quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

(Des)Moralizando o Brasil: minha modesta contribuicao...

Claro, como simples cidadao, nao tenho nenhum poder, influência ou capacidade de atuar em face de grandes fraudadores das contas públicas como soem ser certos "representantes" políticos (que certamente não merecem essa classificação).
Meu único "poder", modestíssimo, está apenas em divulgar falcatruas como essa (mas existem milhares de outras, de colegas da corporação) e colocar meu pequeno protesto virtual.
Nos EUA, após um gesto como esse, o parlamentar seria certamente julgado de modo severo pelo Comotiê de Ética da casa (algo desconhecido por aqui, não a Casa, mas a ética), se não processado civilmente por apropriação indébita de recursos públicos. No mínimo perderia o mandato, podendo até pegar uma pena por delito.
Fica o protesto...
Paulo Roberto de Almeida 

Futura ministra usa verba irregular em hospedagem
Mesmo com auxílio-moradia, Ideli Salvatti pede reembolso de hotel em Brasília

Titular da Pesca a partir de janeiro, senadora do PT recebeu duas vezes para cobrir a mesma despesa, o que é ilegal

A futura ministra da Pesca, senadora Ideli Salvatti (PT-SC), gastou mais de R$ 4.000 em verba indenizatória do Senado com pagamento de diárias de um hotel em Brasília enquanto recebia auxílio-moradia, o que é irregular.
O Senado informou que o uso da verba indenizatória para essa finalidade não é permitido, uma vez que os senadores já recebem um benefício para custear despesas com moradia em Brasília no valor de R$ 3.800 mensais. Ou seja, ela recebeu duas vezes pela mesma despesa.
Após ser procurada ontem, Ideli, há oito anos no Senado, disse por meio de nota ter havido um erro da sua assessoria e mandou devolver o dinheiro aos cofres públicos.
A Folha apurou que a petista pediu ainda ao Senado que apague a informação sobre o gasto no site da Casa, onde ficam registradas todas as despesas dos senadores com a verba indenizatória, após o ressarcimento.
A verba, no valor de R$ 15 mil mensais, só pode ser usada para custear despesas com os escritórios dos senadores "exclusivamente no Estado do parlamentar" ou com o pagamento de aluguel de jatinho para uso dentro de seu Estado.
Conforme registro oficial, a senadora pediu e recebeu ressarcimento do Senado para pagar diárias no hotel San Marco em vários dias dos meses de janeiro, novembro e dezembro deste ano.
A Casa informou que só agora, depois de questionado pela reportagem, a petista percebeu ter havido "erro".
A Folha encontrou notas fiscais do hotel que somam R$ 4.606,68. O site do Senado só passou a dar transparência a esses gastos a partir de abril do ano passado.
No mês passado, Ideli apresentou cinco notas com valores variados: R$ 260,70, R$ 747,01, R$ 475,64, R$ 571,89 e 198,99. Elas somam R$ 2.254,23. Neste mês, apresentou três notas. Somadas, elas chegam a R$ 1.607,65. Em janeiro, foi apresentada uma nota de R$ 744,80.
Os senadores podem optar pelo apartamento funcional ou por usar o auxílio moradia para se hospedar em Brasília -neste caso, o auxílio é pago automaticamente mesmo que o congressista tenha casa própria na cidade.
Segundo a assessoria de Ideli, ela optou pelo hotel San Marco, um quatro estrelas em bairro nobre.
A petista liderou no segundo mandato de Lula a tropa de choque do governo no Senado. Ela defendeu colegas da base acusados de irregularidades, entre eles Renan Calheiros (PMDB-AL) e José Sarney (PMDB-AP).
Defendeu ainda a então ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), quando a hoje presidente eleita foi acusada de envolvimento na elaboração de um dossiê com gastos do governo tucano.
A fidelidade levou Ideli a ser convidada para o ministério da Pesca, após a derrota na eleição para o governo do Estado de Santa Catarina.
(FSP, 23.12.2010)

Diplomacia Sul-Sul, pelo lado unilateral...

