domingo, 23 de junho de 2013

Companheiros tentando remendar a heranca maldita de companheiros - Rolf Kuntz

O tamanho da herança maldita deixa pelo companheiro anterior à companheira sucessora, a quem o anterior não hesita em chamar de poste e tratar como tal, é proporcional ao tamanho do Brasil, embora o outro companheiro encarregado das finanças diga que é do tamanho das reservas internacionais.
Não tenho certeza de que reservas de 370 bilhões de dólares possam suportar por muito tempo um déficit de transações correntes anualizado na casa de 60 ou 70 bilhões de dólares, tanto porque, quando chega nesse nível as coisas se precipitam, a fuga de capitais se acelera, e a inflação dispara...
Ou seja, se trata de uma herança maldita para ninguém botar defeito.
Dá para ter dó do poste?
Acho que não!
Quando o companheiro neoliberal (o único) que ocupava a fazenda pós-tucana (mas ainda tucana em espírito e procedimentos) propôs um forte ajuste fiscal, para zerar o déficit nominal, a antiga responsável da Casa Civil que depois viraria posta disse que se tratava de uma "coisa rústica" e recusou qualquer contenção das despesas públicas.
O castigo não veio a cavalo porque tudo na república dos companheiros anda a passo de lesma, mas neste caso a China continuou ajudando o Brasil durante um bom tempo mais.
Agora que a China também começa a se arrastar, os companheiros e companheiras correm o risco de ficar de pincel na mão...
Não foi por falta de aviso, inclusive aqui mesmo: posso até repescar antigos posts desses anos de abundância para relembrar os alertas então feitos.
Demorou, como a Justiça brasileira, mas parece que não vai falhar, como ela frequentemente falha.
A economia é cruel, e não por outra razão ela se chama a ciência lúgubre...
Paulo Roberto de Almeida

Dilma no inferno da Standard and Poor's, das pesquisas e passeatas
ROLF KUNTZ *
O Estado de S. Paulo, 22 de junho de 2013

O Brasil de dona Dilma vai mal quando cai o dólar, vai mal também quando sobe. É um país invejável. Em todo o mundo, oscilações das moedas principais podem causar tensão e mexer com as bolsas, mas neste país o desarranjo tem sido maior. Em tempos de valorização, o real dispara. Diante da política frouxa no mundo rico, ninguém falou tanto quanto as autoridades brasileiras em tsunami monetário e em guerra cambial. Se o sinal se inverte, como nos últimos dias, a depreciação do real também é maior, como na quinta-feira. Em nenhum outro mercado o dólar chegou a subir 2,45%. A grandeza é a marca nacional. "Temos muita bala na agulha", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, procurando tranquilizar os brasileiros enquanto crescia a turbulência nos mercados. Até o arsenal de intervenção é superior. Nas armas comuns, a conta é uma bala por agulha.

Quanto ao volume de reservas, US$ 376,11 bilhões no dia 19, o ministro Mantega tinha razão. O governo dispõe de bom volume de moeda estrangeira para combater a variação excessiva do câmbio. Mas nem sempre isso basta. Na quinta-feira, o Banco Central ofereceu cerca de US$ 3 bilhões, com escasso resultado. Numa crise prolongada, as reservas se perdem e sai vitorioso quem joga contra a moeda nacional.
É cedo para saber quando os mercados se acomodarão e onde estará o real nesse momento. De toda forma, o governo daria um passo no rumo certo se reconhecesse o mau estado da economia, a tendência de piora de vários indicadores e a vulnerabilidade do País.
O pessoal da Standard & Poor's explicou direitinho por que impôs um viés negativo à perspectiva econômica do País. Os economistas da Moody's também justificaram tecnicamente a decisão de reavaliar a economia brasileira. Não é preciso, no entanto, ter alguma formação econômica para perceber muita coisa fora dos eixos. O alerta das agências de classificação de risco e a perda de popularidade mostrada nas pesquisas sobre o governo apareceram praticamente ao mesmo tempo. Simples casualidade? É difícil e arriscado sustentar essa hipótese, especialmente quando se consideram as reivindicações apresentadas nas passeatas - muito mais amplas que a mera exigência de redução das tarifas de transporte público.
Na quinta-feira, dirigentes do PT conclamaram militantes para entrar nas passeatas com camisas vermelhas e bandeiras do partido. Tentaram e foram rechaçados. Boa parte dos envolvidos nas marchas deve ter votado, no entanto, em Lula, em Dilma e em vários de seus companheiros, incluídos alguns postes. Não está claro se perceberam, mas vários protestos - alguns dos mais notáveis - foram contra iniciativas e políticas federais dos últimos dez anos. Pessoas de espírito mais prosaico já haviam classificado como irresponsabilidade o compromisso de organizar e hospedar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. Já haviam chamado a atenção, há anos, para o atraso das obras, para o aumento dos custos e o risco de bandalheiras, quando fosse preciso compensar o tempo perdido. A organização Contas Abertas, especializada no acompanhamento das finanças públicas, atualizou com frequência os valores comprometidos e as previsões de desembolso. Quem quisesse poderia acompanhar pela internet, sem maior esforço, a formação de mais um imbróglio financeiro e econômico. Novos gastos, alguns muito pesados e de relevância mais que discutível, foram postos no alto da escala de prioridades, tornando mais bagunçada uma gestão pública já muito ruim.
A perda de tempo e boa parte do encarecimento das obras decorreram de um escandaloso desleixo do governo. Nada, ou quase nada, foi feito no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele batalhou com empenho para trazer as competições ao Brasil e foi vitorioso em 2007. A partir daí, parece haver esquecido o assunto. O trabalho duro ficou para o governo seguinte, já herdeiro de uma inflação elevada, de uma economia com baixo padrão de investimentos e de contas externas em situação de risco. Os dados básicos são claros:
1. Nos dois primeiros anos do novo governo o produto interno bruto (PIB) ficou estagnado, com expansão de 2,7%, em 2011, e 0,9%, em 2012. O quadro continua feio em 2013, mas a obrigação de gastar com a Copa e com os Jogos Olímpicos permanece em pé.
2. Enquanto isso, pioram as contas públicas, arrasadas pela gastança, pela multiplicação irresponsável de incentivos fiscais improvisados e também de transferências do Tesouro para os bancos federais. A grande preocupação do governo, nessa área, é inventar meios de continuar fingindo fidelidade à política de metas fiscais. Os truques contábeis empregados até há pouco tempo já foram escrachados.
3. A inflação tem recuado ligeiramente, mas a parcela de itens com elevação de preços ainda supera 60%. A desinflação dos alimentos terminou e os grandes fatores inflacionários, como a gastança federal, permanecem.
4. O Banco Central refez as projeções das contas externas e elevou de US$ 67 bilhões para US$ 75 bilhões o déficit em conta corrente esperado para 2013. As exportações, nesse quadro, serão 2,22% maiores que as do ano passado. As importações aumentarão 7,97% e o superávit comercial diminuirá 63,93%, de US$ 19,41 bilhões para US$ 7 bilhões.
Que fazer? Há uma pauta evidente na área dos investimentos, na tributação (até agora sujeita a remendos mal escolhidos e mal costurados), na educação (com a redefinição urgente de padrões e prioridades) e no campo da tecnologia. Na hora do aperto, no entanto, a presidente corre para ouvir seu padrinho, guru e conselheiro mor da República e da Prefeitura de São Paulo, como se ele fosse inocente da maior parte dos grandes problemas de hoje, incluído o abacaxi multibilionário dos grandes jogos.

