quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Cotas no Itamaraty: uma questao polemica

Até o presente momento, o concurso do Itamaraty tinha dois tipos de candidatos: os afrodescendentes beneficiados com bolsas do programa de "ação afirmativa" do MRE (mais CNPq e Seppir), e todos os demais, os "sem bolsa", independente de serem brancos ou amarelos "pobres". Um afrodescendente de classe média, desde que selecionado, poderia ser contemplado com generosa bolsa para estudar e se preparar para o concurso, que continuava a ser feito inteiramente em bases igualitárias, descontando-se o "empurrão" financeiro.
A partir de 2011, pode ser que tenhamos dois tipos de diplomatas: os afrodescendentes, beneficiados com a política de cotas raciais introduzida por simples portaria pelo ministro "sainte" (apud Lula), e todos os demais, de fato a maioria, mas ainda assim disputando sem o "empurrão" quantitativo agora criado.
Ou seja, ademais dos 300 aprovados na primeira fase, o concurso contará com 10% de "cotistas", que precisarão, obviamente, ser identificados por um "tribunal racial" do Instituto Rio Branco, mas cabe ainda determinar se esses 30 cotistas serão retirados dos bolsistas afrodescendentes, ou dos candidatos em geral, caso no qual se teria de fazer um novo processo de seleção durante a primeira fase do concurso (ou se aceitar a autodeclaração e se estipular, por exemplo, um percentual qualquer de notas inferiores à média, como atualmente parece ser aplicado para o caso dos "deficientes").
Em qualquer hipótese, a medida introduz uma cunha "racialista" num concurso que permanecia, até aqui, razoavelmente meritocrático (claro, sem considerar as "desigualdades estruturais" e a tal de "dívida histórica", que os adeptos das políticas de Apartheid racial sempre invocam como argumentos para justificar o tratamento racista e divisivo que consiste em separar os supostos afrodescendentes de todos os demais brasileiros não pigmentados).
A questão toda, junto com a medida agora tomada, é altamente polêmica, sujeita a controvérsias passionais, como já observado na discussão sobre o estatuto da (des)igualdade racial, aprovado pelo Congresso de maneira amputada (em relação ao que pretendiam os adeptos das políticas racialistas) neste ano de 2010.
O Brasil, pela ação do governo, está criando uma nação dividida em "raças", a pretexto de reparar "injustiças históricas". Não creio, sinceramente, que isso seja positivo, para o Brasil, para o Itamaraty, para os diplomatas em geral.
Paulo Roberto de Almeida

Concurso para admissão de diplomatas terá cotas para negros
Agência Brasil, 28 de dezembro de 2010

Nova regra já passa a valer no concurso do primeiro semestre de 2011, quando serão abertas 30 novas vagas para negros que passarem para a segunda fase

BRASÍLIA - O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, assinou nesta terça-feira, 28, portaria que institui a reserva de vagas para candidatos negros no concurso de admissão à carreira de diplomata, realizado pelo Instituto Rio Branco. A portaria será publicada amanhã no Diário Oficial da União.

Segundo a nova regra, que valerá para o concurso do primeiro semestre do ano que vem, serão abertas 30 novas vagas para negros que passarem para a segunda fase. Atualmente, 300 candidatos são classificados para a segunda etapa de provas. Agora, 330 participarão dessa fase, sendo 30 deles negros.

Ao todo, o concurso é composto de quatro etapas. A primeira é de múltipla escolha. Na segunda etapa, é aplicada uma prova de português e, na terceira, questões dissertativas sobre vários assuntos. A última prova é de línguas.

A portaria assinada hoje dá continuidade ao Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, iniciado em 2002, que concede bolsas de estudo a candidatos afrodescendentes, com o objetivo de auxiliar na sua preparação para o exame de admissão ao instituto.

Até o momento, 198 candidatos negros foram beneficiados pelas bolsas de estudo, dentre os quais 16 foram aprovados no concurso de admissão à carreira de diplomata.

