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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 17 de janeiro de 2010

1705) Haiti e ajuda humanitaria (3)

Rottweiler sem dentes
Clovis Rossi
Folha de S.Paulo, 17.01.2010

O Brasil mudou de complexo. Antes, abrigava n’alma o de vira-lata, segundo Nelson Rodrigues, o notável escafandrista da alma brasileira. Agora, na crise haitiana, mostra complexo de rottweiler.
Pena que não tenha dentes. Refiro-me à ciumeira de autoridades brasileiras em relação a rápida e decidida ação do governo norte-americano. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, reage com pura masturbação diplomática, ao dizer que se trata de “assistencialismo unilateral”.
Qualquer pessoa que não tenha perdido o senso comum sabe que os haitianos não estão preocupados com a cor do assistencialismo, se unilateral, bilateral, multilateral. Querem que funcione.
No aeroporto da capital, está funcionando, conforme relato desta Folha: “Depois que os americanos assumiram o aeroporto, os voos aumentaram e também o envio de medicamentos e alimentos”.
É claro que precisa haver coordenação, como cobra o chanceler Celso Amorim, mas é bobagem resmungar sobre os Estados Unidos assumirem um papel mais relevante que o das forças da ONU. É brigar com os fatos da vida. Os EUA podem mais que qualquer outro país, o que é escandalosamente óbvio.
Ajuda-memória aos resmungões, extraída do texto de Sérgio Dávila: os EUA enviaram vários navios da Guarda Costeira com helicópteros, o porta-aviões Carl Vinson, com 19 helicópteros, 51 leitos hospitalares, três centros cirúrgicos e capacidade de tornar potáveis centenas de milhares de litros de água por dia.
Nos próximos dias, chegam mais dois navios com helicópteros e uma força-anfíbia com 2.200 fuzileiros e um navio-hospital.
O Brasil tem condições de chegar a um décimo disso? Não. Então que pare de rosnar e reforce o seu pessoal no Haiti, que fez e está fazendo notável trabalho, dentro de seus limites bem mais modestos.

Comentário:
CELSO AMORIM É SÓ UM HOMEM RIDÍCULO
Reinaldo Azevedo, 17/01/2010

Não é meu, não. É de Clóvis Rossi, da Folha. Quando se trata de avaliação política, não me lembro de ter concordado com Rossi antes. E ele e seus admiradores podem ficar tranqüilos: não pretendo macular a sua reputação junto a certo leitorado — e, eventualmente, eleitorado — elogiando-o. Em benefício de Rossi, farei de tudo para que isso não aconteça. E sei que alguns se esquecerão de ligar a tecla SAP para ler o texto.

Ocorre que há circunstâncias em que as pessoas que têm compromisso com os fatos — independentemente do lugar que ocupem no espectro ideológico ou das opiniões que tenham sobre isso ou aquilo — são obrigadas a constatar… os fatos!!!

A canalha esquerdopata se fingiu de chocada quando escrevi o texto “Haiti: palco e atoleiro”, em que acusei, de pronto, o assanhamento protagonista de Lula. Escrevi depois um outro texto afirmando que não será a tragédia a me impedir de pensar. Alguns pessoas até de boa fé e muitos bocós vieram me dar conselhos: “Pô, numa hora como essa, você diz essas coisas; os haitianos estão precisando…” Como se eu estivesse contra o auxílio àqueles pobres coitados, vítimas dos homens, vítimas da natureza…

Não! Eu sou favorável à ajuda, é evidente. Eu só percebi a mobilização assanhada para tentar desempenhar o papel de um grande líder — e nada posso fazer, a não ser relatar a vocês o que vejo, se fui mais rápido do que os outros; admito que tem acontecido com freqüência. Acontece que a tragédia era imensamente maior do que a jactância de Lula e Celso Amorim. Pedia a intervenção de alguém acostumado a se comportar como sede do Império (alguns acham ruim; eu, como sou imperialista, acho bom). Em questão de horas, os EUA tinham conseguido mobilizar recursos para nós inimagináveis porque intangíveis — não, melhor usar uma palavra mais forte: INEXISTENTES.

E Celso Amorim fez o quê? Começou a rosnar. Ficou à beira de gritar: “Abaixo o imperialismo” quando os EUA resolveram botar ordem no caos do espaço aéreo, uma precondição para se tentar fazer alguma coisa no espaço terrestre, onde o inferno persiste. E passou a bater os pezinhos de anão enciumado (refiro-me à sua estatura interna, não à externa, como sempre). A inenarrável tragédia haitiana abria uma janela de oportunidades para o nosso… protagonismo!!! Ou melhor: “deles”. Abro uma janela para falar nos soldados brasileiros e retorno ao ponto.

Os soldados brasileiros
Não! Isso nada tem a ver com o duro trabalho, certamente heróico, dos nossos soldados naquele país. Muitos perderam a vida. Mesmo antes do terremoto, faziam um trabalho meritório, embora lutassem, NÃO POR VONTADE DAS FORÇAS ARMADAS, a guerra errada. Já estavam lá por causa desse complexo de rottweiler desdentado, enviados pelo governo Lula. Nelson Jobim diz agora que o Brasil deve ficar mais cinco anos por lá… Ele está chutando. Se não sabia, no caos relativo, quanto tempo permaneceríamos nos comportando como polícia em Cité Soleil, como vai saber agora, no caos absoluto? Ele fala o que lhe dá na telha.

