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sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

"Henry Kissinger ignorou violações de direitos humanos, se aproximou de ditadura e colocou Brasil na posição de aliado principal dos EUA" - Entrevista Matias Spektor (G1)

"Henry Kissinger ignorou violações de direitos humanos, se aproximou de ditadura e colocou Brasil na posição de aliado principal dos EUA"

Matias Spektor, entrevista

Mundo | G1, 1/12/2023

https://g1.globo.com/mundo/noticia/2023/11/30/henry-kissinger-ignorou-violacoes-de-direitos-humanos-se-aproximou-de-ditadura-e-colocou-brasil-na-posicao-de-aliado-principal-dos-eua.ghtml


Para Henry Kissinger, um dos mais influentes diplomatas da história dos Estados Unidosmorto aos 100 anos nesta quarta-feira (29), o Brasil ditatorial era um país a ser apoiado e fortalecido.

“Deveríamos ser capazes de trabalhar com mais frequência com eles [brasileiros] para avançar nossos interesses mútuos no hemisfério”, afirmou o então Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos em 1970, quando o Brasil enfrentava alguns dos anos mais duros do regime militar (1964-1985).

A frase está no livro “Kissinger e o Brasil”, de Matias Spektor, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas e pesquisador visitante na Universidade de Princeton, nos EUA.

Naquele momento, os interesses em comum consistiam, principalmente, em evitar a manutenção e a proliferação de governos de esquerda na América do Sul.

“Quando Kissinger chega ao poder, em 1969 [como conselheiro do então presidente Richard Nixon], ele enxerga que o Brasil pode ser uma âncora de estabilidade para a América do Sul. Era o auge da guerra fria, vários países do continente pareciam estar indo para esquerda, mais especificamente ArgentinaUruguai e Chile. O Brasil era, então, a única ditadura de direita. Já havia denúncias de pau de arara, mas ele faz vista grossa”, diz Spektor, em entrevista ao g1.\

O diplomata americano não só ignorou as denúncias de violações de direitos humanos. Ele foi muito além: desenvolveu uma ótima relação pessoal com o presidente general Emílio Médici, apoiando o governo dele, assim como o programa nuclear brasileiro.

Também atuou para que fosse instituído um canal de comunicação secreto entre o governo americano e o brasileiro (que possibilitava a troca de informações sobre iniciativas dos dois países na América do Sul) e para que os Estados Unidos reconhecessem o Brasil como principal aliado no continente.

“Eles [os dois governos] fazem uma reunião secreta em 1971, na qual combinam que vão trabalhar juntos para impedir que governos de esquerda cheguem ao poder pela via eleitoral na América do Sul. Também combinam que, juntos, vão tentar desestabilizar o governo de Salvador Allende no Chile, que era um socialista”, conta Spektor.

Os esforços de Kissinger na relação com o aliado sul-americano podem ser resumidos na frase com que o então presidente Richard Nixon recebeu Médici em 1971: “Para onde o Brasil for, irá o resto da América Latina”. Era a expressão do desejo do governo americano de que o restante dos países do continente caminhassem para regimes autoritários e anticomunistas.

“E veja que foi o que aconteceu: em 1964, quando tem o golpe no Brasil, a única ditadura na América do Sul era o Paraguai. Em 1974, dez anos depois, os únicos dois países que não são ditaduras são a Colômbia e a Venezuela. O período Kissinger coincide com a transformação de uma América do Sul democrática para um América do Sul ditatorial”, explica Spektor.

Vista grossa e anuência tácita

Em 1974, o então diretor da CIA, a agência de inteligência do governo americano, enviou um telegrama a Kissinger, então secretario de Estado (posição equivalente a de ministro das Relações Exteriores), com o seguinte assunto: “Decisão do presidente brasileiro, Ernesto Geisel, de continuar com as execuções sumárias de subversivos perigosos, sob certas condições”.

O documento, descoberto por Spektor durante pesquisas em 2018, demonstra não apenas o envolvimento direto da cúpula do governo militar no assassinato de opositores, mas também o fato de que Kissinger, então uma das principais autoridades do governo americano, tinha pleno conhecimento das brutais ações repressivas cometidas pelo governo aliado.

