domingo, 29 de junho de 2014

O fascismo a que chegamos: o cidadao so existe para sustentar o Estado - Ives Gandra Martins



Por  e 
Consulto Jurídico, 20 de junho de 2014

Ao concluir a primeira grande radiografia da advocacia de Estado no Brasil, os editores deste site e da publicação não tiveram dúvida em cravar uma chamada ousada para a obra: “O Novo Quarto Poder”, é a manchete de capa do Anuário da Advocacia Pública do Brasil.
A pujança e a eficiência do braço jurídico da União, dos Estados e municípios, entretanto, é vista com reservas por um dos advogados que, em 57 anos de atuação, mais projeção alcançou na história do Brasil: Ives Gandra Martins. Para ele, o poder público não tem obrigações, só direitos. Situação inversa à dos cidadãos. O tributarista elogia a atuação dos advogados públicos que, segundo ele, fazem um bom trabalho, mas têm um cliente que está acostumado a desrespeitar os direitos do cidadão.
Ícone da defesa da livre iniciativa, defensor ferrenho do capitalismo e adversário feroz do esquerdismo em qualquer tonalidade, Ives Gandra surpreendeu a opinião pública ao criticar publicamente e com eloquência o ‘justiçamento’ dos acusados nomensalão — segundo ele, um conjunto de deliberações movidas e turbinadas pelo clamor público, sem nexo com a doutrina e a jurisprudência. Mas essa tangência eventual com o PT não passa de um ponto fora da curva no universo das ideias desse jurisconsulto. 
Convidado a opinar sobre a assimetria nas relações entre o Estado e o cidadão, Ives castiga sem clemência a forma como o governo central exercita o poder. O advogado afirma que o país é tributado para pagar salários do funcionalismo e não para a manutenção do serviço público. O Judiciário, em grande parte, diz ele, se associa na empreitada de buscar receitas que mantenham a máquina burocrática.
Leia a entrevista: 
ConJur — Como o senhor analisa o atual nível das relações entre o Estado e o particular no Brasil? 
Ives Gandra da Silva Martins — Nos Estados Unidos, o presidente Obama — segundo o Torquato Jardim, ex-ministro do TSE — tem 200 cargos em comissão. Outros dizem que um pouco mais. Todos os demais funcionários públicos federais são concursados. No Brasil, com um PIB sete vezes menor, a Presidente Dilma tem 22 mil comissionados. E também um alto índice de corrupção, concussão e peculato que se concentra basicamente entre os cargos em comissão, também chamados de “cargos de confiança”. Muitos dos que aparelham o Estado têm necessidade de viver das benesses que os cargos dão. Isso explica a carga enorme de desvios que a imprensa noticia diariamente. Um exemplo: todos os programas sociais do governo federal consomem R$ 60 bilhões da receita tributária federal, que está em torno de 1trilhão de reais. É o eleitor mais barato. Custa, pois, 6% da arrecadação federal — sendo que a arrecadação global, considerando estados e municípios, está se aproximando dos 2 trilhões de reais. Isso significa que grande parte dos nossos recursos vai para os detentores do poder. Haja vista o déficit da Previdência, sobrecarregado pelos múltiplos benefícios oferecidos ao funcionalismo. 24 milhões de aposentados do povo geram déficit inferior a R$ 50 bilhões, enquanto os do serviço público (em torno de um milhão de beneficiários) superam essa quantia. Os próprios investimentos públicos ficam abaixo dos R$ 100 bilhões. Todo o resto é sugado pela máquina. O governo francês reduziu o número de ministérios para 16. No Brasil são 39. Alguns ministros ficam sem despachar com a presidente da República por meses. Em outras palavras: os cidadãos trabalham para sustentar a burocracia, os detentores do poder, e não o Estado prestador de serviços mínimo. Decididamente, a burocracia brasileira não cabe dentro do PIB. 

ConJur — Os direitos e obrigações do cidadão e do Estado são observados simetricamente no Brasil?
Ives Gandra — Num país em que se trabalha para sustentar os detentores do poder (carga tributária de 37% no Brasil, contra 31% no Japão e Estados Unidos; 25% na China e na Rússia) é evidente que os direitos dos cidadãos estão sendo pisoteados de forma fantasmagórica por parte do poder público, que é profundamente desleal em relação aos cidadãos. Temos a atuação judicial nas cobranças pretendidas e duvidosos créditos por penhoras on line; recusa de certidões negativas que impedem empresas de entrar em licitações; e privilégios de procuradores da Fazenda Nacional garantidos com honorários de sucumbência de 20% e que conseguem no Judiciário, quando o Poder Público perde, que os honorários sejam de apenas 1% — o que implode o principal princípio de uma democracia, que é o da igualdade. Para o poder público, vale o final do famoso livro de George Orwell, a Revolução dos Bichos, ou seja, todos são iguais perante a lei. Mas alguns são mais iguais que outros.

