, a figura de José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, assume grande destaque. Não apenas pela resolução das questões em si, mas, principalmente, pelo respaldo que as negociações que consolidam as fronteiras nacionais assumem perante a validação do novo regime perante a opinião pública. A política externa confere e respalda a legitimidade do regime, nascido de um golpe militar. Ao longo da Primeira República, o Ministério das Relações Exteriores passa por reorganização estrutural; ainda que permeado por indicações políticas, o corpo diplomático começa a instrumentalizar profissionalmente sua atuação, desafiado constantemente pela penúria financeira. 
A instabilidade interna dos arranjos políticos, exemplificada pelo governo Arthur Bernardes, aliada à crise financeira do final dos anos de 1920, resulta na revolução de 30, mais uma intervenção do Partido Fardado, a qual abre caminho para a ditadura caudilhista de Vargas, a qual antes de inspirar-se em fascistas italianos ou portugueses, deve sua filiação à inspiração de Borges de Medeiros e Júlio de Castilhos. Em relação ao período da ditadura do Estado Novo, o autor destaca a questão financeira nacional como um dos motivos para a aproximação com a economia alemã, baseando as transações entre os dois países com os marcos de compensação, que evitavam o uso das poucas reservas em moedas fortes disponíveis no país, evitando a armadilha que situa admiradores de um Estado centralizado, como o General Góes Monteiro, como simpatizantes do regime nazista alemão. 
Após o afastamento de Getúlio Vargas em 1945, inicia-se o que Oliveiros Ferreira sarcasticamente intitula de “república risonha e franca” e sua confusa legislação eleitoral. 
O alinhamento com os Estados Unidos, durante o governo Dutra (1946/1950) é visto sob o impacto da decepção decorrente do rompimento da expectativa de auxílio norte americano, especialmente no campo econômico, para o desenvolvimento brasileiro. 
A comparação da ação americana na Europa e no Japão, elaborada sob o signo do Plano Marshall e do desafio político da URSS, e a relativa perda de importância da América Latina no novo cenário de poder mundial, gera ambiente de frustração com a aliança, supostamente próxima, firmada entre EUA e Brasil durante o conflito mundial. Este novo ambiente forma a base da qual a candidatura de Getúlio Vargas à presidência da República pode ser apresentada: personagem que havia dado dois golpes de Estado (1930 e 1937), que atuou como ditador durante os oito anos de duração do Estado Novo (1937 a 1945), apresenta-se como opção ao eleitorado, gerando o início de conturbado período da vida política, pois divide a sociedade entre os que o haviam combatido desde 1932 e, finalmente, o expulsado do poder em 1945, e os que forneceram suporte político e militar no mesmo período. 
Agosto de 1954 representa um dos momentos nos quais estes dois grupos medem forças de forma direta, alternando entre ambos a balança de poder. Este processo culmina em dois golpes militares seguidos, em defesa da legalidade constitucional, a novembrada de 1955 do General Lott, sustentando a posse do presidente eleito, Juscelino Kubistchek. 
O governo Juscelino, segundo Ricupero, representa o sonho de um país desenvolvido amparado por processo formado por duas mãos, o início de forte processo de urbanização e desenvolvimento de indústria de consumo, sustentado por descontrole dos gastos governamentais e aumento das taxas inflacionárias. O impacto do período mais conflituoso da Guerra Fria na política externa nacional é destacado pelo lançamento da OPA (Operação Pan Americana) em 1958, por iniciativa do governo Juscelino, com a pretensão de obter auxílio econômico dos EUA, sem resultados imediatos. 
O descontrole econômico do período Kubistchek influencia as opções de candidatos nas eleições de 1960, sendo vencedor Jânio Quadro. Ricupero enfatiza a política externa independente (PEI), inaugurada, segundo ele, por Jânio Quadros, com o objetivo de criar espaço próprio brasileiro na arena internacional. O curto governo de Jânio Quadros evidencia a política externa pautada pelo jogo de poder entre as forças internas, com o presidente utilizando em benefício de seu projeto pessoal de poder o impacto da condecoração a Guevara para angariar apoio em ambos os lados do cenário político; de um lado os simpatizantes da revolução cubana e da URSS pelo gesto em si e de outro lado sinalizando aos demais a possibilidade de que, sem apoio direto, poderia tender à posição contrária à tradicional postura da diplomacia nacional. 
