Pois é: eu sempre achei o tal de G-20 comercial, gloriosamente apresentado pelos promotores da tal de diplomacia "ativa e altiva", um tremendo grupo esquizofrênico, ao juntar exportadores agrícolas competivos e não subvencionistas, a outros países importadores, protecionistas, subvencionistas e desejosos de preservar tal condição, como a China e a Índia, por exemplo.
Ou seja, o Brasil patrocinava um grupo que continha países "aliados" que faziam o exato contrário do que ele pregava, e tinha que fazer malabarismos em suas posições diplomáticas para acomodar os interesses desses sócios anti-sócios. Essa era a diplomacia dos velhos tempos, talvez ainda seja...
Vamos ver como ficamos daqui para a frente...
Paulo Roberto de Almeida
A constatação de que a China já concede mais subsídios para seus
agricultores do que os Estados Unidos e a Europa - invariavelmente
apontados pelos países produtores como os responsáveis pelas maiores
distorções no comércio mundial de alimentos - torna mais remota a
possibilidade de o governo brasileiro conseguir impor sua agenda durante
o esforço da Organização Mundial do Comércio (OMC) para concluir, ainda
neste ano, a Rodada Doha de liberalização comercial que se arrasta
desde 2001.
O governo brasileiro não aceita uma negociação no âmbito da OMC que não
tenha como foco a liberalização do comércio de produtos agrícolas.
Países industrializados que subsidiam pesadamente a produção local têm
resistido a essa discussão. A política agrícola do governo de Pequim,
caracterizada por subsídios crescentes, indica que a China se juntará a
esses países para tentar reduzir os limites de uma eventual negociação
sobre o tema conduzida pela OMC.
Como mostrou o
Estado (4/2), levantamento realizado por
um grupo liderado pelos governos da Austrália, Chile, Canadá, Paraguai e
Uruguai - preocupados com o efeito dos subsídios sobre os preços
internacionais e sobre a competitividade de cada país produtor -
constatou que a China distribuiu a seus agricultores subsídios no valor
de US$ 15,3 bilhões por ano, valor superior ao distribuído pelos
governos europeus (US$ 12,6 bilhões) e americano (US$ 12,1 bilhões).
São cifras bem menores do que as apuradas pela Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico, mas igualmente mostram como a
China vem puxando o aumento mundial de subsídios. Em sua defesa, o
governo de Pequim alega que o estímulo à atividade agrícola é essencial
para assegurar o abastecimento doméstico e evitar o êxodo do campo para
as cidades.
Numa manobra para dividir os países em desenvolvimento, entre os quais
estão os mais interessados na liberalização do comércio agrícola, o
governo americano quer excluir dessa classificação países como China,
Brasil e Índia. Isso porque quanto mais economicamente avançado for
classificado um país, mais concessões deverá fazer nas negociações - ou
seja, tem de cortar mais fortemente barreiras tarifárias ou subsídios.
Se a nova classificação for adotada, o Brasil ganhará menos numa
eventual liberalização do comércio agrícola.
Nas negociações na OMC sobre agricultura, a China já deixou claro que o
Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) não passa de uma
sigla engenhosa. Seus interesses nesse campo em nada se assemelham aos
do governo brasileiro. Grande importadora de alimentos, a China se
mostra muito pouco disposta a fazer concessões nessa área. Ao contrário,
pretende não só manter os atuais subsídios, como até ampliá-los ou
criar novas medidas de proteção à produção local. O governo de Pequim
considera que já fez mais concessões do que deveria ter feito.
Apesar das dificuldades cada vez maiores para fazer avançar essa
discussão no sentido que pretende, o governo da presidente Dilma
Rousseff mantém a ideia fixa de condicionar qualquer avanço nas
negociações da Rodada Doha à abertura do comércio agrícola.
Temendo que a nova iniciativa da direção da OMC - à frente da qual está o
brasileiro Roberto Azevêdo - de aceleração das negociações da Rodada
Doha se concentre no comércio de bens industriais e de serviços, o
governo brasileiro já manifestou sua contrariedade.
"Nós certamente não aceitaremos um jogo de faz de conta na OMC em que,
por falta de ambição ou ausência de vontade política, se abandone o
objetivo de ampliar o acesso a mercados para a agricultura", disse ao
jornal Valor o subsecretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do
Itamaraty, embaixador Ênio Cordeiro.
O governo do PT boicotou a criação da Área de Livre-Comércio das
Américas (Alca), que abriria mercados para os nossos produtos
industrializados. Ao fugir novamente da discussão sobre o comércio
desses bens, parece contentar-se em fazer do Brasil um exportador de
produtos primários.