ConJur — Quais são os principais problemas que o senhor identifica?
Ives Gandra — Para sustentar o gigantismo da máquina burocrática, o governo não hesita em criar regras inescrupulosas para garantir receitas. O que lembra outro pensamento, este do jusfilósofo alemão Konrad Hesse: “A necessidade não conhece princípios”. E, no Brasil, não conhece porque o devedor do Estado é cobrado por todas as formas de coação. Nem sua dignidade é poupada, enquanto o Estado brasileiro é um notório caloteiro. Basta lembrar os precatórios e qualquer execução que tenha por vítima o contribuinte, em que todas as formas de expedientes são usadas por seus adversários. Nos meus 57 anos de exercício profissional, o Brasil se transformou numa república fiscal incomensuravelmente pior do que tínhamos nos tempos da ditadura, quando o contribuinte tinha muito mais direitos, nessa área, que hoje. Os magistrados eram mais independentes. A tal ponto que, quando decidem a favor do contribuinte, receia-se que sejam levantadas suspeitas sobre sua índole e autonomia. Maledicências oficiais que objetivam inibir as decisões contra o Erário. Se o Brasil não destruir a adiposidade malsã da máquina burocrática, ela matará o país, com esses fatores concorrentes que testemunhamos, como a alta da inflação, a queda do PIB, a balança comercial negativa, o balanço de pagamentos estourando, a elevação do risco Brasil e todos os indicadores que deram fundamento ao Plano Real, como o superávit primário, as metas de inflação e o câmbio flexível, que estão sendo projetados para o espaço. 

Conjur — Diante desse cenário de abusos, haveria como se reexaminar o poder coercitivo do estado contra o cidadão, em matéria cível?
Ives Gandra — Eu tenho a impressão de que a única solução é o voto. Eleger governantes com outra mentalidade. E nós temos, no Brasil, uma tendência de entender que o estado pode tudo e deve fazer tudo. Os políticos entram com essa mentalidade. E o que nós temos visto é um crescimento monumental da máquina administrativa. Então, eu acho que a única revolução que podemos fazer é através do voto e do esclarecimento à população de que nós, escravos da gleba, estamos vivendo em pleno século XXI o que os escravos da gleba viviam na época medieval. Os nossos senhores feudais são os governantes, e nós somos apenas campo de manobra para eles fazerem com os nossos bens o que quiserem. E estamos em um caminho que é mais triste, de apoio permanente aos regimes bolivarianos, onde o cidadão vai perdendo completamente o seu direito de ser. Vê-se, em relação à Venezuela de hoje, à Bolívia, ao Equador, um apoio monumental da atual estrutura governamental, dos atuais detentores do poder. Dizem que o Paraguai é uma ditadura, porque dentro da Constituição só restou um presidente, que depois concorreu ao Senado sem nenhum problema, sem nenhum trauma. Em compensação, a presidente Dilma se deixa fotografar ao lado de Fidel Castro como se estivesse ao lado de um deus. Assassino notório, que matou 17 mil pessoas em paredão, sem julgamento. Uma inversão absoluta. Testemunhamos, gradativamente, uma redução dos direitos de cidadania. Isto, a meu ver, é o grande drama que vamos ter de enfrentar através do voto. É preciso esclarecer o povo, porque as migalhas dos programas sociais têm eleito os governos. E esses programas sociais, na verdade, mantêm, com algumas migalhas, um contingente de votos que permite a perpetuação no poder de pessoas que pensam mais na detenção do poder do que fazer do país um país moderno, competitivo, com condições de concorrência com outros BRICs e, evidentemente, com condições de concorrência com países desenvolvidos. Eu acho muito difícil essa mudança senão através do voto.