“Ele era informado, sabia do que estava acontecendo e não deixava isso atrapalhar a relação. Estamos falando de uma região do mundo na qual os EUA tem mais autoridade. Se o governo americano tivesse dito: ‘parem de torturar’, isso teria tido um efeito”, diz Spektor.

“Se o chefe da diplomacia dá uma anuência tácita à tortura, isso faz toda diferença”.

A mudança de postura do governo americano só aconteceu após a vitória eleitoral, em 1976, de Jimmy Carter que, durante a campanha, afirma que a relação desenvolvida por Kissinger com o Brasil era um “tapa na cara dos americanos” -- àquela altura, o Congresso americano já havia começado uma investigação para apurar o papel dos EUA nas torturas na América Latina, o que, segundo Spektor, diminuiu o espaço político para que Kissinger continuasse apoiando os regimes autoritários.

Mesmo assim, a “anuência tácita” de Kissinger continuou tendo graves consequências. Um exemplo se deu durante a Operação Condor, atividades coordenadas das ditaduras sul-americanas, lideradas pelo Chile e pela Argentina, para perseguir e eliminar opositores a partir de meados da década de 1970.

Em setembro de 1976, descobrem que a Operação Condor pretendia assassinar opositores no exterior e preparam um documento aos líderes sul-americanos dizendo que os Estados Unidos não tolerariam algo assim. Kissinger não aprovou a mensagem e instruiu que mais nada fosse feito.

Cinco dias depois, um atentado matou, em Washington, o ex-ministro de Relações Exteriores do Chile, Orlando Letelier, durante o governo Allende, e uma colega americana.

“A partir daí o movimento de solidariedade ao Chile nos Estados Unidos torna impossível que Kissinger continue apoiando Pinochet [ditador no país sul-americano], diz Spektor.

O envolvimento do americano em ações violentas em outros países não acaba aí. Ele também autorizou bombardeios no Camboja, durante a Guerra do Vietnã, que deixaram centenas de milhares de mortos, e apoiou um massacre cometido pela Índia em Bangladesh.

Plano para o Brasil frustrado

A ideia de Kissinger de que os Estados Unidos pudessem, eventualmente, delegar funções para o Brasil na América do Sul e a visão dele de que o país pudesse assumir uma posição de liderança no continente foi frustrada ao longo dos anos.

Durante o governo de Ernesto Geisel (1974-1979), discordâncias em outras áreas começam a afetar a relação entre os dois países, especialmente na área comercial. Diferentemente do esperado pelos americanos, o Brasil não se alinhou automaticamente aos Estados Unidos em votações em fóruns multilaterais e na negociações de tratados internacionais.

“É uma relação que fica progressivamente tensa. O projeto que o Kissinger tinha em 1969 de fazer uma grande aproximação geopolítica com o Brasil afunda ao longo dos anos e termina fracassando”, explica Spektor.

Segundo o professor, o americano também começa a se frustrar ao perceber que o Brasil não queria assumir a função de intervir mais diretamente nos processos políticos e eleitorais dos outros países sul-americanos.

“Não pelo Brasil ser bonzinho, mas por achar que não tinha força pra desempenhar essa função em todo o continente”, diz. “O Brasil cumpre essa função no Uruguai, apoia o golpe de Pinochet, mas não foi a causa. Kissinger esperava mais”.

Depois de deixar o governo americano, em 1977, Kissinger manteve relações com o Brasil, mas como consultor de empresas americanas que faziam negócios em terras brasileiras e de firmas brasileiras que atuavam nos Estados Unidos.

Em 1981, ele esteve no Brasil e foi convidado para dar uma palestra na Universidade de Brasília. Foi recebido por estudantes com uma chuva de ovos e tomates e saiu escoltado.

SAIBA MAIS:

quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Saraiva Guerreiro foi um grande diplomata e um chanceler equilibrado: muito diferente de outros que estavam antes ou vieram depois - Elio Gaspari

O efeito Milei e o Itamaraty

Elio Gaspari

Folha de S. Paulo, 15.ago.2023 às 23h15 

 

A encrenca argentina é séria, mas não é inédita. Lá, o general Jorge Rafael Videla, ditador deposto em 1981, morreu num banheiro da cadeia em 2013. Em 2001, o presidente civil Fernando de la Rúa fugiu da Casa Rosada e em duas semanas o país teve três presidentes.

