Maiores partidos políticos já se rendem a nome novo
O desgaste dos partidos e da própria classe política - marcado nas eleições do ano passado pela rejeição do eleitorado - já estimula mudanças nas mais tradicionais e mais estruturadas siglas do País. De imediato, das 10 maiores bancadas do Congresso, ao menos cinco siglas já alteraram ou estudam alterar o nome, decisão que costuma ser anunciada como um processo de busca de conexões com as redes sociais e de renovação de estatutos e programas.
Algo que o DEM, que hoje preside tanto a Câmara quanto o Senado, fez em 2007, quando deixou de ser PFL e adotou a marca Democratas. O PSDB e MDB, as duas maiores bancadas no Senado, devem ir na mesma linha. O fenômeno, segundo especialistas, é uma tendência mundial e revela uma mudança na relação do eleitor com a política que dispensa mediadores e tem campo aberto no meio digital.
Depois de abolir P da sigla, o MDB estuda passar a se chamar apenas Movimento. O PSDB encomendou pesquisa para se reposicionar a partir de junho, quando ocorrerá a convenção nacional. Principal liderança da legenda, o governador de São Paulo, João Doria, fala em transformar o partido em digital.
Ligado à Igreja Universal, o PRB vai se transformar em Republicanos, como antecipou o Estado. A intenção da legenda é focar sua atuação no campo ideológico da centro-direita.
Originário do antigo PCB, o Partido Popular Socialista (PPS) foi rebatizado recentemente como Cidadania, e tirou o Socialista do nome para receber os grupos de renovação política, como Agora, Livres e Acredite. Entre os 74 partidos em formação inscritos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 20 optaram por nomes com cara de movimento: Iguais, Raiz, Tribuna Popular, Animais, Força Brasil, Liga, Arena, UDN, Unidade Popular, entre outros.
O ex-deputado Roberto Freire, fundador e líder do Cidadania, observa que a ideia de partido como configurada hoje surgiu na revolução industrial, com o Partido Social Democrata Alemão. Para ele, este conceito está com os dias contados. O mundo exige outra forma de organização. Os partidos vão deixar de existir, disse. A comunicação direta com o eleitor é uma nova realidade. Hoje é só pelas redes. Ninguém espera mais uma articulação partidária por células em sindicatos de base.
Outra sigla que mudou de nome foi o Partido Trabalhista Nacional (PTN), que se transformou em Podemos em maio de 2017. Somos cidadãos do século 21, mas lidamos com instituições concebidas no século 18. O que mobiliza hoje a sociedade não é mais a ideologia de esquerda ou direita, mas as causas, que são muito dinâmicas, disse a deputada federal Renata Abreu (SP), presidente da legenda.
Sistema
Para o professor de ciência política Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esta tendência indica que o sistema partidário brasileiro é pouco consolidado. Não consigo imaginar o Partido Republicano dos Estados Unidos mudando de nome, disse.
Avritzer avalia que existe grande desconfiança em relação aos partidos. Pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), em parceria com outras instituições, mostrou que, em 2018, oito em cada dez brasileiros (78%) afirmaram não ter nenhuma confiança nessas instituições. Uma das causas, segundo Avritzer, é a ausência de conexão com os anseios de parte da sociedade.
A mudança (de nome dos partidos) é para se viabilizarem como estruturas que possam ser mais atrativas. Mas, provavelmente o motivo da pouca confiança não é que as pessoas não gostam do nome, e sim de determinadas de práticas, diz o cientista político.
O pesquisador vê o Brasil inserido em um movimento mundial de forte insatisfação com o sistema político tradicional. O eleitorado esteve disposto a votar no PSL e no Novo, partidos que praticamente inexistiam em eleições anteriores, destacou. Nos casos dos partidos tradicionais, como MDB e PSDB, ele alerta que a mudança do nome significa, também, abandonar muita coisa. O MDB seria a própria tradição da luta pela redemocratização, e o PSDB seria abrir mão de uma série de bandeiras históricas.
Para o sociólogo Rodrigo Prando, professor do Mackenzie, a ideia de tirar o termo partido é uma tentativa de se mostrar mais conectado com a sociedade, numa tentativa de dar ares de modernidade a uma estrutura antiquada e pouco democrática. Os partidos estão assentados em uma burocracia do século 20 e a sociedade hoje é outra, a democracia representativa está em crise no mundo todo. As eleições de Trump nos EUA e de Bolsonaro no Brasil deram uma chacoalhada no sistema. Para ele, é fundamental que a militância participe da discussão da mudança do nome. Não pode vir só da cúpula.