* ROLF KUNTZ É JORNALISTA. 

A frase da semana: ah, essa cobica terrivel dos imperialistas, um perigo...

“O Brasil é um país muito rico, tem muitas reservas naturais. Esses recursos podem ser objeto de cobiça”.


Celso Amorim, ministro da Defesa

O que acontece quando uma autoridade mente, no Brasil? E nos Estados Unidos?

Reproduzo apenas a chamada da revista Veja:

E agora general?

A Abin mentiu quando disse que seus agentes nunca estiveram no Porto de Suape. Documentos comprovam que quatro espiões não só foram flagrados pela segurança do porto como ficaram detidos por mais de duas horas.

O que acontece, pergunto, novamente, quando alguém que tem status de ministro de Estado mente?
No Brasil, não acontece absolutamente nada. Fica por isso mesmo.

Nos Estados Unidos, essa autoridade seria imediatamente convocada por uma comissão do Congresso, da House ou do Senado, e seria constrangida a se demitir também imediatamente.

Talvez seja por isso que os EUA sejam uma democracia intolerante, e os poderes estatais no Brasil se assemelhem a uma casa de tolerância, a começar pela mais alta instância...
Paulo Roberto de Almeida 

Emprestimos secretos a Cuba e Angola: Senado precisa fazer o seu dever - FSP, Senador Alvaro Dias

O Senado Federal é o órgão constitucionalmente mandatado para aprovar, ou não, todas as operações financeiras externas do Brasil, inclusive a dos Estados. Ou seja, a União, ou o Executivo, não pode perdoar dívidas de países, ou conceder empréstimos externos sem que o Senado aprove, ou desaprove, a operação.
Parece que o Senado não anda fazendo o seu papel...
Paulo Roberto de Almeida

FOLHA TRANSPARÊNCIA
Medida foi assinada pelo ministro Fernando Pimentel um mês após entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação
BNDES fez operações com 15 países em 2012, mas só as dos dois países receberam o carimbo de 'secreto'
RUBENS VALENTEDE BRASÍLIAFolha de S.Paulo, 9 de Abril de 2013

O ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento) tornou secretos os documentos que tratam de financiamentos do Brasil aos governos de Cuba e de Angola. Com a decisão, o conteúdo dos papéis só poderá ser conhecido a partir de 2027.
O BNDES desembolsou, no ano passado, US$ 875 milhões em operações de financiamento à exportação de bens e serviços de empresas brasileiras para Cuba e Angola. O país africano desbancou a Argentina e passou a ser o maior destino destes recursos.
Indagado pela Folha, o ministério disse ter baixado o sigilo sobre os papéis porque eles envolvem informações "estratégicas", documentos "apenas custodiados pelo ministério" e dados "cobertos por sigilo comercial".
Os atos foram assinados por Pimentel em junho de 2012, um mês após a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação. É o que revelam os termos obtidos pela Folhapor meio dessa lei.
Só no ano passado, o BNDES financiou operações para 15 países, no valor total de US$ 2,17 bilhões, mas apenas os casos de Cuba e Angola receberam os carimbos de "secreto" no ministério.
Segundo o órgão, isso ocorreu porque havia "memorandos de entendimento" entre Brasil, Cuba e Angola que não existiam nas outras operações do gênero.
O ministério disse que o acesso a esses outros casos também é vetado, pois conteriam dados bancários e comerciais já considerados sigilosos sem a necessidade dos carimbos de secreto.
INEDITISMO
Antes da nova Lei de Acesso, já existia legislação que previa a classificação em diversos graus de sigilo, mas é a primeira vez que se aplica o carimbo de "secreto" em casos semelhantes, segundo reconheceu o ministério. O órgão disse que tomou a decisão para adaptar-se à nova lei.
O carimbo abrange quase tudo o que cercou as negociações entre Brasil, Cuba e Angola, como memorandos, pareceres e notas técnicas.
As pistas sobre o destino do dinheiro, contudo, estão em informações públicas e em falas da presidente Dilma.
Em Havana, onde esteve em janeiro para encontro com o ditador Raúl Castro, ela afirmou que o Brasil bancava boa parte da construção do porto de Mariel, a 40 km da capital, obra executada pela empreiteira Odebrecht.
Ela contou ainda que o Brasil trabalhava para amenizar os efeitos do embargo econômico a Cuba. "Impossível se considerar que é correto o bloqueio de alimentos para um povo. Então, nós participamos aqui, financiando, através de um crédito rotativo, US$ 400 milhões de compra de alimentos no Brasil."
Na visita a Luanda, em Angola, Dilma falou em 2011 que "os mais de US$ 3 bilhões disponibilizados pelo Brasil fazem de Angola o maior beneficiário de créditos no âmbito do Fundo de Garantias de Exportações" do BNDES.
O Desenvolvimento diz que os financiamentos têm o objetivo de estimular e dar competitividade às empresas brasileiras nas vendas ao exterior. A Folha não conseguiu falar com as embaixadas de Cuba e de Angola.
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Pronunciamento do Senador Álvaro Dias a respeito da operação, num plenário praticamente vazio: 
https://www.youtube.com/watch_popup?feature=player_embedded&v=3DE9E8LVuAo

Sobre os protestos no Brasil - Mansueto Almeida (do Reino Unido)