O governo do presidente Alberto Fernández está bichado. Cumpriu-se parcialmente uma profecia de Jair Bolsonaro, impropriamente enunciada durante a campanha eleitoral de los hermanos. Fernández e Lula aproximaram-se. Javier Milei, por sua vez, aproximou-se de Bolsonaro.

Com as cartas que estão na mesa, é forte o efeito gravitacional que levaria o Brasil a se meter na encrenca argentina. Se Bolsonaro não deveria ter se metido na campanha de 2019, o governo de Lula não deve se meter na disputa de 2023. À primeira vista isso parece impossível, até injusto. Seria como tirar o sapato sem tirar a meia.

Para diplomatas competentes, não só isso é possível, como em circunstâncias piores, o Itamaraty já fez a mágica.

Em 1982, os presidentes Leopoldo Galtieri e João Baptista Figueiredo eram bons amigos. Militares brasileiros sequestravam exilados argentinos no Brasil e militares argentinos sequestravam brasileiros em Buenos Aires. O general Galtieri (um bebum) teve sua ideia: invadir as ilhas Falklands, terras perdidas no meio do oceano, governadas pelos ingleses.

A primeira parte foi fácil e ele tomou as Malvinas. Restava a segunda: o que faria a Inglaterra, governada pela primeira-ministra Margaret Thatcher? No dia 23 de abril de 1982, o embaixador do Brasil em Londres, Roberto Campos, informava: "Especula-se que as propostas britânicas estariam divididas em três fases: retirada argentina, período de transição, onde o Reino Unido faria algumas concessões no sentido de uma administração partilhada, e de uma negociação da situação final das ilhas, inclusive da questão da soberania".

No dia seguinte, foi além: "Vários observadores vêm insistindo em que seria muito pouco provável que o Reino Unido inicie operações militares contra a Argentina enquanto estão em curso negociações".

Ilusão do doutor. Thatcher desceu a frota, retomou as ilhas e Galtieri, humilhado, foi mandado para casa. No Itamaraty, estava o chanceler Ramiro Guerreiro, de sapatos e meias. Ele sabia que a aventura militar acabaria em desastre. Tratava-se de dissociar-se da maluquice, sem colocar o Brasil na condição de aliado dos ingleses numa questão sensível para todos os argentinos.

Guerreiro conteve os ímpetos de Figueiredo e dos militares brasileiros aliados da ditadura argentina, com suas dezenas de milhares de mortos. O chanceler Guerreiro era um diplomata discreto. Seu colega Araújo Castro dizia que ele era a única pessoa capaz de dormir durante o próprio discurso.

Por calado, Guerreiro não deixou registro público da sua mágica. Seus detalhes estão nos arquivos do Itamaraty. Passados 41 anos, eles estão disponíveis para quem sente o impulso de se meter na encrenca argentina e na alma aventureira de Javier Milei.


quarta-feira, 20 de julho de 2022

Vidas Paralelas, como diria algum Plutarco de subúrbio - Paulo Roberto de Almeida

 Vidas Paralelas, como diria algum Plutarco de subúrbio

Putin comete seus crimes porque oligarcas russos bilionários foram manietados e colocados a seu serviço. 

Trump conseguiu deformar terrivelmente a democracia americana porque o Partido Republicano se rendeu inteiramente a um trambiqueiro populista e mentiroso.

Bozo só perpetra as suas barbaridades porque corporações de Estado e caciques políticos corruptos e venais obtêm vantagens de uma submissão vergonhosa a um alucinado no comando do poder!

O mal nunca é cometido isoladamente por algum aventureiro de ocasião: sempre existem conivências por parte das elites dominantes. 

Mussolini foi saudado na sua Marcha sobre Roma pelas oligarquias políticas e econômicas como um necessário “salvador da pátria”.

Salazar construiu o seu Estado Novo com a total colaboração dos dirigentes militares.

Hitler assumiu plenos poderes com o apoio dos grandes industriais e financistas da República de Weimar.

Chávez foi eleito entusiasticamente por todos aqueles que queriam se livrar do partidarismo corrupto fundado sobre o maná maldito do petróleo.

Lula tronou impérvio sobre as massas porque soube reproduzir a esperteza marota de Vargas ao ser, ao mesmo tempo, o Pai dos Pobres e a Mãe dos Ricos.

