domingo, 10 de junho de 2012

A tragedia educacional brasileira: piorando em todos os níveis, do pre ao pos - Simon Schwartzman

Um artigo do conhecido especialista em educação, precedido de um comentário pessoal de meu amigo Mauricio Dias David: 



Simon Schwartzman é um dos mais respeitados sociólogos brasileiros. E um grande especialista em educação. Esteve também um período à frente do IBGE, nos anos 90. Tudo o que o Simon escreve merece uma reflexão atenta. Faz alguns anos, em um almoço em uma tarde de sábado na casa da Ana Célia e do Antonio de Barros Castro, em Itaipava, êle me comentou a sua receita para o sucesso da sua administração à frente do IBGE : " agi como uma rainha da Inglaterra, constituí uma boa diretoria de técnicos e procurava interferir o mais mínimo possível na administração da instituição". Adequados preceitos, cuja sabedoria se ressalta ainda mais em uma época de administrações intervencionistas em que o "professor" tal ou qual ( fico indignado quando tal qualificativo é usado fora do seu contexto de homem dedicado à propagação do saber...) é glorificado por muitos por ficar apontando "campeões nacionais" aqui e acolá... Mas voltando ao texto do Simon, sua leitura é proveitosa e incita à reflexão. Mas as suas conclusões são assustadoras ( pelo menos para quem se preocupa com o futuro da educação pública no Brasil) : " o mais provável é que as universidades federais continuem a se esgarçar, com greves sucessivas e piora nas condições de trabalho dos professores e de estudo para os alunos, abrindo espaço para que o setor privado ocupe cada vez mais o segmento de educação superior de qualidade, como ocorreu no passado com o ensino médio.". Previsões assustadoras e ameaçadoras, justamente no momento em que o nosso País vive jornadas cruciais para a definição do papel da educação, da pesquisa e da inovação na definição do futuro que nos será permitido construir...
Mauricio Dias David

Posted: 09 Jun 2012 03:25 PM PDT
A greve das universidades federais não é um evento isolado, mas parte de um processo que, infelizmente, tem tudo para acabar mal. Para entender, é importante lembrar que, diferentemente da maioria dos outros países da América Latina, o Brasil nunca teve grandes universidades nacionais abertas para todos que concluem o ensino médio, e optou, desde o início, por universidades seletivas, abrindo espaço para o crescimento cada vez maior do ensino superior privado, que, com seus cursos noturnos, de baixo custo e sem vestibulares difíceis, acabou atendendo à grande demanda por ensino superior de pessoas mais pobres e sem condições passar nos vestibulares e estudar de dia, que o setor público não atendia. Hoje, apesar do esforço do governo federal em aumentar a matrícula em suas universidades, 75% dos estudantes estão do setor privado.
Com um setor público pequeno e seletivo, as universidades brasileiras conseguiram criar um corpo de professores de tempo integral e dedicação exclusiva, desenvolver a pós-graduação e criar muitos cursos de qualidade, coisas que quase nenhum outro país da região conseguiu. Mas, como parte do serviço público, elas possuem um sistema homogêneo de contratos de trabalho, regras e promoção de professores e programas de ensino que não tomam em conta o fato de que elas são, na verdade, muito diferentes entre si – algumas têm programas de qualidade de graduação e pós-graduação em áreas dispendiosas como engenharia e medicina e fazem pesquisas relevantes, enquanto outras simplesmente copiam os modelos organizacionais, as regras de funcionamento e os custos das primeiras, com muito pouco de sua cultura institucional e conteúdos. Com a generalização dos contratos de tempo integral e a estabilidade dos professores, os custos subiram, sem mecanismos para controlar a qualidade e o uso adequado de recursos, que variam imensamente de um lugar para outro, independentemente de resultados.
Na década de 90, com Paulo Renato de Souza como Ministro da Educação, houve algumas tentativas de colocar esta situação sob controle, introduzindo um sistema de avaliação de resultados (o provão), vinculando parte do salario dos professores ao número de aulas dadas, e tentando introduzir legislação dando às universidades autonomia não somente para gastar, mas também para assumir a responsabilidade pelo uso eficiente dos recursos públicos através de orçamentos globais, e tentando fazer valer a prerrogativa do governo federal de escolher reitores a partir das listas tríplices selecionadas pelas universidades. Estas políticas encontraram grande resistência, os orçamentos globais nunca foram instituídos, o “provão” na prática só afetou alguns segmentos do setor privado, e o conflito entre as universidades e o governo no episódio da nomeação do reitor da UFRJ, em um tempo em que os salários não aumentavam, mobilizou grande parte dos professores, alunos e administradores das universidades federais contra o Ministério da Educação e o governo Fernando Henrique Cardoso.