 Tenho lido varia análises daqui da Inglaterra sobre a onda de protestos no Brasil. A pessoas aqui me perguntam o que esta acontecendo no Brasil e os motivos dos protestos. O que consigo falar é sobre o que não são os protestos. Há pelo menos três grandes diferenças da onda de protestos no Brasil em relação aos protestos recentes ocorridos no resto do mundo.
Primeiro, a onda de protestos no Brasil não tem paralelo com o tipo de protesto dos “indignados” na Espanha. Na Espanha o protesto era contra as políticas de austeridade em um país no qual a taxa de desemprego está em 25%. No Brasil, temos a menor taxa de desemprego desde 2003, algo como 5,5%. Assim, o tipo de protesto que ocorreu recentemente em alguns países da Europa contra desemprego e cortes de serviços públicos não tem paralelo com o que está acontecendo no Brasil.  O gasto publico e a oferta de serviços público aqui só faz aumentar e recentemente aprovamos o Plano Nacional de Educação para elevar o gasto com educação de 5% para 10% do PIB – se isso ocorrer seremos o país que mais gasta com educação (% do PIB).
Segundo, os protestos no Brasil tambem são diferentes dos protestos que ocorreram nos EUA com a ocupação do Zuccotti Park pelo movimento “Ocuppy Wall Street”. Lá as pessoas estavam se manifestando contra o crescimento da desigualdade de renda, que cresce nos EUA desde a década de 1970, e contra a influência econômica e política dos 1% mais ricos. No Brasil, ao contrário dos EUA, a desigualdade de renda vem caindo nos últimos 10 anos de forma rápida, a renda real dos trabalhadores cresceu e a pobreza diminuiu fortemente. É dificil alguém achar que o pobre de hoje está pior do que o pobre de dez anos atrás.
Terceiro, apesar da semelhança da mobilização via redes sociais como ocorreu com a primavera árabe, os protestos no Egito, Tunísia e agora Síria e Turquia são revoltas da população contra governos anti-democráticos: ditaduras. Novamente, este não é o caso do Brasil. No Brasil, temos democracia, número grande de partidos e liberdade de expressão. O eleitor tem feito escolhas por um Estado mais ativo na oferta de serviços publicos e políticas sociais. Basta lembrar que o Brasil tem uma carga tributaria elevada – 36% do PIB- porque gasta muito com política social e previdência. Os gastos sociais e previdência explicam 84% do aumento do gasto federal no Brasil de 1999 a 2012 e isso parece ser demanda do eleitor por maior proteção social, apesar dessas escolhas serem muitas vezes decorrentes da pressão de grupos organizados e de muitos não conhecerem as distorções do gasto público no Brasil. Mas será que agora o eleitor está arrependido de suas próprias escolhas? Não acredito.
Assim, o que explica a onda de protestos no Brasil? Tarifa Zero? Mas nenhum país do mundo que conheço tem tarifa zero em transporte público. Governos de paises ricos subsidiam o transporte para pessoas de baixa renda e estudantes, mas o transporte público não é de graça.
Os protestos são contra gastos com a copa? Pode ser parte da explicação. Apenas agora a sociedade pode ter se dado conta do elevado custo da infraestrutura da copa. Mas faria sentido agora derrubar os estádios? Por que não houve essa pressão quando o país foi escolhido para sediar a copa e olimpíadas.
Os protestos são contra o governo ou contra a classe política em geral? Não é claro. Ninguém sabe ao certo até porque os protestos ocorrem em várias cidades governadas pela situação e oposição. Ninguém sabe ao certo quais partidos ou grupos políticos se beneficiarão da onda de protestos, mas é claro que as pessoas tenderão a canalizar a maior parte da culpa para o governo atual, independentemente de sua real responsabilidade.
Os protestos são contra corrupção? Mas hoje temos no Brasil um Ministério Publico e uma policia federal que está investigando e punindo corruptos. Mas queremos matar os corruptos como se faz na China? É isso. Não sei.
Em resumo, não sei ao certo quais as demandas dos manifestantes e não há uma liderança dos protestos que possa negociar com o governo uma pauta de reivindicações. No entanto, ninguém sabe ao certo se e quais grupos politicos se beneficiarão dessa onda de protestos. Mas de qualquer forma é um movimento fascinante em uma sociedade que não tem o costume de grandes passeatas e protestos. É um fenomeno novo que ainda vamos levar algum tempo para entender.

Why India Trails China - Amartya Sen (NYT)

The New York Times, June 19, 2013

Why India Trails China



CAMBRIDGE, Mass. — MODERN India is, in many ways, a success. Its claim to be the world’s largest democracy is not hollow. Its media is vibrant and free; Indians buy more newspapers every day than any other nation. Since independence in 1947, life expectancy at birth has more than doubled, to 66 years from 32, and per-capita income (adjusted for inflation) has grown fivefold. In recent decades, reforms pushed up the country’s once sluggish growth rate to around 8 percent per year, before it fell back a couple of percentage points over the last two years. For years, India’s economic growth rate ranked second among the world’s large economies, afterChina, which it has consistently trailed by at least one percentage point.
The hope that India might overtake China one day in economic growth now seems a distant one. But that comparison is not what should worry Indians most. The far greater gap between India and China is in the provision of essential public services — a failing that depresses living standards and is a persistent drag on growth.
Inequality is high in both countries, but China has done far more than India to raise life expectancy, expand general education and secure health care for its people. India has elite schools of varying degrees of excellence for the privileged, but among all Indians 7 or older, nearly one in every five males and one in every three females are illiterate. And most schools are of low quality; less than half the children can divide 20 by 5, even after four years of schooling.
India may be the world’s largest producer of generic medicine, but its health care system is an unregulated mess. The poor have to rely on low-quality — and sometimes exploitative — private medical care, because there isn’t enough decent public care. While China devotes 2.7 percent of its gross domestic product to government spending on health care, India allots 1.2 percent.
India’s underperformance can be traced to a failure to learn from the examples of so-called Asian economic development, in which rapid expansion of human capability is both a goal in itself and an integral element in achieving rapid growth. Japan pioneered that approach, starting after the Meiji Restoration in 1868, when it resolved to achieve a fully literate society within a few decades. As Kido Takayoshi, a leader of that reform, explained: “Our people are no different from the Americans or Europeans of today; it is all a matter of education or lack of education.” Through investments in education and health care, Japan simultaneously enhanced living standards and labor productivity — the government collaborating with the market.
Despite the catastrophe of Japan’s war years, the lessons of its development experience remained and were followed, in the postwar period, by South Korea, Taiwan, Singapore and other economies in East Asia. China, which during the Mao era made advances in land reform and basic education and health care, embarked on market reforms in the early 1980s; its huge success changed the shape of the world economy. India has paid inadequate attention to these lessons.
Is there a conundrum here that democratic India has done worse than China in educating its citizens and improving their health? Perhaps, but the puzzle need not be a brainteaser. Democratic participation, free expression and rule of law are largely realities in India, and still largely aspirations in China. India has not had a famine since independence, while China had the largest famine in recorded history, from 1958 to 1961, when Mao’s disastrous Great Leap Forward killed some 30 million people. Nevertheless, using democratic means to remedy endemic problems — chronic undernourishment, a disorganized medical system or dysfunctional school systems — demands sustained deliberation, political engagement, media coverage, popular pressure. In short, more democratic process, not less.
In China, decision making takes place at the top. The country’s leaders are skeptical, if not hostile, with regard to the value of multiparty democracy, but they have been strongly committed to eliminating hunger, illiteracy and medical neglect, and that is enormously to their credit.
There are inevitable fragilities in a nondemocratic system because mistakes are hard to correct. Dissent is dangerous. There is little recourse for victims of injustice. Edicts like the one-child policy can be very harsh. Still, China’s present leaders have used the basic approach of accelerating development by expanding human capability with great decisiveness and skill.
The case for combating debilitating inequality in India is not only a matter of social justice. Unlike India, China did not miss the huge lesson of Asian economic development, about the economic returns that come from bettering human lives, especially at the bottom of the socioeconomic pyramid. India’s growth and its earnings from exports have tended to depend narrowly on a few sectors, like information technology, pharmaceuticals and specialized auto parts, many of which rely on the role of highly trained personnel from the well-educated classes. For India to match China in its range of manufacturing capacity — its ability to produce gadgets of almost every kind, with increasing use of technology and better quality control — it needs a better-educated and healthier labor force at all levels of society. What it needs most is more knowledge and public discussion about the nature and the huge extent of inequality and its damaging consequences, including for economic growth.

