segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O Itamaraty deixou de ter importância para a Presidência da República - Oliveiros S. Ferreira

Os passos que conduziram à crise da visita

Oliveiros S. Ferreira - O Estado de S.Paulo, 22/09/2013

O adiamento da visita da presidente Dilma Rousseff aos Estados Unidos mudou o mapa geopolítico das Américas. Esse é o fato importante. E a esse ponto voltaremos em outra oportunidade.
A análise do episódio da espionagem da Agência de Segurança Nacional (NSA) permite-nos dizer que houve um momento em que o problema mudou de configuração, deixando de ser de soberania violada para transformar-se em questão, por assim dizer, pessoal: L'État c'est moi.
Recapitulemos: 1) a descoberta do feito ominoso; 2) a reação administrativa do Ministério das Comunicações; 3) a divulgação de que a espionagem violara a privacidade da presidente Dilma Rousseff - aqui se dá a alteração da qualidade no processo; 4) o Itamaraty exige esclarecimentos por escrito e fontes do Palácio do Planalto murmuram que Dilma poderá cancelar a visita; 5) Dilma, em São Petersburgo, dá ultimato: a visita depende de condições políticas e cabe ao presidente Barack Obama criá-las; 6) o chanceler brasileiro vai aos EUA reunir-se com a conselheira de Segurança Nacional sem que resposta por escrito tenha sido recebida; 7) segundo fontes autorizadas, Dilma reuniu-se com seu Conselho Político (do qual fazem parte João Santana e Franklin Martins, que não são governo, muito menos são Estado) e se informa que a presidente ainda depende de conversa com o chanceler para se informar do que foi tratado em Washington; 8) fontes do Planalto insistem em que a visita será cancelada; 9) Obama telefona a Dilma; 10) a visita é adiada sine die.
Três fatos aparentemente sem relação com o caso podem ser a esses todos acrescentados: 1) Vladimir Putin, presidente da Rússia, em artigo no jornal The New York Times, irrita "falcões" e "pombas"; 2) em ato público, Lula diz que se faz necessário um novo fórum de governança mundial e que "é preciso dar o mesmo peso a presidentes e chefes de Estado como o dos Estados Unidos, Alemanha e Brasil, caso contrário 'vamos ter problemas sérios no mundo'" (Valor, 12/9); 3) a Rússia sugere que o Brasil integre a força da ONU que deverá fiscalizar a entrega pela Síria de suas armas químicas.
Conjecturemos.
1) Não se sabe por que o chanceler brasileiro - que não opina no Conselho Político - foi a Washington; o público é informado do andamento da crise (pois é de crise que se trata) pelas "fontes", que se servem da imprensa para informar a Embaixada dos EUA do estado de espírito da presidente.
2) Antes de uma batalha, qualquer general que se preze avaliará a doutrina militar e buscará compreender a ideia que seu adversário faz de como deve travar-se o combate. Ora, o que as "fontes" deixam vazar indica que nenhuma avaliação foi feita, que o sentimento antiamericano no Palácio do Planalto subiu à cabeça dos que decidem e não se considera mais a relação de forças, cujo entendimento deve ser uma das bases de qualquer política externa que não queira, como a de Foster Dulles na guerra fria, chegar à "beira do abismo".
3) O Planalto considera o Brasil, hoje, tão importante na cena internacional quanto Estados Unidos e Alemanha. Essa hipótese terá a alicerçá-la uma certeza de que o poder dos Estados Unidos já não é o que um dia foi.
4) Considerando os números do comércio com os Estados Unidos, o valor dos investimentos diretos e a exposição cambial do nosso país às flutuações do dólar, o antiamericanismo só pode estar apoiado em dois pilares: a certeza da fragilidade do poder dos EUA e a convicção de que a Rússia, queiram ou não os EUA, além do Conselho de Segurança da ONU, é parte do novo "fórum da governança mundial". Ora, se a Rússia pertence ao Brics, o Brasil também!
Se essas conjecturas têm algum fundamento, e se os fatos apontados de início traduzem a realidade, é importante retirar, de umas e de outros, as conclusões concernentes à política externa brasileira.
A primeira é a de que o Itamaraty deixou de ter importância para a Presidência da República. A política externa faz-se, hoje, no Planalto, com ou sem a assistência do Conselho Político - e ousaria dizer que a influência dos "conselheiros" é pequena diante da vontade da presidente, que tem peculiar visão do mundo. O elemento fundamental dessa política é que o Brasil, por seu território, sua posição, sua população e sua economia, é tão importante quanto aqueles países que até hoje decidiram os destinos do mundo. Um observador ousado diria que a presidente Dilma Rousseff se considera, hoje, um Dux.
A nova política externa tem um norte e se assenta em dois pilares. O norte foi traçado por Lula quando presidente: unir a América Latina, começando pela do Sul, se não contra, ao menos afastada dos Estados Unidos. Dilma forneceu novos elementos para a equação: o Brics. Ainda que seja ousadia geopolítica, é conveniente ver que o Brasil é, a um tempo, membro do Brics e do Mercosul, e que a África do Sul foi convidada a participar da nova organização (ainda que esteja em embrião) por sua posição geoestratégica, e não por sua economia. Que ela é importante para a Rússia se evidenciou quando seu presidente, que conferenciava com Putin, deixou Dilma esperando durante uma hora - e sem protestos...
Um dos pilares é a doutrina (ou seria a intenção?) bolivariana, que presidiu o ingresso da Venezuela no Mercosul. Ela está solidamente ancorada nos governos-membros da organização, exceto, por enquanto, o do Paraguai. O outro é permitir a expansão do capital brasileiro na América do Sul, usando o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e, basicamente, as empreiteiras.
Essa política externa está sendo feita e continuará a se fazer porque não se cuida de política externa no debate pré-eleitoral. E dela não se cuida porque o Estado, infelizmente, está ausente do pensamento dos que pretendem fazer Política no Brasil.   
*PROFESSOR DA USP E DA PUC-SP, É MEMBRO DO GABINETE E OFICINA DE LIVRE PENSAMENTO ESTRATÉGICO. SITE: WWW.OLIVEIROS.COM.BR

