Festa com ressalvas
No 35º Encontro Anual da Anpocs, pesquisadores comemoram a evolução das ciências sociais no Brasil ao mesmo tempo em que lutam por reconhecimento no campo da política científica.
Por: Célio Yano
Por um lado, cada vez mais representativa. Por outro, em busca de mais visibilidade. É por esse momento que passa a comunidade de cientistas sociais brasileiros, que em grande parte esteve reunida na última semana em Caxambu (MG), por ocasião do 35º Encontro Anual da
Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs).
De 24 a 28 de outubro, seis hotéis, além do centro de convenções do município mineiro, foram tomados para a realização de cursos, fóruns, simpósios, conferências, exposições, mesas-redondas e apresentação de trabalhos sobre os mais diversos temas da área de ciências sociais.
Desde a primeira edição do evento, o número de participantes saltou de algumas dezenas para quase 2 mil pesquisadores
Desde a primeira edição do evento, realizada em 1977, o número de participantes saltou de algumas dezenas para quase 2 mil pesquisadores. Ao mesmo tempo, a Anpocs passou a ter em seus quadros um número cada vez mais equilibrado de representantes de todos os estados brasileiros.
“O fato de a entidade ser presidida pela primeira vez em sua história por um nordestino reflete essa nova dinâmica”, afirmou o sociólogo pernambucano Marcos Costa Lima, presidente da instituição, eleito, no ano passado, para o biênio 2011-2012.
A interdisciplinaridade também cresceu. “Não estamos mais restritos à antropologia, à sociologia e à ciência política”, ressaltou o antropólogo Gilberto Velho, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Foram agregados, ao longo dos anos, indivíduos e programas de história, comunicação, filosofia, psicologia, geografia, artes, literatura, cinema.”
Exclusão e reivindicação
Apesar de tudo isso, a Anpocs ainda tem muito a fazer como representante da comunidade de cientistas sociais. Isso na avaliação do próprio presidente da entidade. Para Marcos Costa Lima, há a necessidade de internacionalizar as pesquisas da área desenvolvidas no Brasil. “As articulações com outros países têm sido individuais, quando muito de programas, mas nada especificamente relacionado à Anpocs.”
No último mês de julho, o governo federal lançou um programa voltado justamente para a internacionalização da ciência brasileira, que deve ocorrer por meio do intercâmbio de alunos de graduação e pós-graduação com a comunidade acadêmica internacional. Porém, o
Ciência sem Fronteiras, como foi batizado, excluiu as ciências sociais de sua área de abrangência.
O Ciência sem Fronteiras excluiu as ciências sociais de sua área de abrangência
O encontro da Anpocs realizado na semana passada acabou servindo também para que os pesquisadores reafirmassem seu descontentamento com essa decisão. Poucas semanas antes do evento, representantes de várias sociedades científicas de ciências sociais redigiram
uma carta em que reconhecem a importância do Ciência sem Fronteiras, mas solicitam a inclusão de estudantes da área no programa.
O texto é destinado ao presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Glaucius Oliva, e assinado pelo presidente da Anpocs, juntamente com os presidentes da Associação Brasileira de Antropologia, da Associação Brasileira de Ciências Políticas, da Sociedade Brasileira de Sociologia e da Associação Brasileira de Relações Internacionais.
Inclusão e homenagem
Entre os pontos altos do 35º Encontro Anual da Anpocs, destaca-se a participação de lideranças indígenas, quilombolas e representantes do movimento de profissionais do sexo em debates de que normalmente participam apenas pesquisadores.
Direitos humanos, segurança pública,
minorias sexuais, a chamada Primavera Árabe e o projeto de reforma do Código Florestal estiveram entre as discussões em fóruns, simpósios e mesas-redondas.
O evento contou ainda com seis conferencistas estrangeiros, entre eles o sociólogo norte-americano Michael Burawoy, presidente da Associação Internacional de Sociologia, que apresentou um relatório da Unesco sobre o futuro das ciências sociais.
A semana foi marcada também por uma homenagem ao sociólogo Juarez Rubens Brandão Lopes (1925-2011), um dos fundadores do
Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), ao lado de Fernando Henrique Cardoso e José Arthur Giannotti. Lopes morreu em junho passado em São Paulo por falência de órgãos.
“Se pudesse dedicar esse encontro a alguém, eu o faria na lembrança do professor Juarez Brandão Lopes”, disse Marcos Costa Lima. Costa Lima obteve o título de doutor em ciências sociais pela Universidade Estadual de Campinas (SP), sob orientação de Lopes.
Célio Yano*Ciência Hoje On-line/ PR
* O jornalista viajou a Caxambu (MG) a convite da Anpocs.
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