Democracia e responsabilidade fiscal
Marcelo de Paiva Abreu*
O Estado de São Paulo, segunda-feira, 6.9.2010
Depois de longo período em que prevaleceram políticas macroeconômicas sérias, houve significativa deterioração da política fiscal ao final do segundo mandato do presidente Lula, especialmente durante o atual processo eleitoral. Clara indicação de que o governo está disposto a ser imprudente para garantir o sucesso nas urnas. Os sinais de deterioração são conhecidos: transferências maciças de recursos a bancos públicos para a concessão de empréstimos subsidiados de prioridade discutível e aumento de gastos de custeio, inclusive os injustificáveis, no quadro de políticas anticíclicas, para citar só dois exemplos notórios.
E, no entanto, os mercados relevantes têm deixado de refletir integralmente essas preocupações. Não seria o primeiro episódio em que visões de curto prazo prevalecem sobre a prudência que se deveria impor com base em análises de prazo mais longo. Nessas circunstâncias viceja o comportamento de manada, e o que seria normalmente classificado como otimismo infundado toma a forma de demonstração compulsória de patriotismo.
Para os que têm memória longa, é só lembrar a euforia empresarial que marcou a posse do ministro Delfim Netto em 1979, vitorioso em seu embate com o prudente, e impopular, Mário Henrique Simonsen. Ao final, deu "xabú" na planejada fuite en avant: a economia cresceu espetacularmente no ano seguinte, mas, depois, espetaculares mesmo foram a recessão e a aceleração inflacionária.
Outra razão para que os mercados reflitam de forma inadequada as vulnerabilidades de prazo mais longo tem que ver com o sucesso da política econômica prudente. Há grande folga para acomodar erros futuros de política econômica. Isso não quer dizer, entretanto, que os danos deixem de ser significativos e não possam afetar o crescimento futuro da economia.
As manifestações dos dois principais candidatos à Presidência da República tendem a agravar as preocupações. O candidato da oposição, ao manifestar desde cedo na pré-campanha as suas reservas quanto à política monetária, abriu espaço para que a candidata oficial ilegitimamente se apresentasse como defensora de um Banco Central prudente. O candidato adotou a mesma postura de 2002: no melhor dos casos, reticência quanto às conquistas do governo Fernando Henrique Cardoso no terreno econômico. Em linha com a sua relutância em relação ao Plano Real, com sua atitude protecionista e sua discordância quanto a aspectos essenciais das políticas monetária e fiscal então propostas pelo Ministério da Fazenda. Na verdade, uma razão importante para explicar as dificuldades da sua candidatura é a falta de continuidade entre o que o governo do PSDB fez no período FHC e o que o governo do PSDB se propõe a fazer depois de 2010. Agora, já em meio à campanha, houve menções à necessidade de conter o aumento da carga tributária. Parece bem pouco e muito tarde.
A candidata da situação vem demonstrando crescente segurança nas suas manifestações sobre a economia. Desafortunadamente, a segurança não é justificada pela substância do que tem a dizer. Recentemente, perguntada sobre a necessidade de um ajuste fiscal, reagiu com veemência. "Sou contra que se faça ajuste fiscal agora no Brasil." "Déficit fiscal é regime de caixa." "Na despesa você sai cortando: aumento de salário mínimo, aumento de salário." "Tem um lado da receita que todo mundo esquece. Sabe o que você faz? Você aumenta imposto."
Nessa memorável "explicação" a referência essencial é a aumento da receita. Desde o início da década de 1990 a carga tributária tem aumentado - hoje excede 34% do PIB. No governo Lula cresceu em média 0,4% do PIB ao ano. É um peso substancial, especialmente quando se leva em conta a qualidade dos serviços prestados pelo Estado. E tenderá a aumentar rapidamente, especialmente se forem implementadas as ideias da candidata quanto ao Estado no setor produtivo e ao relançamento de taxação vinculada a gastos na área de saúde.
Em outros períodos da história brasileira, foi difícil a convivência entre democracia e responsabilidade fiscal. Na Terceira República, entre 1945 e 1964, déficits públicos crescentes foram financiados de forma inflacionária. Houve enorme complacência quanto às finanças públicas e prevalência de visões de curto prazo com resultados desastrosos, primeiro econômicos, depois políticos. A lição a ser aprendida é que responsabilidade fiscal é condição necessária à preservação da democracia.
Sempre será possível continuar aumentando a carga tributária e enfrentar os custos econômicos e políticos que decorrerão da decisão. Mas não parece o caminho mais acertado. A capacidade de escolher entre objetivos alternativos é requisito fundamental para o exercício da Presidência da República. Para conter o ritmo de crescimento da carga tributária será necessário escolher entre despesas. A candidata deveria ter visão menos rudimentar do que seja ajuste fiscal. Um governo responsável vai ter, sim, de fazer ajuste fiscal. Aceitar os custos de curto prazo para obter os benefícios de longo prazo.
*Doutor em economia pela Universidade de Cambridge, é professor titular do Departamento de Economia da PUC-Rio.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
Brasil-EUA: o rato e o elefante - uma outra versao da historia...
Bem, para a questão do mito, algo já está respondido aqui, sem necessariamente o concurso de um zoologista (mas talvez de quem entenda de outras espécies de ratos).
Quanto ao caso em si, também está feita a retificação: parece que a submissão só foi até 2001: em 2002 já éramos valentes, quem diria?!
Talvez os diplomatas tenham sentido os ares da mudança e criaram coragem.
Nada como um candidato macho para induzi-los a agir, mesmo sendo submissos...
Lulismo: a auto-referência a serviço da propagação da ignorância. Ou: de ratos e elefantes
Reinaldo Azevedo, 08.09.2010
Nem sempre a gente tem um exemplo tão claro, tão evidente, como no texto que vai abaixo, de como Lula, o Depredador de Instituições, seqüestra a história alheia, rouba para si o mérito de terceiros e ainda fala mal daquele que foi espoliado. E tudo com freqüente ajuda da imprensa. Leiam o que informa Fábio Amato na Folha Online. Volto em seguida.
*
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quarta-feira que os EUA e a União Européia aprenderam a respeitar o Brasil depois de disputas comerciais travadas na OMC (Organização Mundial do Comércio) assim como um elefante “tem medo e se borra” de um rato.
A declaração foi feita quando o presidente discursava no evento de inauguração de um armazém de grãos da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), em Uberlândia (MG). De acordo com Lula, no seu governo o Brasil passou a “brigar” contra nações mais desenvolvidas e influentes, contrariando pensamento de seus antecessores que diziam que o país não poderia enfrentar economias como a dos EUA por que “são muito grandes.”
“Um elefante é daquele tamanhão, a tromba dele vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto de um elefante para ver como o bicho tem medo e se borra”, disse Lula, depois de relatar as disputas travadas pelo Brasil na OMC envolvendo temas como açúcar e algodão.
“Eu acho que o que nós fizemos foi dizer para os americanos: nós respeitamos vocês, queremos vocês como parceiro privilegiado nosso, mas nós queremos também ser respeitados”, declarou o presidente, completando que o mesmo recado foi dado à União Européia.
O presidente ainda disse que “o Brasil nunca teve condições de andar de cabeça erguida como agora” e criticou seus antecessores ao afirmar que, antes dele, o país era governado por pessoas com a “mente colonizada.”
Em novembro de 2009, a OMC autorizou o Brasil a retaliar os Estados Unidos em até US$ 830 milhões em resposta aos subsídios concedidos por aquele país aos produtores de algodão. A medida determina que US$ 591 milhões sejam de produtos que terão a tarifa de importação reajustada e cerca de US$ 240 milhões em propriedade intelectual, que envolve marcas, patentes e direitos autorais que podem ser quebrados pelo Brasil.
A retaliação deveria ter começado em abril, mas foi adiada primeiro em duas semanas e depois em dois meses para que, a partir de um aceno americano com medidas paliativas, os dois países fechassem um acordo definitivo.Em junho, porém, o governo brasileiro decidiu suspender por mais dois anos e meio o processo de retaliação comercial a produtos e propriedade intelectual dos Estados Unidos, diante de um acordo provisório que prevê a diminuição até 2012 dos subsídios ilegais ao algodão.
Comento [Reinaldo Azevedo]:
Não estou culpando esse ou aquele, o repórter tampouco. Estou apontando um estado de coisas, caracterizando um tempo. Quem lê o texto acima na Folha Online, além de ser informado da boçalidade vocabular do “guia” de Elio Gaspari — com sua vocação para a escatologia —, imagina que a autorização dada pela OMC para o Brasil retaliar os EUA derivou de uma ação do governo Lula.
Pois é… Quem recorreu à OMC contra os subsídios que o governo americano dava a seus produtores de algodão foi… atenção!, O GOVERNO FHC. Aconteceu em 2002, e o julgamento definitivo só se deu no dia 2 de junho de 2008, com a autorização para a retaliação. Em vez de partir para o confronto, o governo Lula tem postergado a reação, tentando negociar, o que é o certo, diga-se — já escrevi aqui a respeito. Mas imaginem o que os “economistas” do PT não estariam dizendo agora caso fosse FHC a evitar “a punição” aos EUA. Seria acusado de se subordinar ao imperialismo.
Assim vai se construindo uma farsa, nos seus pequenos detalhes. Quanto ao “elefante” que “se borra” (ai, ai…) de medo do “rato”, dizer o quê? Desconstruindo a metáfora em si, é preciso deixar claro: Lula está veiculando uma mentira. O Brasil tem hoje, no comércio mundial, praticamente a participação que tinha em 2002: variou de 1,1% para 1,2%. O valor das commodities é que cresceu brutalmente, o que foi bom para nós, mas Lula não tem nada com isso.