A ONU, para não variar, largou o Haiti ao Deus-dará. E o Brasil ficou pendurado na brocha. Nos quase seis anos de intervenção, quase nada havia mudado por lá. O país continuava praticamente sem instituições. As tropas da ONU, lideradas pelos soldados brasileiros, já se viam obrigadas a intervir, militarmente mesmo, em confrontos armados entre gangues. Antes desse terremoto, houve outros, só que políticos. A pá de cal no país foi jogada por um ex-padre esquerdista, doidivanas e, tudo indica, ladrão também chamado Jean-Bertrand Aristide, que governou o país, pela última vez, entre 2001 e 2004. A grande idéia deste cretino para evitar a instabilidade militar foi extinguir as Forças Armadas… Sabem o que isso significava e significa? Que as forças da ONU haviam assumido esse papel. Cinco anos? Jobim não tem noção do que está falando. Agora, Aristide diz estar pronto para deixar seu conforto na África do Sul, onde está exilado, e voltar ao país. Será que sobrou alguma cadeia na parte do país não atingida pelo terremoto?

Retorno ao ponto
A crítica política — assim como a econômica, a gastronômica ou outra qualquer — não deve ser insensível aos dramas humanos. Ao contrário: a rigor, eles são a razão essencial que nos leva a escrever sobre qualquer assunto: de um tratado de engenharia a um tratado moral. Em tese ao menos, estamos todos empenhados em melhorar a vida do homem.

E uma das formas que a crônica e a análise política têm de demonstrar a sua sensibilidade é acusar a manipulação, a marquetagem, a patifaria. O mundo viu o senhor Celso Amorim tentando medir forças com o governo dos EUA para ver quem iria liderar a ajuda ao Haiti. O gigante não entendeu, até agora, o que é integrar forças da ONU. Por qualquer razão, ele passou a se comportar como uma espécie de governo de fato do Haiti, cobrando que os EUA lhe dessem satisfações sobre os seus atos. É um despautério.

O Haiti pede todos os esforços que estiverem ao nosso alcance. Mas nem aquela tragédia terá feito o número de mortos que um terremoto humano no Sudão chamado Omar Hassan al-Bashir já fez. Este é o nome do ditador daquele país: responde por, ATENÇÃO!!!, 300 MIL MORTOS. E o Brasil de Celso Amorim, não o nosso, nega-se sistematicamente a votar contra o déspota na ONU. Ao contrário: já atuou para protegê-lo. Por quê? Porque quer o apoio dos países islâmicos, especialmente árabes, para ser membro permanente do Conselho de Segurança. Entenderam?

Em nome do protagonismo, o governo Lula tanto pode ignorar os 300 mil mortos de Darfur como pode reivindicar uma espécie de mando sobre os estimados 100 mil mortos do Haiti. Montanhas de cadáveres não são fronteira para as ambições de Lula e Celso Amorim.

E eu continuarei a chamar as coisas pelo nome que as coisas têm. Ainda que isso aborreça muita gente. É o compromisso que tenho firmado com os meus leitores.

4 comentários:

Vinícius Portella disse...

Apesar de puxar da cartola abruptamente um coelho sudanês sem muito compromisso com rigores lógicos, eu acredito que Reinaldo Azevedo expõe coisas muito importantes. Todavia, faço algumas ressalvas:
Aos militares a missão também interessa, não sendo unicamente expressão do "imperialismo megalonanico" (na expressão de uma capa de Veja) do atual governo brasileiro. Além de questões relacionadas ao prestígio dos militares que vão a uma missão no exterior em relação aos que cá ficam, bem como do soldo que recebem em Dólar, ao EB participar de tal operação traz enormes ganhos quanto ao adestramento da tropa. Não é por outra razão que há um rodízio do envio de contingentes de todos os Comandos Militares de Área de modo que a Força por inteira se encontre enriquecida com essa experiência. Vejo que Jobim reverbera estes interesses militares que no momento casam com nosso canarinho que se pôs a bicar a águia careca.

Abraços!

Vinícius Portella disse...

Em tempo:
Paulo, acredito que jamais uma teoria explicou tão bem nosso país como tua Teoria da Jabuticaba. É muito curioso observar a presteza com que os meios estão sendo mobilizados para o Haiti e a burocracia que tem permeado o atendimento às vítimas das enchentes e das chuvas no Rio Grande do Sul...

Abraços.

Anônimo disse...

Testament

When I die, make me a beautiful wake
I`m going neither to paradise nor hell
Don`t be scared of talkin latin to my head

When I die, bury me in the yard
Gather all my friends, make a big feast
Don`t go past the church with my corpse

When I die, everyone should really get it on
Laugh, sing, dance, tell jokes
Don`t be sappy, yell into my ear

I won`t altogether be done when I`m dead;
All the places where there were great bashes,
Where people were free - they`ll remember me,

By Félix Morisseau-Leroy

-Translated from Haitian Creole by Jack Hirschman and Boadiba

Ao Povo haitiano "in memoriam"!

Vale!

Brasil disse...

Os dois "chefes"(what a bossy word) de ministério, Jobim e Amorim, estão se "destacando" como protagonistas que falham ao representar o interesse estatal, quando se prendem aos interesses eleitoreiros no que resta do governo Lula. Ainda que o foco da matéria seja Amorim, Samuel Pinheiro Guimarães e Nelson Jobim me decepcionam como líderes; Guimarães é contra a globalização e o livre mercado enquanto Jobim usa farda de militar sendo civil e descabidamente dá "dicas" sobre o quê fazer com a Amazônia. Eu como ex-aluno de colégio militar já me indigno, agora imagino os militares de carreira que vêem o boss do ministério vestindo farda com divisa de general, quando nenhuma vez , frequentou a academia militar ou aparenta ter uma visão holística do EB.
http://4.bp.blogspot.com/_HY_TtmInUpk/Rr4o20lourI/AAAAAAAAACE/deHIHlMpVcQ/s400/General%2Bde%2BEx%C3%A9rcito%2BJobim.jpg

JD