Amartya Sen, a Nobel laureate, is a professor of economics and philosophy at Harvard. He is the author, with Jean Drèze, of “An Uncertain Glory: India and its Contradictions.”

Manifestacoes de massa no Brasil vistas pelo grande jornal capitalista (WSJ)

Aliás, uma cobertura totalmente asséptica.
Paulo Roberto de Almeida

Brazil's New Middle Class Takes to the Streets

The Wall Street Journal, June 21. 2013

After a Decade of Growth, Protests Seek To Build on Gains in Living Standards

[image]Agence France-Presse/Getty Images
Riot police charge a protester in Rio de Janeiro during demonstrations this week demanding better public services and lower transit costs.
SÃO PAULO—For Alexandre Peppe, the last decade has been great. The 29-year-old from the poor outskirts of São Paulo got a good job in state government, bought a car and became the first in his family to go to college.
All the same, he took to the streets this week with a million other members of Brazil's new middle class over a wide range of grievances, from high bus fares to corruption and crime.
"The population is revolting against the government of Brazil," said Mr. Peppe, who joined others to cram the broad avenues of São Paulo.
Over the last decade, Brazil capitalized on a global commodity boom to lift millions out of poverty and create a new middle class. Brazil's politicians from all political stripes now find themselves under siege from the very same group.
"This middle class had economic growth in a period of low inflation, and suddenly they've unleashed a cauldron of complaints, on a range of issues like corruption, that have been accumulating for a decade," said Maílson da Nóbrega, a former Brazilian finance minister.
Demonstrations in Rio have grown into a movement protesting poor government services, corruption and crime. WSJ's Loretta Chao reports.
On Friday, demonstrators returned to the streets in nearly sixty cities, with reports of looting in Rio de Janeiro, where some of the protests have turned violent in recent days. The protests have continued despite decisions by São Paulo and Rio to give in to a key demand for lower bus fares. But the protest movement has expanded beyond that issue to a field of middle class grievances.
The demonstrations couldn't come at a worse time for Brazil, which is hosting the Confederations Cup soccer tournament in new stadiums built for next year's World Cup. For this soccer-mad nation, hosting the tournament was meant to cap a national rise toward global prestige.
Instead, for some, the protest movement has brought to the fore a range of problems that were mostly left out of the Brazil story as the country became a darling of the global investment community amid the boom.
"This situation in Brazil is the coup de grâce on the idea that Brazil was the next big thing," said Gesner Oliveira, a businessman who ran São Paulo's main water utility for several years and now is a consultant.
In recent days, soccer fans in cities like Salvador and other growing urban centers have had to run for cover from police firing rubber bullets in order to get to games, raising questions about whether Brazil can handle hosting the Cup next year.
Protests erupted a few blocks from the hotel where the Italian national team was staying in Salvador on Friday, causing team coach Cesare Prandelli to say the team would remain holed up in the hotel ahead of its match the following day against Brazil. But he denied rumors that Italy asked for the tournament to be scrapped.
Soccer's governing body FIFA said Friday it would not scrap the tournament due to the unrest and that no team had signaled a desire to pull out. In a statement that would have been unimaginable just two weeks ago, FIFA secretary-general Jérôme Valcke felt compelled to say that Brazil must host the World Cup next year. "There is no plan B," he said.
The tournament has become a catalyst for some of the protesters' complaints. That is because even in this soccer-mad country, the birthplace of Pelé, residents are increasingly frustrated at the amount of money that is been put into two major global events, the 2014 World Cup and the 2016 Olympics, compared with the lack of progress in the issues that impact people's daily lives.
No one in Brazil was caught more off guard than President Dilma Rousseff and her left-wing Workers Party, in power for the last decade.
Before the protesters poured onto the streets, Ms. Rousseff appeared to be cruising toward an easy re-election bid next year as expanded welfare programs boosted living standards of the poor, and a growing economy brought greater prosperity to millions more.
Ms. Rousseff, the country's first female president, at first sought to align with the protesters by reminding marchers that her own political career came from the opposition.
The strategy backfired after Workers Party officials sent their members to the streets, where they were booed by the stridently anti-party marchers.
Ms. Rousseff held an emergency cabinet meeting on Friday, officials said.
Governor Cid Gomes, the governor of Ceará state and a Rousseff ally, told reporters Friday that Ms. Rousseff called him on Thursday night and was in a state of "bewilderment."
Government officials say Ms. Rousseff has been extremely active behind the scenes, and pushed officials in Rio and São Paulo to lower tariffs. Ms. Rousseff did not speak publicly in order to avoid inflaming the protests and on expectation that they might subside after the tariff reductions.
After violence across Brazil late Thursday, including protesters forcing into the foreign ministry, Ms. Rousseff planned a speech for late Friday, where she will acknowledge some of the grievances and offer dialogue with protesters. She will also firmly state that violence will not be tolerated in the country's cities.
Some say much of the explanation for why hundreds of thousands of Brazilians are on the streets right now can be found in Mr. Peppe's experience in recent years—and a school of thought in development economics about why seemingly better-off middle class populations have taken to the streets across the emerging world from Turkey to Chile.
The idea is that populations begin to demand more of their leaders as their own economic conditions improve. Citizens who are better off have the luxury to focus on social grievances that seem less pressing to impoverished people whose biggest concern are earning enough to feed themselves.
Mr. Peppe grew up in the sprawling northern outskirts of São Paulo, a poor and crime-ridden maze of small concrete homes during the years of four- digit inflation and successive currency crashes.
His mother, who never learned to read, raised him on around $80 a month. His father, a cop, was killed when Mr. Peppe was 11.
Amid Brazil's boom, Mr. Peppe was able to find work, take out loans to pay for a new car and apartment, and took a second job to pay for it. As he marched, he took photos of face-painted protesters with sleek a Sony Ericsson smartphone.
But Mr. Peppe's prosperity was matched by the bitterness for the injustices that he says came into focus as his life expanded beyond his neighborhood.
"The inequality is very sad, even revolting," Mr. Peppe said. "And now, the population of Brazil is waking up."
Much of the ire is directed at a political system that critics say affords broad impunity to engage in corruption while mostly ignoring the demands of ordinary Brazilians.
Adding to middle-class anxieties are warning signs that the commodity boom that lifted the economy is coming to an end. Brazil's economy has slowed after posting 7.5% growth in 2010.
—Luciana Magalhaes contributed to this article.
Write to John Lyons at john.lyons@wsj.com, Loretta Chao at loretta.chao@wsj.comand Matthew Cowley at matthew.cowley@dowjones.com
A version of this article appeared June 22, 2013, on page A10 in the U.S. edition of The Wall Street Journal, with the headline: Brazil's New Middle Class Takes to the Streets.