Quanto à coisa em si, É MENTIRA QUE ELEFANTES TENHAM MEDO DE RATOS. Trata-se de um mito, pura expressão de ignorância. Alguém deve ter visto alguma vez o pesado animal tentando pisar na minúscula e ágil criatura e supôs tratar-se de medo. O primeiro registro dessa bobagem em livro é de Plínio, o Velho, na enciclopédia “História Natural”. Segundo ele, o ódio do paquiderme pelo bichinho é tal que chega a recusar o feno em que o rato tenha passado. Plínio também achava que os elefantes tinham respeito pela religião.
Lula deve imaginar que o elefante de fato teme que o rato lhe entre tromba adentro — provável origem dessa tolice, temor idêntico, na seara política, que o EUA teriam do Brasil. Huuummm… Lula bem que tentou “entrar na tromba” de Obama no caso do Irã e até de Honduras. E levou uma trombada que o jogou a alguns metros de distância.
O lulismo é isto: a auto-referência a serviço da propagação da ignorância.
Quanto ao caso em si, também está feita a retificação: parece que a submissão só foi até 2001: em 2002 já éramos valentes, quem diria?!
Talvez os diplomatas tenham sentido os ares da mudança e criaram coragem.
Nada como um candidato macho para induzi-los a agir, mesmo sendo submissos...
Lulismo: a auto-referência a serviço da propagação da ignorância. Ou: de ratos e elefantes
Reinaldo Azevedo, 08.09.2010
Nem sempre a gente tem um exemplo tão claro, tão evidente, como no texto que vai abaixo, de como Lula, o Depredador de Instituições, seqüestra a história alheia, rouba para si o mérito de terceiros e ainda fala mal daquele que foi espoliado. E tudo com freqüente ajuda da imprensa. Leiam o que informa Fábio Amato na Folha Online. Volto em seguida.
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quarta-feira que os EUA e a União Européia aprenderam a respeitar o Brasil depois de disputas comerciais travadas na OMC (Organização Mundial do Comércio) assim como um elefante “tem medo e se borra” de um rato.
A declaração foi feita quando o presidente discursava no evento de inauguração de um armazém de grãos da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), em Uberlândia (MG). De acordo com Lula, no seu governo o Brasil passou a “brigar” contra nações mais desenvolvidas e influentes, contrariando pensamento de seus antecessores que diziam que o país não poderia enfrentar economias como a dos EUA por que “são muito grandes.”
“Um elefante é daquele tamanhão, a tromba dele vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto de um elefante para ver como o bicho tem medo e se borra”, disse Lula, depois de relatar as disputas travadas pelo Brasil na OMC envolvendo temas como açúcar e algodão.
“Eu acho que o que nós fizemos foi dizer para os americanos: nós respeitamos vocês, queremos vocês como parceiro privilegiado nosso, mas nós queremos também ser respeitados”, declarou o presidente, completando que o mesmo recado foi dado à União Européia.
O presidente ainda disse que “o Brasil nunca teve condições de andar de cabeça erguida como agora” e criticou seus antecessores ao afirmar que, antes dele, o país era governado por pessoas com a “mente colonizada.”
Em novembro de 2009, a OMC autorizou o Brasil a retaliar os Estados Unidos em até US$ 830 milhões em resposta aos subsídios concedidos por aquele país aos produtores de algodão. A medida determina que US$ 591 milhões sejam de produtos que terão a tarifa de importação reajustada e cerca de US$ 240 milhões em propriedade intelectual, que envolve marcas, patentes e direitos autorais que podem ser quebrados pelo Brasil.
A retaliação deveria ter começado em abril, mas foi adiada primeiro em duas semanas e depois em dois meses para que, a partir de um aceno americano com medidas paliativas, os dois países fechassem um acordo definitivo.Em junho, porém, o governo brasileiro decidiu suspender por mais dois anos e meio o processo de retaliação comercial a produtos e propriedade intelectual dos Estados Unidos, diante de um acordo provisório que prevê a diminuição até 2012 dos subsídios ilegais ao algodão.
Comento [Reinaldo Azevedo]:
Não estou culpando esse ou aquele, o repórter tampouco. Estou apontando um estado de coisas, caracterizando um tempo. Quem lê o texto acima na Folha Online, além de ser informado da boçalidade vocabular do “guia” de Elio Gaspari — com sua vocação para a escatologia —, imagina que a autorização dada pela OMC para o Brasil retaliar os EUA derivou de uma ação do governo Lula.
Pois é… Quem recorreu à OMC contra os subsídios que o governo americano dava a seus produtores de algodão foi… atenção!, O GOVERNO FHC. Aconteceu em 2002, e o julgamento definitivo só se deu no dia 2 de junho de 2008, com a autorização para a retaliação. Em vez de partir para o confronto, o governo Lula tem postergado a reação, tentando negociar, o que é o certo, diga-se — já escrevi aqui a respeito. Mas imaginem o que os “economistas” do PT não estariam dizendo agora caso fosse FHC a evitar “a punição” aos EUA. Seria acusado de se subordinar ao imperialismo.
Assim vai se construindo uma farsa, nos seus pequenos detalhes. Quanto ao “elefante” que “se borra” (ai, ai…) de medo do “rato”, dizer o quê? Desconstruindo a metáfora em si, é preciso deixar claro: Lula está veiculando uma mentira. O Brasil tem hoje, no comércio mundial, praticamente a participação que tinha em 2002: variou de 1,1% para 1,2%. O valor das commodities é que cresceu brutalmente, o que foi bom para nós, mas Lula não tem nada com isso.
Quanto à coisa em si, É MENTIRA QUE ELEFANTES TENHAM MEDO DE RATOS. Trata-se de um mito, pura expressão de ignorância. Alguém deve ter visto alguma vez o pesado animal tentando pisar na minúscula e ágil criatura e supôs tratar-se de medo. O primeiro registro dessa bobagem em livro é de Plínio, o Velho, na enciclopédia “História Natural”. Segundo ele, o ódio do paquiderme pelo bichinho é tal que chega a recusar o feno em que o rato tenha passado. Plínio também achava que os elefantes tinham respeito pela religião.
Lula deve imaginar que o elefante de fato teme que o rato lhe entre tromba adentro — provável origem dessa tolice, temor idêntico, na seara política, que o EUA teriam do Brasil. Huuummm… Lula bem que tentou “entrar na tromba” de Obama no caso do Irã e até de Honduras. E levou uma trombada que o jogou a alguns metros de distância.
O lulismo é isto: a auto-referência a serviço da propagação da ignorância.
Brasil-EUA: o rato e o elefante que se borra de medo...
A imagem do rato e do elefente é tradicional, mas ainda não a tinhamos visto aplicada às relações Brasil-EUA. Aliás, eu não tenho certeza de que os elefantes tem medo de ratos: pode ser mito, mas talvez algum zoólogo, ou ratólogo (elefantólogo também serve) poderia confirmar...
Quanto ao fato de todo mundo no Brasil, especialmente no Itamaraty, ser colonizado antes de 2003, parece que nunca antes neste país alguém tinha se lembrado de ser independente; éramos todos colonizados, assim por gosto de ser submisso, dependente, servil. Foi preciso vir um presidente muito macho para ordenar que parássemos de ser colonizados. Ainda bem...
Paulo Roberto de Almeida
Disputa na OMC
Lula compara EUA a um elefante que se 'borra' de medo de rato
Luiza Damé, enviada especial
O Globo, 08/09/2010 às 15h04m
"Um elefante é daquele tamanhão, a tromba do elefante vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto do elefante para ver como o bicho tem medo e se borra."
UBERLÂNDIA (MG) - Na inauguração de um armazém graneleiro da Conab, nesta quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou os Estados Unidos a um elefante que tem medo de rato - o Brasil. Lula falava dos contenciosos do Brasil e dos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre algodão e açúcar, afirmando que foi criticado por comprar briga com um país maior. Segundo Lula, o elefante é maior, mas "se borra" de medo do rato.
- Um elefante é daquele tamanhão, a tromba do elefante vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto do elefante para ver como o bicho tem medo e se borra. Eu acho que o que nós fizemos foi dizer para os americanos: nós respeitamos vocês, queremos como parceiro privilegiado nosso, mas queremos também ser respeitados. Dissemos para os europeus a mesma coisa. O Brasil nuca teve condições de andar de cabeça erguida como agora - afirmou Lula.
Segundo Lula, antes do seu governo havia uma mentalidade colonizada nos governantes brasileiros. Lula disse que houve um tempo em que o Brasil foi governado por "pessoas que pareciam inteligentes, mas tinham mentalidade colonizada" e seguiam as orientações dos Estados Unidos e da Europa.
- A independência que nós conquistamos em 1822, na verdade, ultrapassou o século 19 porque a mentalidade das pessoas ficou colonizada. Hoje o Brasil respeita os Estados Unidos, respeita a Europa, mas o Brasil é dono de seu nariz, anda de cabeça erguida e nós queremos competir em igualdade de condições - afirmou.
Lula inaugurou um graneleiro com capacidade para armazenar 100 mil toneladas de grãos e defendeu o fortalecimento da Conab. Para Lula, a empresa é fundamental para manter os estoques reguladores de alimentos no país.
Quanto ao fato de todo mundo no Brasil, especialmente no Itamaraty, ser colonizado antes de 2003, parece que nunca antes neste país alguém tinha se lembrado de ser independente; éramos todos colonizados, assim por gosto de ser submisso, dependente, servil. Foi preciso vir um presidente muito macho para ordenar que parássemos de ser colonizados. Ainda bem...