Conjur — Este governo tem defeitos próprios, como qualquer outro. Mas a hipertrofia do Estado e a assimetria na relação entre o particular e o Estado, é característica comum de todos os governos desde o tempo do Império, não é? 
Ives Gandra — É como um câncer, que existe desde o Império, mas hoje estamos com metástase em todo o organismo social. Se compararmos a hipertrofia no atual governo, com situações similares no passado, vemos que os próprios militares poderiam ser considerados monges trapistas nesse departamento. Há cerca de 20 anos, a carga tributária era de 22%, 23%. É a carga que sustenta a administração pública. Estamos falando da carga tributária que existia em 1992, 1993, na gestão de Itamar Franco. Hoje estamos com uma carga de 37%. Os serviços públicos continuam, se comparado com de outros países, muito ruins. O que ainda funcionou foram os privatizados, rodovias etc.

Conjur — Voltando para o cenário da máquina judiciária. Há casos que chamam a atenção. Houve uma desapropriação de fazendeiros, na área onde foi construída Itaipu, para reforma agrária. Os donos das terras não foram indenizados. Posteriormente, os colonos da reforma agrária, que nem chegaram a plantar, foram desapropriados para criação da represa. Esses colonos foram indenizados. Como se passaram 30 ou 40 anos, o valor do crédito dos fazendeiros ficou enorme. O tamanho da cifra é motivo para não pagar?
Ives Gandra — A máquina só funciona contra o cidadão, porque temos um estado aético e caloteiro. É preciso entender isso para compreender a realidade brasileira. Os precatórios: quantas vezes eles mudaram a Constituição para continuar caloteiros? E quando cresce a dívida, fica mais evidente a vocação caloteira do nosso poder público, a vocação aética. Eles dizem: “Não, agora temos de cuidar do interesse público.” Para mim, interesse público não existe. Existe interesse dos detentores do poder. Interesse público é interesse da sociedade. Quem diz: o interesse individual não pode prevalecer sobre o interesse público, está mentindo. O interesse individual é o interesse da sociedade a quem o poder público deveria servir. Mas, na verdade, o poder público, quando fala em interesse público, ele quer dizer: “Pelo meu interesse de detentor do poder, de gastador da máquina burocrática, os valores muito grande nós não devemos pagar. E é o que está acontecendo com os precatórios. O próprio Supremo que decidiu a favor do cidadão com os precatórios teve que colocar “n” condições, e eles não conseguem executar de qualquer forma.

Conjur — E qual é a responsabilidade do Judiciário nesse contexto?
Ives Gandra — Eu ouvi de muitos agentes ligados aos defensores do poder público, quando se trata de questões de valor: “De onde é que saem seus recursos, senhores magistrados? Saem da nossa receita.” Há uma manifestação, na imprensa, de uma queridíssima amiga, por quem tenho uma profunda admiração, a ministra Ellen Grace, de que os ministros do STF mereciam aumento, porque tinham garantido uma receita da União como não havia antes. Declaração criticada pela OAB. Ora, a função do Supremo não é garantir receita, é fazer justiça. Então, na prática, esta mentalidade hoje é uma mentalidade não só do Executivo ou do Legislativo, que é um notório desperdiçador de recursos. Há procuradores da Fazenda Nacional que dizem: “Como é que se pode dar aumento de vencimento se as decisões forem contra o Fisco?” E quando procuradores da Fazenda Nacional são assessores de ministros nos tribunais. Quer dizer, eles são procuradores, vão para o tribunal e depois voltam a ser procuradores. Como aconteceu no caso de uma procuradora que era advogada da procuradoria, foi para a assessoria e decidiu no próprio caso em que ela era advogada.

Conjur — Que notícia sairia...
Ives Gandra — E a Ordem [dos Advogados do Brasil] levou o caso para o CNJ e o CNJ decidiu, por 11 a 4, que não havia problema nenhum. Hoje se fala em matéria tributária federal e em judiciário independente, quando sabemos que pelo alto número de questões em exame, são os assessores, não concursados, que decidem. Eu fui de banca examinadora de três concursos de magistratura, sendo dois de Magistratura Federal e um de Magistratura Estadual. Examinei o quê? 7 mil ou 8 mil candidatos, para aprovar menos de cem. Exames muito mais difíceis do que qualquer doutoramento, eu tinha pena dos candidatos. Para decidir em primeira instância. Pois nos Tribunais Superiores são não concursados que, na maior parte das vezes, decidem em nome dos Ministros, porque eles não têm mesmo condições de atender a todos os processos. E quando esses assessores são parte — e todo procurador da Fazenda Nacional, não licenciado, é parte, não é magistrado — é evidente que alguma coisa está desequilibrada em nosso sistema.