A possibilidade de ampliação das relações comerciais com a URSS, seus satélites e também com a China continental serve como principal justificativa e fundamento econômico da PEI pois a balança comercial apresenta saldo negativo e o desequilíbrio fiscal e inflacionário é grave; com novos parceiros comerciais e mercados, eventualmente o desenvolvimento nacional poderia adquirir maior impulso. O autor registra que, em seus momentos iniciais, a PEI não causa maior questionamento por parte dos EUA, principal parceiro comercial à época, uma vez que não gera em si efeitos práticos de afastamento brasileiro do conjunto latino americano e ocidental. 
A renúncia de Quadros – provocada pelo seu temperamento intempestivo ou por projeto de obtenção de poderes especiais delegados pelo Congresso e/ou Forças Armadas - leva o processo político interno a elevado grau de tensão, pela questão do veto dos ministros militares à posse do vice-presidente, João Goulart, dividindo o estamento militar e levando o país à beira de um conflito. O compromisso de implantação imediata do parlamentarismo - mantendo amplos poderes presidenciais - com referendo de consulta posterior em relação ao regime (se presidencialista ou parlamentarista), permite a redução da tensão interna. 
A partir deste ponto, o autor enfatiza sua admiração pessoal pela figura do ministro das Relações Exteriores, San Thiago Dantas, como um formulador estratégico de políticas públicas e dotado de fina sensibilidade política. Ao longo do texto é curioso como a defesa do prestígio de San Thiago Dantas e de sua possível competência analítica, contrasta com o registrado à página 434 da obra: 
A informação ou a capacidade analítica ao alcance do Itamaraty e do governo sobre as prováveis tendências da evolução do castrismo nunca haviam podido antecipar as decisões de Fidel. 
Ricupero destaca a reunião realizada entre Goulart e Robert Kennedy em dezembro de 1962 como sendo um ponto de inflexão da relação entre Brasil e EUA. O autor não está pessoalmente presente, mas analisa os efeitos do encontro a partir de anotação da diplomacia norte americana e de suas conclusões pessoais em relação à política interna. Percebe-se, segundo o autor, a simpatia pessoal de Goulart em relação a posturas nitidamente contrárias aos EUA, ainda que manifestadas diretamente por elementos de seu entorno político e familiar, como a encampação de empresa de capital norte americano, sem a respectiva indenização adequada, realizada por Leonel Brizola, seu cunhado. Esta reunião ocorre antes da realização do plebiscito que reinstaura o presidencialismo no Brasil e marca a relação de relativo antagonismo entre os dois governos, até a deposição de Goulart. 
O autor destaca sua preocupação quanto ao real compromisso democrático do governo Goulart, evidenciado pela solicitação de decretação do estado sítio, em outubro de 1963, como resposta ao desafio oposicionista representado, principalmente, pelo governador do então estado da Guanabara, Carlos Lacerda. 
Os governos militares sucedâneos não apresentam, segundo Ricupero, um único modelo de política externa, ainda que compartilhem a origem castrense. O autor discute os diferentes períodos e as distintas orientações de política externa, iniciando com comentários sobre o governo Castelo Branco, envolvendo os anos de 1964 a 1967, no qual a Guerra Fria domina conceitualmente as ações externas, inclusive a participação brasileira na questão dominicana. 
O governo Costa e Silva teria como mandato o intervalo de 1968 a 1973. Contudo, afastado em 1969 por problemas de saúde, seu sucessor, Emílio Médici, completa o período presidencial que apresenta o endurecimento do regime, caracterizado pelo recrudescimento da guerrilha interna, pelo paulatino isolamento internacional e, especialmente, pelo crescimento e desenvolvimento econômico, que marca o período como Milagre Econômico. Registra aqui uma fissura no Estamento militar entre dois grupos; um desejando retirar-se do poder após os ajustes que julga necessários e outro procurando manter-se no poder e implementar os conceitos e estratégias discutidos internamente nas Forças Armadas desde o movimento tenentista. 