Paulo Roberto de Almeida
Disputa na OMC
Lula compara EUA a um elefante que se 'borra' de medo de rato
Luiza Damé, enviada especial
O Globo, 08/09/2010 às 15h04m
"Um elefante é daquele tamanhão, a tromba do elefante vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto do elefante para ver como o bicho tem medo e se borra."
UBERLÂNDIA (MG) - Na inauguração de um armazém graneleiro da Conab, nesta quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou os Estados Unidos a um elefante que tem medo de rato - o Brasil. Lula falava dos contenciosos do Brasil e dos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre algodão e açúcar, afirmando que foi criticado por comprar briga com um país maior. Segundo Lula, o elefante é maior, mas "se borra" de medo do rato.
- Um elefante é daquele tamanhão, a tromba do elefante vale uns dez ratos, mas coloca um ratinho perto do elefante para ver como o bicho tem medo e se borra. Eu acho que o que nós fizemos foi dizer para os americanos: nós respeitamos vocês, queremos como parceiro privilegiado nosso, mas queremos também ser respeitados. Dissemos para os europeus a mesma coisa. O Brasil nuca teve condições de andar de cabeça erguida como agora - afirmou Lula.
Segundo Lula, antes do seu governo havia uma mentalidade colonizada nos governantes brasileiros. Lula disse que houve um tempo em que o Brasil foi governado por "pessoas que pareciam inteligentes, mas tinham mentalidade colonizada" e seguiam as orientações dos Estados Unidos e da Europa.
- A independência que nós conquistamos em 1822, na verdade, ultrapassou o século 19 porque a mentalidade das pessoas ficou colonizada. Hoje o Brasil respeita os Estados Unidos, respeita a Europa, mas o Brasil é dono de seu nariz, anda de cabeça erguida e nós queremos competir em igualdade de condições - afirmou.
Lula inaugurou um graneleiro com capacidade para armazenar 100 mil toneladas de grãos e defendeu o fortalecimento da Conab. Para Lula, a empresa é fundamental para manter os estoques reguladores de alimentos no país.
Venezuela: ou vai ou racha, em direcao ao socialismo
Não foi exatamente isso que disse el comandante (outro...), mas foi algo equivalente.
Em todo caso, a hora se aproxima, e de fato será o tradicional "ou vai ou racha"...
Venezuela: Chávez exige un “viraje estratégico radical” para reforzar el sistema socialista
Infolatam, Caracas, 6 de septiembre de 2010
"Han intentado hacer una campañita de que soy antijudío (...); en verdad, respetamos y queremos al pueblo judío", dijo Chávez.
El presidente de Venezuela, Hugo Chávez, exigió a sus seguidores, especialmente a sus ministros y viceministros, “un viraje estratégico radical” a favor del “poder popular”, convencido de que de ello depende su proyecto socialista.
“Exijo que a partir de este mismo instante hagamos un viraje estratégico radical en esto de las formación de las comunas (…); el éxito del proyecto socialista depende de muchos factores, pero uno de ellos, uno de los más sólidos, de los más grandes, de los más impactantes, es el proyecto de los consejos comunales y las comunas: el poder popular”, dijo en Táchira, estado fronterizo con Colombia.
Tras una jornada dominical de manifestaciones, acompañado de prácticamente todos sus ministros, de cara a las elecciones parlamentarias del próximo día 26, y de visitas a diversas organizaciones populares y empresas comunales, urbanas y rurales de la zona, el gobernante admitió que ha constatado que en organización popular “todavía no hemos avanzando lo hay que avanzar”.
Con el poder popular organizado se logrará, dijo Chávez, “evitar que los capitalistas vuelvan a tomar los gobiernos”.
“Lo que más debemos cuidar no es lo que hasta ahora hemos logrado. Lo que hemos logrado es positivo, pero es muy poco comparado con lo que vamos a lograr en el futuro. Entonces, lo que más debemos cuidar es el futuro”, insistió.
Em todo caso, a hora se aproxima, e de fato será o tradicional "ou vai ou racha"...
Venezuela: Chávez exige un “viraje estratégico radical” para reforzar el sistema socialista
Infolatam, Caracas, 6 de septiembre de 2010
"Han intentado hacer una campañita de que soy antijudío (...); en verdad, respetamos y queremos al pueblo judío", dijo Chávez.
El presidente de Venezuela, Hugo Chávez, exigió a sus seguidores, especialmente a sus ministros y viceministros, “un viraje estratégico radical” a favor del “poder popular”, convencido de que de ello depende su proyecto socialista.
“Exijo que a partir de este mismo instante hagamos un viraje estratégico radical en esto de las formación de las comunas (…); el éxito del proyecto socialista depende de muchos factores, pero uno de ellos, uno de los más sólidos, de los más grandes, de los más impactantes, es el proyecto de los consejos comunales y las comunas: el poder popular”, dijo en Táchira, estado fronterizo con Colombia.
Tras una jornada dominical de manifestaciones, acompañado de prácticamente todos sus ministros, de cara a las elecciones parlamentarias del próximo día 26, y de visitas a diversas organizaciones populares y empresas comunales, urbanas y rurales de la zona, el gobernante admitió que ha constatado que en organización popular “todavía no hemos avanzando lo hay que avanzar”.
Con el poder popular organizado se logrará, dijo Chávez, “evitar que los capitalistas vuelvan a tomar los gobiernos”.
“Lo que más debemos cuidar no es lo que hasta ahora hemos logrado. Lo que hemos logrado es positivo, pero es muy poco comparado con lo que vamos a lograr en el futuro. Entonces, lo que más debemos cuidar es el futuro”, insistió.
US obsession with terrorism - George Friedman
9/11 and the 9-Year War
By George Friedman
Stratfor, September 8, 2010
It has now been nine years since al Qaeda attacked the United States. It has been nine years in which the primary focus of the United States has been on the Islamic world. In addition to a massive investment in homeland security, the United States has engaged in two multi-year, multi-divisional wars in Iraq and Afghanistan, inserted forces in other countries in smaller operations and conducted a global covert campaign against al Qaeda and other radical jihadist groups.
In order to understand the last nine years you must understand the first 24 hours of the war — and recall your own feelings in those 24 hours. First, the attack was a shock, its audaciousness frightening. Second, we did not know what was coming next. The attack had destroyed the right to complacent assumptions. Were there other cells standing by in the United States? Did they have capabilities even more substantial than what they showed on Sept. 11? Could they be detected and stopped? Any American not frightened on Sept. 12 was not in touch with reality. Many who are now claiming that the United States overreacted are forgetting their own sense of panic. We are all calm and collected nine years after.
At the root of all of this was a profound lack of understanding of al Qaeda, particularly its capabilities and intentions. Since we did not know what was possible, our only prudent course was to prepare for the worst. That is what the Bush administration did. Nothing symbolized this more than the fear that al Qaeda had acquired nuclear weapons and that they would use them against the United States. The evidence was minimal, but the consequences would be overwhelming. Bush crafted a strategy based on the worst-case scenario.
Bush was the victim of a decade of failure in the intelligence community to understand what al Qaeda was and wasn’t. I am not merely talking about the failure to predict the 9/11 attack. Regardless of assertions afterwards, the intelligence community provided only vague warnings that lacked the kind of specificity that makes for actionable intelligence. To a certain degree, this is understandable. Al Qaeda learned from Soviet, Saudi, Pakistani and American intelligence during the Soviet occupation of Afghanistan and knew how to launch attacks without tipping off the target. The greatest failure of American intelligence was not the lack of a clear warning about 9/11 but the lack, on Sept. 12, of a clear picture of al Qaeda’s global structure, capabilities, weaknesses and intentions. Without such information, implementing U.S. policy was like piloting an airplane with faulty instruments in a snowstorm at night.
The president had to do three things: First, he had to assure the public that he knew what he was doing. Second, he had to do something that appeared decisive. Third, he had to gear up an intelligence and security apparatus to tell him what the threats actually were and what he ought to do. American policy became ready, fire, aim.
In looking back at the past nine years, two conclusions can be drawn: There were no more large-scale attacks on the United States by militant Islamists, and the United States was left with the legacy of responses that took place in the first two years after 9/11. This legacy is no longer useful, if it ever was, to the primary mission of defeating al Qaeda, and it represents an effort that is retrospectively out of proportion to the threat.
If I had been told on Sept.12, 2001, that the attack the day before would be the last major attack for at least nine years, I would not have believed it. In looking at the complexity of the security and execution of the 9/11 attack, I would have assumed that an organization capable of acting once in such a way could act again even more effectively. My assumption was wrong. Al Qaeda did not have the resources to mount other operations, and the U.S. response, in many ways clumsy and misguided and in other ways clever and targeted, disrupted any preparations in which al Qaeda might have been engaged to conduct follow-on attacks.
Knowing that about al Qaeda in 2001 was impossible. Knowing which operations were helpful in the effort to block them was impossible, in the context of what Americans knew in the first years after the war began. Therefore, Washington wound up in the contradictory situation in which American military and covert operations surged while new attacks failed to materialize. This created a massive political problem. Rather than appearing to be the cause for the lack of attacks, U.S. military operations were perceived by many as being unnecessary or actually increasing the threat of attack. Even in hindsight, aligning U.S. actions with the apparent outcome is difficult and controversial. But still we know two things: It has been nine years since Sept. 11, 2001, and the war goes on.
What happened was that an act of terrorism was allowed to redefine U.S. grand strategy. The United States operates with a grand strategy derived from the British strategy in Europe — maintaining the balance of power. For the United Kingdom, maintaining the balance of power in Europe protected any one power from emerging that could unite Europe and build a fleet to invade the United Kingdom or block its access to its empire. British strategy was to help create coalitions to block emerging hegemons such as Spain, France or Germany. Using overt and covert means, the United Kingdom aimed to ensure that no hegemonic power could emerge.