China x Brazil (BBVA)


The impact of the emergence of China on Brazilian international trade, published by BBVA, indicated by Enestor dos Santos. This work studied the impact that the Chinese trade expansion had on the Brazilian international trade. Available data analyzed in this paper evidences that in the last years Brazilian exports of commodity products increased significantly due to the emergence of China and other Asian countries. They showed that Brazilian exports of high technological content and high quality increased more than the average and more than low technological and low quality exports in the last years.
http://bit.ly/8XBwbJ
anexos
Fazer download deste ficheiro (WP_1022_tcm348-231940.pdf)WP_1022_tcm348-231940.pdf1517 Kb17/11/2010

Resultados (magros) da diplomacia Sul-Sul, e uma critica

Uma nova política externa
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Por Milton Lourenço, de São Paulo

É necessário priorizar também os países desenvolvidos, grandes compradores de nossos produtos, e não só as nações emergentes ou com menor desenvolvimento.

O governo que se encerra entrega o país em processo de desindustrialização, com nítidas tendências de um retorno à fase colonial ou à primeira metade do século XX, quando era, sobretudo, um fornecedor de matérias-primas. Quem ainda não despertou para esse detalhe que leia e analise com atenção os números que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) divulgou.

É verdade que, como fez questão de destacar o MDIC, as exportações podem chegar a US$ 200 bilhões até o final do ano, superando o recorde de 2008, registrado na temporada de pré-crise econômica internacional. Não é pouco. Além disso, no mês de novembro, a exportação alcançou US$ 17,6 bilhões e média diária de US$ 884,4 milhões, maior média para meses de novembro. Sobre novembro de 2009, as exportações registraram aumento de 39,8%, enquanto sobre outubro de 2010 retrocederam 3,8%, pela média diária.

Só que há um detalhe – e a vida é feita de detalhes. A meta de exportações prevista será resultado direto da venda de produtos básicos, que tiveram em novembro um crescimento de 69,2% em relação ao mesmo período do ano passado. Ao mesmo tempo, os produtos semimanufaturados registraram uma evolução de 45,5%. O detalhe preocupante está aqui: as vendas para o exterior de produtos manufaturados (de alto valor agregado) cresceram apenas 18,6%.

Diante de uma taxa cambial valorizada e pressionada pelas despesas provocadas pelo chamado custo Brasil – ou seja, alta carga tributária, infraestrutura atrasada, burocracia excessiva, altos custos trabalhistas –, a indústria nacional de vestuário, equipamentos de uso doméstico e outros perdem espaço no mercado externo, especialmente para mercadorias procedentes da China e da União Europeia. E sofre a concorrência predatória de produtos chineses no próprio mercado nacional, ainda que medidas antidumping tenham sido tomadas e alcançado bons resultados, como no caso dos calçados.

Não é esse o melhor dos mundos para um país que, na segunda década do século XXI, precisará crescer e modernizar sua infraestrutura, o que equivale a dizer que será obrigado a investir pesado na importação de equipamentos. É verdade que a tendência é que o preço das commodities continue a subir, o que significa que o Brasil pode seguir registrando superávits comerciais, ainda que venha a perder outros mercados para seus produtos acabados.

Mas não se pode esquecer que a China, principal responsável pela demanda de nossas commodities, começa a buscar estratégias para combater a inflação decorrente da elevação das matérias-primas. Por enquanto, as commodities, que representam 70% das receitas da exportação, permanecem em patamar elevado, favorecendo a expansão das vendas externas, em que pese o Brasil manter-se dependente de cenário e demanda internacionais favoráveis.

O que se espera é que o novo governo adote uma política externa que não seja voltada somente para os países emergentes ou menos desenvolvidos, mas que priorize também os países desenvolvidos. Afinal, são estas nações que compram de forma permanente, principalmente os Estados Unidos.

11/12/2010

Fonte: ViaPolítica/O autor

Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC).