Iran: o fim de um lamentavel presidente (que não seja o unico) - Luiz Felipe Lampreia

O Globo, 22/06/2013

A eleição presidencial iraniana produziu dois resultados importantes: a vitória do candidato menos radical, Hassan Rouhani, e o fim do lamentável Mahmoud Ahmadinejad, presidente desde 2005. O presidente eleito fez campanha com o slogan “prudência e esperança”, o que está longe de ser uma plataforma arrojada, mas acenou com um ambiente de maior liberdade pessoal. Muito relevante foi sua postura, como ex-negociador nuclear, favorável a uma redução das tensões nessa matéria entre o Irã e os principais países ocidentais para permitir o abrandamento das sanções do Conselho de Segurança da ONU que estão sufocando a economia iraniana.
Quanto a Ahmadinejad, ele teve um de seus poucos momentos de glória no dia 16 de maio de 2010, quando o presidente do Brasil ergueu seu braço e proclamou vitória no confronto com aqueles que queriam cercear o programa iraniano de “uso pacífico” da energia nuclear”.
Deu no que deu: uma derrota esmagadora no Conselho de Segurança da ONU. Ao fim de seu mandato, restam para o povo iraniano uma das maiores taxas de inflação do mundo, elevados índices de desemprego, violenta queda das receitas de petróleo em resultado das sanções internacionais da ONU. Mestre da bazófia inflamada e das posições radicais, Ahmadinejad entra para a História como um pária internacional.
As eleições presidenciais do dia 14 de junho podem vir a reduzir a intransigência do regime. É óbvio que Rouhani, como aiatolá que é, não representa um opositor ainda que velado da teocracia. Alguns de seus predecessores no cargo também eram clérigos xiitas e também buscaram uma abertura política, com êxito muito relativo. Quem detém o poder, acima de todos, é sempre o aiatolá Khamenei, “líder supremo”. Para usar a expressão de um estrategista político brasileiro do passado, o regime iraniano avança por sístoles e diástoles. Em todo caso, pelo que se pode ler na imprensa internacional, Hassan Rohani, que foi o negociador nuclear de seu país, é o mais moderado de todos os que disputaram a eleição.
É interessante sublinhar que, mesmo com ênfases teocráticas e militaristas, o regime de Teerã promove regularmente transições de poder, fenômeno raro no Próximo Oriente.
Contudo, como atesta a violenta supressão do Movimento Verde de protestos, com sua agenda reformista, em 2009, o Irã não é uma democracia nos moldes ocidentais.
Com a recentíssima eleição, o regime adquiriu indiscutivelmente mais legitimidade. A questão que se põe é se o Irã poderá desempenhar um papel internacional mais construtivo sob o próximo presidente. A busca de armas nucleares poderá abrandar, permitindo uma atenuação das sanções do Conselho de Segurança? Veremos.
Haverá modificação em outra coluna mestra da política regional de Teerã: o apoio ao regime sanguinário de Bashar Assad? Sabe-se que a ingerência direta do Irã nos assuntos da Síria e do próprio Líbano continua a atear mais fogo nos conflitos internos desses países. Em minha opinião, o propósito de aumentar e consolidar sua influência em toda a região é um cânone do política externa iraniana que será mantido, seja qual for o resultado das eleições, com os métodos que forem necessários.
Resta a conhecer quais métodos serão empregados doravante pelo Irã.
Se Rohani não tiver poder para alterar profundamente os rumos do Irã, enquanto durar o regime retrógrado dos aiatolás o país não poderá exercer na sua região uma influência positiva, no plano cultural e político, compatível com sua grande herança cultural, seu peso específico e a contribuição do segmento mais culto de sua população. O presidente eleito vai assumir suas funções com muitos desafios.
O primeiro deles será afirmar-se na política iraniana em meio às lutas entre ultraconservadores que sempre ameaçam o equilíbrio interno.
O segundo desafio estará em combater a crise econômica que deriva sobretudo do maior conjunto de sanções jamais impostas a um país e que cortaram mais de 50% das exportações de petróleo e gás do Irã. O terceiro teste de Rouhani será conseguir avanços nas negociações nucleares sem ser atacado internamente como um vende-pátria. Três enorme desafios.
A Pérsia foi a primeira superpotência da Antiguidade.
Na época em que atacou a Grécia, sob Dario, em 490 AC, e dez anos depois, sob seu filho Xerxes, o império chegava à Índia e poderia ter-se firmado na Europa, não fossem as vitórias gregas em Maratona e Salamina.

Com os hebreus, os persas são os únicos povos antigos cujos textos sobreviveram nos tempos modernos. “A ascensão dos aiatolás tem sido um rebaixamento do país no sentido da violência feita às grandes tradições do passado iraniano”, como disse Robert Kaplan. Esperemos que Hassan Rouhani consiga reverter este curso.

Fernando Henrique Cardoso e os Pensadores do Brasil - livro, entrevista (Estadao)

Formação do Brasil

Fernando Henrique Cardoso mostra a importância que ainda tem a obra dos grandes intelectuais nacionais