A história é repleta de exemplos desse tipo: e parece que o Brasil se prepara para recrutar novamente Mircea Eliade no caminho de reproduzir o Mito do Eterno Retorno.

Viveremos em círculos em torno de “mais do mesmo”?

Cosi é si vi pare…

Paulo Roberto de Almeida

segunda-feira, 11 de julho de 2022

Ainda há militares em Brasília? - Merval Pereira (O Globo)

 Ainda há militares em Brasília?

Merval Pereira
O Globo, domingo, 10 de julho de 2022

A exacerbação da retórica radicalizada do presidente Bolsonaro à medida que se aproximam as eleições, com indicações de dificuldades quase intransponíveis para sua reeleição, demonstra que ele não está aceitando a derrota e prepara o terreno para uma subversão do resultado. Informações não desmentidas de que a recente reunião ministerial, além da ilegalidade de ter tratado da campanha eleitoral, foi uma exaltação a um golpe de Estado com ares de legalidade, fazem com que o sinal de alerta tenha sido ligado em diversas instituições democráticas, e provocou a denúncia do Observatório para Monitoramento dos Riscos Eleitorais no Brasil à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Bolsonaro ameaçou as eleições novamente na reunião ministerial no Planalto. O caso é mais sério porque o general Braga Netto, ex-ministro da Defesa, estava presente, e o atual ministro da pasta, general Paulo Sergio, respaldou as ameaças, ao afirmar que o TSE não respondeu às demandas das Forças Armadas. O primeiro absurdo é fazer reunião ministerial para tratar de eleições durante o expediente dentro do Palácio do Planalto, e pedir aos ministros que participem da campanha.

Os relatos indicam que o presidente disse que, se as informações pedidas pelas Forças Armadas não forem dadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ele não participará da eleição. Isso é diferente de “não vai ter eleição”, como vinha ameaçando. Pode desistir, se sentir que vai perder já no primeiro turno? Não parece de seu feitio, o que aumenta a possibilidade de que pode tentar decretar um estado de sítio, ou medida semelhante. O que passa pela cabeça dele não pode ser coisa boa, porque está batendo com muita persistência nas urnas eletrônicas, e nos dias mais recentes tem claramente estimulado uma reação de seus seguidores: “Vocês sabem o que têm que fazer”, disse Bolsonaro nada enigmático.

Ele não tem escrúpulo, vai avançando sobre as leis e sobre os limites, e os tribunais ficam numa situação difícil porque, se impugnarem sua candidatura, o que já merecia ter acontecido, tantas são as ilegalidades que comete, irão provocar uma grande reação – que é o que ele quer -, e, se não fizerem nada, permitem o avanço sobre a democracia. Como o Congresso tem a maioria governista e está fazendo manobras para aprovar benesses sociais para ajudá-lo, não há medida de contenção à vista.

Como estamos antevendo uma tentativa antidemocrática de contestação dos resultados da eleição presidencial como a levada adiante pelo então presidente Donald Trump com a invasão do Capitólio em Washington, seria bom também relembrar episódios edificantes das Forças Armadas dos Estados Unidos na contenção dessa tentativa de golpe. A principal autoridade militar dos EUA, o chefe do Estado-Maior Conjunto, general Mark Milley, tão preocupado estava em que o então presidente e seus aliados tentassem um golpe que se uniu a outras autoridades com o objetivo de parar Trump.

Não foi apenas o comunicado oficial colocando de prontidão as Forças Armadas para defender a democracia. O livro dos repórteres do The Washington Post Carol Leonnig e Philip Rucker, ganhadores do Prêmio Pulitzer, intitulado I Alone Can Fix It ( “Só eu posso resolver”, em tradução livre), uma frase usada por Trump que os autores ironizam, descreve como Milley e os outros membros do Estado-Maior tomaram a decisão de renunciar para não cumprir ordens que considerassem “ilegais, perigosas ou imprudentes”.

A obra conta os bastidores do último ano do “catastrófico” governo de um Trump desequilibrado após perder a eleição de 2020. Milley conversou com autoridades e políticos, e garantiu que Trump e seus aliados não conseguiriam fazer nada sem os militares: “Eles podem tentar, mas não vão conseguir. (…) Não dá para fazer isso sem a CIA e o FBI. Nós somos os caras com as armas”.