O paradoxo peruano: crescimento e baixa popularidade - Mac Margolis

Paradoxo peruano

MAC MARGOLIS - O Estado de S.Paulo, 22/09/2013

Em um continente conturbado e com indicadores sofríveis, o caso peruano desponta. Sua economia deve cravar crescimento de 5,6% este ano, o dobro do desempenho brasileiro, e em 2014 promete ser o melhor Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina.
Os bons números nada têm de milagre. São fruto da moeda estável, regras econômicas claras e políticas fornidas longe da fogueira populista que tanto atrai os líderes latinos. Loas para Ollanta Humala, o ex-militar e outrora golpista que, para se eleger presidente, guardou as camisas vermelhas, abriu o punho cerrado e revisou a retórica nacionalista para os tempos mais sóbrios.
Quem olhe o país de longe vê um dínamo nos Andes. De perto, a vista é outra. Humala amarga um dos piores índices de popularidade da América Latina. Os 41% de peruanos que aprovaram seu governo em junho hoje são 27%. Há dois meses, milhares de manifestantes, a maioria da classe média, tomaram as ruas contra Humala.
Como um país pode ir tão bem e seu líder, tão mal?
O paradoxo não é privilégio peruano. O Chile segue líder disparado na região, com crescimento forte, investimento robusto e a melhor cultura de administração do continente. Já seu presidente, Sebastian Piñera, um empresário equilibrado, corre o risco de terminar seu mandato com uma rejeição recorde.
Na Colômbia, não é diferente. Lá, o presidente Juan Manuel Santos preservou a política de segurança e de sobriedade fiscal que elevou o país à condição de segunda economia sul-americana. No entanto, a aprovação de Santos despencou 27 pontos desde junho (está em 21%) e sua reeleição em 2014 já é dúvida.
Enquanto os líderes moderados ardem no inferno astral político, os bolivarianos no Equador, Venezuela e Bolívia e Nicarágua, gozam de índices invejáveis mesmo quando pisoteiam seus dissidentes e tumultuam suas economia.
Venezuela sofre blecautes, uma epidemia de crime e escassez de papel higiênico? Não importa, Hugo Chávez, que governou soberano durante 14 anos, é quase beato enquanto seu inexpressivo sucessor, Nicolás Maduro, tem o dobro de aprovação de seu par colombiano. Nicarágua é um dos países mais pobres da América Central, mas o comandante Daniel Ortega conta com 70% de aprovação dos nicaraguenses.
Pão e circo. A senha para essa aprovação é distribuir pouco para muitos, uma receita garantida por petrodólares e ingressos de minérios, e controlada pelo poder estatal. Encampar empresas privadas, calar a imprensa e intimidar sindicatos, tudo pode desde que haja migalhas. O pão sustenta o circo bolivariano.
No Peru, Humala cometeu erros e deslizes. A violência subiu na zona rural e em alguns bairros de Lima, piorando a sensação de insegurança. (Mesmo que o país ostente uma das menores taxas de homicídio nas Américas: 2,4 por 100 mil habitantes.) Um quarto dos peruanos ainda vive na pobreza.
Seu pior pecado, no entanto, foi quebrar tabus. Para desgosto de muitos ex-companheiros, o mandatário defendeu as reformas de Alberto Fujimori. Não foi afinidade ideológica. Humala sabe que o ex-tirano fechou o Congresso, atropelou direitos humanos, comprou apoio político e acabou na cadeia. Também reconhece que Fujimori abriu a economia, equilibrou as contas e esmagou a guerrilha maoista.
Melhor para os investidores, sim, que apostaram alto em obras vultosas de mineração e infraestrutura. Só que seus ganhos também impulsionaram a economia e criaram empregos. Com dois anos de antecedência, o Peru acaba de alcançar os Objetivos do Milênio das Nações Unidas, reduzindo pela metade o número de pobres em 15 anos.
No Peru, como em outras sociedades em ascensão, quem sobe de vida enxerga melhor e logo, exige mais. Foi assim com os presidentes Alejandro Toledo e Alan Garcia, dois que abraçaram reformas e também saíram às vaias. Agora, a bola da vez é Humala.
Todas as colunas de Mac Margolis

Surrealismo bolivariano: Kafka nos Andes (unbolivable)

O inferno em La Paz
Mônica Bergamo (monica.bergamo@grupofolha.com.br)