O Estado de S.Paulo, 22 de junho de 2013
Fernando Henrique Cardoso conversou com o Estado na tarde de quinta-feira, em seu apartamento, em São Paulo. Ele acabara de chegar de um evento promovido pelo governo da Dinamarca. O cansaço logo se dissipou quando começou a falar sobre seus mestres.
'Processo saturou', diz Fernando Henrique Cardoso sobre o lulismo - Evelson de Freitas/Estadão
Evelson de Freitas/Estadão
'Processo saturou', diz Fernando Henrique Cardoso sobre o lulismo
Qual característica mais forte de cada um desses pensadores que marcou sua carreira?
Fernando Henrique Cardoso - 
Começo por Joaquim Nabuco. Era um sujeito capaz de combinar um estilo aristocrático com forte preocupação social. Ele era um sociólogo de fato, o que era raro na época. Apesar de ter um certo pendor pela monarquia e esteticamente ser conservador, Nabuco era um democrata. Por isso que o comparo a Tocqueville, que era um reacionário mas compreendia as mudanças de tempo. Também gosto de Nabuco por considerar a democracia inglesa superior à americana por causa da noção da igualdade perante à lei.
O senhor vê alguma semelhança com a sua trajetória?
Fernando Henrique Cardoso - 
Em alguns pontos, sim, pois ele, como eu, conciliou uma vida intelectual com outra política, e também porque enfrentou todo o drama envolvido (risos).
É curiosa a diferença apontada pelo senhor entre a visão que Nabuco tinha do Império comparada com a de Sergio Buarque de Holanda.
Fernando Henrique Cardoso - 
A análise do Sergio é brilhante e tem menos repercussão que merece - Raízes do Brasil é o livro que o fez entrar para história. É um belo ensaio, mas o outro também é genial. E, na contraposição entre o democrata Sérgio Buarque e o aristocrata Joaquim Nabuco, esse se deixava enrolar pelos meandros do Império, enquanto Sérgio via nesse Império a dominação escravocrata. Ele desmistifica a tradição de que aquele governo era civilizador. Acho que, entre todos os pensadores, é o mais explicitamente democrático. Afinal, Sérgio escreve Raízes do Brasil nos anos 1930, marcados pela ascensão do comunismo e do integralismo. Assim, a aposta que ele fez era rara, pois, na época, comunista é que era democrata e ele era basicamente liberal, acreditava que a ascensão das classes populares resultaria na democracia. E seu livro foi lido ao contrário, como se portasse uma visão tradicional, uma outra maneira de ser Gilberto Freyre. Algumas de suas frases ainda são atualíssimas, como "só existe democracia com a lei da universal". O Sérgio seria um analista ideal para o que está acontecendo hoje.
Como assim?
Fernando Henrique Cardoso - 
Ele veria que a ascensão do sindicalismo não resultou necessariamente em democracia - ao contrário, vem reforçando a matriz tradicional, corporativista, patrimonialista, da discricionariedade. O instinto democrático tornou-se clientelista. Foi absorvido pela cultura tradicional brasileira.
Por falar em Gilberto Freyre, um dos destaque do livro é a forma como o senhor reavalia sua obra, dando-lhe mais importância.
Fernando Henrique Cardoso - 
Tive pouca convivência com ele, mas, quando li sua obra pela primeira vez, desenvolvi um horror pela sua posição política. Eu tinha muita resistência por dois motivos - a primeira porque, em São Paulo, tentávamos fazer uma sociologia empírica, científica, e a visão que se tinha dele (precipitada, na verdade) era de que se tratava mais um ensaísta (e conservador) que um analista. Quando reli sua obra, descobri um grande intelectual, a despeito de ser conservador.
O senhor deixou nomes de fora?
Fernando Henrique Cardoso - 
Sim. José Bonifácio, por exemplo, primeiro pensou o Brasil. Cito muito sua importância, mas não me aprofundo. Também não falo de Rui Barbosa, ícone do liberalismo, mas que não me influenciou. Nunca li sua obra, embora merecesse. Talvez seja um preconceito, pois venho de uma família de militares positivistas. Enquanto meu bisavô era monarquista, meu avô era a favor da abolição e meu pai participou das revoluções de 1922 e 24. Todos tinham horror do Ruy Barbosa, que era mais liberal enquanto eles apoiavam o Estado. E confesso que herdei um pouco dessa aversão.
E como foi a relação com Caio Prado Jr.?
Fernando Henrique Cardoso - 
Era um escritor seco, mas moderno, que notou detalhes importantes na relação do Brasil colonial com a metrópole portuguesa, no latifúndio e na escravidão. Um livro que considero pouco valorizado é A Revolução Brasileira, no qual é revisionista com relação às teses do Partido Comunista. Ao mesmo tempo em que era militante, tinha uma importante formação intelectual. Não se saiu bem na filosofia, na dialética, mas era bom nas análises concretas, além de revelar uma noção sólida de geografia - ele não viajava como turista, mas em busca de aprendizado.
É visível sua admiração por Celso Furtado.
Fernando Henrique Cardoso - 
Porque ele inaugura uma nova tradição. Celso via o Brasil como um país subdesenvolvido em relação aos demais, apontando o crescimento econômico como principal solução para esse problema. Ele introduziu o viés da análise econômica na compreensão do retrato do Brasil. Se Caio tinha uma visão marxista, mas um tanto mecânica, Celso fez análise do processo de formação do mercado interno. Ele explica a dinâmica do processo ao mesmo tempo em que oferecia um projeto nacional com fundamento econômico. A minha geração cresceu lendo Celso Furtado. Nossa paixão, na época, anos 1950 e 60, era o desenvolvimentismo. Só depois, com regime autoritário, veio a paixão pela democracia, movimentos sociais, já nos anos 70.
É nesse momento que acontece uma mudança?
Fernando Henrique Cardoso - 
Sim, pois a ideia da formação do Brasil vai até minha geração. A partir daí, começa a ser diferente, pois começa a integração, a globalização, palavra, aliás, que ainda nem existia. Começávamos a entender que havia algo novo, a periferia do mundo estava se industrializando e buscava caminhos diferentes. Era preciso entender o interesse nacional de cada país em um contexto global. Caio dizia que não se entendia a colônia sem entender o vínculo com o império. Já Celso afirmava que era preciso romper o vínculo e desenvolver o mercado interno. Hoje, sabemos que o certo não é romper, mas refazer.
Esses pensadores funcionam como um farol para o senhor?
Fernando Henrique Cardoso - 
Sim, formataram meu pensamento atual. Mas hoje, com as ruas agitadas, não se sabe para onde ir. Antes, esses pensadores diziam o que fazer. O farol está agora na popa e só vamos para frente porque o mar está empurrando. Não quero personalizar, mas, desde o governo Lula, a visão do futuro está errada. Não se percebeu que a crise terminaria, como deve acontecer. Acreditava-se que os EUA entrariam em decadência e não vão. O Brasil fez o caminho contrário da China, que se concentrou na exportação para acumular capital e investir, enquanto aqui se montou a base a partir do consumo, uma solução trôpega. O consumo cresceu, mas quem consome não está feliz e protesta na rua. Quer outras coisas, sem saber exatamente o quê. Basta ver os cartazes de protesto: tarifa, PEC, saúde, corrupção. Por trás disso, surge uma mensagem poderosa: quero viver melhor e isso não significa apenas consumir. O processo lulista deu o contrário. Saturou rapidamente. 

Veja também:

Farol da sabedoria

Fernando Henrique Cardoso reúne textos sobre intelectuais que formaram seu pensamento