The Americans inherited that grand strategy from the British but elevated it to a global rather than regional level. Having blocked the Soviet Union from hegemony over Europe and Asia, the United States proceeded with a strategy whose goal, like that of the United Kingdom, was to nip potential regional hegemons in the bud. The U.S. war with Iraq in 1990-91 and the war with Serbia/Yugoslavia in 1999 were examples of this strategy. It involved coalition warfare, shifting America’s weight from side to side and using minimal force to disrupt the plans of regional aspirants to gain power. This U.S. strategy also was cloaked in the ideology of global liberalism and human rights.
The key to this strategy was its global nature. The emergence of a hegemonic contender that could challenge the United States globally, as the Soviet Union had done, was the worst-case scenario. Therefore, the containment of emerging powers wherever they might emerge was the centerpiece of American balance-of-power strategy.
The most significant effect of 9/11 was that it knocked the United States off its strategy. Rather than adapting its standing global strategy to better address the counterterrorism issue, the United States became obsessed with a single region, the area between the Mediterranean and the Hindu Kush. Within that region, the United States operated with a balance-of-power strategy. It played off all of the nations in the region against each other. It did the same with ethnic and religious groups throughout the region and particularly within Iraq and Afghanistan, the main theaters of the war. In both cases, the United States sought to take advantage of internal divisions, shifting its support in various directions to create a balance of power. That, in the end, was what the surge strategy was all about.
The American obsession with this region in the wake of 9/11 is understandable. Nine years later, with no clear end in sight, the question is whether this continued focus is strategically rational for the United States. Given the uncertainties of the first few years, obsession and uncertainty are understandable, but as a long-term U.S. strategy — the long war that the U.S. Department of Defense is preparing for — it leaves the rest of the world uncovered.
Consider that the Russians have used the American absorption in this region as a window of opportunity to work to reconstruct their geopolitical position. When Russia went to war with Georgia in 2008, an American ally, the United States did not have the forces with which to make a prudent intervention. Similarly, the Chinese have had a degree of freedom of action they could not have expected to enjoy prior to 9/11. The single most important result of 9/11 was that it shifted the United States from a global stance to a regional one, allowing other powers to take advantage of this focus to create significant potential challenges to the United States.
One can make the case, as I have, that whatever the origin of the Iraq war, remaining in Iraq to contain Iran is necessary. It is difficult to make a similar case for Afghanistan. Its strategic interest to the United States is minimal. The only justification for the war is that al Qaeda launched its attacks on the United States from Afghanistan. But that justification is no longer valid. Al Qaeda can launch attacks from Yemen or other countries. The fact that Afghanistan was the base from which the attacks were launched does not mean that al Qaeda depends on Afghanistan to launch attacks. And given that the apex leadership of al Qaeda has not launched attacks in a while, the question is whether al Qaeda is capable of launching such attacks any longer. In any case, managing al Qaeda today does not require nation building in Afghanistan.
But let me state a more radical thesis: The threat of terrorism cannot become the singular focus of the United States. Let me push it further: The United States cannot subordinate its grand strategy to simply fighting terrorism even if there will be occasional terrorist attacks on the United States. Three thousand people died in the 9/11 attack. That is a tragedy, but in a nation of over 300 million, 3,000 deaths cannot be permitted to define the totality of national strategy. Certainly, resources must be devoted to combating the threat and, to the extent possible, disrupting it. But it must also be recognized that terrorism cannot always be blocked, that terrorist attacks will occur and that the world’s only global power cannot be captive to this single threat.
The initial response was understandable and necessary. The United States must continue its intelligence gathering and covert operations against militant Islamists throughout the world. The intelligence failures of the 1990s must not be repeated. But waging a multi-divisional war in Afghanistan makes no strategic sense. The balance-of-power strategy must be used. Pakistan will intervene and discover the Russians and Iranians. The great game will continue. As for Iran, regional counters must be supported at limited cost to the United States. The United States should not be patrolling the far reaches of the region. It should be supporting a balance of power among the native powers of the region.
The United States is a global power and, as such, it must have a global view. It has interests and challenges beyond this region and certainly beyond Afghanistan. The issue there is not whether the United States can or can’t win, however that is defined. The issue is whether it is worth the effort considering what is going on in the rest of the world. Gen. David Petraeus cast the war in terms of whether the United States can win it. That’s reasonable; he’s the commander. But American strategy has to ask another question: What does the United States lose elsewhere while it focuses on the future of Kandahar?
The 9/11 attack shocked the United States and made counterterrorism the centerpiece of American foreign policy. That is too narrow a basis on which to base U.S. foreign policy. It is certainly an important strand of that policy, and it must be addressed, but it should be addressed through the regional balance of power. It is the good fortune of the United States that the Islamic world is torn by internal rivalries.
This is not dismissing the threat of terror. It is recognizing that the United States has done well in suppressing it over the past nine years but at a cost in other regions, a cost that can’t be sustained indefinitely and a cost that could well result in challenges more threatening than a rising Islamist militancy. The United States must now settle into a long-term strategy of managing terrorism as best as it can while not neglecting the rest of its interests.
After nine years, the issue is not what to do in Afghanistan but how the global power can return to managing all of its global interests, along with the war on al Qaeda.
9/11 and the 9-Year War - STRATFOR
By George Friedman
Stratfor, September 8, 2010
It has now been nine years since al Qaeda attacked the United States. It has been nine years in which the primary focus of the United States has been on the Islamic world. In addition to a massive investment in homeland security, the United States has engaged in two multi-year, multi-divisional wars in Iraq and Afghanistan, inserted forces in other countries in smaller operations and conducted a global covert campaign against al Qaeda and other radical jihadist groups.
In order to understand the last nine years you must understand the first 24 hours of the war — and recall your own feelings in those 24 hours. First, the attack was a shock, its audaciousness frightening. Second, we did not know what was coming next. The attack had destroyed the right to complacent assumptions. Were there other cells standing by in the United States? Did they have capabilities even more substantial than what they showed on Sept. 11? Could they be detected and stopped? Any American not frightened on Sept. 12 was not in touch with reality. Many who are now claiming that the United States overreacted are forgetting their own sense of panic. We are all calm and collected nine years after.
At the root of all of this was a profound lack of understanding of al Qaeda, particularly its capabilities and intentions. Since we did not know what was possible, our only prudent course was to prepare for the worst. That is what the Bush administration did. Nothing symbolized this more than the fear that al Qaeda had acquired nuclear weapons and that they would use them against the United States. The evidence was minimal, but the consequences would be overwhelming. Bush crafted a strategy based on the worst-case scenario.
Bush was the victim of a decade of failure in the intelligence community to understand what al Qaeda was and wasn’t. I am not merely talking about the failure to predict the 9/11 attack. Regardless of assertions afterwards, the intelligence community provided only vague warnings that lacked the kind of specificity that makes for actionable intelligence. To a certain degree, this is understandable. Al Qaeda learned from Soviet, Saudi, Pakistani and American intelligence during the Soviet occupation of Afghanistan and knew how to launch attacks without tipping off the target. The greatest failure of American intelligence was not the lack of a clear warning about 9/11 but the lack, on Sept. 12, of a clear picture of al Qaeda’s global structure, capabilities, weaknesses and intentions. Without such information, implementing U.S. policy was like piloting an airplane with faulty instruments in a snowstorm at night.
The president had to do three things: First, he had to assure the public that he knew what he was doing. Second, he had to do something that appeared decisive. Third, he had to gear up an intelligence and security apparatus to tell him what the threats actually were and what he ought to do. American policy became ready, fire, aim.
In looking back at the past nine years, two conclusions can be drawn: There were no more large-scale attacks on the United States by militant Islamists, and the United States was left with the legacy of responses that took place in the first two years after 9/11. This legacy is no longer useful, if it ever was, to the primary mission of defeating al Qaeda, and it represents an effort that is retrospectively out of proportion to the threat.
If I had been told on Sept.12, 2001, that the attack the day before would be the last major attack for at least nine years, I would not have believed it. In looking at the complexity of the security and execution of the 9/11 attack, I would have assumed that an organization capable of acting once in such a way could act again even more effectively. My assumption was wrong. Al Qaeda did not have the resources to mount other operations, and the U.S. response, in many ways clumsy and misguided and in other ways clever and targeted, disrupted any preparations in which al Qaeda might have been engaged to conduct follow-on attacks.
Knowing that about al Qaeda in 2001 was impossible. Knowing which operations were helpful in the effort to block them was impossible, in the context of what Americans knew in the first years after the war began. Therefore, Washington wound up in the contradictory situation in which American military and covert operations surged while new attacks failed to materialize. This created a massive political problem. Rather than appearing to be the cause for the lack of attacks, U.S. military operations were perceived by many as being unnecessary or actually increasing the threat of attack. Even in hindsight, aligning U.S. actions with the apparent outcome is difficult and controversial. But still we know two things: It has been nine years since Sept. 11, 2001, and the war goes on.
What happened was that an act of terrorism was allowed to redefine U.S. grand strategy. The United States operates with a grand strategy derived from the British strategy in Europe — maintaining the balance of power. For the United Kingdom, maintaining the balance of power in Europe protected any one power from emerging that could unite Europe and build a fleet to invade the United Kingdom or block its access to its empire. British strategy was to help create coalitions to block emerging hegemons such as Spain, France or Germany. Using overt and covert means, the United Kingdom aimed to ensure that no hegemonic power could emerge.