Eduardo Saboia, diplomata que ajudou um senador a fugir da Bolívia, diz que o país é 'a Síria brasileira', com problemas que podem 'estourar na nossa cara'
Os funcionários da embaixada brasileira em La Paz, capital da Bolívia, inventaram uma palavra que não existe no vocabulário. É "unbolivable", corruptela do inglês "unbelievable" (inacreditável). "Quando um problema atinge a escala do inimaginável, e por lá acontecia isso com frequência, a gente usava essa piada", conta Eduardo Saboia, 46, ao repórter Morris Kachani.
Ex-encarregado de negócios da embaixada, ele ficou célebre ao ajudar o senador Roger Pinto Molina, asilado na representação por 453 dias, a fugir para o Brasil no mês passado. E decreta: "A Bolívia é a nossa Síria".
"A embaixada é o saco de pancadas que Brasília nunca defendeu. Tudo que pode dar errado, dá mais errado", afirma. "É o teatro do absurdo, com uma trupe de atores, amigos até, que já atuaram juntos em peças melhores. É Esperando Godot', é O Anjo Exterminador'", diz, citando obras de Samuel Beckett e Luis Buñuel marcadas pela negação e pelo tragicômico.
Não é à toa que Saboia cita o surrealismo de "O Anjo Exterminador", em que os personagens estão presos no salão de uma mansão após um pomposo jantar: ele próprio não via a hora de trocar de posto. Havia o desgaste de empreitadas como as 18 viagens que teve de fazer a Oruro (a três horas de La Paz) como negociador na questão dos torcedores corintianos que foram presos após a morte do menino Kevin.
E outro motivo, especial. Saboia é casado com a cônsul brasileira de Santa Cruz de la Sierra. Eles têm três filhos, de 20, 17 e 15 anos. O do meio é autista. O ideal seria ir para um país referência na abordagem da síndrome.
Após dois anos na Bolívia, Saboia negociava seu retorno a Washington, nos EUA, para servir na missão brasileira junto ao FMI.
Não que a vida em La Paz fosse feita só de estorvos. "Gosto muito da Bolívia", diz ele. Nas horas vagas, fazia aulas particulares de violão clássico. Percorreu trilhas nos Andes, escalou uma montanha de 6.088 m, correu a maratona em La Paz.
A mudança acabou sendo protelada. Em 23 de agosto, quando coordenava interinamente a missão brasileira, seu destino adquiriu novos contornos: ele decidiu trazer ao Brasil o senador Roger Pinto, líder da oposição ao presidente boliviano Evo Morales e investigado por corrupção, dano ambiental e assassinato, acusações que nega. "Pinto vinha conversando com a geladeira, de tão deprimido. Vivia confinado em uma sala de 20 m², em um prédio de escritórios, sem banho de sol." As tardes de sexta eram as mais tristes porque o fim de semana se avizinhava solitário. No período final do asilo, só a filha tinha o direito de visitá-lo.
A fuga, em dois Nissan Patrol, escoltados por dois fuzileiros navais brasileiros e com dois motoristas bolivianos no volante, foi como um road movie: as passagens pelos checkpoints, o trânsito em Cochabamba ("três horas em uma névoa terrível"), a parada em Santa Cruz, perto de onde mora sua família, os 650 km finais até a fronteira, em que há só dois postos de combustível. E o epílogo, com o tanque quase vazio e a leitura de salmos evocando socorro contra os perseguidores.
Foram 22 horas em que até fralda geriátrica eles usaram. Pinto vomitou na descida de La Paz a Cochabamba, estrada cheia de curvas e sem acostamento.
A "operação", como ele define o episódio, custou a cabeça do chanceler Antonio Patriota. Saboia foi removido para Brasília e responde a sindicância do Itamaraty.
Não anda animado, mas, além de críticas, recebe aplausos. O pai, Gilberto Saboia, ex-secretário de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso, já se disse aflito, mas orgulhoso do filho. Ele também é diplomata, amigo de estrelas do Itamaraty como Celso Amorim, e os filhos de ambos cresceram brincando juntos.
A mulher de Eduardo Saboia está se desligando do posto em Santa Cruz. Os dois não se veem há dois meses. Ele está na casa de familiares dela em Brasília e usa as roupas que o pai, que mora no Rio, lhe trouxe. Diz que não se arrepende. "Hannah Arendt falava na banalização do mal. No meu caso, foi a banalização do bem. Não quebrei hierarquia. Ele já tinha o asilo. E eu precisava proteger o senador da depressão."
"Eu vinha alertando o Itamaraty. Mas havia uma atitude de não se posicionar, de varrer para debaixo do tapete. Éramos orientados para não falar com a imprensa nem com parlamentares. Um sistema de incentivo para você não falar a verdade." Só demonstra arrependimento quando é lembrado que comparou a embaixada de La Paz ao DOI-Codi, enfurecendo a presidente Dilma Rousseff.
Virou amigo de Roger Pinto. Diz que Brasília e a embaixada se debruçaram sobre os 21 processos contra o senador na Bolívia. A conclusão preliminar, afirma, foi a de que "metade dos processos apareceu depois de denúncias que ele fez [contra o governo]. Há ações por desacato e corrupção. Uma por desmatamento --de duas árvores. Outra por homicídio que não diz quem ele teria matado".
Cita o caso dos corintianos para discorrer sobre "a falência, extorsão e corrupção características do Judiciário boliviano". "Ali tudo se paga, por dentro e por fora. São US$ 15 mil para uma sentença, por exemplo. Até pela cela você tem que pagar, ou por uma audiência."
Segundo ele, há mais de cem brasileiros nas prisões bolivianas. "Não que todos sejam inocentes, mas como apoiá-los oficialmente nessas circunstâncias?"
Lista outros incidentes para ilustrar "o drama que é servir na Bolívia": a nacionalização de refinarias da Petrobras, a paralisação de uma obra da OAS, as revistas em aviões da FAB. Empreendedores chegam "como num faroeste, achando que a embaixada é uma UPP".
Segue com os pequenos agricultores brasileiros na fronteira, a venda de cocaína para o Brasil, segundo maior mercado consumidor do mundo. "É a nossa relação internacional mais difícil. Existe uma proximidade e uma assimetria entre os dois países. Os nacionalistas mais fervorosos consideram-nos um covil de ladrões, porta-vozes da direita golpista."
Vê como positiva a política externa do governo Lula, também em relação à Bolívia. O país seria a "nossa Síria" porque "é onde estão os problemas que podem estourar na nossa cara". "A Bolívia não pode ser minimizada como um país periférico. Você pode não querer ir até a Bolívia. Mas a Bolívia vai até você."


  • Igo Estrela/Folhapress
    a
    O diplomata Eduardo Saboia diz que a Bolívia, onde trabalhava, é "a Síria brasileira", com problemas que podem "estourar na nossa cara"

    Across the whale in a month (7): dos cassinos aos vinhedos, de Reno, NV, a Napa e Sonoma, CA

    Hoje, domingo, dia 22 de setembro, fizemos "apenas" 244 milhas, descendo das montanhas do Nevada e da California, para as colinas das regiões vinícolas da California, basicamente Napa valley e Sonoma valley, onde estamos neste momento,
    O caminho é muito bonito, feito de altas montanhas em sua primeira parte, inclusive com direito a neve e tudo o mais.  Carmen Lícia fez dezenas de fotos do roteiro, neve, pinheiros, montanhas brancas, florestas, etc...
    Depois é uma descida sinuosa, em direção a Sacramento, onde paramos para visitar.
    Sacramento é uma cidade histórica, da época do ouro e da construção da ferrovia transcontinental.
    Ainda conserva aquele ar de Hollywood: construções de madeira, saloons, hoteis rústicos, comércio para pioneiros, hoje cheio de bugigangas indígenas e californianas para os turistas, que somos todos nós. Só que não é Hollywood, e sim a cidade histórica, tal qual foi preservada. Estátua do Poney Express, carruagens com cavalos, barco de pás no rio, enfim, só faltaram bandidos assaltando os bancos...
    Novamente a estrada I-80, que nos acompanha praticamente desde a costa leste, com alguns desvios para cima ou para baixo em alguns pontos, e chegamos a Napa, uma bonita cidade, atravessada pelo rio do mesmo nome, e seu vale repleto de dezenas, centenas de pequenos vinhedos, com seus nomes bizarros, ou simplesmente americanos.
    Tem uma adega, que aliás eu já conhecia dos vinhos presentes em Hartford, que se chama "Ménage à Trois", o que é provavelmente charmoso para os americanos, mas não deixa de ser vulgar...
    Tem muitos mais nomes curiosos, mas ficamos com a paisagem que cerca as duas vias que percorrem o vale, a leste e a oeste do rio Napa.
    De Napa, viemos a Sonoma, chegando já no final da tarde, e só deu para fazer esta foto da Missão franciscana que pretendemos visitar amanhã, segunda-feira.
    Agora vamos jantar...
    Paulo Roberto de Almeida
    Sonoma, 22.09.2013