Nos primeiros anos do governo Lula as relações das universidades federais com o governo passaram por um período de lua de mel: tudo era concedido, e nada era cobrado. A gratificação de docência foi incorporada aos salários, que passaram a crescer graças à melhora da economia e do aumento geral dos gastos públicos; o “provão” foi substituído por um pretencioso sistema de avaliação, o SINAES, que demorou em se organizar e continuou sem afetar as instituições federais; e a nomeação dos reitores eleitos internamente pelas universidades se transformou em regra. Para atender à demanda crescente por educação superior, o governo comprou vagas no setor privado com o Prouni, em troca de isenção de impostos, aumentando cada vez mais a proporção de estudantes no setor privado. Ao mesmo tempo, o governo iniciava uma política de expansão do acesso às instituições federais, primeiro com a introdução de cotas raciais e sociais, depois com a criação de novas instituições e a abertura de novas sedes das universidades existentes, e finalmente com o programa Reuni que, em troca de mais recursos, exigiu que as universidades federais praticamente duplicassem o número de vagas abrindo novos cursos, sobretudo noturnos, e aumentassem o número de aulas dadas por professor. Ao mesmo tempo, os antigos centros federais de educação tecnológica, os CEFETs, foram transformados em Institutos Federais de Tecnologia e equiparados às universidades em termos de custos e prerrogativas. Segundo dados do INEP, o gasto por aluno do governo federal passou de 9 mil reais ao ano em 2001 para 18 mil em 2010, acompanhando a inflação. Como o número de alunos do sistema federal duplicou nestes dez anos, devendo estar hoje em cerca de um milhão, os custos do sistema aumentaram na mesma proporção em termos reais, embora o número de formados tenha aumentado pouco. Só o programa REUNI custou 4 bilhões de reais, metade para investimentos e outra metade que passou a se incorporar ao orçamento das universidades federais.
Esta política de expansão acelerada não obedeceu a nenhum plano ou avaliação cuidadosa sobre prioridades, abrindo instituições aonde não havia demanda, admitindo alunos antes de existirem os edifícios e instalações adequadas, forçando as universidades a criar cursos noturnos e contratar mais professores mesmo quando não haviam candidatos qualificados, e sobretudo sem preparar as universidades para lidar com alunos que chegavam do ensino médio cada vez menos preparados. Ao mesmo tempo, a necessidade de contenção de gastos do governo Dilma tornou impossível atender às expectativas de aumento salarial dos professores, gerando um clima generalizado de insatisfação revelado pela greve.
É possível que a greve leve a algumas concessões salariais por parte do governo federal, como costuma acontecer, mas o efeito mais visível deste tipo de movimento é o de prejudicar os estudantes e professores mais comprometidos com o estudo e pesquisa, levando à desmoralização das instituições, sem que as questões de fundo sejam tocadas. A principal questão de fundo é a impossibilidade de o setor público continuar se expandindo e aumentando seus custos sem modificar profundamente seus objetivos e formas de atuação, diferenciando as instituições dedicadas à pesquisa, à pós-graduação e ao ensino superior de alta qualidade, que são necessariamente mais caras e centradas em sistema de mérito, das instituições dedicadas ao ensino de massas em carreiras menos exigentes, que é onde o setor privado atua com custos muito menores e qualidade pelo menos equivalente. Esta é uma tese que provoca enorme reação nas instituições federais e os sindicatos docentes, que querem sempre continuar iguais e niveladas por cima em seus direitos, embora esta nivelação não exista em relação aos resultados. Mas a conta, simplesmente, não fecha.
Uma diferenciação efetiva exigiria limitar os contratos de trabalho de tempo integral e dedicação exclusiva às instituições que consigam demonstrar excelência em pesquisa, pós-graduação e formação profissional; introduzir novas tecnologias de ensino de massas e à distancia, aumentando fortemente o número de alunos por professor; e criar mecanismos efetivos que estimulem as instituições a definir seus objetivos, trabalhar para eles, e receber recursos na proporção de seus resultados. Um exemplo do que poderia ser feito é o processo de Bologna que está ocorrendo na Europa, que cria um primeiro estágio de educação de superior de massas de três anos, com muitas opções, e depois as instituições se especializam em oferecer cursos avançados de tipo profissional e científico conforme sua vocação e competência. É necessário, também, criar condições e estimular as instituições federais a buscar recursos próprios, inclusive cobrando anuidades dos alunos que podem pagar. Esta diferenciação exigiria que as universidades federais fossem muito mais autônomas e responsaveis pelos seus resultados do que são hoje, sobretudo na gestão de seus recursos humanos e financeiros, o que se torna impraticável quando os salários dos professores são negociados diretamente entre os sindicatos e o Ministério da Educação e as tentativas de diferenciar benefícios e financiamento em função do desempenho são sistematicamente combatidas.
Se nada disto for feito, o mais provável é que as universidades federais continuem a se esgarçar, com greves sucessivas e piora nas condições de trabalho dos professores e de estudo para os alunos, abrindo espaço para que o setor privado ocupe cada vez mais o segmento de educação superior de qualidade, como ocorreu no passado com o ensino médio.
(Simon Schwartzman)