E-mail: fiorde@fiorde.com.br

Site: www.fiorde.com.br

 
14.12.2010
 

Resultados (magros) da diplomacia Sul-Sul - editorial OESP

Parece que a propalada nova geografia comercial é uma esquálida (para usar um termo muito aprecisado de certos bolivarianos) diversificação dos parceiros comerciais, mas seria um exagero classificar esses acordos como significativos.
Paulo Roberto de Almeida

O acordo Sul-Sul

Editorial - O Estado de S.Paulo
20 de dezembro de 2010

A mais ambiciosa negociação comercial entre economias em desenvolvimento, lançada há seis anos e meio por ministros de 43 governos, foi concluída oficialmente na última quarta-feira, em Foz do Iguaçu, com apenas 11 participantes. Foram até o fim os 4 membros do Mercosul - Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai - e também Coreia do Sul, Cuba, Egito, Índia, Indonésia, Malásia e Marrocos. O resultado, muito mais modesto que o pretendido, foi, no entanto, festejado como um marco. O presidente das negociações, o argentino Alberto Dumont, referiu-se ao acordo como "um primeiro e importante passo em um contexto de maior integração entre os países em desenvolvimento". O diplomata brasileiro Roberto Azevedo, embaixador do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), foi na mesma direção: "Há um espaço enorme a ser explorado daqui para a frente", comentou.
O acordo é muito mais amplo que os dois celebrados anteriormente - em 1988 e 1992 - no âmbito do Sistema Geral de Preferências Comerciais entre Países em Desenvolvimento (SGPC). As concessões oferecidas pelos 11 participantes envolvem 47 mil produtos. As facilidades concedidas pelo Mercosul valem para 6,7 mil. Mas a abertura é limitada. Os compromissos envolvem 70% dos bens importados e a preferência tarifária é de 20% sobre as alíquotas efetivamente aplicadas pelos participantes.
Cada país foi autorizado a manter 30% protegidos. A lista do Mercosul inclui as indústrias têxtil, de automóveis, de eletroeletrônicos e de bens de capital. Dentro de dois anos haverá uma revisão do acordo e as concessões poderão ser ampliadas.
A diplomacia brasileira tem contrastado o "sucesso" da Rodada São Paulo - é esse o nome da negociação recém-concluída em Foz do Iguaçu - com o impasse na negociação global de comércio, a Rodada Doha, lançada no fim de 2001, ainda emperrada e ainda sem perspectiva de conclusão. "Quando os países estão realmente dispostos a negociar, é possível chegar a acordos", comentou o embaixador Antônio Patriota, convidado pela presidente eleita para comandar o Itamaraty. De fato, sobrou má vontade na Rodada Doha, mas a comparação entre os dois empreendimentos é um tanto exagerada.
A retórica do governo brasileiro é até compreensível. A diplomacia petista produziu poucos acordos comerciais e nenhum de peso para o Brasil. O Mercosul foi criado nos anos 90. Nesta década o bloco celebrou alguns acordos com parceiros em desenvolvimento. Nenhum pacto comercial importante foi assinado com os principais mercados, Brasília concentrou suas apostas na Rodada Doha.
Evidente desde o primeiro instante, o erro foi confirmado de forma indiscutível quando se perderam as esperanças de uma conclusão ainda no governo do presidente George W. Bush. O governo democrata, não havia dúvida, viria com ideias muito diferentes sobre o comércio e muito menos favoráveis aos países emergentes.
Outros países cuidaram, mesmo durante a negociação global, de buscar acordos bilaterais. Alguns desses países participaram do lançamento da Rodada São Paulo, mas ficaram no meio do caminho. Esse grupo inclui Chile, Colômbia e México, muito mais abertos que o Brasil petista a entendimentos comerciais com países de qualquer grupo, sem preconceitos terceiro-mundistas. Alguns deles talvez decidam aderir ao acordo de Foz do Iguaçu. Adesões estão previstas nos documentos assinados pelos diplomatas dos 11 países.
É difícil avaliar, sem um exame mais detalhado de todos os compromissos, se esse acordo trará benefícios importantes ao Brasil ou mesmo se haverá mais custos do que vantagens. Industriais brasileiros têm-se mostrado menos otimistas que o governo em relação a essa rodada.
O comércio do Brasil com o Mercosul é muito maior que o intercâmbio com os demais participantes do acordo. Suas exportações para os sete países estranhos ao bloco totalizaram US$ 11,75 bilhões neste ano, até novembro. O País é deficitário nas transações com os dois maiores parceiros. Diante da Coreia, o déficit chegou a US$ 4,4 bilhões. Qual será o resultado com as novas concessões tarifárias? Vem aí mais um teste para a competitividade brasileira.