De acordo com o Itamaraty, no primeiro semestre, deverão ser chamados para o curso de formação de diplomatas 26 candidatos que passaram nas quatro fases do último concurso.

4 comentários:

  1. Bom dia.

    Quando tomei conhecimento acerca da Bolsa do IRBr ainda em 2009 precisei ler o edital três vezes para entender que basta ser afrodescendente e obter aprovação na seleção para conseguir os R$ 25.000,00, independente de situação financeira pessoal ou renda familiar.

    Na mesma época, uma colega de estudos (e quiçá futura colega diplomata) comentou que um professor de universidade federal, com mestrado (óbvio), cumpriu os requisitos e gozou do prêmio, sem obter aprovação no CACD.

    Eu não consigo ver onde está o senso de justiça e igualdade nesses sistemas, tanto da Bolsa do IRBr quanto o de cotas (já amplamente discutido neste blog e outros meios de comunicação).

    Fica o registro. Um abraço.

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  2. Fabricio,
    Creio que voce pede muito do programa de Ação Afirmativa, ao pretender que ele cumpra seus objetivos declarados, o de justiça e igualdade. Creio que a intençao, mesmo, é apenas de ter um pouco mais de negros, ou afrodescendentes, no Itamaraty, para mostrar como esse governo é justo e bem inrtencionado, ou seja, mais a prática de demagogia política do que correção das desigualdades.
    O que agora se cria, cotas, de verdade, na segunda fase, é uma tentativa de cumprir o objetivo que não vinha sendo atingido apenas com as bolsas. Os resultados do programa foram modestos, e provavelmente os poucos que ingressaram teriam condições de tê-lo conseguido mesmo sem as bolsas, simplesmente porque eram negros de classe média que estudaram bastante e entraram por mérito próprio. Pode ser que tenha acontecido também o que você apontou: rentistas oportunistas que aproveitaram apenas um "ajutório" de 25 mil sem empenhar muito esforço em ingressar numa nova carreira.
    O esforço demagógico anterior agora torna-se mais explícito.
    Mas, existe um senão no seu comentário: não "basta ser afrodescendente e obter aprovação na seleção para conseguir os R$ 25.000,00, independente de situação financeira pessoal ou renda familiar", pois é preciso também ser bem sucedido numa seleção objetiva, uma prova não identificada, embora exista também, uma espécie de tribunal racial e social, um comitê que entrevista os candidatos, para ver se eles são efetivamente negros, ou afrodescendentes, e supostamente para saber se eles realmente precisam da bolsa, embora eu creia que eles também selecionam os que apresentam condições reais de ingressar no concurso.
    Agora, vai se facilitar mais um pouco, sempre com o espírito demagógico que caracteriza este governo.
    Em todo caso, se aprofunda mais um pouco as políticas de corte racialista que vão fazer um tremendo mal ao Brasil.
    Paulo Roberto de Almeida

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  3. Deixo duas perguntas no ar para reflexão:

    1-Um afrodescendente, consciente de sua condição, enquanto negro, aceitaria a política racial funesta do governo de querer vender-lhe a ideia de que ser "negro" no Brasil é o mesmo que ser um "portador de necessidades especiais"?!;

    2-Por outro lado, os candidatos afrodescendentes, uma vez aprovados, tanto na Bolsa-Prêmio quanto no CACD, correriam o risco, dentro da instituição(IRBr/Itamaraty), de iniciarem a "carrière" com a pecha de diplomatas de "segunda classe"(!); em face destes "incentivos"?!(Deveria o candidato afrodescendente sentir-se "culpado" pelo fato de obter êxito em ambos os concursos!!!).

    Vale!

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  4. Anônimo,
    Boas perguntas, que no entanto não vou responder, pois não costumo dialogar com as paredes (ainda não fiquei maluco o suficiente), ou falar com desconhecidos.
    Como diria um molusco, melhor olhos nos olhos, ou com escrevinhadores identificados.
    Você deveria responder às suas perguntas, e se desejar, pode fazê-lo anonimamente. Eu pluco,
    Só não vou responder a um anônimo.
    Paulo Roberto de Almeida

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