Ode ao jumento - Gilles Lapouge

Um verdadeiro hino de amor ao jumento, tanto o francês, quando o jegue brasileiro. No Brasil, já saíram em defesa do jumento brasileiro ao se aventar a hipótese de serem exportados os simpáticos animais para a China, para fins, digamos, alimentares. Para quê? Bastou isso para deslanchar um movimento de solidariedade e de oposição a esse ignóbil ato de comércio exterior.
Aqui, o conhecido jornalista francês, correspondente do Estadão na França, sai em defesa do mais útil animal de toda a história humana.
Será verdade?


Ao jegue, com carinho

Submisso e glorioso, resignado e irredutível, é como se ele nos olhasse, compadecido, e dissesse: 'Não se preocupe. Vai passar'

Gilles Lapouge
Estado de S.Paulo, 10 de junho de 2012
Está na hora de lembrar dos jumentos. Os jornais falam muito do Festival de Cannes, do aquecimento global, do naufrágio da Grécia, mas aos jumentos quase ninguém se refere. O cavalo é mais favorecido. É sempre o foco da atenção pois tem elegância, brilho. Domingo vai às corridas, onde caminha gingando como uma estrela de cinema. Os homens usam belas calças e as mulheres lindos chapéus para montar nele.
O jumento não tem a mesma presença. É chamado de "burro" e de "asno". Palavras ofensivas. Tem cor de estopa. É desnutrido. Por que esse rosário de afrontas? Se eu fosse jumento, faria um motim. Brigitte Bardot falou recentemente dos jumentos, os do Brasil. Ela ficou furiosa ao saber que o Rio Grande do Norte, visando a criar uma nova fonte de renda, teria aceitado exportar 300 mil jumentos por ano para a China para nutrir as indústrias alimentícias e cosméticas desse país. Eu compartilho da cólera de Brigitte.
A rarefação dos jumentos nos campos - no Nordeste brasileiro, no sul da França, mesmo na Palestina - sempre me pareceu uma desgraça. Fizemos tanta coisa juntos, eles e nós - as pirâmides, as minas, as rodas d'água, as catedrais, a agricultura...
O jumento também transformou uma desvantagem em mérito. Ele sofre de um problema de vértebras: tem uma a menos. Mas, como é dono de um espírito dócil, aceitou esse infortúnio, que lhe dá pavor de correr e lhe tira o fôlego quando o dono o faz trotar. Na verdade, ele transforma essa fraqueza em força. Como suas vértebras dorsais são bastante desenvolvidas, seu dorso é saliente e seus rins são fortes. Essa constituição singular se ajusta à sela, de madeira ou de couro.
Todas essa inferioridade e a maneira com que ele teve de assumi-la compuseram o destino do jumento. Ele não é bom para correr e não sabe galopar. Em compensação é ótimo para puxar charrete, mover as rodas que trazem a água para a superfície no deserto, carregar feixes de trigo e sacos de terra e pedra. É bom também para descer ao fundo das minas de carvão, onde, muitas vezes, de tanto viver no escuro, acaba ficando cego.
O jumento participou de todas as aventuras do homem. Suou por nós. Perdeu seu fôlego por nós. Morreu sob nossos golpes. E, quando os engenheiros inventaram o motor de explosão, a moto, o trator e o caminhão, adeus jumento! Adeus, velho servidor! Vamos vendê-lo para a China para que as pessoas o comam. Nós o jogamos como se joga uma roupa esgarçada, uma gilete sem corte. Adeus, velho amigo, mas você não serve para mais nada!
Gosto muito dos jumentos do Nordeste brasileiro. Venho testemunhando sua derrota há 40 anos. E vi esta aberração: motos ruidosas, nauseabundas, perigosas, substituindo jumentos para cercar os rebanhos, em meio a um atroz odor de combustível. Em 1974 fiz uma longa viagem pelo Nordeste do Brasil. Sozinho. Fui de cidade em cidade, ao acaso, segundo meu desejo, em ônibus que rodavam 10, 12 horas por dia. Os jumentos já começavam a desaparecer, mas ainda eram numerosos. Faziam parte da paisagem nordestina. Quando chegava aos vilarejos assolados pela seca, eu ia cumprimentá-los. Eles me lembravam aqueles jumentos que conheci e amei na minha infância, não no Brasil, mas na França, nas montanhas austeras e pedregosas da Provença. Eu falava com os jumentos de João Pessoa ou de Epitácio Pessoa. Temos boas lembranças em comum, os jumentos do Nordeste e eu. Hoje, quando atravesso esses lugares ermos, em meio à barulheira dos caminhões e das motos, procuro por todo o lado as orelhas, as belas orelhas sensíveis, e elas sumiram.
Eu respirava seu odor. Olhava seus grandes olhos melancólicos e era como se um tapete mágico me conduzisse de volta aos tempos felizes da infância. Foi nessas longas noites no Nordeste que compreendi por que tanto amava os jumentos. Do outro lado do mundo, encontrei os mesmos animais, tão bonitos, tão fortes, tão resignados. Como seus congêneres da Provença, os pequenos jumentos do Nordeste se aproximavam de mim e cheiravam minhas mãos. Eles gostavam do meu cheiro, e eu do deles. Certas noites, nesse longo périplo solitário entre Salvador e Natal, Recife e Terezinha, sentia uma certa angústia pelo fato de estar só. Então ia ver os jumentos. Tínhamos este ponto em comum: detesto a solidão, os jumentos, também. Se um jumento está sem companhia, fica infeliz. Entedia-se a ponto de parecer que pode morrer de tédio.
O jumento não é só corajoso e útil: também tem caráter. Apesar de sua cortesia e indulgência com relação às loucuras e vilanias dos homens, jamais transige em questão de princípios. Na Bíblia, uma jumenta impediu que seu senhor, o adivinho Balaam, bloqueasse a passagem do povo de Israel quando este se aproximava da Terra Prometida. Naquele dia, os homens estiveram muito perto do desastre. Se a jumenta não tivesse dado uns bons coices em Balaam, os judeus jamais teriam continuado sua epopeia e isso teria provocado uma grande confusão na Bíblia, na história religiosa e em toda a História. Teríamos que começar tudo do zero. E Deus, como iria se sair dessa?
Em recompensa, o jumento teve o privilégio de aquecer com seu sopro o Menino Jesus na manjedoura. O jumento também teve a honra de servir de montaria para Cristo quando Ele entrou em Jerusalém, antes da Paixão. Jesus ficou muito emocionado e marcou o dorso do jumento com um sinal da cruz. Na Provença nós chamamos de "cruz de Santo André". Fiquei comovido ao encontrar nos jegues do Nordeste o mesmo sinal da cruz.