Flagrantes da Universidade Brasileira: o mito da dedicacao exclusiva

Flagrantes, aqui, é um conceito que pode ser tomado em diversos sentidos, ainda que os ditos cujos não tenham sido pegos em flagrante, embora de certo modo sim...
Quanto à exclusividade, alguém acredita que este problema seja exclusivo da Unifesp?
Paulo Roberto de Almeida

Docentes da Unifesp são acusados de burlar exclusividade

LAURA CAPRIGLIONE - DE SÃO PAULO
Folha de S. Paulo21/12/2010

Vinte docentes da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) foram acusados pelo Ministério Público Federal de improbidade, enriquecimento ilícito, dilapidação de patrimônio público e atentado aos princípios da administração pública.
Fiscalização do Tribunal de Contas já havia apontado os 20 professores como violadores do regime de dedicação exclusiva 'ao qual voluntariamente aderiram'.
Basicamente, a universidade possui três regimes de trabalho: 1) dedicação exclusiva; 2) 40 horas semanais sem exclusividade; 3) tempo parcial de 20 horas. Pelo compromisso que impõe, o regime de dedicação exclusiva prevê remuneração maior. Atividade envolvendo outros recebimentos precisam ser autorizadas pela universidade.
Entre as acusações contra professores, há a de manter consultórios particulares, lecionar em outras instituições e gerir órgãos de saúde externos à Unifesp.
Ainda segundo as acusações, nove docentes, além de violar a exclusividade, se dedicavam à gerência, administração ou representação técnica de sociedades comerciais, o que é vedado pelo Estatuto do Servidor Federal.
Os procuradores da República Sergio Gardenghi Suiama e Sônia Maria Curvelo pedem que os professores sejam condenados a ressarcir o dano apurado, a perder o cargo de docentes da Unifesp, à suspensão dos direitos políticos por até dez anos, a pagar multa de até três vezes o valor da vantagem indevidamente recebida.
Pedem também que os acusados sejam proibidos de fazer contratos com o poder público durante o prazo de dez anos.
A Procuradoria avalia que o prejuízo ao erário envolvido nas três ações seja da ordem de R$ 1,4 milhão.
APURAÇÃO
Em nota, a Unifesp afirmou que 'não pode ser responsabilizada por atos pessoais de seus servidores, que devem seguir a legislação pertinente aos servidores públicos federais, o Estatuto do Funcionário Público, cujo acesso e consulta é livre a qualquer cidadão'.
Segundo a universidade, 'nenhum dos 20 professores solicitou prévia autorização' para exercer atividades remuneradas extracampus.
A Unifesp informa ainda ter aberto processos administrativos disciplinares para apuração dos fatos.
Os docentes ainda poderão contestar as acusações.

Meus livros "ensebados", metaforicamente...

Talvez ensebados não seja exatamente o termo. Os meus "meus" estão, é verdade, precisando de algum espanador, talvez até um descupinizador, inseticida, whatever, e certamente de uma boa classificação e arrumação.
Mas estes aqui, que são "meus", mas não estão comigo, estão apenas em sebos, esperando alguma vivente interessado:















quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Economia no limite - Edmar Bacha

Uma entrevista tocando nos problemas da atualidade econômica brasileira:

Entrevista: Formulador do Plano Real não vê desindustrialização, mas "disputa" por mão de obra