O momento seguinte de 1974 a 1979, correspondente ao governo Geisel, possui, segundo Ricupero, como elemento diferencial, o início de processo de distensão política junto ocorrido conjuntamente ao início da crise do modelo econômico. Em relação à política externa, o acordo nuclear com a Alemanha Ocidental opõe diretamente os interesses nacionais, ditos pragmáticos, com a política de inspiração wilsoniana do governo Carter nos EUA, o qual, utilizando instrumentos de pressão que vão desde o questionamento à política de direitos humanos até a questões econômicas, bem como seu encontro pessoal com Geisel em 1977, procura ativamente intervir nas questões internas brasileiras. Curiosamente, gerou efeito de certa aproximação tática das diferentes forças políticas brasileiras, legais e clandestinas, face ao desafio externo. 
Para Ricupero, o acordo nuclear seria o símbolo maior de que a política externa de Geisel não emula a de Castelo Branco, uma vez que representa momento de forte e direta confrontação com os EUA. Para o período citado, destaca ainda a intensa colaboração com o Japão, visando o desenvolvimento de pesquisa agrícola que representará, no futuro, o desenvolvimento da cultura de soja no ambiente ecológico do cerrado, base do agronegócio brasileiro em meados do século XXI. O encaminhamento da negociação do aproveitamento de rios da bacia hidrográfica sul para geração de energia hidroelétrica, envolvendo Brasil, Argentina e Paraguai, ainda que finalizado no governo Figueiredo, é outro ponto de relevo da diplomacia brasileira, demonstrando capacidade de pressão e negociação, aplicadas em doses distintas ao longo do período e produzindo resultados aceitáveis aos envolvidos. 
O governo Figueiredo é apresentado sem nenhuma distinção especial em política externa, caracterizado que é pela crise econômica do modelo de desenvolvimento, aliada à perda de sustentação interna do regime militar. 
O acidental governo Sarney, sob o impacto da elaboração da nova constituição e conduzindo com exemplar incompetência a gestão econômico-financeira, mergulha o país em seguidos planos heterodoxos que apenas agravam ainda mais o processo hiperinflacionário em curso, somando ainda a perda de confiança na estrutura institucional que as seguidas intervenções no mercado geram no empresariado e nos trabalhadores, culminando na declaração de moratória da dívida, apresentada aos brasileiros como ato de soberania quando, em verdade, constituía-se em simples falta de disponibilidade de caixa. 
Ações políticas ampliam o protecionismo do mercado interno, como a política de informática criando uma reserva exclusiva do mercado nacional, fato que, no futuro imediato, impactará negativamente a produtividade nacional, reduzindo a possibilidade de que produtos industriais possam competir adequadamente no mercado internacional. 
No meio externo, o governo Sarney inicia uma maior aproximação com a Argentina copiando – infelizmente - as exóticas estratégias econômicas de Buenos Aires, mas, ao longo do tempo, obtém a redução da tensão da corrida nuclear entre ambos, dando os passos iniciais para uma maior integração econômica entre ambos os países, os quais, devido à realidade geopolítica regional, acabam por incluir Paraguai e Uruguai em um bloco econômico denominado de Mercosul. 
Estratégias formuladas no exterior (Plano Brady) permitem o início do encaminhamento da questão da dívida externa, não apenas a brasileira, processo que impactava negativamente a concessão de créditos internacionais necessários devido à baixa capacidade de formação de capital interna. 
A eleição de 1990, ocorrida no esgotamento do modelo nacional desenvolvimentista, resulta no governo Collor, entendido como de inspiração favorável ao mercado, mas que inicia não apenas mais um congelamento de preços, mas inova acrescentando o confisco de investimentos e poupança. Como entende Ricupero, nada mais distante de qualquer postulado liberal. Como a abertura econômica realizada cria condições econômicas diferenciadas, o mercado interno é exposto à concorrência internacional, gerando redução de custos e evidenciando a perda de competitividade nacional, especialmente na indústria, com consequente fechamento de plantas fabris, perda de empregos e queda da participação da indústria na formação do PIB do Brasil e perda de mercados externos. 
O autor entende o movimento de abertura comercial realizado no governo Collor como uma adaptação, ainda que tardia, do que intitula como movimento liberal ocorrido nas economias dos EUA e Reino Unido, em especial; uma evidência que como as transformações ocorridas na “...história mundial exercem influência irresistível sobre o Brasil e seus vizinhos...”, ainda que deslocados em termos temporais. 