O jumento é bem considerado pelos deuses. Enquanto os homens o condenam ao insulto, ao desprezo, à pancada e ao trabalho perpétuo, as sociedades religiosas têm consideração com ele. A história santa está repleta de jumentos. A Bíblia o cita 133 vezes, um recorde entre os animais. Em Josué, ficamos sabendo que o jumento foi montado por judeus da mais alta sociedade, príncipes e damas. Cada patriarca tinha seu jumento. Abigail, que vai ao encontro de David, sela seu jumento (Samuel, 25) Zorobabel, depois da Babilônia retorna a Jerusalém montado no dele. Sansão, quando 3 mil filisteus o atacam, usa uma queixada de jumento para revidar e os mata.
O jumento vai do Velho Testamento para o Novo. Jesus escolheu um burrico, não um cavalo, para entrar em Jerusalém. Em Roma, os pagãos ridicularizavam a religião cristã por causa de sua amizade com os jumentos. Um pouco mais tarde, encontramos muitos místicos cristãos no Egito que se entregavam a penitências terríveis: viver sentados na ponta de uma coluna de pedra, numa árvore, quase imersos num pântano ou então se mantendo de tal modo imóveis que os pássaros faziam ninho em suas mãos. Os pagãos se divertem com esses fanáticos. E os chamam de "jumentos".
É verdade que mesmo em países cristãos os jumentos foram às vezes maltratados. Na Espanha, quando Isabel, a Católica, mandava queimar uma feiticeira, esta era amarrada nua num burro para que, à pena de morte, se adicionasse o suplício de partir da vida no dorso de um animal desprezado e obsceno. Na França os professores durante muito tempo colocavam um chapéu de asno na cabeça dos maus alunos. Por toda parte o jumento foi relegado ao desprezo e à injúria. Ao longo da história (salvo nos países do Oriente Médio), ele esteve no mais baixo nível da sociedade. Pior: foi sempre o bode expiatório dos mais humildes, o doméstico dos domésticos, o escravo dos escravos, o proletário dos proletários.
Alguns intelectuais foram em seu socorro. Victor Hugo escreveu, no fim da vida, um imenso poema glorificando o jumento. O grande historiador Michelet sublinhou o papel do burro na história dos homens, e o grande naturalista Buffon defendeu o jumento contra o cavalo. O filósofo da Renascença Giordano Bruno, último homem queimado pela Inquisição, em 1600, fez do jumento um modelo de espírito e erudição. Os sábios que acompanharam Napoleão Bonaparte no Egito, em 1798, montavam jumentos. Quando a tropa foi atacada pelos mamelucos, os oficiais franceses gritaram: "Protejam os jumentos no centro". No geral, pintores e poetas amam o jumento. Os cabalistas judeus descobriram que a palavra "jumento", em hebraico, tem as mesmas letras que a palavra "matéria". E concluíram que o jumento é "o mestre dos segredos do universo". Têm razão. O jumento entende tudo: se é idiota, é idiota como O Idiota de Dostoievski, o príncipe Muichkine - que é genial porque, se não compreende as coisas corriqueiras, compreende, por outro lado, as mais obscuras.
O jumento sabe tudo. Ele não trota nas mesmas paisagens que nós. Apenas aparenta compartilhar nossos caminhos, quando na realidade está em outro lugar, vem de outro lugar, vai para outro lugar. Ele atravessa educadamente nossa geografia sem fazer ruído para não nos perturbar, mas na verdade não caminha no mesmo passo que nós. Somente os poetas compreenderam a nobreza do jumento. Na França, no início do século 20, Francis Jammes escreveu uma oração para eles. É tão bela e luminosa que eu vou citá-la:
Prece para chegar ao Paraíso em Companhia dos Jumentos
Quando for a hora de ir a vosso encontro, meu Deus, fazei com que seja num dia em que o campo esteja brilhando em festa. Pegarei meu bastão e pela grande estrada irei, e direi aos jumentos, meus amigos: sou Francis Jammes e vou para o paraíso, porque não existe inferno na terra do Bom Deus. Eu lhes direi: venham pobres animais queridos, que com um brusco movimento de orelhas se livram das moscas, dos golpes e das abelhas. Que eu apareça diante de Vós entre esses animais que amo tanto porque baixam a cabeça docemente e juntam as pequenas patas de uma maneira tão gentil que dá pena. Meu Deus, fazei com que eu chegue até Vós com esses jumentos. Fazei com que os anjos nos conduzam em paz pelos riachos ensombreados em cujas margens tremulam cerejeiras, e fazei com que nessa morada das almas, sob vossos divinos olhos, eu me assemelhe aos jumentos, cuja humildade e doce pobreza se refletirão na limpidez do amor eterno.
Certamente, com o passar do tempo e dos milênios (ele está entre nós há 5 mil anos) o jumento começa a entender que as coisas não vão muito bem para ele, mas não se revolta. Sua tática é sutil. O cérebro humano não a alcança. O jumento é submisso e glorioso ao mesmo tempo, resignado e irredutível, escravo e soberano, vencido e vencedor. Ele dá cambalhotas nas primaveras onde não já não estamos. Encontrou obstáculos e os contornou. Ele se salvou do tempo. Sobre seus belos cascos, trota nas pradarias onde as horas não soam.
Se o espancamos, ele nos olha com um olhar incrédulo e belo. Não fica com raiva. Tem pena de nós. Não nos culpa, só nos observa. Ele gostaria de nos ajudar a ser menos vingativos. E nos consola de nossas maldades. "Não se preocupe", parece dizer, arreganhando os beiços, "não é sua culpa. Você é assim, mas isso vai passar. É um mau momento, uma má eternidade. Depois, você vai ver, tudo será melhor."
Durante a 1ª Guerra Mundial, em Verdun, inúmeros soldados foram mortos e enterrados. Inúmeros jumentos também foram mortos, mas não foram enterrados. Há alguns anos, um pintor de Auvergne (região montanhosa no centro da França onde há muitos jumentos), Raymond Boissy, manifestou sua indignação. E propôs que um monumento fosse erigido aos mortos, um monumento ao Jumento Desconhecido (como há em Paris o Túmulo do Soldado Desconhecido).
É uma ótima ideia. Aqueles jumentos, o Exército francês os fez vir de barcos do Magreb, do Marrocos, porque os jumentos dessa região são pequenos, dóceis e muito fortes. Eram capazes de transportar 150 quilos de obuses. Rastejavam nas trincheiras levando munição para os soldados que se encontravam em casamatas e fortins. Claro, os alemães descobriram e seus artilheiros bombardearam os ventres dos pequenos jumentos marroquinos. Foi uma carnificina. Aqueles que sobreviveram e retornaram às linhas francesas, contentes de reencontrar seus senhores, estavam feridos. Então foram abatidos. 150 mil jumentos foram mortos em Verdun.
O solo de Verdun está repleto de valas comuns de jumentos. Ali eram jogados os cadáveres desses animais tão gentis, suas pequenas coxas quebradas, as pequenas patas rígidas, seus olhos, tão belos, tão indulgentes, tão resignados. Como não chorar? / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Argentina: sempre recuando para os erros passados...