    domingo, 22 de setembro de 2013

    Socialismo e'... quando falta papel higienico, e quando a privada nao funciona... - Venezuela, of course

    Nunca me esqueci desta definição perfeita do socialismo, que fez Pedro Paulo, meu filho, então com 4 anos, a quem, depois de percorrermos vários países socialistas da Europa central e oriental, no início dos anos 1980, eu tentava explicar as diferenças entre o socialismo e o capitalismo, onde ele nasceu, mais exatamente no capitalismo ideal da Suíça.
    Depois de falar da propriedade privada dos meios de produção, do papel do Estado, e de todas aquelas coisas que estão nos melhores manuais do marxismo-leninismo, eu resolvi perguntar a ele.
    "E aí Pedro, você entendeu as diferenças entre socialismo e capitalismo?"
    Ele me olhou bem seriamente, e em vista de todas as nossas experiências por hoteis até de luxo na Europa oriental, me disse, o mais candidadamente possível o que vai no título:
    "Ah, já sei. Socialismo é quando a privada não funciona e falta papel higiênico."

    Achei perfeita a definição, muito melhor que todos os exercícios eruditos de comparação entre sistemas políticos e econômicos, genial na sua simplicidade, tanto que nunca esqueci, e não me canso de dizer: socialismo é quando falta papel higiênico...

    Pois bem, sob esse ponto de vista, a Venezuela já é um país perfeitamente socialista...
    Paulo Roberto de Almeida

    Venezuela desabastecimiento

    Ocupan fábrica de papel higiénico por abatecimiento

    Reuters
    Caracas, 22 de septiembre de 2013
    Las claves
    • El desabastecimiento de alimentos, medicinas y otros productos se ha agravado este año en medio de una galopante inflación. Las largas filas frente a los supermercados son comunes cuando surten productos escasos.
    • "La decisión se tomó al observar la vulneración de este derecho en el acceso al rubro papel higiénico", dijo la jefa de la reguladora Superintendencia Nacional de Costos y Precios (Sundecop), Karlín Granadillo.

    ¿Qué pasa si Maduro gana?

    El análisis
    Luis V. León
    “No son ciertas ni las tesis chavistas que indican que la oposición está devaluada, ni las consignas opositoras que plantean que a Maduro no lo quiere ni su mamá. El país mostró en abril que, electoralmente hablando, las dos fuerzas son similares. Los números recientes no muestran nada muy distinto, excepto que ambos grupos políticos enfrían su relación con la gente, de manera más o menos pareja, algo que seguramente cambiará en el clímax de la campaña local, convertida en plebiscito simbólico”. (El Universal. Venezuela)
    El Gobierno venezolano ordenó el viernes la ocupación temporal de la fábrica de papel higiénico Manpa para asegurar el abastecimiento de un producto que se convirtió en un símbolo de la escasez de bienes esenciales en el país.
    El desabastecimiento de alimentos, medicinas y otros productos se ha agravado este año en medio de una galopante inflación. Las largas filas frente a los supermercados son comunes cuando surten productos escasos.
    “La decisión se tomó al observar la vulneración de este derecho en el acceso al rubro papel higiénico”, dijo la jefa de la reguladora Superintendencia Nacional de Costos y Precios (Sundecop), Karlín Granadillo, en un comunicado de prensa.
    Sundecop dijo que la medida se decidió para verificar el proceso de producción, distribución y comercialización del papel higiénico, pero no dio detalles sobre las normas que habría vulnerado la empresa.
    Manpa es una empresa local que fabrica papel higiénico, toallas sanitarias y pañales desechables.
    “El equipo responsable de la ocupación temporal podrá adoptar las medidas que sean necesarias para la ejecución de lo ordenado en este acto administrativo”, agregó Granadillo.
    “Incluso pueden asumir la dirección de las actividades de producción, distribución y comercialización desde la fecha de su notificación y por 15 días continuos”, sostuvo.
    El Gobierno de Nicolás Maduro culpa a las empresas privadas de la escasez, mientras industriales e importadores se quejan de las dificultades para acceder a los dólares que les permiten comprar materia prima y bienes finales en el exterior, en medio de un estricto control cambiario.
    ===========

    Carlos Malamud: Venezuela desabastecimiento

    Papel higiénico e industrialización por sustitución de importaciones (ISI)