Ele acreditava que Trump estava fomentando uma agitação com o intuito de invocar a Lei de Insurreição e convocar os militares. Após a insurreição de 6 de janeiro, o livro diz que Milley fez teleconferências diárias com Mark Meadows, chefe de gabinete de Trump, e o então secretário de Estado Mike Pompeo, assim como com a presidente do Congresso, Nancy Pelosi. Quando Trump demitiu o secretário de Defesa Mark Esper em novembro, Pelosi foi um dos vários congressistas que ligaram para o general Milley. “Estamos todos confiando em você”, disse. “Lembre-se de seu juramento”.

Após a insurreição de 6 de janeiro, Pelosi disse ao general que estava preocupada com a possibilidade de que Trump , que ela considerava louco, usasse armas nucleares durante seus últimos dias no cargo. Ele a tranquilizou: “Seguiremos apenas ordens legais. Só faremos coisas que sejam legais, éticas e morais”.

Por que não relembramos esses episódios de resistência democrática de militares, ou ainda o julgamento a que está sendo submetido Donald Trump pelo Congresso dos Estados Unidos, para exorcizar essas ameaças ? A frase famosa “Ainda temos juízes em Berlim”, que enaltece a independência do judiciário a favor de um camponês que estava sendo ameaçado pelo rei Frederico II, merece uma repetição: “ Ainda temos militares em Brasília?”.


sexta-feira, 8 de julho de 2022

Does Democracy Drive Growth? - Greater Pacific, London and Mumbai

  

Greater Pacific, Londres e Mumbai – 7.7.2022

Does Democracy Drive Growth? Can China Succeed Without it and India Prosper Under it?

 

The 20th Century has undoubtedly been the century of democracy. The past 100 years have seen democratic government move from being an anomaly for modern states to being the rule, with the number of democratic countries in the world increasing from under 10 in 1900 to over 120 in 2007, covering nearly 60% of the world’s population. The fall of Communism late in the 20th century was seen as the final triumph for liberal democracy and the capitalist economic system it supported. However, in the minds of many, China’s economic rise over the past 30 years cast doubt over the superiority of democratic government, at least with regards to creating economic growth and prosperity, its own brand of state capitalism having delivered decades of double digit GDP growth. India in contrast stood as a developing country that failed to demonstrate the economic growth from its democracy. Today, developing countries appear to have the choice to reject liberal democracy without rejecting economic growth, by following China’s authoritarian-based development model. However, the question of democracy and the role of freedom in economic growth has resurfaced as China sees its own growth slowing and struggles to once again re-invent its economy while preserving its authoritarian political institutions. In contrast, India’s growth has started to increase under its new leadership. Understanding freedom’s impact on economic development appears to once again be critical for both the likely economic trajectory of major economies such as China and India and indeed for the continued growth of democracy in the world, which at least in Western minds, is not just an economic growth enabler but also a fundamental human right.

 

Do Democracy and Freedom Drive Economic Growth?

 

This seemingly straightforward question has sparked much debate and analysis, which has typically sought to separate the impacts of democracy (defined as "a system of government in which all the people…are involved in making decisions about its affairs” ) from that of freedom. In terms of the former, strong arguments have been voiced both in favour of and against democracy’s impact on growth. Its supporters point to the developed world and the OECD in particular, arguing that only democracies have to date created post-industrial economies and societies. Its detractors point to China, who under authoritarian leadership has embarked on one of history’s most amazing development feats, and to countries such as India, which despite (or because of, they argue) its democracy has suffered from low growth for much of its modern history. Logical arguments about democracy’s impact or lack thereof on growth support both sides of the debate. Supporters of democracy point to the accountability it creates for leaders and the checks and balances on their power that it instils in addition to democracy’s broader promotion of fundamental human rights and the dignity of the individual, which are (more or less) universally recognised as worthy goals in and of themselves. Democracy’s detractors on the other hand point to the distorting effects that elections give rise to, ranging from a skewed focus on short-term priorities over long term needs to the undemocratic impact of special interest groups shaping government policy.

While it is clear that democracies (and politically free) states are on average richer than authoritarian and unfree states, studies that have tried to statistically quantify democracy’s impact on economic growth, have been inconclusive. This is should be no surprise given the complexity in separating cause and effect in topics related to social science and impact of variables other than freedom impacting economic growth. In broad-based studies, authoritarian states include the majority of the world’s high growth oil states, while the democratic states include among others African states at the time of their independence, then lacking the basic institutions required to ensure security, stability and development.