Não se podia mesmo esperar outra coisa: o mais incrível é a vocação dos dirigentes argentinos de cometer os mesmos erros econômicos várias vezes seguidas.
Inconsciência? Memória fraca? Arrogância?
Seja como for, os argentinos vão novamente pagar um alto preço pelos erros de seus dirigentes...
Paulo Roberto de Almeida 

Argentina dólares

Argentina: medidas cambiarias aceleran la salida de dólares de los bancos

dolares
Infolatam/Efe
Buenos Aires, 10 de junio de 2012
Las claves
  • Las nuevas normas restringieron el acceso de muchos inversores al mercado cambiario formal, lo que hizo resurgir los circuitos informales de compraventa de divisas, un mercado ilegal donde el precio del dólar es entre un 25 y un 30 % más caro que el oficial.
  • Mientras en el mercado oficial, el dólar cerró el viernes a 4,5 pesos por unidad, en el mercado informal, según publicaron medios locales, se comercializó a entre 5,9 y 6 pesos por dólar.

Los errores que explican la protesta

El análisis
Joaquín Morales Solá
“¿Descomprimirá la caída de Reposo la revuelta de sectores sociales? Las cacerolas fueron mayoritariamente eyectadas de las cocinas por la economía y por los dólares, no por Reposo. El Gobierno tiene reservas reales en el Banco Central por 36.000 millones de dólares; es mucho dinero… El problema es la desconfianza y la inflación que el Gobierno ignora”. (La Nación. Argentina)
Las restricciones a la compra de dólares en Argentina y la posible “pesificación” de algunas operaciones económicas aceleraron en las últimas semanas el retiro de depósitos en dólares de los bancos.
Según datos publicados por la prensa local, en la última semana de mayo la salida de dólares de los bancos ascendió a un promedio diario de 120 millones de dólares, frente a una media diaria de 100 millones en la semana previa.
El fenómeno coincide con un incremento en las restricciones a la compra de divisas impuestas por el Fisco en noviembre pasado para contener la fuga de capitales.
En la práctica, las nuevas normas restringieron el acceso de muchos inversores al mercado cambiario formal, lo que hizo resurgir los circuitos informales de compraventa de divisas, un mercado ilegal donde el precio del dólar es entre un 25 y un 30 % más caro que el oficial.
Según el economista Ramiro Castiñeira, de la consultora Econométrica, en mayo el Gobierno llevó los “cupos” para la compra de dólares en bancos y casas de cambio “a cero” si el “fin” de la operación es el atesoramiento (ahorro personal).
“Solo acceden al mercado cambiario, y con restricciones, importadores o quienes cancelen deuda externa, entre otros”, dijo hoy el experto en un informe.
El diagnóstico coincide con el de la consultoraAnalytica, que en un informe señaló que al cerrarse “el grifo para el atesoramiento” “se instaló definitivamente la percepción de que el dólar es un bien escaso y que avanza la pesificación de la economía”.
“Este escenario, sumado a la falta de una comunicación oficial clara y consistente, derivó en una suerte de histeria colectiva que alimentó la corrida al dólar paralelo”, afirmó la consultora.
Así, mientras en el mercado oficial, el dólar cerró este viernes a 4,5 pesos por unidad, en el mercado informal, según publicaron medios locales, se comercializó a entre 5,9 y 6 pesos por dólar.
“Cuanta más improvisación ve la gente en el Gobierno, más quiere comprar dólares y más sube esta fiebre por el dólar”, dijo a Efe Orlando D’Adamo, director del Centro de Opinión Pública de la Universidad de Belgrano, cuyo último sondeo marca los controles cambiarios como la principal razón del deterioro de la imagen de la presidenta argentina, Cristina Fernández.
Por su parte, Castiñeira señaló que las nuevas restricciones no solo incrementaron la brecha entre el mercado oficial y el paralelo, sino también que los proyectos de “pesificación” de algunas operaciones en moneda extranjera, como las inmobiliarias, “renovaron temores y dispararon una nueva corrida sobre los depósitos privados en dólares”.

A frase da semana - Winston Churchill

Especialmente adaptada para os companheiros no poder: 


Men occasionally stumble over the truth, but most of them pick themselves up and hurry off as if nothing happened.
Winston Churchill

Coitada da Estonia: ultraliberal e crescendo...

Poucos dias atrás, um comentarista anônimo que pretendia me dar uma bela lição de economia, saiu-se, entre outras, com esta: 
"É so ver a situação da Estonia hoje, ultraliberal : quase perdeu 20% do PIB na crise."
Confesso que não tive o que responder, pois o gajo estava manifestamente mal informado. É certo que a Estonia, que antes da crise chegou a ter um déficit de mais de 20% do PIB em transações correntes, estava justamente vivendo o seu momento keynesiano, gastando a rodo e esperando o maná do euro cair do céu. Teve uma queda brutal, e aproveitou para se corrigir, seguindo justamente o que eu chamaria de anticartilha Paul Krugman, um demagogo que virou político depois que começou a escrever para jornais, e esqueceu suas lições de economia.
No Brasil, ele é endeusado, a ponto de uma tradutora idiota, e uma editora idem, terem traduzido o título de seu livro, "The Conscience of a Liberal", como "A Consciência de um Liberal", quando o sentido americano é totalmente oposto. Liberal, nos EUA, significa social-democrata, quase socialista, ou seja, um keynesiano distributivista, o que ele é, realmente.
O título deveria ser indicando ser ele um "social-democrata", ou algo do gênero, jamais um "liberal" no nosso sentido, que nos EUA são chamados de "conservative".
Mas, enfim, surpreendido pelo comentario krugmaniano sobre a Estonia, só pude responder isto: 
My God, o simplismo se juntou à ignorância dos fatos para estabelecer uma das correlações mais estúpidas que já escutei.
Agora, tendo recebido duas contribuições sobre o assunto, tenho o prazer de postá-las aqui, para informação dos leitores, e deleite do meu comentarista anônimo metido a professor de economia.
Primeiro o Bruno Castanho, que escreve direto de Tallin: 