    El papel higiénico es un artículo de lujo en Venezuela.
    El papel higiénico es un artículo de lujo en Venezuela.
    Infolatam
    Madrid, 22 septiembre 2013
    Por CARLOS MALAMUD
    En un país normal existen básicamente dos respuestas frente a la falta de productos de consumo final. La primera, que permite afrontar la escasez con resultados inmediatos, es abrir su importación con el fin de satisfacer el exceso de demanda que pueda haber en un momento determinado. La segunda, que durante largas décadas tuvo una fuerte presencia en la mayor parte de América Latina y hasta fue enarbolada como todo un programa de desarrollo, es producir en el país lo que hasta entonces se importaba.
    Esta solución conocida como industrialización por sustitución de importaciones (ISI) se concentraba en los años posteriores a la finalización de la Segunda Guerra Mundial en la producción de bienes de consumo final. Cuanta menos tecnología se incorpore, como ocurre con el papel higiénico, más fácil es producir determinados bienes.
    En Venezuela el papel higiénico escasea de forma manifiesta y pese a haberse convertido en un tema político de importancia ni se han abierto de par en par las fronteras para importarlo ni se han adoptado los estímulos necesarios para que emprendedores privados comiencen su producción. Si bien en mayo pasado el gobierno aprobó la importación de 50 millones de rollos para solventar la crisis , las serias dificultades que constriñen al comercio exterior impidieron una rápida normalización de su abastecimiento.
    En contra de la premisa inicial, Venezuela no es un país normal, al menos en este sentido. Debido a una serie de políticas económicas erróneas el mercado ha sido laminado y no existe ningún sistema racional de fijación de precios, más allá de los decretos gubernamentales. En aras de construir el llamado socialismo del siglo XXI en Venezuela se han cometido verdaderas tropelías económicas, comenzando por las frecuentes nacionalizaciones de sectores no estratégicos de la economía.
    La última medida del gobierno del presidente Nicolás Maduro para paliar los efectos de la falta de papel higiénico ha sido la ocupación militar de la fábrica de Manufactura de Papel (Manpa) en el centro del país. Teóricamente la maniobra tiene un carácter “temporal” y según la Superintendencia de Costos y Precios Justos su objetivo básico es “garantizar el abastecimiento normal de los rubros de primera necesidad para el pueblo”.
    Un tweet del vicepresidente Jorge Arreaza, uno de cuyos mayores méritos políticos es estar casado con una hija de Hugo Chávez, ha provocado mayor confusión. Según Arreaza la medida se tomó “para verificar el proceso de producción, comercialización y distribución de papel higiénico”. De acuerdo con el Diccionario de la Real Academia (vigésima edición, 1984) el verbo verificar tiene tres acepciones: 1) Probar que una cosa que se dudaba es verdadera; 2) Comprobar o examinar la verdad de una cosa y 3) Realizar, efectuar.
    Vayamos por partes. En el caso de aplicarse la primera acepción el gobierno trataría de comprobar que efectivamente en la planta de Manpa se produce papel higiénico y no otra cosa, y no se estaría burlando la confianza del consumidor. Con la segunda acepción presente uno podría pensar en una auditoría en toda regla del proceso de producción, distribución y comercialización (por este orden) del papel higiénico, desde que la pasta de celulosa llega a la fábrica hasta que el consumidor final tiene los rollos en sus manos.
    La tercera es la más problemática, aunque es la que más condice con la filosofía rectora del gobierno venezolano en los últimos 14 años: el intervencionismo estatal. En este caso, el más probable de los tres, el operativo militar tendría el propósito de ocupar la fábrica, bien para que la producción sea controlada por el gobierno o bien para aprender los arcanos secretos de la producción de papel higiénico. De este modo, una nueva “Misión” bolivariana impulsaría la construcción de diversas factorías de papel higiénico en los distintos estados venezolanos para garantizar un abastecimiento normal y fluido.
    La actual coyuntura no deja mucho margen para la sorpresa, dado el lamentable estado del sector manufacturero privado, por no hablar de las nacionalizaciones. A esto se agrega que Venezuela es el único importador neto de materias primas agrícolas en América Latina. En 2012 sus exportaciones agrícolas y de alimentos apenas sumaron u$a36,64 millones gracias al ron, cacao, frutas tropicales y camarones. Esta situación se complica aún más según reconoció el ministro de Agricultura Yván Gil, ya que el país importa el 50% de los alimentos que consume, una cantidad que fuentes privadas aumentan al 70 – 80% del total. El año pasado la factura por importación de alimentos ascendió a u$a8.120 millones, un 58% más que en 2011, según el INE (Instituto Nacional de Estadísticas).
    Siguiendo la misma receta aplicada durante muchos años por Hugo Chávez, el gobierno venezolano busca resolver problemas políticos (y económicos) con una metodología y tácticas militares. Por eso se define a lo que está pasando como una “guerra económica” desatada por la oposición para acabar con el gobierno legítimo. Pero la formación militar de Maduro, a diferencia de su mentor político, es muy deficiente. De seguir por este camino no sólo es bastante probable que pierdan la batalla contra el desabastecimiento sino también la guerra por mantener vivo el proyecto bolivariano e incluso la figura misma de Hugo Chávez.

    Austeridade: uma simples questão de bom senso, nao de capitalismo

    Você aí leitor: quando não tem mais dinheiro sobrando, continua gastando sem contar, pois tem alguma tia rica para quem mandar a conta?
    Pois é: contrariamente a Keynes, em Bretton Woods, os Estados Unidos se recusaram a ser a tia rica da Grã-Bretanha, no que fizeram muito bem, do contrário o capitalismo ocidental não teria conhecido as três décadas de prosperidade, dos anos 40 aos 70. O keynesianismo destruiu isso, razão da volta a políticas de austeridade, que os beócios chamam de neoliberalismo.
    E contrariamente aos que recomendam mais facilidades, hoje, a Alemanha se recusa a ser a tia rica de Grécia, Portugal e outros, no que ela faz muito bem: do contrário, eles continuariam a viver acima de seus meios, como aconteceu durante muito tempo com os americanos.
    O título da matéria, portanto, está errado, mas não o sentido, caro leitor, e não se trata de uma idéia perversa do capitalismo, e sim de simples bom-senso, aplicável a qualquer sistema econômico, em qualquer tempo e lugar, no setor público, ou privado, coletivamente ou individualmente.
    Quem pode viver acima dos seus meios? Ninguém, nem Deus...
    Paulo Roberto de Almeida

    Cenário

    Austeridade: a ideia poderosa que dá vida ao capitalismo

    Veja, 21/09/2013

    Às vésperas das eleições na Alemanha, modelo econômico defendido por Angela Merkel se mostra certeiro — apesar de doloroso; sua intensidade é colocada em xeque, mas não sua eficácia