Conjur — Como é que o senhor vê o uso da rescisória? No caso da Usina de Itaparica, o governo rompeu o compromisso do financiamento da obra. O construtor financiou com seus próprios recursos, o caso foi julgado, o direito à reparação foi estabelecido e transitou em julgado. Na fase da execução, reverteu-se a coisa julgada...
Ives Gandra — Mas não é só esse caso. Eu tenho visto a Procuradoria da Fazenda Nacional constantemente entrar com rescisórias depois do trânsito em julgado, porque, na pior das hipóteses, atrasa incomensuravelmente o pagamento. O que vale dizer que esse é um instrumento que tem sido utilizado para não pagar. Porque, como eu disse, o estado brasileiro é naturalmente caloteiro. É duro dizer isso. Costumo dizer que democracia eu terei no dia em que eu chegar para a presidente da República e chamar: “Vossa senhoria, que está a meu serviço.” E ela me disser: “Vossa excelência, a quem eu sirvo.” Porque eu sou cidadão a quem ela serve, e ela está a meu serviço. Mas no Brasil, quando o cidadão vira autoridade, a partir deste momento ela se torna VIP (Very Important People)... Basta dizer, você tem dois tipos de tratamento em qualquer lugar, aeroportos etc, todas as autoridades são VIPs. E nós somos NIPs (No Important People), precisamos ficar em qualquer lugar, apertados, sem condições. Porque o povo está a serviço do governo, que sendo aético diz: “Nós temos o direito de ser caloteiros. Nós temos o direito de ser aéticos. O interesse público é o nosso interesse. Se houver possibilidade, nós fazemos serviços públicos.” Mas não é da essência do exercício do poder o serviço público. Eu tenho um livrinho, “Uma Breve Teoria do Poder.” Você lê lá: o poder é necessariamente aético e quem busca o poder sabe que vai ser aético, vai se identificar com o poder — e no Brasil isso é monumental —, e aí tem todos os direitos. O povo é campo de manobra. E quanto mais, por exemplo, um cidadão tem direito, mas seu crédito é grande, menos chance ele tem de receber. Rescisórias são uma das formas mais fáceis de ir atrasando, porque nunca se aplica ou raramente se aplica ao poder público as penas de litigante de má-fé. Basta entrar com uma rescisória, qualquer juiz suspende imediatamente até que a rescisória seja decidida. Se eu tenho um crédito a receber, suspenso, eu sei que vou levar 10, 12 ou 15 anos para receber aquele crédito, mesmo que eu venha a ganhar.

Conjur — Com a globalização do Direito, surgiram foros internacionais, tribunais aos quais se pode recorrer na área de direitos humanos. Haveria, no campo cível e empresarial, digamos, no direito econômico, como recorrer a algum foro? 
Ives Gandra — Eu acho que não. Até porque, mesmo nos casos de direitos humanos, você não vê nenhuma decisão internacional ser aplicada no Brasil, nunca foi. E por uma razão muito simples: o artigo 5º, inciso 35, da Constituição, declara que toda lesão pode ser levada ao poder judiciário. O cidadão pode recorrer da decisão internacional e dizer: “Não. Eu tenho o direito de recorrer aqui, porque o crime foi praticado aqui. Por exemplo, a lei da anistia, com aquela ideia de se recorrer à Costa Rica. O que disseram os membros do Supremo: “Pode recorrer ao Tribunal de São José. Mas isso não vai ter valor nunca, porque nós não vamos cumprir.” No caso do Cesare Battisti, o STF disse o seguinte: “Temos que devolver, porque o crime foi praticado lá, o cidadão era de lá, etc.” Se não fosse o Lula, e o Supremo ter fragilizado a sua jurisprudência, ele teria sido imediatamente expatriado e mandado de volta para a Itália.

Nosso fascismo ordinario: o Estado proibe o cidadao de ser livre

As novas formas de transporte "solidário" (ou seja, de fato com pagamento partilhado) ou baseados em esquemas tipo Uber, são importantes, pois podem justamente desafogar as cidades de milhares de carros individuais.
As autoridades, seja porque estão a serviço de concessionários oligopolistas e geralmente corruptos, seja porque são justamente de mentalidade fascista, querem proibi-las, regulamentar e taxar. 
Paulo Roberto de Almeida 

"Carona paga" é ilegal, diz agência reguladora sobre app Uber

Segundo ANTT, oferta de transporte em troca de pagamento sem autorização pública desrespeita resolução