More straightforward however, is the question of economic freedom on economic (GDP) growth, which has been clearly demonstrated. The key transmission mechanisms whereby economic freedom drives growth include the creation of strong institutions (including property rights, the rule of law and free markets), a focus on creating and unlocking value from human capital and the reduced importance of government consumption in the economy. Some combination of these factors, if not all of them, have been critical components to the successful economic development of every major economy in the world during the past 50 years. Importantly, these growth promoting economic freedoms are not necessarily accompanied by political freedoms or democratic government: Chile and South Korea (not to mention China), for example in the early phases of their development implemented economic freedoms under authoritarian regimes and still grew successfully as a result. Further, as the events of the Global Financial Crisis has shown, economic freedom, particularly an excess of freedom in the form of a fundamental lack of regulation, can have high economic costs, enabling extreme cycles, market bubbles and subsequent crashes. However, despite big swings, these freedoms also create systems of enterprise that are self-balancing and end up putting the country and its people back on an upward trajectory of growth, which explains their enduring success (and the corresponding failure of communist economic planning).

While democracy’s statistical impact on economic growth may remain uncertain, economic growth’s impact on democracy is clear, and strongly positive. The increased standards of living that result from growth (which are a result of economic freedoms) invariably drive demands for political rights too, and only a few countries have been able to resist the demands of its citizens for political reforms over the long term. What is less clear is what happens to growth once these political reforms and freedoms are implemented and whether democratic transitions on balance hurt or help further economic growth, especially in the short term.

Understanding this relationship is critical to understanding the economic value of democracy, (its fundamental value as a fundamental human right aside). Is democracy a “luxury good” that, while valuable for its own sake, can only be afforded past a given level of national wealth or is it a required cost in ensuring sustainable growth above a certain level of development that virtually all countries need to make? The answer to this question likely depends not only on what happened to GDP growth after democratisation but also on at what levels of GDP the transition itself took place at. History has shown that democratisation in the absence of strong institutions and a base of economic performance has led to serious economic and political disruptions and even regime failure in some cases (e.g. post-colonial Africa and certain former members of the USSR). What is more, the process of democratisation by revolution and mass uprising can destabilise existing institutions, thereby depressing economic development and undermining the political reform process itself, as the lessons of the Arab Spring in countries such as Egypt demonstrate. This is by no means to say that the choice of people to rise up en masse is not a legitimate part of the process of social-political change; it is to recognize that it can lead to economic and political setbacks and unintended consequences. The key questions to ask therefore are (i) where along the development curve does the pressure to democratise sustainably build up, (ii) whether democratising at this stage drives or restricts further GDP growth and (iii) how long do the adjustment pains last after which one can expect the trajectory to continue to be an upward one.

These questions are highly relevant to both India and China: India has (many believe) paid a high price in the past for being a democracy, and the key questions for it are whether and where along its own development curve the hoped for “democratic dividend” will kick in. China on the other hand has for a long time enjoyed economic success from having implemented many of the economic policies and (to a lesser extent) freedoms that help growth while continuing to run an authoritarian political regime. Given the dramatic shift down of China’s economy, markets and currency, for China observers (if not China itself), the question of the value of democracy to continued prosperity and when the demand for democracy is likely to be at critical or irresistible point is critical, given that successive leaderships have appeared to be committed to maintaining the political status quo indefinitely, regardless of economic development levels and growth considerations.

 

When Do States Democratise?

 

What is undeniably true is that there are only a few examples of developed and at least moderately wealthy countries that are not democratic and politically free. The table below captures all of the countries with GDP/capita levels above US$7,500, and compares economic prosperity with political freedom. While this does not provide an indication of when and how countries have democratised during their development, it does show that the pressure towards political liberalisation has been resisted by only a small number of well to do countries.