    Silhueta da chanceler alemã Angela Merkel durante uma declaração na Chancelaria em Berlim, em 2007
    Angela Merkel: eleições devem consagrá-la pela terceira vez no comando do país (Hannibal Hanschke/AP/Pool)
    Quando um indivíduo cheio de dívidas e inadimplente se vê forçado a reduzir seus gastos e vender bens para saldar débitos e ‘limpar o nome’, pode-se dizer que ele se torna austero – que passa a mostrar rigor e disciplina. Convertida em doutrina econômica, a austeridade talvez não tenha muito charme, mas é uma ideia poderosa. A adoção dessa doutrina é o que tem garantido que nações como Grécia e Irlanda consigam reduzir seu endividamento público para retomar, no futuro, uma trajetória de crescimento sustentável. A Alemanha é encarnação da austeridade. E a chanceler Angela Merkel, que deverá ser reconduzida ao poder neste domingo, é sua maior defensora. A provável vitória de Merkel – com o aplauso de outros países europeus – evidencia a consciência europeia de que ‘cortar na carne’, por vezes, é um mal necessário.
    Apesar de se mostrar uma alternativa dolorosa, especialmente para os países guiados pelo modelo de bem-estar social, a austeridade se faz necessária para manter o mundo – onde as economias estão cada vez mais interligadas – em certo equilíbrio. Ela tem defensores e críticos eloquentes, sobretudo porque os países que implementaram os cortes para reduzir a dívida ainda não deram sinais de crescimento. O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brown, nos Estados Unidos, Mark Blyth, em seu livro Austerity – The History of a Dangerous Idea(Austeridade – A História de uma Ideia Perigosa), cita o economista britânico John Maynard Keynes para embasar suas restrições ao modelo. “Keynes estava certo ao dizer que a austeridade é, sim, necessária. Porém, em períodos de crescimento acelerado da economia, e não quando há crise”, diz Blyth.
    O surgimento - O professor de origem escocesa fez uma ampla pesquisa sobre as origens do modelo de austeridade e constatou que suas raízes estão fincadas na Grã-Bretanha do século XVII, nas mãos do filósofo John Locke, o pai do estado liberal. “Locke era um revolucionário econômico. Ele fundamentou no direito à propriedade privada toda a sua noção do que constitui uma regra legítima. Sem isso não haveria liberalismo econômico, separação entre mercado e estado e o capitalismo como o conhecemos hoje”, escreve o professor. Blyth explica que Locke foi o primeiro a atentar para o fato de que os gastos da realeza criavam uma dívida que era paga pelos impostos da população e que isso impedia os mercadores de prosperar, não importasse a ‘vontade de Deus’. “Ele era contra os ganhos do estado a todo custo e acreditava que era preciso diminuir a capacidade de o estado de extrair mais recursos da  população”, afirma o autor. A redução do papel do estado na economia é um dos principais pilares da doutrina que hoje é aplicada aos países europeus em crise.
    Além de Locke, dois escoceses  tiveram papel primordial no desenho do que viria a ser a austeridade. Primeiro, o filósofo e economista David Hume, a quem o endividamento público causava repulsa. Hume era contra a emissão de dívida não só porque, para ele, se tratava de um artifício arriscado, mas também porque era politicamente hipócrita, já que permitia que governos se endividassem para agradar aos eleitores, quando, na verdade, a real necessidade era de aumento de impostos. O segundo, contemporâneo de Hume, foi Adam Smith — que não apenas criticou o endividamento público, como também encontrou uma solução para ele. “Para Smith, o dinheiro fácil conseguido por meio da rentabilidade de títulos da dívida subvertia a parcimônia, que, para ele, era o motor do crescimento e do progresso. É por isso que ele defendia que a dívida pública fosse combatida e que a austeridade, na forma de parcimônia, fosse adotada”, escreve o autor.
    A prática - A doutrina só saiu do papel e foi, de fato, aplicada na década de 1930, durante a Grande Depressão que sucedeu a crise de 1929, nos Estados Unidos. Por uma década, a economia americana e se contraiu como resultado de intensos cortes de gastos e a taxa de desemprego chegou a 25%. Na segunda metade da década, o Congresso americano aprovou novos cortes, aumentou impostos e conseguiu eliminar um déficit de 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Como resultado, a economia recuou 11% entre 1937 e 1938. A retomada só aconteceu na década de 1940, período em que o keynesianismo ganhou força, tendo como oponente a escola austríaca, cujo principal nome foi Friedrich Hayek.
    A Alemanha também foi uma das primeiras a colocar em prática a política de austeridade para tentar conter a hiperinflação e uma década de política anticíclica estimulada pelo governo. O então líder do partido de centro, Heinrich Bruning, escolhido como chanceler em 1930, implementou uma série de reformas e cortes de gastos que pegaram de surpresa uma população acostumada com o expansionismo econômico desde o final da Primeira Guerra. Para Blyth, foi essa austeridade abrupta e desmedida que permitiu a chegada ao poder do Partido Social Democrata de Adolf Hitler. “Eles eram os únicos que não defendiam a austeridade e tinham alguma chance de ganhar”, escreve o autor.
    Após a Segunda Guerra, a Europa escondeu e enterrou qualquer vestígio de aperto fiscal. Parcimônia, como previa Adam Smith, foi um conceito esquecido até a chegada da crise financeira de 2008. Durante a segunda metade do século XX, países como França, Alemanha e Grã-Bretanha tiveram de ampliar o déficit fiscal para arcar com os benefícios previdenciários de uma população envelhecida. No caso da Grécia, houve outro tipo de agravante: maquiagem nas contas públicas e a entrada para a zona do euro, o que impedia o país de desvalorizar sua moeda para aumentar sua competitividade. Segundo o economista Otaviano Canuto, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Banco Mundial, diante do cenário pós-crise de 2008, depois que todos os erros já haviam sido cometidos, a única saída para os países – sobretudo os periféricos – era cortar gastos, estivesse Keynes de acordo ou não. “Quando o crédito bancário secou, toda uma estrutura de financiamento do consumo que estava pautada no ingresso de dinheiro deixou de existir. Diante disso, não havia outra saída a não ser passar pela austeridade. O que cabe discutir é se o processo de ajuste poderia ser menos doloroso”, afirma.
    A intensidade - As críticas sobre o quão intensos foram os cortes recaem, em especial, sobre a Alemanha de Merkel. Ela foi a responsável por orquestrar, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), as contrapartidas que os países resgatados seriam obrigados a cumprir para receber os aportes financeiros para sanar suas contas. Com o desemprego na Grécia atingindo 27%, e na Espanha 30%, além de uma previsão de contração de 0,6% para a zona do euro em 2013, muitos economistas que outrora levantavam a bandeira da austeridade acima de todas as outras, como o pesquisador de Harvard Kenneth Rogoff, começam a questionar não o modelo, mas sua intensidade. O ponto crucial é a crença de que a política de austeridade alemã foi implementada de maneira tão truculenta nos países periféricos para que a própria Alemanha receba deles o pagamento pelos títulos públicos que detêm. “A Alemanha precisa aceitar e desistir de receber pelos títulos. Ela nunca vai conseguir receber tudo. Se a situação fosse oposta e a Alemanha fosse o devedor, a filosofia em torno da austeridade seria outra”, afirma Rogoff.
    No início de 2013, Rogoff foi alvo de um bombardeio no mundo econômico (ao lado da também economista Carmen Reinhart) justamente devido ao tema da austeridade. Em janeiro de 2010, Rogoff e Reinhart produziram um estudo intitulado Crescimento em Tempos de Dívida, que afirmava que um endividamento público superior a 90% do Produto Interno Bruto (PIB) era nocivo para as economias. O texto foi amplamente utilizado pelos governantes europeus e pelo partido Republicano nos Estados Unidos para justificar políticas de aperto fiscal num ano em que o mundo ainda sofria os efeitos recessivos da crise. Mas um novo artigo publicado no início deste ano pelo economista Thomas Herndon apontava erros no estudo da dupla Rogoff e Reinhart. Assim, muitos defensores de políticas de estímulo aproveitaram o novo texto para desqualificar não só a teoria da austeridade, como também os renomados economistas. “Foi um ataque sem fundamentos e usado politicamente, cheio de omissão seletiva de informações, má interpretação e declarações falsas”, disse Rogoff ao site de VEJA.
    A questão envolvendo os economistas norte-americanos evidencia o entusiasmo que o tema evoca em tempos de economia cambaleante. Em Austerity, Mark Blyth escolhe claramente um lado da discussão: ao valer-se de argumentos técnicos e históricos, mostra, de maneira até mesmo passional, que a austeridade nem sempre é o melhor caminho em momentos de crise. Contudo, recai no clichê ao afirmar que a escolha pela austeridade sempre está nas mãos de governantes que dificilmente terão suas vidas modificadas pela piora dos serviços públicos decorrente de um aperto fiscal. Assim, Blyth reduz a discussão à retórica da luta de classes. Como alternativa, sugere que a austeridade seja substituída pelo aumento de impostos. Mas não explica como, sem cortes de gastos, é possível impedir que um país minúsculo como a Grécia dê o calote em sua dívida e arraste consigo um continente inteiro, numa espiral de pânico e derretimento da economia mundial.