Renata Honorato
Veja.com, 28/06/2014
Rafiq Maqbool
Aplicativo Uber instalado em um smartphone (Rafiq Maqbool)
O Uber, aplicativo americano de "carona" mais popular do mundo, anunciou sua chegada ao Brasil em maio, pouco antes de ser avaliado em 18,2 bilhões de dólares. A startup já oferece corridas no Rio e em São Paulo, a taxas que variam de 15 a 12 reais, abrindo uma guerra com taxistas — que se dizem prejudicados. Agora, o governo entrou na discussão, afirmando que o modelo é ilegal. Questionada pela reportagem de VEJA.com, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) diz que a resolução 4.287 "considera serviço clandestino o transporte remunerado de usuários, realizado por pessoa física ou jurídica, sem autorização ou permissão do poder público competente". 
Segundo Beto Aquino Agra, coordenador do Laboratório de Inovação Digital da ANTT, a cobrança pelo serviço, como feita pelo Uber, caracteriza a modalidade de transporte público: se realizado sem a devida autorização do poder público, é ilegal. Uber e similares, como o Zaznu, que sugerem uma taxa de pagamento em troca do transporte, portanto, não obedecem à resolução.
O Uber respondeu. "Oferecemos um serviço mais sofisticado, com carros executivos, diferente do que é oferecido por táxis. Não somos um concorrente direto dos taxistas e nem de qualquer outro transporte público", diz Solamon Cruz Estin, responsável pela expansão internacional da companhia. "Estamos dispostos a colaborar com a comunidade e com o governo para criar um ambiente de harmonia para todo o ecossistema de transporte urbano."
Para coibir a "carona paga", a ANTT promete realizar inspeções, embora reconheça que não será fácil identificar os motoristas que burlam a lei. "Vamos intensificar as nossas fiscalizações, porque em muitos casos os piratas dizem se tratar de carona solidária, uma prática não considerada irregular pela resolução 4.287 ou pelo artigo 736 do Código Civil, que diz: 'Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia'", diz Agra. Quem for pego, contudo, será multado e poderá ter o seu carro retido por 72 horas. O valor da multa pode chegar a 5.000 reais. 
A rede Uber é composta por usuários — qualquer pessoa que baixar o app em seu smartphone — e motoristas profissionais. "Avaliamos experiências anteriores na profissão, porque nos preocupamos com o bem-estar dos nossos clientes. Para ser um motorista Uber, é preciso ter um carro executivo — modelos Chevrolet Zafira, Toyota Corolla ou Hyundai Azera —, possuir habilitação e seguro de automóvel para uso comercial", afirma Estin. Os colaboradores do Uber não têm contrato de exclusividade com a companhia e 80% do valor pago nas corridas são repassados como remuneração ao motorista. 

Franca: irreformavel, como sempre - Marcos Troyjo

A França e sua 'malaise'
Marcos Troyjo
Folha de S. Paulo, Sexta, 27 de junho de 2014

Basta passar alguns dias na França –e dialogar com algumas mentes brilhantes que esse país ainda produz– para perceber que nações, como indivíduos, também experimentam crises existenciais. 
À sombra dos monumentos que tanto amamos, a sociedade francesa é assolada pelo título de uma das maiores obras de Gauguin: "De onde viemos? O que somos? Aonde vamos?"
Os franceses ressentem-se da dívida pública e desemprego que só aumentam. Dividem-se quanto à imigração do Magreb ou da Europa do Leste. Muitos não se reconhecem mais no país em que nasceram.
Jovens doutores não encontram emprego na iniciativa privada. Recorrem à mal remunerada colocação no desestimulante serviço público –totalmente ossificado pelos sindicatos.
Ademais de seus problemas internos, a França peleja com sua posição na União Europeia (UE). Desempenha, no mais das vezes, função de "sócio-junior" em dinâmica cujo epicentro está em Berlim.
Para fugir de papel cada vez mais coadjuvante, a França busca liderar o debate sobre o que seria uma "UE 2.0". Na reunião de cúpula que começa nesta sexta (27) na Bélgica, François Hollande proporá nova estrutura de governança na UE com poderes acrescidos aos países-membros da zona do euro.
A ideia de Hollande, que também vai ao encontro das articulações do primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, permitiria a implementação de uma política social e industrial com base no conceito de empresas "campeãs europeias" –à semelhança da estratégia de nosso BNDES e seu (agora abandonado) favoritismo às campeãs nacionais.
Tal medida suscita problemas. Ela diminuiria a influência na comunidade de membros como o Reino Unido, que optaram por não integrar a zona do euro. Esse "novo desenvolvimentismo" europeu feriria potencialmente regras da OMC.
Criaria, de certo, novos obstáculos ao mega-acordo UE-EUA. Retardaria a já esgarçada agenda negociadora UE-Mercosul, cujo conclusão, mesmo sem as novas ideias de Hollande, não se cogita para 2014.
Resta ainda observar como a Alemanha, maior economia da região, reagirá à institucionalização de subsídios industriais para fortalecer conglomerados europeus. As competitivas empresas alemãs dispensam tal fortificante. Sua produtividade beneficiou-se nas últimas décadas da existência de moeda comum para o comércio intraeuropeu.
Berlim não deseja, ademais, estranhar-se com países que não aderiram à zona do euro. Quer ainda que os acordos com EUA e Mercosul saiam do papel.
Como parece correta a noção de que hoje nada se faz em Bruxelas sem a liderança alemã, resta saber como Hollande lidaria com mais uma iniciativa frustrada.
Aliás, a frustração com Hollande, detentor de abissais 18% de aprovação popular, muito contribui à atual 'malaise' francesa. 
Ouvi de um editor do "Figaro", o jornalão francês, que todo presidente de seu país, de De Gaulle a Sarkozy, sempre dispôs de inteligência abundante ou charme gálico. E que Hollande, mais impopular presidente da história da França, carece de ambos.
mt2792@columbia.edu
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcostroyjo/2014/06/1477127-a-franca-e-sua-malaise.shtml