Bruno Castanho e Silva deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Uma licao de economia: primeiro, vincular fatos a ...": 
Agora que Paul Krugman resolveu escrever algumas bobagens sobre a Estônia, apontando sua abertura econômica como causadora da crise, seus leitores fiéis - que não têm idéia nem de onde seja o país - saem repetindo o mantra.
Com a visão "privilegiada" de quem mora aqui e lê o noticiário local, posso dizer que nada está mais longe da verdade. A liberalização econômica implementada desde os primeiros anos da independência transformou uma província da União Soviética num país moderníssimo, com um sistema educacional básico invejável (não há pessoa que fale menos do que 3 línguas - em geral estoniano, inglês e russo), aumento brutal na qualidade de vida e no padrão de consumo e um desenvolvimento tecnológico que a coloca à frente de muitos dos países europeus desenvolvidos na área da informática - o que se pode observar pelo número de empresas internacionais com sede aqui, pelo grande número de profissionais estrangeiros deste setor que estão no país, e até fatos mais simples, como a disponibilidade de conexão wi-fi gratuita em qualquer rua de qualquer cidade do país.
A perda do PIB já está sendo compensada - com a sua tradicional austeridade (superávit orçamentário e dívida pública em 6% do PIB) a Estônia cresceu 7,6% em 2011, mais do que qualquer outro país da UE.
Enfim, era de se esperar que keynesianos fossem tentar esconder este claro exemplo de sucesso de uma economia liberal, mas Krugman parece já ter chegado a um nível alto demais de alienação da realidade.
Abraços  


Agora o Felipe Xavier que me envia um artigo, que posto logo mais abaixo.
Comento no final.
Paulo Roberto de Almeida 


Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Uma licao de economia: primeiro, vincular fatos a ...": 
Pois e, professor, os seguidores do Krugman talvez devessem dar uma lida 
Abraco,
Felipe Xavier

Yes, they use the euro. And the economy is booming.

A fiscal surplus, low debt and soaring growth. No, this isn’t Germany, but it is a result of German medicine for crisis-burdened countries.
TALLINN, Estonia — It’s the euro zone Jim, but not as we know it.
Sixteen months after it joined the struggling currency bloc, Estonia is booming. The economy grew 7.6 percent last year, five times the euro-zone average.
Estonia is the only euro-zone country with a budget surplus. National debt is just 6 percent of GDP, compared to 81 percent in virtuous Germany, or 165 percent in Greece.
Shoppers throng Nordic design shops and cool new restaurants in Tallinn, the medieval capital, and cutting-edge tech firms complain they can’t find people to fill their job vacancies.
It all seems a long way from the gloom elsewhere in Europe.
Estonia’s achievement is all the more remarkable when you consider that it was one of the countries hardest hit by the global financial crisis. In 2008-2009, its economy shrank by 18 percent. That’s a bigger contraction than Greece has suffered over the past five years.
How did they bounce back? “I can answer in one word: austerity. Austerity, austerity, austerity,” says Peeter Koppel, investment strategist at the SEB Bank.
After three years of painful government belt-tightening, that’s not exactly the message that Europeans further south want to hear.
At a recent conference of European and North American lawmakers in Tallinn, Koppel was lambasted by French and Italian parliamentarians when he suggested Europeans had to prepare for an “inevitable” decline in living standards, wages and job security, in order for their countries to escape from the debt crisis.
While spending cuts have triggered strikes, social unrest and the toppling of governments in countries from Ireland to Greece, Estonians have endured some of the harshest austerity measures with barely a murmur. They even re-elected the politicians that imposed them.
“It was very difficult, but we managed it,” explains Economy Minister Juhan Parts.
“Everybody had to give a little bit. Salaries paid out of the budget were all cut, but we cut ministers’ salaries by 20 percent and the average civil servants’ by 10 percent,” Parts told GlobalPost.
“In normal times cutting the salaries of civil servants, of policemen etc. is extremely unpopular, but I think the people showed a good understanding that if you do not have revenues, you have to cut costs,” adds Parts, who served as prime minister from 2003-2004.
As well as slashing public sector wages, the government responded to the 2008 crisis by raising the pension age, making it harder to claim health benefits and reducing job protection — all measures that have been met with anger when proposed in Western Europe.
History helps explain citizens’ willingness to bite the austerity bullet. Estonia broke free from Soviet rule just over 20 years ago, together with its Baltic neighbors Latvia and Lithuania — who are also enjoying a robust recovery, but are outside the euro zone.
For older Estonians, memories of the grim days of Soviet occupation make it easier to accept sacrifices today. Among the young, there is a widespread awareness that in a nation of just 1.3 million people, the freedom and opportunities their generation enjoy depends on unity in times of crisis.
“Western Europe has not really experienced a decrease in living standards since the Second World War,” says Koppel. “Historically, austerity is inevitable, but it’s not part of the culture of Western Europe right now. This is what really differentiates us, that we were able to understand that.”
It still has its share of economic problems. The average monthly take-home pay of 697 euros ($870) is among the lowest in the euro zone and unemployment at 11.7 percent is still above the bloc’s average. The shockwaves of euro-zone collapse radiating from southern Europe could yet snuff out the recovery.
The jobless rate is falling however, thanks in part to a thriving tech sector.
Post-independence governments invested heavily in scientific education and information technologies, successfully attracting investment with the e-stonia label.
Estonia has also paid close attention to the fundamentals of establishing a favorable business environment: reducing and simplifying taxes, and making it easy and cheap to build companies. Its location — with quick access to Nordic, German and Russian markets — has also helped, along with the very low debt level Estonia inherited when it broke from the Soviet Union. Joining the euro zone on Jan. 1, 2011, Estonia stable economy shone, despite the crisis in the currency bloc.
Innovative young companies have been at the forefront of the Estonian revival thanks to successful startups like the web-designer Edicy, online money transfer service Transferwise and point-of-sale software developer Erply.
The daddy of them all is Skype, which was developed by a quartet of Estonian software geeks with their Swedish and Danish buddies back in 2003, and was bought up by Microsoft last year for $8.5 billion.
The internet phone company runs its biggest operations out of a technology park in a Tallinn suburb, where over 400 people from 30 countries work in a relaxed, light-filled office block complete with sauna, childcare and series of trendily designed cafes and chill-out lounges for the engineers to recharge their creative energies.
“In Estonia we have this national trait of just getting things done,” says Tiit Paanenen, the site leader at Skype Estonia.
“I’ve tried to work out why this is and I think it’s because we are small. The circles working on the same subject all know each other, so you create this sense of accountability with each other. If you screw up everybody knows about it.”
Estonia itself was like an innovative startup, when it suddenly became independent in 1991, Paanenen explains. Old hierarchies were overturned and youngsters thrust into key political and business positions as the country built an economy from scratch.
“One of the results is that we are very competitive, because of the efficiency, because of the use of technology in the areas where otherwise you’d have a lot of overheads and waste,” the shaggy haired executive said in an interview.
“Estonia is bigger than its size already … we are making an impact in the world and it will continue.”
Editor's note: This article has generated extensive discussion: NY Times correspondent Paul Krugman weighed in with this post; the president of Estonia responded (agressively) on Twitter, and GlobalPost questioned Krugman's post here. Please let us know what you think.
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Meus comentários finais.
Pois é, imaginem se um país que praticou gastança keynesiana durante anos a fio, como a maior parte dos membros da UE, pode se recuperar fazendo mais gastança keynesiana.
De vez em quando eu penso se os malucos que propõem esse tipo de "remédio" não são de fato malucos.
Mas, mesmo que o Brasil quisesse seguir uma receita alemã de austeridade -- seguida pela Estonia, em parte pela Grécia, parcialmente pela Espanha, um pouco na Irlanda e quase nada na Itália, até agora -- ele simplesmente não poderia.
A Constituição, esse monumento à estupidez econômica, diz que é proibido reduzir salários. Atenção: não estou nem falando dos salários do setor público, que portugueses, espanhois, gregos, estonianos e irlandeses fizeram, cada um a seu modo, estou falando até de salários do setor privado.
A nossa CF é tão estúpida que ela proíbe até esse tipo de coisa, ou seja, o Estado determinando como deve se comportar o setor privado. Conclusão: o cara acaba sendo demitido (aliás numa tolerância mútua e mentira deslavada entre patrão e empregado), recebe o salário desemprego e depois acaba sendo recontratado por um salário menor.
Ou seja, se fraudam as contas do Ministério do Trabalho -- que na verdade é o dinheiro de todo mundo --, se premia a esperteza safada, calhorda e criminosa, e se ajustam as coisas segundo as leis do mercado, que é assim que acontece, em última instância.
Mas o Brasil é certamente o único país do mundo em que os pagamentos por salário desemprego aumentam enquanto o desemprego está diminuindo.
Como é que vocês vão querer reformar um país assim?
Paulo Roberto de Almeida 