"São textos sobre autores que me influenciaram. Uma leitura sobre como aprendi a olhar o Brasil" - Evelson de Freitas/Estadão
Evelson de Freitas/Estadão
"São textos sobre autores que me influenciaram. Uma leitura sobre como aprendi a olhar o Brasil"
UBIRATAN BRASIL - O Estado de S.Paulo
Em seu processo de formação, o sociólogo e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso alimentou-se das ideias de intelectuais que ajudaram a forjar e solidificar seus conceitos sobre a identidade e as grandes questões do País. Obras de Joaquim Nabuco e Euclides da Cunha despertavam sua atenção, assim como de mestres com quem teve a honra de conviver, como Sergio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes, Antonio Candido, Caio Prado Jr., Raimundo Faoro e Celso Furtado, entre outros.
São autores que ele interpreta como faróis, no sentido de ser um facho de luz que pode iluminar um caminho. Ao longo da vida acadêmica e política, Fernando Henrique escreveu sobre seus mestres, tanto na forma de ensaio como na de discurso. É esse material que forma Pensadores Que Inventaram o Brasil, seleção de textos escritos entre a década de 1970 e a atual, que será lançada oficialmente pela Companhia das Letras na terça-feira, no Masp, às 19 horas, quando começa um debate entre Fernando Henrique e o historiador José Murilo Carvalho, autor do posfácio do livro, com mediação da professora Lilia Schwarcz.
"Não se trata de uma obra pretensiosa, que pretende contar a história da cultura", avisa o sociólogo. "São textos sobre autores que me influenciaram. Uma leitura pessoal sobre como aprendi a olhar o Brasil."
Nos 18 artigos escolhidos - alguns foram publicados na extinta revista Senhor Vogue em 1978, outros, como o que analisa Raimundo Faoro, foram especialmente escritos para esse volume -, Fernando Henrique Cardoso trata de assuntos que sempre lhe foram caros, na carreira política ou na acadêmica, como a relação entre Estado e sociedade civil, os percalços do desenvolvimento econômico, a herança da colonização, a dificuldade em promover a justiça social.
Apesar de utilizar o mesmo rigor intelectual para todos, o sociólogo deixa transparecer sua simpatia pelos intelectuais com quem manteve uma relação próxima, como Florestan Fernandes, de quem foi aluno e assistente, ou Antonio Candido, também professor e mais tarde colega. E, apesar do viés econômico ter caracterizado mais a sua obra, Celso Furtado faz parte da seleção pela lucidez com que sempre apontou o melhor caminho para o desenvolvimento do País.
Fernando Henrique aproveita também para apresentar um mea culpa e, em um texto de 2010, recolocar Gilberto Freyre, antes apontado como reacionário, no panteão dos grandes pensadores do Brasil.

CRÍTICA: a identidade do País por um fluente professor

Capítulos mais saborosos são aqueles que misturam interpretação analítica com testemunhos e evocações pessoais

Elias Thomé Saliba - Especial para o Estado
"Clássico é um livro que as gerações dos homens, urgidos por razões diversas, leem com prévio fervor e com uma misteriosa lealdade." Esta notável definição de Jorge Luis Borges poderia servir de epígrafe para as leituras e releituras dos clássicos brasileiros que Fernando Henrique Cardoso realiza em Pensadores Que Inventaram o Brasil. Escritos por razões diversas e cobrindo um extenso período, que vai de 1978 a 2013, são 18 ensaios que revelam não apenas as obras daqueles pensadores que inventaram o Brasil, mas também muito da trajetória intelectual do próprio autor. Pertencente à geração imediatamente posterior aos clássicos da ciência social brasileira, Fernando Henrique publicou suas primeiras obras naqueles anos de questionamento das grandes interpretações do Brasil, nos quais as "visões gerais" começavam a ceder espaço àquelas investigações mais pontuais e, ao mesmo tempo, mais especializadas e mais inovadoras, como foram, aliás, os próprios livros do sociólogo Fernando Henrique. 
Embora irregulares, alguns dos capítulos mais saborosos são aqueles que misturam interpretações analíticas com testemunhos e evocações pessoais, pois Fernando Henrique conheceu - e em alguns casos conviveu - com autores como Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes, Antonio Candido e Celso Furtado. Recorda os bons tempos de quando entrou na Faculdade de Filosofia, em 1949 - localizada ainda no prédio da Praça da República e com classes que não tinham mais do que 12 alunos. Relembra, ainda, fazendo referência aos seus colegas, que todos queriam mesmo ser socialistas e não sociólogos. E que de repente se viram frente a um grupo de jovens professores que vestiam aquele obrigatório avental branco de cientistas de laboratório, como Florestam Fernandes e, mais discretamente, Antonio Candido - que lhes ensinaram a nunca transigir com o rigor da análise, com a solidez da pesquisa ou com qualquer coisa que prejudicasse a fluência dos argumentos. 
Além de ensaios menores sobre Euclides da Cunha, Paulo Prado, Caio Prado Jr. e Sérgio Buarque, e de uma primorosa resenha de Os Parceiros do Rio Bonito, de Antonio Candido, as análises mais detalhadas recaem sobre Joaquim Nabuco, Gilberto Freyre, Celso Furtado e Raymundo Faoro. O ensaio sobre Nabuco, de difusa inspiração freudiana, recupera os episódios da infância do grande abolicionista, incluindo a afetiva convivência com os escravos e as dramáticas perdas familiares. Já ao discorrer sobre a trajetória política de Nabuco, Fernando Henrique parece indiretamente falar um pouco de si - do intelectual que participa da política, se entrega inteiramente a ela em dados momentos, mas não quer se despersonalizar e nem perder seus mais caros valores existenciais.
Já os ensaios mais longos sobre Gilberto Freyre constituem uma espécie de desabafo de consciência culpada do autor, que pertenceu a uma geração que, durante os anos 1950 e 1960, tratou de rotular o autor de Casa Grande & Senzala como o reacionário criador e propugnador de uma (ilusória) democracia racial brasileira. Rótulos que nasceram menos de uma discutível "escola paulista de Sociologia" e mais da primeira leitura de um sociólogo militante, ansioso por cobrar dos outros uma posição de recusa da ordem estabelecida. Sem deixar de apontar os deslizes e os devaneios literários de Freyre, Fernando Henrique - desta feita escrevendo já em 2010 - ressalta a força mítica da obra do pernambucano: a sociedade patriarcal; as relações desiguais, mas próximas, entre as raças; o repúdio do racismo como guia heurístico (sem prejuízo dos deslizes racistas) e a afirmação de uma cultura singular, acabaram se tornando parte tácita e indistinguível da realidade brasileira. Mito é muito simplesmente a narrativa de uma história que não aconteceu, mas também daquela história que gostaríamos de acreditar que aconteceu - ou que ainda virá a acontecer, a qual fruímos, à maneira de Borges, com "prévio fervor e misteriosa lealdade". De qualquer forma, ao definir o estilo de Freyre como encantatório, cheio de reveladoras epifanias, Fernando Henrique não se esquece ainda de apontá-lo como um inesperado precursor daqueles estudiosos que criaram um método todo particular, no qual as sutilezas do estilo narrativo substituem os modelos teóricos e os conceitos abstratos.
Também se destacam as observações sobre Caio Prado Jr: um autor no qual "o método e os achados interpretativos caminham juntos, sem que ele esteja a cada instante batendo no peito para fazer o ato de contrição dos marxistas acadêmicos". 
Se apenas o epílogo do livro reproduz uma aula magna, ministrada pelo então ministro das Relações Exteriores aos alunos do Instituto Rio Branco, poderíamos dizer que o estilo de quase todos os ensaios é menos do político e mais aquele de um fluente professor - que também nos dá a deixa para uma outra definição de um clássico: "quando o livro é grande, os andaimes pesam menos e é preciso ver menos a maquinaria utilizada e mais a beleza da obra construída, mesmo que, às vezes, sem muito rigor". Nesta elegante e ponderada releitura da pedagogia da brasilidade, talvez seja mesmo possível reconhecer o que há ainda de atual e de inatual naqueles clássicos - todos eles um tantinho angustiados em pensar o futuro do País a partir de um retrato panorâmico de seu povo e de sua história. Se alguns daqueles retratos panorâmicos envelheceram, outros ainda fazem falta, sobretudo num país que vivencia - como, aliás, todo o mundo contemporâneo - uma crise de perspectivas de futuro.
* ELIAS THOMÉ SALIBA É HISTORIADOR, PROFESSOR DA USP E AUTOR DE RAÍZES DO RISO, ENTRE OUTROS

sábado, 22 de junho de 2013

Perguntas ainda sem resposta: Argumentos substantivos ou Atirando contra o mensageiro...