A closer look at the undemocratic outliers above reveals their being in one of two groups, either resource rich states (e.g. the Gulf States and other oil producers) or countries that have delivered consistent and a few nations with long-term high economic growth (e.g. China, Turkey, and to a lesser degree Singapore).Resource-rich states of course either directly own the natural resources in question or generate the majority of their tax income from them, making them less dependent on, and receptive to its citizens’ wishes, impacting the balance of power between state and society. However, the Arab Spring has demonstrated that this cannot be taken for granted indefinitely, particularly in states with large young and increasingly well connected populations with access to information. High growth states, on the other hand, have a powerful currency in the form of increasing household wealth that they can offer its citizens in exchange for continuing to forfeit increasing political freedom. The former of these models is of course dependent on the continued production of natural resources, while the latter model is dependent on delivering consistent and on-going growth. The table on the right captures the long-term growth rates and effective resource dependency of the outliers, indicating their grouping in one or the other of these categories.

 

Para acessar íntegra, com gráficos e quadros:

https://www.greaterpacificcapital.com/thought-leadership/does-democracy-drive-growth-can-china-succeed-without-it-and-india-prosper-under-it

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Como andamos para trás! - Embaixador Sergio Abreu e Lima Florêncio

 Como andamos para trás!

Embaixador Sergio Abreu e Lima Florêncio
Autor do livro Diplomacia, Revolução e Afetos: de Vila Isabel a Teerã (Curitiba: Appris, 2022)
Brasília, 20/04/2022
Em 1976, diante de provas irrefutáveis da prática de tortura pela ditadura militar, o Almirante Júlio Bierrenbach, meu tio em segundo grau, Ministro do Superior Tribunal Militar - STM, afirmava. " Não podemos admitir que o homem, depois de preso, tenha sua integridade fisica atingida por indivíduos covardes, na maioria das vezes, de pior caráter que o encarcerado."
Em 2022, vem a público mais de 10 mil horas de gravação de sessões do STM. Foram examinados na época casos de tortura que provocaram a indignação de Ministros como Julio Bierrenbach e Rodrigo Otavio.
Diante de tão vergonhosas evidências, o atual Presidente do STM, Luis Carlos Gomes Matos, declara. " Simplesmente ignoramos uma notícia tendenciosa daquela, que nós sabemos o motivo, né?"
Logo em seguida, o Vice-Presidente da República , com ar de deboche, acrescenta. " Vai tirar do túmulo?"
O Vice e o Presidente da República, repetidas vezes, afirmam sua admiração pelo oficial Brilhante Ustra, um dos maiores torturadores no regime militar.
Ao comparar as declarações dos Ministros do STM em 1976, com a reação do atual Presidente do STM e com o deboche seguido de riso do Vice- Presidente, em 2022, a conclusão é inescapável. Como andamos para trás!
Triste Brasil.


segunda-feira, 28 de junho de 2021

Sobre os 100 anos do Partido Comunista da China, 1921-2021 - Paulo Roberto de Almeida

 Sobre os 100 anos do Partido Comunista da China, 1921-2021 

 

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivoregistrar um artigo de opiniãofinalidadeinformação pública]

  

O PCC, ao chegar aos 100 anos, se sente orgulhoso por tudo o que fez de progressos materiais na China atual. Esquece as horas mais sombrias do maoísmo demencial, com o sacrifício de dezenas de milhões de chineses, e a sempre persistente ditadura, nos últimos 4 mil anos na verdade, para ressaltar os sucessos do presente.

De fato, fez muito, nos últimos 30 ou 40 anos, em termos de progressos materiais e de realizações sociais, arrancando centenas de milhões de chineses, sobretudo rurícolas (80% da população até os anos 1980), de uma miséria abjeta para uma pobreza aceitável e, agora, para modestos patamares de bem-estar social (com milhares de milionários e dezenas de bilionários e grande concentração de renda, mas progressos em todas as faixas). 

Tudo isso aderindo à economia de mercado, desprezada por Mao e outros marxistas ignorantes, e fazendo dos atuais membros do Partido perfeitos mandarins, ao estilo dos funcionários imperiais de um passado extremamente remoto.

Sim, a China é hoje a maior economia de mercado do mundo, possuindo estatais, planejamento setorial e monopólios — como várias democracias capitalistas —, apenas que dirigida por um Partido Comunista que detém o monopólio do poder e que pretende estar construindo um “socialismo com características chinesas”.

Não, não está: está construindo um capitalismo com características chinesas, o que significa um regime político centralizado e altamente burocratizado, talvez a “gaiola de ferro” de que falava Max Weber, que também fez as suas incursões pelo “despotismo oriental”.

