O acordo entre Mercosul e União Europeia
O Estado de S. Paulo, 4/08/2019 (Blog de Fausto Macedo)
No fim do mês de junho, praticamente no último dia do semestre de 2019, a comunidade empresarial recebe a notícia: a conclusão do acordo entre a União Europeia e o Mercosul. Um mercado gigantesco que abrange quase 800 milhões de pessoas . Quando retiramos a população brasileira dessa soma, estamos avaliando que as indústrias brasileiras têm à vista 600 milhões de consumidores finais. Devemos lembrar que é altamente provável também uma reforma no Mercosul, para facilitar as trocas comerciais intrabloco, o que aumenta ainda mais a expectativa de uma maior abertura comercial.
Antes que sejam criadas expectativas sobre o propósito do artigo, não tecerei críticas ou elogios ao acordo, mas o fato é que ele, mais cedo ou mais tarde, avançará nos parlamentos envolvidos. Existe à frente pelo menos três anos para que o acordo ratificado pela União Europeia e pelo Brasil seja internalizado e comece a abertura comercial, que levará entre dez a quinze anos para ser concluída. Então, pensando em “controlar o próprio destino”, ao invés de pensar que está fadado ao fracasso, como as empresas brasileiras poderiam preparar-se para enfrentar a tão conhecida competitiva indústria europeia?
O primeiro ponto a ser citado é que as empresas necessitam conhecer as próprias ineficiências. Todas as possuem, sem exceção. Mas quais são? Quanto custa cada uma dessas ineficiências? Raramente os gestores sabem responder a essas questões. A remodelagem de processos, independentemente de qual ferramenta aplicada, é extremamente bem-vinda, pois impulsionará os líderes a tomarem ciência sobre os problemas e buscar soluções para esses. Ao conhecer o processo como um todo, será mais fácil a identificação dos problemas-raízes e a tomada de decisão terá maior qualidade.
Provavelmente, será possível inspirar-se em estudos de casos ou basear-se na experiência de bons profissionais para resolver os problemas-raízes. Mas, observando a 4ª Revolução Industrial, as soluções também poderiam envolver as novas tecnologias. Como exemplos: o desenvolvimento de plataformas blockchain para o compartilhamento de informações entre os intervenientes e o aumento da rastreabilidade da mercadoria, desde o fabricante até o comprador; a automatização de processos de exportação e de importação, principalmente para a elaboração de documentos padrões.
Para empresas que não possuem sistemas robustos e flexíveis, esse momento apresenta-se como uma grande oportunidade (e motivo) para implementá-los. Duas perguntas simples a serem respondidas internamente: quanto tempo é desperdiçado em etapas que seriam facilmente automatizadas? Quantas multas foram aplicadas por algum órgão que poderiam ter sido evitadas se um sistema tivesse alertado sobre determinada ação?
Aliás, um alto volume de penalidades está relacionado a não conformidades da utilização de regimes especiais. Essas multas prejudicam totalmente os benefícios previstos e calculados no momento da implementação desses nas operações de comércio exterior, com destaque a RECOF, Drawback e REPETRO. Devemos destacar que esses regimes serão vitais para que as empresas aumentem (ou mantenham) a competitividade internacional.
A implementação de um regime especial ou do supracitado programa pode ser encarado como uma inovação interna. Entretanto, a empresa deve arriscar-se. Para ser competitivo internacionalmente, as empresas devem tornar-se mais inovadoras. Tomemos um extremo cuidado com o autoengano de “sou inovador” ou simplesmente indicar nos valores da empresa e não implementar uma cultura de inovação. Isso não está limitado a um departamento de Pesquisa e Desenvolvimento. Essa cultura deve ser disseminada em toda a estrutura da empresa. O ambiente interno deve respirar inovação, independentemente da indústria. Observem que a inovação pode estar atrelada, absolutamente, a todos os tópicos anteriores. Para isso realmente tornar-se uma realidade, um projeto de mudança de cultura deve ser implementado.
Por fim e de extrema importância, o novo ambiente de comércio exterior passará obrigatoriamente pela valorização do profissional de comércio exterior. Geralmente, o comércio exterior é entendido como um anexo da logística. Portanto, não necessariamente é encarado como um ponto crucial para a organização. Na próxima década, equipes cada vez mais competentes, eficientes e criativas, que entendam a tecnologia como suporte e não como um rival às próprias atividades desempenhadas internamente, serão vitais para tornar a empresa cada vez mais competitiva.
Sabemos perfeitamente que o Governo também necessita fazer o seu papel, com a implementação rápida de políticas industriais, a diminuição de taxas de juros, a simplificação de processos (com destaque para o Portal Único e demais compromissos assumidos perante o Acordo de Facilitação do Comércio), entre outras etapas. Mas, as empresas não devem esperar para iniciar projetos internos para tornarem-se mais competitivas. Motivos para isso não faltam.
* Yuri da Cunha é especialista de comércio exterior na eCOMEX – NSI
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