UNE e PCdoB: entidades fechadas e dirigentes presos...

Calma, calma, nada disso aconteceu. E claro que não acontecerá. Pelo menos não neste país do "nunca antes", que admite todo tipo de falcatrua, todo tipo de crime, todo tipo de mentira, fraude, enganação, corrupção, desvio de recursos públicos, com a benção do companheiro maior que adora dar dinheiro público -- ou seja, nosso -- para seus amigos bandidos.
O título do post é apenas porque eu sonhei que estava na Alemanha, ou nos Estados Unidos, onde bandidos desse tipo são procurados pela polícia -- no caso de crimes federais, como esses, pelo FBI -- saem algemados, com direito a rádio, TV ao vivo, jornais, etc, e depois ganham um belo pijama amarelo, vistoso, e amargam uma bela cadeia, até serem julgados, em três meses, em média, e do tribunal vão direto para a penitenciária.
Em seis meses, por exemplo, o ladrão de gravata Maddof, que roubou menos do que certos políticos no Brasil, era sentenciado a 150 anos de prisão. Eu disse 150 anos...
Imaginem como eu sou bobo: por um momento pensei que estivesse em países em que criminosos vão para a cadeia, não continuam roubando dinheiro público como se nada tivesse acontecido...
Paulo Roberto de Almeida 

As contas da UNE

Editorial O Estado de S.Paulo, 10 de junho de 2012
Convertidas em entidades chapa-branca desde a ascensão do PT ao poder e apoiando todas as iniciativas administrativas e políticas do Palácio do Planalto nos últimos dez anos, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Municipal dos Estudantes Secundaristas (Umes) de São Paulo estão sendo investigadas pelo Ministério Público (MP) Federal por malversação no uso de verbas públicas.
A investigação, informa o jornal O Globo de sexta-feira, foi aberta pelo procurador Marinus Marsico, que atua no Tribunal de Contas da União (TCU). Ao examinar as prestações de contas das duas entidades, entre outras irregularidades, ele identificou o uso de notas fiscais frias e descobriu que parte dos recursos liberados pelo governo para promoção de atividades culturais e "caravanas da cidadania" foi gasta com a compra de cerveja, vinho, cachaça, uísque e vodca e com a aquisição de búzios, velas e celulares.
Entre 2006 e 2010, a UNE e a Umes receberam cerca de R$ 12 milhões dos cofres públicos para implementar projetos de capacitação de estudantes e promover eventos esportivos, além de iniciativas culturais. Segundo o procurador Marinus Marsico, as duas entidades gastaram perdulariamente esses recursos em atividades que nada tinham a ver com os objetivos dos convênios firmados com os Ministérios da Educação, Saúde, Cultura, Turismo e Esporte.
No caso dos convênios firmados pela Umes com o Ministério da Saúde, no valor de R$ 234,8 mil, por exemplo, a entidade não teria realizado licitação pública para a escolha das escolas beneficiadas nem apresentou qualquer justificativa para a dispensa de concorrência, como exige a legislação.
Segundo o MP Federal, quatro notas da empresa WK Produções Cinematográficas apresentadas para justificar gastos com a Caravana Estudantil da Saúde, realizada em 2009 para promover a "conscientização da importância de doar sangue", são "inidôneas". Gastos de R$ 20 mil previstos para assessoria jurídica foram elevados para R$ 200 mil, sem qualquer justificativa.
As investigações também constataram duplicidade de pagamentos, imprecisão do objeto do convênio e até a transferência de recursos da conta oficial da entidade para contas bancárias pessoais dos responsáveis pela Caravana Estudantil da Saúde. Na representação que encaminhou ao TCU, o procurador Marinus Marsico afirma que as irregularidades são graves, sugerindo "possíveis atentados aos princípios da moralidade, da legalidade, da legitimidade e da economicidade, além de evidenciarem possíveis danos ao erário público".
No caso dos convênios firmados há quatro anos pela UNE com os Ministérios da Cultura e do Esporte, para "implantação de atividades esportivas e debates" durante a 6.ª Bienal de Artes, Ciência e Cultura, as prestações de contas não foram enviadas até hoje pela entidade. "É lamentável, especialmente pela história de lutas dessas entidades. Elas teriam que ser as primeiras a dar à sociedade o exemplo de zelo no uso do dinheiro público", diz o procurador.
Por não prestar contas de como gasta dinheiro vindo de convênios firmados com a União, a UNE foi, no ano passado, inscrita pela Procuradoria-Geral do Ministério da Fazenda como inadimplente no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin). E, se for condenada pelo TCU, com base nas provas que estão sendo coletadas pelo MP Federal, poderá ser obrigada a devolver as vultosas quantias que já recebeu.
No passado, a UNE lutou efetivamente, tanto contra a ditadura de Getúlio Vargas quanto contra a ditadura dos militares. Hoje, a UNE é um reduto do PC do B - partido que se destacou no escândalo dos repasses irregulares de recursos públicos a organizações não governamentais fantasmas, denunciado no ano passado. Além de viver de regalias do governo e do monopólio na expedição de carteiras estudantis, a UNE é manipulada por estudantes profissionais que fazem do lazer e da bajulação sua principais "especializações".
É por isso que as "tomadas de posição" da UNE já não valem o papel em que são escritas.