"A economia tem limites e o país está no limite", diz Bacha

João Villaverde | Do Rio
Valor Econômico – pág. A12
22/12/2010

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Aumentamos as importações não porque a indústria não tem capacidade instalada, mas porque a mão de obra está cara" Temos um problema com essa emergência da classe média, que todo mundo está achando uma maravilha"
Em 1974, quando Edmar Bacha criou o termo "Belíndia" para designar o modelo econômico brasileiro - que unia a riqueza da Bélgica, um país pequeno, com a pobreza da Índia, um país continental - o Produto Interno Bruto (PIB) havia crescido 8,1%, mas a inflação dobrara, passando de 15,5% para 34,5% de 1973 a 1974. Era o fim do "milagre" produzido pela ditadura militar a partir de 1967, e início de um período que mesclaria crescimento acelerado com endividamento externo e inflação crescente. Vinte anos mais tarde, Bacha, doutor em economia por Yale (EUA) em 1968, integrava o grupo de economistas formado por Persio Arida, Gustavo Franco e André Lara Resende na formulação e implementação do Plano Real, que trouxe a inflação dos 2.477,1% registrados em 1993 para menos de dois dígitos a partir de 1996. Hoje, com a economia caminhando para repetir a alta de 8% registrada pelo PIB nos anos 1970, Bacha avalia que o Brasil está no limite.
"O Brasil está mais complexo que nos anos 1970 e 90. Superamos os grandes problemas da ditadura, da hiperinflação e da perspectiva para um governo de esquerda. Não há mais um grande problema, mas uma série de questões para serem atacadas", avalia Bacha, para quem o país conta "com uma produtividade ainda fraca, o setor público ainda abocanha uma parcela muito grande do PIB e não entrega de volta no mesmo nível, o sistema político brasileiro é um horror, o sistema tributário é uma vergonha, e a Previdência, se não for reformada, vai quebrar o país em 2050".
Na entrevista que deu no prédio projetado por Oscar Niemeyer, com jardins de Roberto Burle Marx ao fundo, onde funciona o Instituto de Estudos de Pesquisa Econômica Casa das Garças, Bacha, diretor do centro e até a semana que vem consultor sênior do Itaú BBA, fez um balanço dos oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, e avaliou os principais desafios de Dilma Rousseff. E foi contundente em dizer que não vê risco de desindustrialização no país, mesmo com os indicadores de produção industrial andando de lado desde abril. "Como podemos falar em desindustrialização quando estamos com pleno emprego?", pergunta, se referindo à demanda por mão de obra, que acaba por elevar os salários. A seguir os principais trechos de sua entrevista:
Valor: Com o atual ritmo de crescimento do PIB, câmbio valorizado, inflação acima da meta do BC e financiamento externo elevado, como é possível se alterar esse modelo sem que se bata em um gargalo?
Edmar Bacha: A economia tem limites, apesar do Antônio Delfim Netto achar que não existe produto potencial. Claramente estamos trabalhando nos limites. Como sair disso sem aumentar a poupança interna? Com produtividade. O que temos a oferecer para aumentar a produtividade? Os avanços tecnológicos não caem do céu, é preciso ir atrás deles e isso vai na contramão da tese de desindustrialização, afinal estamos importando mais tecnologia, justamente para ampliar a produtividade.
Valor: O sr. então refuta a ideia de que o Brasil está se desindustrializando?
Bacha: Estamos em pleno emprego, que desindustrialização é essa? A verdade é que por estar em pleno emprego e a mão de obra em escassez, e por estarmos nos especializando em serviços, comércio e construção civil, a indústria não consegue concorrer na disputa pelo trabalhador.
Valor: Por isso os indicadores de produção industrial estão tão fracos desde abril?