The Americans inherited that grand strategy from the British but elevated it to a global rather than regional level. Having blocked the Soviet Union from hegemony over Europe and Asia, the United States proceeded with a strategy whose goal, like that of the United Kingdom, was to nip potential regional hegemons in the bud. The U.S. war with Iraq in 1990-91 and the war with Serbia/Yugoslavia in 1999 were examples of this strategy. It involved coalition warfare, shifting America’s weight from side to side and using minimal force to disrupt the plans of regional aspirants to gain power. This U.S. strategy also was cloaked in the ideology of global liberalism and human rights.
The key to this strategy was its global nature. The emergence of a hegemonic contender that could challenge the United States globally, as the Soviet Union had done, was the worst-case scenario. Therefore, the containment of emerging powers wherever they might emerge was the centerpiece of American balance-of-power strategy.
The most significant effect of 9/11 was that it knocked the United States off its strategy. Rather than adapting its standing global strategy to better address the counterterrorism issue, the United States became obsessed with a single region, the area between the Mediterranean and the Hindu Kush. Within that region, the United States operated with a balance-of-power strategy. It played off all of the nations in the region against each other. It did the same with ethnic and religious groups throughout the region and particularly within Iraq and Afghanistan, the main theaters of the war. In both cases, the United States sought to take advantage of internal divisions, shifting its support in various directions to create a balance of power. That, in the end, was what the surge strategy was all about.
The American obsession with this region in the wake of 9/11 is understandable. Nine years later, with no clear end in sight, the question is whether this continued focus is strategically rational for the United States. Given the uncertainties of the first few years, obsession and uncertainty are understandable, but as a long-term U.S. strategy — the long war that the U.S. Department of Defense is preparing for — it leaves the rest of the world uncovered.
Consider that the Russians have used the American absorption in this region as a window of opportunity to work to reconstruct their geopolitical position. When Russia went to war with Georgia in 2008, an American ally, the United States did not have the forces with which to make a prudent intervention. Similarly, the Chinese have had a degree of freedom of action they could not have expected to enjoy prior to 9/11. The single most important result of 9/11 was that it shifted the United States from a global stance to a regional one, allowing other powers to take advantage of this focus to create significant potential challenges to the United States.
One can make the case, as I have, that whatever the origin of the Iraq war, remaining in Iraq to contain Iran is necessary. It is difficult to make a similar case for Afghanistan. Its strategic interest to the United States is minimal. The only justification for the war is that al Qaeda launched its attacks on the United States from Afghanistan. But that justification is no longer valid. Al Qaeda can launch attacks from Yemen or other countries. The fact that Afghanistan was the base from which the attacks were launched does not mean that al Qaeda depends on Afghanistan to launch attacks. And given that the apex leadership of al Qaeda has not launched attacks in a while, the question is whether al Qaeda is capable of launching such attacks any longer. In any case, managing al Qaeda today does not require nation building in Afghanistan.
But let me state a more radical thesis: The threat of terrorism cannot become the singular focus of the United States. Let me push it further: The United States cannot subordinate its grand strategy to simply fighting terrorism even if there will be occasional terrorist attacks on the United States. Three thousand people died in the 9/11 attack. That is a tragedy, but in a nation of over 300 million, 3,000 deaths cannot be permitted to define the totality of national strategy. Certainly, resources must be devoted to combating the threat and, to the extent possible, disrupting it. But it must also be recognized that terrorism cannot always be blocked, that terrorist attacks will occur and that the world’s only global power cannot be captive to this single threat.
The initial response was understandable and necessary. The United States must continue its intelligence gathering and covert operations against militant Islamists throughout the world. The intelligence failures of the 1990s must not be repeated. But waging a multi-divisional war in Afghanistan makes no strategic sense. The balance-of-power strategy must be used. Pakistan will intervene and discover the Russians and Iranians. The great game will continue. As for Iran, regional counters must be supported at limited cost to the United States. The United States should not be patrolling the far reaches of the region. It should be supporting a balance of power among the native powers of the region.
The United States is a global power and, as such, it must have a global view. It has interests and challenges beyond this region and certainly beyond Afghanistan. The issue there is not whether the United States can or can’t win, however that is defined. The issue is whether it is worth the effort considering what is going on in the rest of the world. Gen. David Petraeus cast the war in terms of whether the United States can win it. That’s reasonable; he’s the commander. But American strategy has to ask another question: What does the United States lose elsewhere while it focuses on the future of Kandahar?
The 9/11 attack shocked the United States and made counterterrorism the centerpiece of American foreign policy. That is too narrow a basis on which to base U.S. foreign policy. It is certainly an important strand of that policy, and it must be addressed, but it should be addressed through the regional balance of power. It is the good fortune of the United States that the Islamic world is torn by internal rivalries.
This is not dismissing the threat of terror. It is recognizing that the United States has done well in suppressing it over the past nine years but at a cost in other regions, a cost that can’t be sustained indefinitely and a cost that could well result in challenges more threatening than a rising Islamist militancy. The United States must now settle into a long-term strategy of managing terrorism as best as it can while not neglecting the rest of its interests.
After nine years, the issue is not what to do in Afghanistan but how the global power can return to managing all of its global interests, along with the war on al Qaeda.
9/11 and the 9-Year War - STRATFOR
Shift in global power: it's China again
Detecting subtle shifts in the balance of power
Daniel Blumenthal - Shadow Government
Foreign Policy, Friday, September 3, 2010
Subtle shifts in the balance of power are difficult to detect yet of foremost importance to peace and stability. And even if detected in a timely fashion, policymakers can be slow to react. But maintaining a balance of power favorable to one's interests is one of a president's key tasks. On that score, our leaders have been negligent for over a decade.
Occasionally, presidents detect shifts in the military balance when it is too late and then compound the problem by responding with questionable policy choices. For example, President Eisenhower's policy of massive retaliation was, in part, a response to what seemed to be a loss of the U.S nuclear monopoly and Soviet conventional supremacy in continental Europe. (Eisenhower also wanted to maintain U.S superiority on the cheap -- by cutting Truman's conventional defense build-up).
A policy of responding with a nuclear attack to Soviet aggression anywhere did not seem very prudent to many at the time, but at least the president took the perceived shift in the balance of power seriously. Some of President Nixon and Carter's questionable arms control ideas were a response to a shift in the strategic balance in favor of the Soviets. Unfortunately, most of the time, policymakers do not react to an adversary's growing capabilities until met with disaster (e.g. Pearl Harbor, the Soviet invasion of Afghanistan, 9/11).
Today the balance of power in Asia is shifting. Since the end of World War II, Washington has kept the peace in Asia through its forward presence of military forces and its uncontested ability to project force into the region. Take an example from just 14 years ago. Realizing how destabilizing were China's missile tests conducted in the waters around Taiwan, President Clinton sent carrier battle groups near the Taiwan Strait. The missile tests stopped, Taiwan held its elections, and conflict was avoided.
Today, any president would think twice about doing the same. Why? China has arguably gained conventional supremacy around its periphery. Without remediation this could become a hard fact. China's growing short-range missile arsenal (maybe up to 1,500) and fleet of modern aircraft could not only be used to destroy much of Taiwan, but could also be used to strike devastating blows against U.S. forces in Japan. Together with its fast-growing submarine fleet, the Chinese missile force will, within the next decade, be able to cause serious harm to U.S. carriers steaming into the region.
Beijing has been focused like a laser beam on how to coerce and intimidate Taiwan while deterring U.S. and Japanese intervention. Washington has not given the same attention to defense. Our shipbuilding program has atrophied, our ability to protect the bases from which our aircraft fly is non-existent, and there is nothing in the current navy or air force programs of record that demonstrate our attentiveness to this problem.
As a country, we have become so accustomed to projecting air and sea power with impunity anywhere in the world that the idea that our aircraft could be shot down or surface ships sunk seems like science fiction. But China has been studying how to undermine the way we do battle for decades, and its efforts are bearing fruit.
A president choosing to respond to a Chinese attack on Taiwan would now face a host of bad options, most of which are dangerously escalatory. If U.S. forces or those of an ally were attacked, Washington could eventually bring its superior power to bear from other theaters of conflict, but it would take time, and, as shown both in the Center for Strategic and Budgetary Assessment's AirSea Battle and in RAND's A Question of Balance, would probably require hitting military targets in China itself. Considering China's growing conventional superiority, a president's response to a devastating blow by the Chinese against U.S., Japanese, and Taiwanese assets may, by necessity, be highly escalatory.
The good news is that it is not too late to restore some stability to the equation. The United States is a far richer and more stable nation than China. With marginal adjustments in how we spend our finite tax-payer dollars, we can restore a favorable conventional balance in the Pacific that would lessen Chinese temptations to use force and provide us with more strategically stable defensive options should Beijing succumb to those temptations. We seek a cooperative relationship with China, which makes it difficult to think about the unthinkable -- a conflict with China. But a conflict with the United States is just about all the PLA thinks about, and for the sake of peace we must take them seriously.
…………………………………………………
Biography
Dan Blumenthal is a current commissioner and former vice chairman of the U.S.-China Economic and Security Review Commission, where he directs efforts to monitor, investigate, and provide recommendations on the national security implications of the economic relationship between the two countries. Previously, he was senior director for China, Taiwan, and Mongolia in the Secretary of Defense's Office of International Security Affairs and practiced law in New York prior to his government service. At AEI, in addition to his work on the national security implications of U.S.-Sino relations, he coordinates the Tocqueville on China project, which examines the underlying civic culture of post-Mao China. Mr. Blumenthal also contributes to AEI's Asian Outlook series and is a research associate with the National Asia Research Program.
……………………………………
Shadow Government is a blog about U.S. foreign policy under the Obama administration, written by experienced policy makers from the loyal opposition and curated by Peter D. Feaver and William Inboden.