Para Ricupero, a ação diplomática realizada sob o signo da Rio-92, abre oportunidade para que o país possa apresentar-se ao sistema internacional com roupagens distintas. Não mais palco de exóticas experiências econômicas, mas como importante ator no campo do desenvolvimento sustentável, destacando que, desde o evento, ainda não desenvolvemos adequadamente tal postura. 
Ao impedimento de Collor, segue-se o governo Itamar o qual, contrariamente ao que seria de se esperar de seu perfil político, executa não apenas uma política de privatização – ainda que questionável – como, principalmente, favorece o desenvolvimento de plano econômico diferenciado, pois sem intervenções governamentais diretas no ambiente econômico – por exemplo, congelamentos e sequestro de ativos - implantando de forma paulatina o Plano Real, permitindo ao mercado tempo de adequação ao novo modelo desenvolvido pela equipe econômica coordenada inicialmente por Fernando Henrique Cardoso. 
Ricupero passa a atuar diretamente na gestão do plano econômico, assumindo o Ministério da Fazenda, uma vez que seu antecessor se apresenta como candidato à Presidência. Entretanto, sua função ministerial encerra-se devido a comentários inadequados, relacionados aos efeitos da política econômica, gravados e divulgados ao público sem seu conhecimento. 
A eleição de Fernando Henrique em 1995, impulsionada pelo relativo sucesso do Plano Real, ocorre no período das discussões relativas à proposta da ALCA, intercalada com crises financeiras internacionais (Rússia e Ásia). No mesmo período de governo, o Brasil assina o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, permitindo o acesso a tecnologias de uso pacífico. 
Internamente, o controle inflacionário provocou a necessidade de ações de saneamento do setor financeiro, uma vez que a alavancagem da correção monetária ocultava graves ineficiências. Contudo, a frouxidão fiscal e o uso de âncora cambial criam condições para que a recém obtida estabilidade inflacionária seja comprometida ao final do primeiro governo Cardoso. 
Sua reeleição, em 1998, ainda apoiada pelas lembranças e expectativas de estabilidade monetária, permitiu alavancar a tentativa de obtenção de vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU, vista como objetivo importante, mas não prioritário da política externa. As medidas econômicas adotadas no início do segundo governo Cardoso geram desequilíbrio cambial e rompimento do acordo político de sustentação, apenas parcialmente recuperado pela ação da nova gestão do Banco Central e da implantação do tripé econômico (fiscal, monetário e cambial) entretanto, sem conseguir ampliar o desenvolvimento econômico nacional, que ainda sofre com os efeitos do racionamento de energia elétrica em 2001, que afeta produção e consumo. 
Para Ricupero, a eleição presidencial seguinte, vencida por Luiz Inácio da Silva, em termos de política externa, apresenta o surgimento de uma diplomacia paralela ao Itamaraty, gerando efeitos dispersivos e, por vezes, contraditórios, face a condução de processos que submetem interesses nacionais à condução ideológica, exemplificada na nacionalização de ativos da Petrobras por parte do governo boliviano em 2006. Registre-se ainda a omissão da diplomacia nacional quanto a ações como a devolução de atletas cubanos que solicitaram asilo político ao Brasil durante os Jogos Pan-americanos de 2007 e a política de empréstimos, via BNDES, a governos simpáticos ideologicamente, ainda que os referidos projetos e investimentos trouxessem pouca ou nenhuma vantagem econômica ao Brasil. 
Apoiado na explosão dos preços internacionais de commodities provocada pela entrada da China em posição compradora e aliado à estabilidade relativa alcançada anteriormente, o governo de Luiz Inácio da Silva pode apresentar quadro econômico geral de crescimento do PIB. A política interna sofre o impacto da denúncia do mensalão, estrutura de aliciamento de votos por meio da compra de apoio político, algo não exatamente novo em termos de processo, mas distinto no sentido de amparo à construção de um projeto de poder institucionalizado. 
O desastre econômico que abaterá no futuro o governo Dilma é construído durante o segundo governo de Luiz Inácio da Silva, com o abandono das estratégias de racionalização, parcialmente mantidas até 2008, em favor de conceito entendido sob um amplo guarda chuva temático intitulado de Nova Matriz Econômica, novo nome para o velho processo intervencionista e regulador do Estado nas estruturas de mercado. 