A incivilidade brasileira - Cristovam Buarque

Cristovam Buarque
O Globo, 28/06/2014

A obscenidade contra a presidente da República na abertura da Copa, na frente de dois bilhões de pessoas no Mundo, devia merecer uma reflexão sobre suas causas. Mas, em vez de refletirem, os opositores comemoram o constrangimento criado, e o governo tira proveito, denunciando a grosseria.
A obscenidade foi contra todos os políticos, inclusive a presidente e seu partido, por serem iguais aos outros, depois de terem prometido ser diferentes. Foi contra a promiscuidade política e a desfaçatez dos partidos; foi um protesto contra o que ocorre na Petrobras, no metrô de São Paulo e outras corrupções; também contra a defesa dos novos corruptos alegando que os antigos também roubavam; foi manifestação de descrença na democracia da compra e venda de parlamentares, da troca de favores, do deboche de alianças inusitadas do poder pelo poder para propiciar negócios ilícitos; foi contra a violência nas ruas.
Não foi uma manifestação ideológica, porque ali estavam os beneficiados pela construção do estádio com recursos desviados de outras prioridades, como o saneamento necessário a poucos metros dali. Tampouco foi um protesto por perda de privilégios, porque os avanços sociais dos últimos governos foram feitos sem qualquer reforma estrutural, sem tocar nos beneficiados históricos do progresso brasileiro.
Nem foi um grito novo. Por 350 anos a sociedade brasileira gritou a mesma obscenidade contra milhões de negros vindos da África ou aqui nascidos para servirem como escravos; há décadas os gritos são feitos contra os pobres excluídos dos benefícios do progresso, os que usam transporte público, os que sofrem em filas nos hospitais, as crianças sem escola.
A incivilidade brasileira não é fenômeno apenas de uma tarde no estádio, é uma característica atávica da sociedade brasileira. Os gritos daquela tarde são ecos de nossa história, ouvidos há séculos no dia a dia da sociedade degradada que caracteriza nossa estrutura social, nosso padrão de distribuição de renda; nossas ruas violentas e maltratadas; nossos serviços públicos ineficientes; a corrupção no comportamento dos políticos e nas prioridades das políticas; o desprezo pela educação das crianças.
É injustificável aquela vergonhosa agressão à presidente e ao país, mas é injustificável que a presidente não reflita sobre o fato grosseiro e incivilizado, suas causas históricas e conjunturais; é triste que ela não busque explicações, não perceba sua responsabilidade, como de todos que fazemos política e lideramos o Brasil. Como é injustificável não darmos os passos necessários para orientar nosso progresso na direção de uma sociedade civilizada, sem gritos obscenos contra presidentes, políticos, escravos, pobres, crianças, doentes, desempregados, velhos...
Aqueles foram gritos de incivilidade. Não perceber isso, ou manipular o fato para tirar proveito da obscenidade, não buscar suas causas e soluções, é um gesto de cumplicidade com os que gritaram.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF)