    Alemanha, Europa: os criticos da austeridade estao errados

    A crítica, feita pelo ministro das Finanças da Alemanha, se aplica tanto a keynesianos respeitáveis, como o Prêmio Nobel Paul Krugman, quanto a keynesianos de botequim, como os que existem no Brasil, aliás no mais alto nível.
    Paulo Roberto de Almeida

    'Não havia como crescer sem austeridade'
    Braço direito de Merkel, ministro de Finanças alemão defende posição de Berlim no combate àcrise
    JAMIL CHADE, CORRESPONDENTE / GENEBRA
     O Estado de S.Paulo, 22 de setembro de 2013 | 2h 22

    Braço direito de Merkel, ministro de Finanças alemão defende posição de Berlim no combate à crise
    A realidade provou que a Alemanha estava certa em sua estratégia e a Europa dá sinais de crescimento graças às políticas de austeridade. Quem garante isso é o ministro de Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, que, depois de cinco anos de crise, deixa claro que não havia como promover um crescimento no Velho Continente sem que os países colocassem a casa em ordem. "O endividamento do Estado envenena o crescimento."
    Em entrevista exclusiva ao Estado, às vésperas das eleições na Alemanha que ocorrem hoje e que podem definir o futuro da Europa, o braço direito da chanceler Angela Merkel insiste em defender a posição do governo de Berlim. Mas hoje, depois de ver mais de uma dezenas de governos cair por conta da crise, é a vez de Merkel testar nas urnas se de fato sua estratégia de resgate da Europa funcionou diante do próprio eleitorado.
    Odiado na Grécia, Espanha e Portugal, Schaeuble se transformou em peça central no debate sobre a crise europeia. Citado como o "dono da chave do cofre", ele passou os últimos anos em um dos cargos mais explosivos e de maior responsabilidade na economia mundial. Desde os primeiros momentos da crise, foi taxativo: não emprestaria dinheirosem uma contrapartida dos governos falidos. Se Schaeuble hoje comemora, seus inimigos o acusam de ter levado sociedades inteiras ao colapso.
    Ele não dá sinais de arrependimento. "Uma política fiscal prudente é precondição para um crescimento sustentável, e não o oposto." Schaeuble é um dos pesos-pesados da política alemã e, para seus aliados, definiu o rumo da nova Europa que terá de renascer após a pior crise em 70 anos.
    Mas a política não é novidade para Schaeuble. O ministro é o mais antigo membro do Parlamento ainda em serviço, tendo sido eleito pela primeira vez ainda nos anos 70. Foi chefe de gabinete do chanceler Helmut Kohl e responsável por negociar a reunificação da Alemanha. Nem mesmo uma tentativa de assassinato o afastou da política, ainda que tenha de ter continuado em uma cadeira de rodas. Hoje, sua visão dentro do governo de Merkel conta tanto quanto a da chanceler.
    Em 2013, marca-se a Temporada da Alemanha no Brasil, com a meta de fortalecer os laços econômicos, mas também como enfrentar de uma forma comum os desafios do futuro em áreas como ciência, tecnologia e inovação, educação e sustentabilidade.
    A seguir, os principais trechos da entrevista.
    Recentemente, o FMI publicou uma estimativa de que o crescimento econômico da Alemanha poderia ser mais baixo do que se esperava.
    A forte recuperação na zona do euro, que não me surpreendeu, mas sim a muitos economistas, mostrou que previsões e realidade são duas coisas diferentes. Apesar do ambiente econômico internacional difícil, a economia da Alemanha continua a se desenvolver muito bem. Nosso PIB cresceu 0,7% no segundo trimestre de 2013. Todos os indicadores econômicos mostram que a economia da Alemanha deve provavelmente continuar sua recuperação no resto do ano. Indicadores que apontam para o futuro são muito encorajadores e a Alemanha está, estruturalmente, numa forma muito boa. Há um ponto mais amplo nesses dados: economias maduras, como a alemã e a de outros países da União Europeia, têm como objetivo que suas políticas econômicas gerem um crescimento duradouro e sustentável. Mas eles não podem esperar taxas de crescimento de economias emergentes.
    O Banco Central Europeu tem dado uma atenção especial às pequenas empresas na Europa. A esperança é de que políticas para fortalecer esse setor reduzam o desemprego entre os jovens?
    Pequenas e médias empresas são a coluna vertebral de nossa economia e nosso principal motor de crescimento. Existem razões históricas para fortalecer pequenas e médias empresas na Alemanha, e nem todas podem ser repetidas fora do país. Mas está claro que elas podem ter um papel importante em outros países também como vetores de crescimento e criadoras de empregos, principalmente entre os jovens. Apoiar a pequenas e médias empresas é um caminho importante para incentivar o crescimento e a criação de empregos. Entre os fatores mais importantes está o treinamento e educação, investimento em pesquisa e desenvolvimento, um sistema financeiro estável, uma administração eficiente, um regime de direito e uma infraestrutura que funcione. Muitos países na zona do euro implementaram reformas estruturais corajosas nos últimos anos, o que deve incentivar a criação de empresas. A restruturação e fortalecimento do setor bancário que está ocorrendo na região, incluindo nosso projeto de união bancária, deve melhorar o ambiente de empréstimos para pequenos negócios e permitir que tenham acesso a um financiamento, seja onde estiverem na Europa.