O nao-estado da nao-relacao de nao-integracao Brasil-Argentina (ufa, duas palavras sem nao...)

Ainda bem que se trata de uma relação estratégica. Imaginem se não fosse.
Ainda bem que o Mercosul é de alta prioridade para o Brasil. Imaginem se não fosse.
Ainda bem que as relações Brasil-Argentina são excelentes. Imaginem se não fosse.
Se não fosse por todas essas coisas boas, as relações poderiam até desandar, o comércio patinar, o Mercosul retroceder. Ainda bem que não é assim.
Imaginem se tudo fossem barreiras, denegações, impedimentos.
Imaginem se o nosso governo fosse conivente com o arbítrio comercial.
Ainda bem que estamos a salvo de tudo isso...
Paulo Roberto de Almeida

Problemas contínuos

Editorial O Estado de S.Paulo, 10 de junho de 2012 
Só agora, 11 anos depois de aceita com relutância pelos demais países do Mercosul como medida "excepcional e temporária", está sendo eliminada a isenção tarifária que a Argentina concedia às importações de bens de capital. Na quarta-feira (6/6), o governo de Cristina Kirchner anunciou que, doravante, as importações desses bens produzidos fora do Mercosul serão taxadas com alíquota de 14% quando não houver similar nacional, como ocorre nos outros países do bloco econômico do Cone Sul.
É uma medida que reforça a Tarifa Externa Comum (TEC), que, com o princípio da livre circulação de mercadorias entre os membros do bloco, constitui a base da união aduaneira em que formalmente se transformou o Mercosul. Mas é uma medida claramente insuficiente para que o bloco possa ser, de fato, considerado uma união aduaneira, pois são muitas as exceções à TEC e as restrições que o governo Kirchner vem impondo à entrada na Argentina de produtos originários de outros membros do Mercosul, sobretudo do Brasil.
Conivente com boa parte das barreiras administrativas e tarifárias que - em flagrante desacordo com as normas que regem uma união aduaneira - o governo Kirchner (desde o de Néstor, marido, já falecido, e antecessor de Cristina) vem impondo sucessivamente à importação de produtos brasileiros, o governo do PT, quando reage aos excessos argentinos, o faz de maneira espasmódica.
A cada dificuldade, marcam-se reuniões entre representantes dos dois governos, ora em Brasília, ora em Buenos Aires. Esses encontros sempre são encerrados com a reafirmação de que os problemas foram resolvidos, o que nunca aconteceu.
São muitas as marcas concretas dos conflitos comerciais entre Brasil e Argentina. Eles se intensificaram depois que a Argentina passou a incluir mais e mais produtos na lista daqueles que não têm mais licença automática de importação.
Desde fevereiro o governo argentino exige a apresentação prévia, pelo importador, de uma declaração juramentada, que é examinada por diferentes órgãos federais, a começar pelo equivalente argentino da Receita Federal. Isso retarda o processo. Em muitos casos, a manifestação oficial do governo, autorizando ou não a importação, demora mais de 60 dias, prazo máximo permitido pela Organização Mundial do Comércio.
Filas de caminhões com produtos acabados formam-se dos dois lados da fronteira entre a Argentina e o Brasil, pois o governo brasileiro também decidiu controlar a entrada no País de alguns produtos argentinos. Há veículos acabados produzidos nos dois lados da fronteira, maçãs argentinas das Províncias de Río Negro e Neuquén e produtos industriais variados.
A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) informou que há 1,7 milhão de pares já vendidos para comerciantes argentinos que aguardam licença para entrar no país. Cerca de 12 mil pares estão estocados no Rio Grande do Sul aguardando essa licença desde junho de 2011, quando foram vendidos.
O impacto dessas medidas sobre o volume do comércio entre os dois países é muito forte. As exportações de calçados brasileiros para a Argentina nos cinco primeiros meses deste ano foram 55% menores do que no período janeiro-maio de 2011.
Mesmo quando a Argentina anuncia a liberação rápida de determinados produtos, os resultados práticos demoram. Há cerca de duas semanas, o poderoso secretário de Comércio Interior da Argentina, Guillermo Moreno - que, apesar do título de seu cargo, é o principal inspirador das medidas protecionistas do governo Kirchner na área de comércio exterior -, anunciou que, "num gesto de boa vontade" em relação ao Brasil, reabriria o comércio de suínos sem limites. Apesar do anúncio, a liberação passou a ser concedida a conta-gotas, como se queixaram há dias os exportadores brasileiros.
Os sinais cada vez mais claros de que a economia argentina se aproxima da recessão devem levar o governo Kirchner a proteger ainda mais a produção local, criando mais dificuldades para as exportações brasileiras.

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Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...