Desde a derrota de Fernando Haddad para Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial do ano passado, o PT intensificou as discussões sobre como superar o antipetismo e o desgaste da imagem do partido.
Houve até a proposta de mudança do nome - hipótese prontamente descartada. Hoje o PT debate internamente a criação de uma frente formada por partidos, movimentos sociais e setores democráticos, como forma de fazer oposição ao governo Bolsonaro. A justificativa para a estratégia da frente é a ausência de um deslocamento da situação política à esquerda.
MDB quer ser 'movimento"
Depois de deixar o Palácio do Planalto, sofrer forte derrota nas eleições do ano passado e perder a presidência da Câmara e do Senado, o MDB tenta se reposicionar na cena política para sair do isolamento. Dirigentes do partido querem agora construir uma agenda econômica com novas bandeiras, limpar a imagem da legenda abalada por escândalos de corrupção e influenciar no debate do Congresso, para ser uma espécie de fiel da balança em votações importantes para o governo de Jair Bolsonaro.
A estratégia para sair da segunda divisão e ganhar protagonismo após a crise passa por um alinhamento entre as bancadas do Senado e da Câmara e mudanças no cartório.
Uma ala do MDB quer trocar o nome do partido, desta vez para Movimento. Por trás desse novo batismo está a ideia de que o MDB admite erros, mas não é estático e dá a volta por cima. No fim de 2017, o PMDB já havia removido o P da sigla, voltando a ser chamado de Movimento Democrático Brasileiro (MDB), como foi criado, em 1966, quando fazia oposição à ditadura militar.
Antes antagônicas e em disputa, as bancadas do partido na Câmara e no Senado procuram agora alinhavar táticas conjuntas para avançar algumas casas no jogo legislativo e acumular força. Um dos temas em discussão, por exemplo, é a reforma da Previdência e o outro, as mudanças tributárias.
Temos um Everest para escalar, disse o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM). Os governos, estrategicamente, sempre tentaram nos dividir, mas agora começamos a ter uma relação mais próxima. Estamos construindo várias pautas de políticas públicas e queremos debatê-las com o povo e com o governo.
A meta é explorar temas que têm impacto na vida da população e jogar os holofotes sobre a marca MDB. As bancadas do partido querem, por exemplo, mexer na proposta do governo Bolsonaro sobre abono salarial e propor uma nova política de salário mínimo para vigorar a partir de 2020. Uma das ideias do partido é preparar uma proposta de transição para a implantação da mudança no abono, incluídas pelo governo na reforma da Previdência, e que prevê a redução de dois para um salário mínimo a renda de acesso ao benefício.
Na avaliação do deputado Baleia Rossi (SP), líder do MDB na Câmara, o novo momento do País exige uma aliança entre todas as correntes do partido. Não vejo sentido em ter dois MDBs diferentes, afirmou. Precisamos superar as dificuldades e essa união ajuda a projetar nosso crescimento porque o próximo desafio é a eleição municipal de 2019. O plano do MDB é lançar candidatos próprios nas capitais e em cidades com mais de 200 mil eleitores.
Presidente do MDB paulista, Baleia Rossi disse que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária, apresentada por ele, é um dos temas que podem juntar as duas bancadas no Legislativo, além das mudanças sugeridas para a aposentadoria rural e para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), por exemplo.
TSE
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicam que o MDB ainda é o maior partido do País, com 2,3 milhões de filiados, embora tenha enfrentado um terremoto nas eleições do ano passado. Hoje, a sigla tem três governadores (Alagoas, Distrito Federal e Pará), 1.030 prefeitos, comanda um ministério no governo Bolsonaro - o da Cidadania, com Osmar Terra, e 34 deputados federais - um pouco mais da metade do que tinha antes -, mas ainda é dona da maior bancada do Senado, com 13 parlamentares.
Presidente do MDB, o ex-senador Romero Jucá (RR) não se reelegeu, assim como outros quadros históricos do partido no Senado, como Eunício Oliveira (CE), Edison Lobão (MA) e Garibaldi Alves (RN). Denunciado pela Lava Jato, Jucá atribuiu a derrota, na ocasião, ao que classificou como linchamento contra a classe política e à crise humanitária que atingiu Roraima, seu Estado, com intenso fluxo migratório de venezuelanos na região. Recentemente, Jucá conversou com Bolsonaro. Mas não vamos entrar na base aliada, avisou. O MDB quer ser independente.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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