Bacha: No Brasil, nunca olhamos direito para a questão do emprego, mas sempre para a utilização da capacidade produtiva. Acho que é uma novidade o que está ocorrendo. Nunca tivemos uma taxa de desemprego tão baixa. A indústria se anima porque a demanda está mais alta e tenta contratar mais mão de obra, e aí o preço sobe. O próprio Valorfez uma matéria chamando atenção para os acordos salariais recordes neste ano. Isso representa aumento do custo da mão de obra e consequentemente reduz a rentabilidade da indústria. Então a indústria não tem por quê produzir mais. Não há pressão sobre a capacidade instalada, mas sobre mão de obra. E não é só na indústria, o pessoal de construção civil também. Não tem engenheiro e também não tem pedreiro.
Valor: Essa dificuldade em produzir, então, facilita a entrada de importados?
Bacha: Ao tentar produzir mais o salário sobe, e com isso diminui a rentabilidade, então ela não produz além de certo patamar. Aumentamos as importações não porque a indústria não tem condições de concorrência, mas porque ela está plenamente empregada.
Valor: Onde isso pode chegar?
Bacha: Essa falta de mão de obra pode extravasar para aumento da inflação ou um déficit não financiável nas transações correntes. Esse é que é o problema, não é a desindustrialização.
Valor: Não estamos dependendo muito da demanda chinesa por commodities?
Bacha: A ideia de que os preços estão em alta e podem cair e gerar um problema é exagerada. Se daqui a cinco anos a China parar de consumir, a Índia assume a demanda. Vivemos uma mudança estrutural profunda, semelhante a que ocorreu na passagem do século XIX para o XX, quando o país líder era consumidor de commodities, a Inglaterra, e passou a ser os Estados Unidos, um país produtor de commodities. Passamos, então, cem anos com os preços das commodities no chão, o que deu caminho para a industrialização. Agora está saindo dos EUA e indo para China e Índia, que, como a Inglaterra antigamente, demandam commodities.
Valor: O Brasil, então, continuará sendo o país do futuro?
Bacha: Não temos um terço da humanidade, como têm China e Índia. Mas temos diversos desafios vencidos, o que é ótimo, o que deixa o caminho aberto. Superamos a ideia de que o Brasil só crescia de maneira estável com ditadura, primeiro com a industrialização induzida por Vargas e depois com os militares. Superamos essa fase, podemos ser uma economia que não vai por saltos, mas cresce e com democracia. Depois a ideia de que a única maneira de crescer era com inflação. Eu me lembro do Celso Furtado dizendo que 17% de inflação é mais ou menos igual a zero nos países desenvolvidos. Superamos isso também. A terceira questão é a esquerda no Brasil, e essa é a importância do Lula.
Valor: Como assim?
Bacha: Até dezembro de 2001, quando o PT teve o manifesto de Olinda e ignorou o fim da Guerra Fria, ninguém poderia saber como seria um governo de esquerda. Aí vem o Lula e joga com todos os velhos vícios da política brasileira. Nós passamos por esse teste.
Valor: O que falta, então?
Bacha: Faltava demanda por recursos naturais, mas até isso superamos, com o surgimento da Ásia, com forte demanda pelos produtos que os latino-americanos têm à oferecer. Nossos problemas agora não têm a dramaticidade que tinham quando as questões eram hiperinflação, ditadura, a perspectiva de um governo de esquerda e a falta de demanda por nossas commodities. Isso é passado.
Valor: O Brasil está mais complexo. Mas ainda não superou todos os problemas do passado, como a desigualdade de renda...
Bacha: Concordo. Continuamos com um problema de distribuição de renda, que é coisa que precisa sempre ser priorizada. Mas não é só isso, temos outros problemas, antigos, que não foram resolvidos. Temos uma produtividade ainda fraca, o setor público ainda abocanha uma parcela muito grande do produto e não entrega no mesmo nível, o sistema político é um horror, o sistema tributário é uma vergonha e a Previdência, se não for reformada, vai quebrar o país em 2050. Uma quantidade enorme de problemas que precisam ser atacados, mas nós temos o know-how.
Valor: Este é o momento para discutir essas questões?