Eu sou por natureza didático, e polêmico, assim parece ser a minha essência, com todos os defeitos inerentes às duas qualidades (ou falta de). Gosto de ler, de refletir, e de escrever. Como também me julgo um cidadão responsável, pelo menos tentativamente, por uma parte dos problemas do país (afinal de contas sou pago com os impostos de todos os trabalhadores brasileiros, e não tenho certeza de que a minha produtividade no trabalho seja condizente com a remuneração e outros privilégios associados), eu também pretendo oferecer minhas críticas à situação corrente e minhas sugestões sobre como melhorar o país.
Faço a minha parte, em todo caso, que é esta mesma: leio, reflito, escrevo e publico, neste instrumento solitário que é este aqui.
Mas, sendo um veículo aberto, eu me exponho às criticas, comentários, sugestões, e até xingamentos, dos 15 leitores que devo possuir regularmente. Não me importariam muito as ofensas, se ao menos elas trouxessem algum comentário substantivo junto, mas isso é mais raro.
Adesistas Anônimos e Mercenários a Soldo, como eu os designei, exibem o péssimo costume de atirar sobre o mensageiro, em lugar de se debruçar sobre as questões. Por vezes é uma palavra errada, uma concordância mal feita, uma crase mal colocada (sempre na pressa da redação), pronto; basta isso para os AAs e os MSs soltarem sua bateria de ofensas. Algumas, até a maioria, eu posto aqui, pois não tenho problemas com que me critiquem e até me ofendam, pois isso é também um demonstrativo de como anda o Brasil, sempre com a ofensiva dos totalitários ao pretender dividir o país entre nós e eles, ao inverso, se vocês me entendem.
O "nós" deles é o poder totalitário, que não admite críticas nem contestações, o pensamento único gerado pelo partido totalitário e que pretende monopolizar o poder.
O "eles" somos nós, os que admitem o debate democrático, que acreditamos nas virtudes da democracia, e que achamos que alternância no poder sempre é bom e salutar em qualquer sociedade.
Fiz uma série de postagens especialmente dedicadas a meus leitores furibundos e até agora não recebi nenhum comentário, nem para responder, nem para ofender, o que pode ser preocupante.
Talvez eles não tenham tido tempo de ler tudo o que escrevi, e por isso vou resumir aqui as perguntas que fiz aos AAs e aos MSs.
Aqui vão elas, com seus respectivos links para as explicações introdutórias.

1) Pergunta: o Brasil precisa de 40 ministérios?
2) Por que nossa taxa de poupança voluntária é tão baixa, e por que o investimento público é inacreditavelmente baixo, o que impede que tenhamos taxas mais robustas de crescimento?
3) O Brasil precisa de rádios, TVs, jornais públicos, ou pagos com o dinheiro público?
4) Quais são os argumentos a favor do Fundo Soberano do Brasil?
5) Sabendo que a maior parte dos países (inclusive aqueles que exibem alta qualidade no ensino) gasta aproximadamente, na média, entre 5 e 6% nos orçamentos educacionais, por que o Brasil precisaria colocar 10% do PIB no dispendio educacional?
 
Está aberta a estação de caça ao mensageiro, ou a abertura da academia socrática...
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 22/06/2013

A paranoia normal de dirigentes eleitos: atinge qualquer um...

Dirigentes acuados, ou contestados, sempre tendem para a paranoia, e começam a falar bobagem, como o Erdogan, neste caso.
Interessante como pessoas que subiram pelo voto, uma vez no poder, tendem a se sentir autorizados a tudo, e desenvolvem não só comportamentos paranoicos, como também sentimentos autocráticos ou autoritários, quando não tendencialmente totalitários.
Já vimos isso no Brasil, também, basta olhar os candidatos a déspotas...
Paulo Roberto de Almeida 

PROTESTOS
Erdogan: Brasil e Turquia são alvo de conspiração internacional
Folha de S.Paulo, 22/06/2013 - 15h38 | Redação | São Paulo

Premiê turco afirmou que os dois países -- duas potências emergentes -- sofrem tentativa de desestabilização vinda de fora

O primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que enfrenta uma onda de manifestações em seu país, afirmou neste sábado (22/06) que os protestos registrados nos últimos dias no Brasil fazem parte uma conspiração para desestabilizar a presidente Dilma Rousseff, assim como estaria acontecendo com ele próprio.

Erdogan falava a centenas de milhares de simpatizantes na cidade de Samsun, uma das paradas de uma jornada de mobilizações em apoio a ele. Há três semanas, protestos contra a construção de um centro comercial da Praça Taksim de Istambul foram violentamente reprimidos pela polícia. A repressão impulsionou as manifestações, onde palavras de ordem contra Erdogan e pela sua saída do governo são frequentes.

Situação semelhante aconteceu no Brasil, quando a repressão da Polícia Militar do Estado de São Paulo nas quatro primeiras manifestações contra o aumento da tarifa de ônibus (responsabilidade da prefeitura), metrô e trem (responsabilidade do governo do estado) – especialmente em 14 de junho, pela violência e agressão contra jornalistas – chocou o país.

Antes apoiada pelos principais jornais, a ação da polícia gerou uma onda de protestos, que acabaram absorvendo outras pautas, como corrupção, inflação, insegurança, algumas incluídas em um rechaço à realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

A violência registrada nas manifestações seguintes – quinta-feira (20/06) na cidade de São Paulo houve agressão contra militantes de partidos de esquerda – foi condenada nesta sexta-feira (21/06) por Dilma, que se dispôs a receber os manifestantes e propôs um pacto para buscar atingir as demandas dos que protestaram.

Assim como Dilma, que lidera um país com altos níveis de crescimento econômico e social, Erdogan tem alta aprovação após 10 anos de governo. Para ele, os protestos são alimentados por forças estrangeiras, banqueiros e a mídia turca. Em Samsun, o premiê disse que o Brasil – outra economia emergente – foi alvo da mesma tentativa de desestabilização.

“O mesmo jogo está sendo jogado no Brasil. Os símbolos são os mesmos, Twitter, Facebook, são os mesmos, a mídia internacional é a mesma. Os protestos estão sendo levados ao mesmo centro”, analisou Erdogan. “Eles estão fazendo o máximo possível para conseguir no Brasil o que não conseguiram aqui. É o mesmo jogo, a mesma armadilha, o mesmo objetivo”. 


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