A China atual não é mais despótica, mas sim autoritária, tem as suas formas internas de escolha democrática de representantes (não todos do PCC) e detesta que estrangeiros lhe venham dar lições de democracia ou de direitos humanos. Ela foi muito humilhada pelas grandes potências ocidentais, e barbaramente estraçalhada pelo Japão fascista, durante seu largo período de declínio político e econômico, e não aceita qualquer arrogância imperial, depois do término dos tratados desiguais (que no seu caso durou até 1943). 

Na verdade, foi o PCC que restabeleceu a plena soberania da China (totalmente ilusória sob Chiang Kai-shek) e construiu a vibrante economia de mercado, totalmente inserida na interdependência global. 

Ela não ameaça a paz e a segurança internacionais, embora existam pendências que ela considera como sendo de sua inteira soberania — Hong Kong, Taiwan, Tibete, Xinjiang — que potências ocidentais (que fizeram muito pior no seu passado colonialista e imperialista) pretendem sinalizar como sendo “violações do Direito Internacional”, ao lado de disputas no Mar “do Japão” e do “Sul da China”, nas quais ela assume a defesa acirrada de seus interesses, desprezando inclusive resoluções da CIJ-Haia.

Um balanço objetivo das realizações do PCC não pode deixar de reconhecer as imensas realizações alcançadas sob a sua autoridade incontrastável e ditatorial. Um regime ao estilo do Kuomintang, ou seja, uma República burguesa, corrupta e disfuncional, teria obtido os mesmos êxitos — abstraindo-se os anos tirânicos e demenciais do maoísmo — que o regime totalitário e atualmente autoritário do PCC? 

É muito improvável que o conseguisse num tempo absolutamente recorde de 30 ou 40 anos, ainda que talvez o tivesse conseguido em maior período de tempo — talvez cem anos —, com menor sacrifício das liberdades democráticas. Mas o que a China do PCC fez em matéria de progressos tecnológicos e de mudanças sociais é excepcional em toda a história da Humanidade. Muito disso não se deve exclusivamente ou essencialmente ao PCC, e sim à extraordinária energia inventiva e disposição para o trabalho do povo chinês, uma vez liberto das idiotices do maoísmo no terreno econômico. Registre-se que pelo seu atraso — temporal e estrutural — o “comunismo” chinês foi mais superficial do que o regime soviético, destruindo menos as instituições tradicionais e o substrato cultural do povo chinês do que o fez o stalinismo totalitário na Rússia.

Creio, pessoalmente, que não se deve julgar a China pelos parâmetros ocidentais no campo do poder político, seja pelo simplismo infantil dos “democratismos” dos ocidentais, seja mesmo pelas explicações mais sofisticadas à la Barrington Moore, por exemplo. 

A história é sempre única e original, e se desenvolve pelas vias mais surpreendentes, avançando com um velho carro de bois, com rodas desequilibradas por uma estrada muito esburacada, para usar uma imagem do historiador britânico Lawrence Stone.

Se tivéssemos de dar notas ao PCC pelos seus primeiros cem anos, eu arriscaria no máximo 30, na primeira metade do século XX, menos do que 20 sob o maoísmo demencial, talvez 30 sob Deng Xiaoping, mais de 40 ou mesmo 50 na direção colegiada e rotativa que se seguiu, e provavelmente 70 nos primeiros anos da era Xi Jinping, recuando sensivelmente depois que ele se tornou “imperador”. Mas aqui seria preciso distinguir entre as realizações materiais — absolutamente impressionantes, mesmo fulgurantes nos últimos anos — e o reforço do monopólio autoritário no campo político. O que não deixa de se encaixar na longa história do “despotismo oriental”, embora com progressos materiais para o seu povo que jamais existiram nos 4 mil anos de história de uma civilização extremamente sofisticada.

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3938, 28 de junho de 2021


 

quarta-feira, 31 de março de 2021

Ditadura militar: nota zero em democracia, e zero também em economia - Felippe Hermes

 Felippe Hermes

Não há pontos positivos na ditadura – nem mesmo a economia no período

Período marca o início de um intervencionismo sem fim, responsável por produzir a ilusão, que reina até hoje, de que gerou evolução ao país, ao menos no campo econômico