So, Shadow Government has three goals: 1) to provide you, our readers, with a respectful and nuanced assessment of the Obama administration's foreign policy; 2) to offer, where we find points or policies to disagree with, what we think is a responsible alternative course of action; and 3) to defend the Obama administration, as fellow foreign-policy professionals, when good decisions they make are misunderstood or unfairly criticized.
We are critical at times, but we always seek to be civil and constructive. We occasionally find fault, but we always do so in good faith. And we do all of this with the goal of elevating the discourse on U.S. foreign policy, as much as one blog can. We hope you find it interesting.
—Peter Feaver & William Inboden
Daniel Blumenthal - Shadow Government
Foreign Policy, Friday, September 3, 2010
Subtle shifts in the balance of power are difficult to detect yet of foremost importance to peace and stability. And even if detected in a timely fashion, policymakers can be slow to react. But maintaining a balance of power favorable to one's interests is one of a president's key tasks. On that score, our leaders have been negligent for over a decade.
Occasionally, presidents detect shifts in the military balance when it is too late and then compound the problem by responding with questionable policy choices. For example, President Eisenhower's policy of massive retaliation was, in part, a response to what seemed to be a loss of the U.S nuclear monopoly and Soviet conventional supremacy in continental Europe. (Eisenhower also wanted to maintain U.S superiority on the cheap -- by cutting Truman's conventional defense build-up).
A policy of responding with a nuclear attack to Soviet aggression anywhere did not seem very prudent to many at the time, but at least the president took the perceived shift in the balance of power seriously. Some of President Nixon and Carter's questionable arms control ideas were a response to a shift in the strategic balance in favor of the Soviets. Unfortunately, most of the time, policymakers do not react to an adversary's growing capabilities until met with disaster (e.g. Pearl Harbor, the Soviet invasion of Afghanistan, 9/11).
Today the balance of power in Asia is shifting. Since the end of World War II, Washington has kept the peace in Asia through its forward presence of military forces and its uncontested ability to project force into the region. Take an example from just 14 years ago. Realizing how destabilizing were China's missile tests conducted in the waters around Taiwan, President Clinton sent carrier battle groups near the Taiwan Strait. The missile tests stopped, Taiwan held its elections, and conflict was avoided.
Today, any president would think twice about doing the same. Why? China has arguably gained conventional supremacy around its periphery. Without remediation this could become a hard fact. China's growing short-range missile arsenal (maybe up to 1,500) and fleet of modern aircraft could not only be used to destroy much of Taiwan, but could also be used to strike devastating blows against U.S. forces in Japan. Together with its fast-growing submarine fleet, the Chinese missile force will, within the next decade, be able to cause serious harm to U.S. carriers steaming into the region.
Beijing has been focused like a laser beam on how to coerce and intimidate Taiwan while deterring U.S. and Japanese intervention. Washington has not given the same attention to defense. Our shipbuilding program has atrophied, our ability to protect the bases from which our aircraft fly is non-existent, and there is nothing in the current navy or air force programs of record that demonstrate our attentiveness to this problem.
As a country, we have become so accustomed to projecting air and sea power with impunity anywhere in the world that the idea that our aircraft could be shot down or surface ships sunk seems like science fiction. But China has been studying how to undermine the way we do battle for decades, and its efforts are bearing fruit.
A president choosing to respond to a Chinese attack on Taiwan would now face a host of bad options, most of which are dangerously escalatory. If U.S. forces or those of an ally were attacked, Washington could eventually bring its superior power to bear from other theaters of conflict, but it would take time, and, as shown both in the Center for Strategic and Budgetary Assessment's AirSea Battle and in RAND's A Question of Balance, would probably require hitting military targets in China itself. Considering China's growing conventional superiority, a president's response to a devastating blow by the Chinese against U.S., Japanese, and Taiwanese assets may, by necessity, be highly escalatory.
The good news is that it is not too late to restore some stability to the equation. The United States is a far richer and more stable nation than China. With marginal adjustments in how we spend our finite tax-payer dollars, we can restore a favorable conventional balance in the Pacific that would lessen Chinese temptations to use force and provide us with more strategically stable defensive options should Beijing succumb to those temptations. We seek a cooperative relationship with China, which makes it difficult to think about the unthinkable -- a conflict with China. But a conflict with the United States is just about all the PLA thinks about, and for the sake of peace we must take them seriously.
…………………………………………………
Biography
Dan Blumenthal is a current commissioner and former vice chairman of the U.S.-China Economic and Security Review Commission, where he directs efforts to monitor, investigate, and provide recommendations on the national security implications of the economic relationship between the two countries. Previously, he was senior director for China, Taiwan, and Mongolia in the Secretary of Defense's Office of International Security Affairs and practiced law in New York prior to his government service. At AEI, in addition to his work on the national security implications of U.S.-Sino relations, he coordinates the Tocqueville on China project, which examines the underlying civic culture of post-Mao China. Mr. Blumenthal also contributes to AEI's Asian Outlook series and is a research associate with the National Asia Research Program.
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Shadow Government is a blog about U.S. foreign policy under the Obama administration, written by experienced policy makers from the loyal opposition and curated by Peter D. Feaver and William Inboden.
So, Shadow Government has three goals: 1) to provide you, our readers, with a respectful and nuanced assessment of the Obama administration's foreign policy; 2) to offer, where we find points or policies to disagree with, what we think is a responsible alternative course of action; and 3) to defend the Obama administration, as fellow foreign-policy professionals, when good decisions they make are misunderstood or unfairly criticized.
We are critical at times, but we always seek to be civil and constructive. We occasionally find fault, but we always do so in good faith. And we do all of this with the goal of elevating the discourse on U.S. foreign policy, as much as one blog can. We hope you find it interesting.
—Peter Feaver & William Inboden
Minha campanha contra a idiotice nacional - Limitacao das propriedades rurais
Este blog já foi acusado de várias coisas, sendo que duas delas são:
1) Chamar os outros, de cujas opiniões discordo, de idiotas;
2) De desrespeitar os pontos de vista alheios, dos quais também discordo.
Já me redimi pela primeira atitude, pois de fato eu estava errando o alvo: não são as pessoas que são idiotas (embora algumas também possam sê-lo, mas isso eu não posso saber, à distância), mas as ideias que elas defendem é que podem ser idiotas. Desculpo-me pela grosseria e prometo só chamar de idiota aquele que for comprovadamente idiota; os demais são apenas equivocados, embora possam defender ideias idiotas, também, que serão devidamente denunciadas aqui, um blog que se destina precipuamente à discussão de ideias, justamente.
Quanto à segunda atitude, objeto de pelo menos dois comentários, devidamente postados em um dos muitos posts em que discuto ideias idiotas, meu contra-argumento é o seguinte: meu blog, como indicado no "en-tête", se destina precisamente, e como amplamente esclarecido, a discutir ideias. Tenho, portanto, pleno direito de não respeitar "pontos de vista" que encontro equivocados ou até nefastos, no plano das políticas ou dos comportamentos.
Um outro correspondente já sugeriu o contra-argumento, e eu o retomo de modo bem mais explícito.
Não há porque "respeitar" pontos de vista que são manifestamente nocivos do ponto de vista do bem estar social.
Imaginem se os estadistas dos países aliados, em plena Segunda Guerra Mundial, dissessem ao Fuhrer:
-- Herr Hitler, nós não concordamos com a sua política de genocídio contra a população judia, mas respeitamos inteiramente o seu ponto de vista, e portanto vamos nos abster de condenar sua política, ou de denunciá-la como um crime contra a humanidade.
Sei que o meu intelocutor que mencionou essa questão do "respeito pela opinião alheia" não estava pensando nessa situação extrema, mas mesmo nas menos extremas não se pode tolerar ideias simplesmente nefastas.
Todos tem direito a seus pontos de vista, mas se eles os expressam publicamente, é porque assumem responsabilidade pelo que pensam e dizem -- exatamente o que faço aqui -- e portanto devem se submeter à crítica alheia.
Sei perfeitamente que minhas ideias são controversas e muitos devem se sentir chocados, e outros podem até me detestar pessoalmente, provavelmente em função de minhas ideias, justamente. Todos eles são livres de expressar aqui o seu desacordo, e eu vou publicar comentários contrários, desde que dirigidos ao assunto em questão, com contra-argumentos que traduzam ideias, quaisquer que sejam elas (menos aquelas manifestamente racistas ou ofensivas a determinadas crenças).
Pois bem, essa longa introdução para dizer que acabo de receber mais uma dessas propostas que reputo perfeitamente idiotas, mas que recebem ampla aceitação na sociedade. Como também já devo ter dito, não me preocupam as unanimidades: o mesmo Hitler e seu colega Mussolini dispunham de sólidas unanimidades em suas "gestões" e nem por isso podiam deixar de ser considerados o que eram de fato: crápulas criminosos, militaristas degenerados, fascistas doentios.
O que motivou este post sobre a idiotice nacional foi mais um desses plebiscitos que se destinam a impulsionar alguma "causa nacional". Lembro-me de dois precedentes: o plebiscito sobre a dívida externa, em 2001 (que recolheu mais de 97% a favor da suspensão do seu pagamento) e o de 2002 sobre a Alca, que também recolheu "maiorias norte-coreanas" de 99% contra esse projeto americano de zona de livre comércio hemisférico.
Não vou retomar aqui o que já escrevi na época a respeito de cada um deles, apenas mencionar o caráter vicioso das perguntas, induzindo automaticamente ao resultado esperado, numa das mais estupendas demonstrações de má-fé e de desonestidade intelectual de seus promotores.
Os mesmos personagens estão agora atrás deste novo plebiscito, que transcrevo abaixo.
Pelo que verifiquei no site (aqui), ele já recolheu 77% de votos a favor (uau!; estamos longe da unanimidade...), mas promete ser amplamente aceito pela sociedade.