Passeios de fim de semana: Carmen Licia e eu em West Hartford

Depois de uma visita ao New Britain Museum of American Art, para uma nova exposição especial de obras de arte em vidro,

fomos a Avon, e depois a West Hartford, onde jantamos num restaurante de comida italiana.
Na saída, um simpático casal jovem, fez esta foto de um casal menos jovem...
Paulo Roberto de Almeida


sábado, 28 de junho de 2014

Um companheiro das Arabias (do patropi mesmo)

A salada estilístico-ideológico-misteriosa do black bloc de saias
Rafael Lusvarghi, de kilt: acusado de associação criminosa - Avener Prado/Folhapress
Rafael Lusvarghi, de kilt: acusado de associação criminosa – Avener Prado/Folhapress
Por Mariana Barros, na VEJA.com:
Na última segunda (23), Rafael Marques Lusvarghi, 29 anos, foi preso pela polícia após participar de uma manifestação em São Paulo. Ele e o estudante Fabio Hideki Harano, 26 anos, foram acusados de associação criminosa e levados pelos policiais que acompanhavam o protesto. O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella Vieira, apresentou a dupla à imprensa como “os primeiros black blocs presos” em flagrante na capital.

Quando foi detido, Lusvarghi usava uma saia kilt e tinha o que parecia ser uma cicatriz do lado esquerdo do rosto. Só parecia: o falso machucado foi feito no último dia 17, enquanto o Brasil jogava contra o México, em um estúdio de tatuagem em Jundiaí, na Grande São Paulo. A técnica é chamada de escarificação e consiste em criar na pele um corte milimetricamente desenhado na base do bisturi. Para fazê-lo, Lusvarghi inspirou-se nos games: ele é fã do jogo God of War e queria uma marca no rosto igual à do personagem Kratos, o fortão espartano que protagoniza a saga. Aos amigos, contou que nas diversas brigas que arranjou nunca conseguiu um machucado que marcasse seu rosto – apenas sinais no pulso e num dos dedos.
Aficionado pela história russa e pela cultura militar, Lusvarghi coleciona álbuns com retratos dos líderes da Revolução Russa e do período comunista. Fotos de exércitos, tanques e armas também estão no seu acervo. Obcecado por vikings, tem tatuada no braço a palavra Berserk, nome de um mangá, posteriormente transformado em anime, inspirado nos guerreiros da mitologia nórdica.
Lusvarghi e a falsa cicatriz, milimetricamente desenhada na base do bisturi - Reprodução/Facebook
Lusvarghi e a falsa cicatriz, milimetricamente desenhada na base do bisturi -Reprodução/Facebook
Lusvarghi nasceu em Jundiaí, numa família de classe média. A mãe é professora formada em Biologia e o pai, de quem ela é separada, gerencia uma pequena empresa em Minas. É o mais velho de quatro irmãos. Um deles conta que, desde pequeno, Lusvarghi sonhava alistar-se na Legião Estrangeira da França. Aos 18 anos, comprou uma passagem para aquele país, onde morou por três anos – como integrante da tropa, segundo disse a familiares. Quando regressou ao Brasil, prestou concurso para soldado da Polícia Militar em São Paulo e ficou na corporação entre março de 2006 e julho de 2007. O motivo de sua saída é desconhecido, mas em agosto ele já prestava um novo concurso, desta vez para ser PM no Pará. Aprovado, permaneceu na corporação até 2009 e, mais uma vez, saiu antes de concluir o curso de oficial.
Partiu, então, para a Rússia. Em 2010, mudou-se para Kursk, cidade onde ocorreu uma das mais importantes batalhas da Segunda Guerra Mundial. O que fez lá ninguém sabe. Segundo parentes, teria estudado administração e tentado alistar-se no exército russo. Como não conseguiu, regressou ao Brasil. Logo depois de chegar, em janeiro deste ano, iniciou uma viagem de um mês e meio entre Colômbia e Venezuela. Disse ao irmão ter “feito contato” com as Farc neste período – e não gostou da experiência. Na volta, instalou-se em Indaiatuba, no interior paulista, onde começou a trabalhar como professor de inglês e técnico de informática.
Lusvarghi é detido durante ato contra a Copa do Mundo na Avenida Paulista, em São Paulo - Fernando Donasci/Agência O Globo
Lusvarghi é detido durante ato contra a Copa do Mundo na Avenida Paulista, em São Paulo –Fernando Donasci/Agência O Globo
Além do fortão do videogame de quem copiou a cicatriz no rosto, Lusvarghi se diz admirador do presidente russo Vladimir Putin. Antes de ser detido nesta semana, ele fazia planos de ir para a Ucrânia “lutar pelas forças separatistas”. O que o kilt tem a ver com tudo isso segue sendo um mistério.