Bacha: Nas épocas eleitorais claramente não é. Quando você vê o nível do debate que tivemos em 2010 dá vontade de correr. Especialmente quando o principal debate se deu em torno do aborto. Temos um problema aí com essa emergência da classe média, que todo mundo está achando uma maravilha, mas ela não necessariamente tem uma face bonita, basta ver nos EUA com o Tea Party. Acho que está fora de cogitação pensar que essa classe média pode pensar em ditadura, mas estará ela disposta a discutir a fundo esses diferentes problemas? Em alguns temas já formamos consensos, como na questão dos tributos, que foi levantada depois das eleições, quando falaram sobre o financiamento da saúde.
Valor: O sr. concorda com o retorno da CPMF?
Bacha: É claro que não concordo. Acho absurdo pensar em criar mais um imposto quando o governo está arrecadando barbaridades. É preciso arrumar os gastos, não a arrecadação.
Valor: O caso da Previdência é um exemplo?
Bacha: Exatamente. Gastamos 11% do PIB com Previdência quando o normal seria 5%. Dentro da Previdência, o equivalente a 3,5 pontos percentuais são gastos com pensões, quando o normal seria 1% do PIB. Temos esses privilégios adquiridos que têm uma força enorme e representam uma parcela muito grande dos impostos.
Valor: Mas programas como o Bolsa Família são baratos, não?
Bacha: Sim, o Bolsa Família atinge 12 milhões de famílias e custa apenas 0,4% do PIB. O Loas, que atinge quantidade enorme de idosos, custa só 0,6% do PIB. Então, quando o governo fala em financiar os programas sociais, não pode estar se referindo a esses, que são muito baratos. O que ocorre é uma usurpação dos gastos sociais, dando a todo tipo de gasto o nome de social.
Valor: Dê um exemplo, por favor.
Bacha: Na educação, o grosso dos gastos públicos vai para universidades gratuitas. Não tem a mínima razão para as universidades serem gratuitas no Brasil.
Valor: Nenhuma?
Bacha: Não, nenhuma. Desde que se tenha uma política de bolsas, não precisamos ter universidades gratuitas.
Valor: Então seria possível privatizar as universidades públicas?
Bacha: Eu não gosto dessa palavra "privatizar", há mecanismos em que os beneficiários dos gastos públicos têm co-participação desde que tenham renda para tal, seja por bolsa, seja por empréstimos escolares. Os argumentos que estão por trás desses privilégios, tanto na Previdência quanto na educação superior, vêm da Constituição, que prevê que o ensino deve ser universal e gratuito. É gratuito, mas não pode ser universal e nem pode ser, e o dia que for o país arrebenta, porque não dá para atender todo mundo de graça. Essa é a dificuldade do PT para comandar o próximo passo.
Valor: E esse passo seria qual?
Bacha: O processo que vêm pela frente está baseado na eficiência do setor público e na equidade nos gastos, porque eles não gostam de falar em privatização.
Valor: O país deixaria então de ser a "Belíndia"?
Bacha: Se continuarmos no ritmo desses últimos dez anos, daqui a 15 anos estaremos perto dos Estados Unidos de hoje. O índice de Gini do Brasil passou de 0,65 para 0,56, mas o padrão americano é de 0,40, e o europeu é de 0,25, então ainda há muito a ser feito. Temos trilhado esse caminho, mas as coisas vão ficar mais difíceis. Os desafios que temos hoje na área social são mais caros e mais complexos. Uma coisa era resolver o problema da vacinação e da mortalidade infantil, algo razoavelmente simples, mas dar SUS para todos é muito mais complicado. Com educação, uma coisa era colocar todo mundo na escola, agora é preciso fazer as crianças aprender alguma coisa.
Valor: E o Estado consegue dar conta de tudo?
Bacha: Claro que não. Boa parte do desafio agora é encontrar formas de maior participação do setor privado nessa área social. E aí tem esse grande entrave do PT. A pior coisa do governo que termina foi ter demonizado a ideia de privatização. Nós não conseguimos resolver o problema dos aeroportos porque qualquer coisa que mexe com privatização é travado. Isso é terrível porque nessa nova fase o setor público não consegue dar conta, seja do ponto de vista administrativo, seja do lado financeiro. Talvez a Dilma nos surpreenda.
Valor: Você acha que ela vai surpreender?
Bacha: Não sei. Até agora o ministério é muito velho, não? Não vejo uma cara de estar preparado para uma nova fase, parece quatro anos do mesmo.