A diplomacia conduzida pelo Itamaraty, limitada pelo desenvolvimento de estrutura paralela orientada para o conceito de aproximação Sul-Sul, pouco contribui para a ampliação dos laços comerciais e econômicos. Esta estrutura paralela simula uma política externa ativa que, segundo seus propositores, permitiria posicionar o Brasil de forma diferenciada no sistema internacional, assumindo papel de protagonista. Entretanto, sem o amparo dos fatores de poder nacional (Política, Econômica, Psicossocial, Militar e Científico-Tecnológico), tal estratégia passa a ser expressão de desejo, com pouca ou nenhuma consequência em relação à ação efetiva no sistema internacional. 
O governo Dilma apresenta extraordinário voluntarismo na condução econômica e completa anemia em relação à política exterior, em sua dupla expressão – tanto a diplomacia paralela, quanto a oficial, conduzida pelo Ministério das Relações Exteriores. A grande diferença na execução da agenda de governo, entre a dinâmica intervenção interna e a apatia externa, é um diferencial da administração Dilma em relação aos governos anteriores. Excetuando-se a ação conjunta com Argentina e Uruguai, articulando a suspensão temporária do Paraguai para a inclusão da Venezuela no Mercosul, pouco mais pode ser destacado quanto a diplomacia. 
Já em relação ao citado voluntarismo econômico e suas consequências, destaca a edição da Medida Provisória 579 de 2012, a qual rompe com regras e contratos vigentes no marco regulatório do setor elétrico, tendo como consequência a perda de confiabilidade na estrutura institucional firmada a duras penas desde o governo Itamar, tendo em vista a intervenção governamental. À chamada Nova Matriz Econômica é acrescentada criatividade contábil, oriunda da Secretaria do Tesouro, contribuindo para a depressão que assola a economia brasileira até o presente momento, face ao descontrole das despesas públicas. 
A obra é encerrada comentando sobre a singularidade do momento atual, face ao sistema político internacional, destacando os limites de uma política amparada exclusivamente em critérios de poder do Estado, bem como a impossibilidade prática em reduzir tais critérios a parâmetros de menor importância. 
A eventual consolidação do conceito de segurança coletiva, como registra Ricupero, poderá reduzir a importância da noção de grande potência associada fundamentalmente ao poder militar, abrindo oportunidade para que o Brasil possa participar ativamente do jogo amparado em posições de relevo em objetivos tais como a política ambiental, o posicionamento do agronegócio e consequente grande fornecedor de alimentos, dentre outros, impulsionando o desenvolvimento nacional sob um sistema internacional colaborativo. 
Em sua conclusão, o autor registra que, em sua opinião, a diplomacia, considerando o conjunto das ações tomadas ao longo dos séculos face à construção do Brasil, apresenta como saldo resultados positivos. 
Os elementos do jogo de poder interno, tratados com tamanho destaque ao longo do texto, permitem compreender a forma pela sociedade trata dos desafios que lhe são apresentados. 
A formação institucional brasileira, transformada quer por meio de negociação/acomodação entre as forças políticas, quer pelo rompimento abrupto das regras, por meio de golpes de Estado, é entendida como obra inacabada, não necessitando apenas de reformas, como de efetivo erguimento de instituições sólidas, a serem constituídas pelo processo de aprendizagem, tentativa, erros e ajustes. 
O autor consegue manter ao longo do texto, o foco inicialmente proposto para a obra, sem deixar de considerar aspectos relevantes que contribuem para a história diplomática nacional. 
A meu ver, o objetivo da elaboração de obra de consulta, englobando aspectos políticos e econômicos, tanto do sistema internacional quanto do jogo político interno é atingido plenamente. 
A partir de sua publicação, o público acadêmico e o leitor interessado nos temas abordados, passará a contar com referencial bibliográfico que contribuirá para a discussão e estudos. 
Osmar M. Visibelli Mestre em Ciências Sociais, Professor na Universidade Anhembi Morumbi, nos cursos de Comércio Internacional, Relações Internacionais e Ciências Econômicas. 

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