PAC = Propaganda Arranjada dos Companheiros, um fracasso, como sempre...

O PAC da propaganda
Editorial do jornal O Estado de S.Paulo, 28/06/2014

Um trem fantasma circula entre Campinas e Rio de Janeiro, correndo nos trilhos imaginários do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Prometido inicialmente para este ano, o trem-bala nunca saiu da promessa, continua como um vago projeto e, assim mesmo, seu status aparece como "adequado" no 10.º balanço do PAC, apresentado na sexta-feira pela ministra do Planejamento, Míriam Belchior. Em agosto do ano passado o leilão do trem de alta velocidade, com percurso de 511 quilômetros e custo estimado de R$ 32 bilhões, foi adiado pela terceira vez. Mas oficialmente o projeto está em dia.
Bastaria essa classificação para minar a credibilidade de mais um balanço triunfal de realizações federais. Mas outros dados comprovam, mais uma vez, o baixo grau de sucesso de um programa destinado principalmente, como indica seu nome, a ampliar a capacidade de expansão da economia brasileira.
O novo relatório comprova, mais uma vez, a predominância dos gastos com habitação no mais vistoso programa do governo central. A execução orçamentária do PAC 2 até 30 de abril deste ano envolveu aplicações de R$ 871 bilhões, 84,6% do total previsto para o período 2011-2014. Os financiamentos habitacionais, R$ 285,3 bilhões, corresponderam a 32,7% do valor aplicado. Nem sequer se poderia classificar esse montante como investimento, até porque o dinheiro pode ter sido gasto, no todo ou em parte, em imóveis velhos.
Somando-se a isso as aplicações do programa Minha Casa, Minha Vida, R$ 78 bilhões, chega-se a R$ 361,6 bilhões, ou 41,7% dos R$ 871,4 bilhões comprometidos entre 2011 e o fim de abril. O resto é dividido entre os demais setores, com destaque para os de energia e de transportes.
Não há como desmentir: o PAC é essencialmente um conjunto de financiamentos e investimentos habitacionais. Os programas de moradia podem ser importantes socialmente, economicamente úteis e louváveis sob vários aspectos, mas a aceleração do crescimento, finalidade explícita do programa, depende muito mais de investimentos em infraestrutura.
Os dispêndios das estatais, R$ 231,4 bilhões desde o início do PAC 2 até 30 de abril, corresponderam a 26,6% das aplicações totais. Somados os gastos do Orçamento-Geral da União chega-se a R$ 324,2 bilhões, valor bem menor que o dedicado à habitação.
Como explicar o peso desproporcional dos gastos com habitação? A resposta provavelmente envolve a dificuldade muito maior de planejar, projetar e executar obras de estradas, ferrovias, portos, armazéns, aeroportos, centrais elétricas, sistemas de transmissão e de pesquisa, exploração e refino de petróleo.
A escassa competência do governo federal no tratamento dessas questões já foi comprovada muitas vezes, especialmente a partir do primeiro PAC. Muitos projetos emperram antes de sair do papel, ou já nas primeiras fases de execução, por descumprimento, por exemplo, dos padrões financeiros cobrados pelo Tribunal de Contas da União. Outros emperram por má administração ou mesmo por falhas escandalosas de planejamento, como, por exemplo, nos casos de centrais elétricas impedidas de funcionar por falta de linhas de transmissão.
O PAC nunca foi, de fato, mais que uma sigla usada para marketing político. Desde a primeira versão, esse nome serviu basicamente para designar uma colcha formada pela costura apenas formal de várias ações desenvolvidas, em nível federal, pela administração direta e pelas várias estatais.
Já existiam os grandes projetos do setor elétrico. O planejamento da Petrobrás, periodicamente revisto e atualizado, era parte da rotina da empresa. As necessidades do setor de transportes eram conhecidas e obras importantes estavam em execução. O PAC nada acrescentou a esse conjunto, além de um nome de fantasia e de uma bandeira de propaganda.
Esse programa - ou "programa" - teria algum valor prático se tivesse ao menos servido para introduzir maior racionalidade no planejamento federal. Nada semelhante ocorreu. Ao contrário: a qualidade gerencial decaiu, como ficou demonstrado com a desastrosa intervenção na política de tarifas de energia, com a manutenção do controle de preços da Petrobrás e com o uso das estatais para remendar as contas públicas. O resto é propaganda ruim, nem sequer enganadora.

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