Valor: A inflação deve fechar o ano em torno de 6%, acima da meta de 4,5% do Banco Central. Em 2002, quando a inflação dobrou, o sr. defendeu uma meta mais branda. O que acha hoje?
Bacha: Naquela época tivemos um choque de oferta, não era a economia trabalhando a mil, como hoje. Com choque de oferta se justifica um tratamento mais brando na hora de trazer inflação para a meta. Não é que o BC não tenha de atacar a inflação, mas atacar de forma compatível com o problema. Em 2010 é outra história, é basicamente demanda. Tem um ciclo de alimentos, que ajudou por três meses a inflação e agora está incomodando.
Valor: Isso quer dizer que a maior taxa de juros do mundo vai subir ainda mais?
Bacha: Seria ótimo que o lado fiscal ajudasse, mas não acho que isso vai acontecer. Quem dera que o "neomanteguismo" me surpreenda com um ajuste fiscal forte, mas vai sobrar para o BC. O que é ruim, porque já temos a maior taxa de juros do mundo.
Valor: Mas o PIB deve crescer fortemente nos próximos anos, não? Não só pelo carry-over de 2010, mas também pela perspectiva de pré-sal, Copa do Mundo, Olimpíada etc.
Bacha: Não acho que o PIB vá crescer tudo isso que está sendo projetado pelo governo e pelo mercado.
Valor: Por quê?
Bacha: Porque não temos poupança para isso.
Valor: Mas podemos continuar ampliando nosso déficit em transações correntes para sustentar o crescimento, não?
Bacha: Podemos, claro, nessa hipótese o PIB crescerá mesmo, e imitaremos a Austrália, que cresce há muitos anos, mesmo com um endividamento externo elevado, de 5% a 7% do PIB. Mas se chegarmos nesse nível o mercado pode achar que somos mais Hungria que Austrália, e a confiança se esvai rapidamente.
Valor: Como tornar o crescimento sustentável, como incentivar poupança?
Bacha: É mais fácil ter um diagnóstico da poupança do setor público que do privado. O setor público já chegou a poupar 7% do PIB, hoje poupa 1,5%. Quando se controla o gasto corrente sobra mais para poupar e investir, não tem muito mistério nisso. A questão do setor privado é mais complexa. Pense na China. O problema deles não é como aumentar a poupança, mas diminuí-la. Sabe como?
Valor: Como?
Bacha: Dê a eles um sistema universal de saúde, educação e previdência. A poupança das famílias, das empresas e do Estado vai embora rapidinho. Precisamos pensar além da poupança, os EUA nunca pouparam muito. Precisamos pensar na inovação, essa foi a razão do sucesso dos americanos.
Valor: O que deve fazer o Estado?
Bacha: Precisa fazer coisas básicas, como ocupar o Morro do Alemão (RJ). Esse é um caso quase patético de como o Estado deve agir. É como quando acabamos com a inflação, havia todo um nundo novo à nossa frente.
Valor: Que balanço o sr. faz do governo Lula?
Bacha: Teve dois grandes méritos. O PT nasceu longe das bases comunistas e populistas, mais ligado à social-democracia, a um sindicalismo mais avançado, às bases da Igreja. O que vai ser quando chegar no poder? O discurso era péssimo, assustador. Mas chegou lá e demonstrou que é possível ter governo de esquerda no Brasil. Outra coisa é o pragmatismo do Lula. Começou a atacar a pobreza com o Fome Zero. Quando viu que o programa era ruim, foi para o Bolsa Família, que deu muito certo.
Valor: E o que o sr. avalia mal?
Bacha: Um dos erros nem foi propriamente do Lula, que foi o caso do mensalão, quando o governo resolveu fazer as reformas do começo de governo, reformas difíceis de fazer e de passar pelo Congresso e resolveram utilizar o método tradicional, mais fácil, de comprar os parlamentares. A partir daí [quando estouraram as denúncias], Lula resolveu desistir de passar reformas. Ter abandonado as reformas foi algo muito ruim. Outro problema foi a demonização da privatização. Como Lula ganhou em 2006 do Alckmin com essa plataforma, percebeu que esse ideário funciona, é eleitoralmente impotente. É uma coisa muito ruim isso, porque o Brasil não vai conseguir fazer a Copa do Mundo do jeito que os aeroportos estão. Quantas PPPs o governo fez? Não sei se a Dilma vai ter a capacidade de fazer as coisas de outra forma.
Assista vídeo com a entrevista em www.valor.com.br

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...