Nem por isso vou deixar de caracterizar a proposta como especialmente idiota, embora cumpro o prometido de não chamar mais ninguém de idiota.
Vou simplesmente transcrever a nova idiotice, sem nenhum comentário, esperando talvez que algum leitor comente o que desejar a respeito.
Se for o caso, voltarei um dia para dizer por que encontro a ideia idiota e como ela pode ser nefasta do ponto de vista das políticas públicas no Brasil.
Não tenho nenhuma dúvida de que essa ideia seria implementada, caso se consiga uma maioria no parlamento a seu favor, o que não acredito que se consiga desde já. Mas do jeito que caminha o Brasil, não se pode excluir nada...
Paulo Roberto de Almeida
Plebiscito pelo limite de terra continua até o próximo dia 12
08/09/2010 11:20
Maioria dos estados brasileiros decidiu prorrogar o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra até o próximo final de semana; divulgação do resultado será feita nos dias 18 e 19 de outubro
Diga sim! Coloque limites em quem não tem!
por Assessoria de Comunicação FNRA
A decisão foi tomada devido à grande procura da população para participar do Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra, que começou em todo Brasil na última quarta-feira, dia 1º de setembro.
Com o feriado prolongado de 7 de setembro, várias escolas e universidades que estão com comitês formados para a votação vão continuar com o plebiscito popular. Além disso, paróquias também vão realizar grandes manifestações no fim de semana para chamar suas comunidades a aderirem à Campanha Nacional pelo Limite da Propriedade de Terra.
Os estados confirmados para a prorrogação são: Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo, Mato Grosso, Tocantins, Amazonas, Pará, Bahia, Paraíba, Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraná e Rio Grande do Sul. O estado do Rio de Janeiro continua com a votação até a próxima sexta-feira, dia 10.
O abaixo-assinado, que circulou junto com a votação, continua em todo país até o final deste ano. O objetivo desta coleta de assinaturas é entrar com um Projeto de Emenda Constitucional (PEC) no Congresso Nacional para que seja inserido um novo inciso no artigo 186 da Constituição Federal que se refere ao cumprimento da função social da propriedade rural.
Já o plebiscito popular, além de consultar a população sobre a necessidade de se estabelecer um limite máximo à propriedade da terra, tem a tarefa de ser, fundamentalmente, um importante processo pedagógico de formação e conscientização do povo brasileiro sobre a realidade agrária do nosso país e de debater sobre qual projeto defendemos para o povo brasileiro. Além disso, o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra veio como um instrumento para pautar a sociedade brasileira sobre a importância e a urgência de se realizar uma reforma agrária justa em nosso país.
Além das 54 entidades que compõem o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, também promovem o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade da Terra, a Assembléia Popular (AP) e o Grito dos Excluídos. O ato ainda conta com o apoio oficial das Pastorais Sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).
1) Chamar os outros, de cujas opiniões discordo, de idiotas;
2) De desrespeitar os pontos de vista alheios, dos quais também discordo.
Já me redimi pela primeira atitude, pois de fato eu estava errando o alvo: não são as pessoas que são idiotas (embora algumas também possam sê-lo, mas isso eu não posso saber, à distância), mas as ideias que elas defendem é que podem ser idiotas. Desculpo-me pela grosseria e prometo só chamar de idiota aquele que for comprovadamente idiota; os demais são apenas equivocados, embora possam defender ideias idiotas, também, que serão devidamente denunciadas aqui, um blog que se destina precipuamente à discussão de ideias, justamente.
Quanto à segunda atitude, objeto de pelo menos dois comentários, devidamente postados em um dos muitos posts em que discuto ideias idiotas, meu contra-argumento é o seguinte: meu blog, como indicado no "en-tête", se destina precisamente, e como amplamente esclarecido, a discutir ideias. Tenho, portanto, pleno direito de não respeitar "pontos de vista" que encontro equivocados ou até nefastos, no plano das políticas ou dos comportamentos.
Um outro correspondente já sugeriu o contra-argumento, e eu o retomo de modo bem mais explícito.
Não há porque "respeitar" pontos de vista que são manifestamente nocivos do ponto de vista do bem estar social.
Imaginem se os estadistas dos países aliados, em plena Segunda Guerra Mundial, dissessem ao Fuhrer:
-- Herr Hitler, nós não concordamos com a sua política de genocídio contra a população judia, mas respeitamos inteiramente o seu ponto de vista, e portanto vamos nos abster de condenar sua política, ou de denunciá-la como um crime contra a humanidade.
Sei que o meu intelocutor que mencionou essa questão do "respeito pela opinião alheia" não estava pensando nessa situação extrema, mas mesmo nas menos extremas não se pode tolerar ideias simplesmente nefastas.
Todos tem direito a seus pontos de vista, mas se eles os expressam publicamente, é porque assumem responsabilidade pelo que pensam e dizem -- exatamente o que faço aqui -- e portanto devem se submeter à crítica alheia.
Sei perfeitamente que minhas ideias são controversas e muitos devem se sentir chocados, e outros podem até me detestar pessoalmente, provavelmente em função de minhas ideias, justamente. Todos eles são livres de expressar aqui o seu desacordo, e eu vou publicar comentários contrários, desde que dirigidos ao assunto em questão, com contra-argumentos que traduzam ideias, quaisquer que sejam elas (menos aquelas manifestamente racistas ou ofensivas a determinadas crenças).
Pois bem, essa longa introdução para dizer que acabo de receber mais uma dessas propostas que reputo perfeitamente idiotas, mas que recebem ampla aceitação na sociedade. Como também já devo ter dito, não me preocupam as unanimidades: o mesmo Hitler e seu colega Mussolini dispunham de sólidas unanimidades em suas "gestões" e nem por isso podiam deixar de ser considerados o que eram de fato: crápulas criminosos, militaristas degenerados, fascistas doentios.
O que motivou este post sobre a idiotice nacional foi mais um desses plebiscitos que se destinam a impulsionar alguma "causa nacional". Lembro-me de dois precedentes: o plebiscito sobre a dívida externa, em 2001 (que recolheu mais de 97% a favor da suspensão do seu pagamento) e o de 2002 sobre a Alca, que também recolheu "maiorias norte-coreanas" de 99% contra esse projeto americano de zona de livre comércio hemisférico.
Não vou retomar aqui o que já escrevi na época a respeito de cada um deles, apenas mencionar o caráter vicioso das perguntas, induzindo automaticamente ao resultado esperado, numa das mais estupendas demonstrações de má-fé e de desonestidade intelectual de seus promotores.
Os mesmos personagens estão agora atrás deste novo plebiscito, que transcrevo abaixo.
Pelo que verifiquei no site (aqui), ele já recolheu 77% de votos a favor (uau!; estamos longe da unanimidade...), mas promete ser amplamente aceito pela sociedade.
Nem por isso vou deixar de caracterizar a proposta como especialmente idiota, embora cumpro o prometido de não chamar mais ninguém de idiota.
Vou simplesmente transcrever a nova idiotice, sem nenhum comentário, esperando talvez que algum leitor comente o que desejar a respeito.
Se for o caso, voltarei um dia para dizer por que encontro a ideia idiota e como ela pode ser nefasta do ponto de vista das políticas públicas no Brasil.
Não tenho nenhuma dúvida de que essa ideia seria implementada, caso se consiga uma maioria no parlamento a seu favor, o que não acredito que se consiga desde já. Mas do jeito que caminha o Brasil, não se pode excluir nada...
Paulo Roberto de Almeida
Plebiscito pelo limite de terra continua até o próximo dia 12
08/09/2010 11:20
Maioria dos estados brasileiros decidiu prorrogar o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra até o próximo final de semana; divulgação do resultado será feita nos dias 18 e 19 de outubro
Diga sim! Coloque limites em quem não tem!
por Assessoria de Comunicação FNRA
A decisão foi tomada devido à grande procura da população para participar do Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra, que começou em todo Brasil na última quarta-feira, dia 1º de setembro.
Com o feriado prolongado de 7 de setembro, várias escolas e universidades que estão com comitês formados para a votação vão continuar com o plebiscito popular. Além disso, paróquias também vão realizar grandes manifestações no fim de semana para chamar suas comunidades a aderirem à Campanha Nacional pelo Limite da Propriedade de Terra.
Os estados confirmados para a prorrogação são: Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo, Mato Grosso, Tocantins, Amazonas, Pará, Bahia, Paraíba, Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraná e Rio Grande do Sul. O estado do Rio de Janeiro continua com a votação até a próxima sexta-feira, dia 10.
O abaixo-assinado, que circulou junto com a votação, continua em todo país até o final deste ano. O objetivo desta coleta de assinaturas é entrar com um Projeto de Emenda Constitucional (PEC) no Congresso Nacional para que seja inserido um novo inciso no artigo 186 da Constituição Federal que se refere ao cumprimento da função social da propriedade rural.
Já o plebiscito popular, além de consultar a população sobre a necessidade de se estabelecer um limite máximo à propriedade da terra, tem a tarefa de ser, fundamentalmente, um importante processo pedagógico de formação e conscientização do povo brasileiro sobre a realidade agrária do nosso país e de debater sobre qual projeto defendemos para o povo brasileiro. Além disso, o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra veio como um instrumento para pautar a sociedade brasileira sobre a importância e a urgência de se realizar uma reforma agrária justa em nosso país.
Além das 54 entidades que compõem o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, também promovem o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade da Terra, a Assembléia Popular (AP) e o Grito dos Excluídos. O ato ainda conta com o apoio oficial das Pastorais Sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).
Marx e as eleicoes brasileiras - Paulo R. Almeida
Este artigo meu, já devidamente reproduzido aqui (creio), e publicado num boletim político, foi reproduzido em outro site, como abaixo.