    Um número cada vez maior de economistas, jornalistas e instituições internacionais, como o FMI, está questionando a ideia de que uma austeridade rigorosa é a única forma efetiva para voltar ao crescimento econômico.
    Austeridade estrita nunca foi a política da Europa ou da Alemanha. Essa é uma percepção errônea das reformas que estão ocorrendo. A crise de confiança na zona do euro vem principalmente de duas fontes: perda de competitividade em muitos países-membros e dívidas do Estado que não eram mais sustentáveis. A Europa lidou com ambas. Os déficits foram reduzidos, as reformas estruturais foram iniciadas e a confiança foi reconquistada. Uma política fiscal prudente é uma pré-condição para um crescimento sustentável, e não o oposto. Finanças públicas sólidas criam confiança nos investidores e consumidores. Isso os permite fazer planos de longo prazo. Elas são os caminhos para evitar ou reduzirendividamento excessivo, que envenena o crescimento. De outro lado, crescimento induzido por déficits públicos são apenas fogo de palha.
    Se você retira o déficit, esse tipo de crescimento para e o que resta é apenas a dívida. Atualmente, em todos os informes recentes sobre a situação da economia alemã, o FMI deixou claro que estamos cumprindo nossas obrigações em termos da ajuda à economia mundial na correção de seus desequilíbrios. A OCDE e a Comissão Europeia tem sido também positivas em seus informes. Nossas políticas são bem equilibradas. Finalmente, o que testemunhamos hoje na zona do euro é uma recuperação impressionante, graças aos esforços para controlas gastos e reformas de estruturas econômicas. Nos EUA, onde os gastos públicos caíram de forma dramática este ano, voltou a crescer. O mesmo ocorre com o Reino Unido, onde o governo colocou ênfase em finanças públicas sólidas. A realidade mostrou que nossa estratégia funcionou.
    Hoje, a Alemanha é o quarto maior parceiro comercial do Brasil, o que tem levado economistas a discutir a possibilidade de modificar os tratados de impostos entre os dois países.
    Não existe um acordo de dupla taxação entre Brasil e Alemanha. Os especialistas de ambos os países se reuniram em julho para discutir uma cooperação em termos fiscais e explorar a possibilidade de começar negociações sobre tal acordo. Como resultado de discussões intensas, eles chegaram à conclusão de que não deveríamos começar com essa negociação por enquanto, mas deveríamos, no lugar, focar em redigir um acordo de troca de informações fiscais.
    Qual sua avaliação sobre a política monetária do Brasil. Os dois países seguiram o mesmo caminho?
    Os BCs dos dois países são instituições independentes. De acordo com seus mandatos respectivos, a política monetária deve ser conduzida para levar à estabilidade de preços domésticos, enquanto continua apoiando uma recuperação. Os dois BCs são conscientes de suas responsabilidades e certamente não me cabe comentar.
    Dilma Rousseff acusa a Europa de inundar os mercados com dinheiro barato e criar uma guerra cambial.
    Não me cabe comentar o que a presidente Dilma tenha ou não dito. Do meu lado, o que eu diria é que não vejo sinais de uma guerra de moedas no momento. Pelo contrário, as políticas monetárias tem apoiado a recuperação da economia global nos últimos anos, incluindo com medidas não convencionais. Claro que os efeitos dessas medidas, inclusive em outros países, deve ser cuidadosamente monitorados. Os presidentes de BCs e ministros de Finanças do G-20 prometeram em sua última reunião em Moscou a manter uma vigilância sobre os riscos e sobre os efeitos colaterais de períodos extensos de políticas monetárias mais frouxas. Mudanças futuras de políticas monetárias continuarão a ser cuidadosamente calibrados e claramente comunicadas. O G-20 também deixou claro que volatilidade em excesso nos fluxos financeiros e movimentos desordenados nas taxas de câmbio podem ter implicações adversaspara a estabilidade financeira e econômica. Políticas macro-econômicas sólidas podem ajudar a lidar com essa potencial volatilidade.
    É o membro mais antigo do Parlamento ainda em serviço, tendo sido eleito pela primeira vez ainda nos anos 70. Foi chefe de gabinete do chanceler Helmut Kohl e responsável por negociar a reunificação da Alemanha. Nem mesmo uma tentativa de assassinato o afastou da política, ainda que tenha de ter continuado em uma cadeira de rodas.


    Postagem em destaque

    Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

    Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...