Paulo Roberto de Almeida
Marx e as eleições brasileiras
Paulo Roberto de Almeida
Dom Total, 02/09/2010
Uma tendência bem conhecida da ciência política consiste em fazer uma análise econômica dos processos eleitorais e dos sistemas políticos. Embora se possa dizer que metodologias e problemas podem ser aproximados, para fins de análise e de interpretação, o fato é que existem diversos elementos diferenciadores que fazem com que o mercado político não seja o exato equivalente do mercado de bens e serviços correntes. Este último é, em princípio, caracterizado pela atomização dos ofertantes e pela livre disposição de seus recursos da parte dos demandantes, ao passo que o primeiro se caracteriza por tendências bem claras ao monopólio e à exclusão.
Independentemente, porém, do grande número de variáveis que concorrem para diferenciar um do outro, pode-se dizer que mercado político não é igual a mercado de bens e serviços correntes por um motivo muito simples: embora o Estado possa interferir tanto num quanto noutro – por meio de regras quanto ao seu funcionamento, ou por meio de impostos sobre as transações, por exemplo –, nos mercados puramente econômicos, os compradores dispõem (pelo menos nos sistemas capitalistas e razoavelmente democráticos) de liberdade completa para determinar quantidades, tipos e formatos das prestações dos bens e serviços aos quais pretendem alocar seus ativos financeiros.
O consumidor é, em princípio, soberano nas suas escolhas e atua com base nas informações disponibilizadas pelos produtores, que teoricamente concorrem entre si pelas preferências do primeiro. Economistas liberais tendem a considerar a economia dos livres mercados como sendo uma espécie de “ditadura do consumidor”, o que se aproxima apenas parcialmente da realidade (já que cartéis, monopólios, coalizões e colusões de produtores deformam as condições de concorrência, em detrimento dos consumidores, obviamente). Na prática, todos os mercados são imperfeitos.
Nos mercados políticos, ao contrário dos de natureza econômica (ou com bem maior ênfase do que nestes), o Estado é não apenas um interlocutor incontornável e um regulador necessário, como atua, também, como agente de seus próprios interesses, obviamente não enquanto Estado, mas enquanto governo. O Estado é, em grande medida, uma figura abstrata, virtual ou, em certo sentido, quase ficcional; ele existe, obviamente pelas suas instituições e pelo conjunto de leis e normas que regulam a ação de seus agentes permanentes, mas se expressa de modo muito mais afirmado enquanto ator de primeiro plano em suas roupagens de governo e de coalizão de forças a serviço dos partidos e dos grupos de interesse representados, e ocupando suas instituições dotadas de vontade política.
Nessa condição, o Estado deixa de ser abstrato para passar a representar interesses políticos, econômicos e projetos tangíveis e intangíveis vinculados aos líderes políticos que ocupam temporariamente suas alavancas de comando. Isto é básico e elementar, conhecido de qualquer estudante de graduação que tenha lido seus manuais de ciência política ou se debruçado sobre a obra de Max Weber. Aliás, até mesmo Marx, nas páginas muito rudimentares do Manifesto Comunista, ou naquelas melhor elaboradas do 18 Brumário, já tinha detectado essa captura do Estado por forças políticas ou por personagens excepcionais – nem todos representando as “elites” tradicionais – que se movimentam no grande palco das lutas pelo poder.
Uma interpretação marxista dos embates eleitorais no Brasil de 2010
Justamente, se Marx fosse chamado a reescrever suas obras políticas mais conhecidas – como os já citados Manifesto e 18 Brumário, acrescidos do Luta de Classes na França – adaptando-as ao cenário do Brasil atual, eis o que ele talvez redigisse, como síntese da campanha eleitoral em curso e da própria conjuntura.
Se considerarmos o estado atual da luta de classes no Brasil, depois de anos e anos de afirmação de uma liderança cesarista e carismática, o que se pode dizer é que todas as classes se renderam ao Bonaparte do momento. Não ocorreu, para todos os efeitos, qualquer golpe na trajetória política recente do país, algo inesperado como um raio caído de um céu azul. Não; tudo foi o resultado racional-legal da lenta ascensão de classes pouco trabalhadoras ao pináculo do poder, o produto final da lenta acumulação de forças pelo partido da reforma conservadora. O final lógico desse teatro de lutas contra os burgueses liberais nos últimos anos já era o esperado: o manto imperial caiu, finalmente, nos ombros do pequeno Bonaparte, sem sequer algum gesto dramático, menos ainda com qualquer sinal de tragédia. Foi, assim, um triunfo de comédia.
Todas as classes, com exceção de uma fração extremamente reduzida de ideólogos da pequena burguesia libertária, se renderam ao líder aclamado; a minoria que o ataca não tem qualquer força social atrás de si para contestar o seu domínio completo sobre a sociedade. A máquina burocrático-sindical já estava ganha desde o início, pois foi dela mesmo que o novo Cesar emergiu para uma ascensão lenta, mas irresistível. Os movimentos desorganizados do lumpesinato e do proletariado não sindicalizado foram os que convergiram em segundo lugar, pois eles encontraram no Tesouro da República a justa compensação pela escolha judiciosa que fizeram.
Não foi preciso repetir a história, sequer como farsa, no caso da grande burguesia industrial e dos representantes da alta finança: eles já tinham sido convencidos, desde antes da ascensão do imperador, de que seus interesses de classe seriam regiamente compensados, como de fato o foram, pela fidelidade demonstrada ao novo esquema de poder. Todos eles foram colocados na mesma categoria de apoiadores, meras figuras decorativas na urna de votos do novo Cesar, como se fossem simples unidades indistintas de um grande saco de batatas.
O fato é que até mesmo o antigo partido da reforma conservadora foi parar nesse saco de batatas, e virou o partido da Ordem, submisso como todos os outros ao poder do chefe supremo. As bases de seu poder são relativamente transparentes, pois basta seguir o itinerário do dinheiro que escorre dos cofres públicos – isto é, dos bolsos da burguesia e da pequena burguesia, dos grandes proprietários fundiários, dos caixas das empresas da burguesia industrial, e até mesmo dos parcos tostões do proletariado e seus aliados menores.
Temos, em primeiro lugar, a plutocracia financeira, aquela que sempre se opôs ao partido da reforma, quando este era desestabilizador, mas que logo se acomodou, ao constatar que o grande líder propunha, na verdade, uma coalizão diferente para manter o mesmo esquema de poder real; ela foi contemplada, como sempre, com os juros da dívida pública, sem precisar fazer qualquer esforço no mercado de capitais ou na busca de clientes para seus empréstimos extorsivos. A grande burguesia das fábricas e dos negócios comerciais também soube encontrar o seu nicho no novo esquema de poder: um mercantilismo renascido com um Estado ainda mais forte, capaz de dispensar empréstimos facilitados, isenções fiscais, tarifas protetoras e toda sorte de prebendas e subsídios que tinham uma existência mais modesta na antiga República neoliberal.
Vem em seguida a nova aristocracia sindical, que já não era operária havia anos, provavelmente há décadas; sua fração burocrática converteu-se em parte integrante da nomenklatura estatal, a nova classe privilegiada, que alguém já chamou de “burguesia do capital alheio”. A maior parte, porém, continuou nas corporações sindicais, agora se locupletando de fundos públicos, que lhe são repassados sem qualquer controle. Junto com os militantes do antigo partido da reforma, eles constituem os elos mais relevantes do novo peronismo em construção, uma nova força política que é puro movimento, sem qualquer doutrina ou construção teórica mais elaborada.
Os aliados da academia, que poderiam fornecer uma base intelectual para o partido da reforma, os universitários gramscianos, estes parecem singularmente estéreis na produção de novas idéias, pois ficam repetindo velhos slogans do socialismo do século 19, sem qualquer originalidade ou refinamento. São tão atrasados, e alienados, esses acadêmicos repetitivos, que terminaram por ver num coronel golpista, de notórias tendências fascistas, um líder progressista do novo socialismo; o êmulo de Mussolini pretende que o seu socialismo seja do século 21, quando este nada mais constitui senão uma confusão mental e uma construção estatal digna do que havia de pior no sovietismo esclerosado.
Outros componentes do mesmo saco de batatas são os funcionários públicos, alguns verdadeiros mandarins, a maioria simples beneficiários da prodigalidade estatal, que, na média, recebem o dobro do que ganhariam na iniciativa privada, para níveis de produtividade que são, na média, menos da metade daquelas do setor privado.
Figuram ainda no saco, finalmente, os recipientes do maior programa social do mundo, que vem a ser, também, um grande curral eleitoral: o lumpesinato, de forma geral, e os vários lumpens urbanos, em particular, com alguns pequeno-burgueses espertalhões aqui e ali. Não se deve esquecer, tampouco, tubérculos igualmente vistosos, como os beneficiários de bolsas para diversas categoriais sociais ou as cotas para os representantes do Apartheid em formação, os promotores do novo racismo oficial.
Ficam de fora do saco de batatas apenas e tão somente 3 ou 4% do eleitorado, representado politicamente por figuras teimosas, que recusam inexplicavelmente o mito do demiurgo e que pretendem continuar o combate de retaguarda, sem qualquer esperança de reverter o curso do processo político no futuro previsível. Esses novos mencheviques intelectuais também fazem sua própria história, mesmo se eles ainda não têm consciência disso: eles não podem, contudo, esperar fazer sua revolução a partir de um passado já enterrado; apenas em direção ao futuro, embora o caminho seja longo e os resultados muito incertos.
O que parece certo é que a mistura de pequeno Napoleão com um Perón improvisado também terá um dia sua estátua derrubada do alto da coluna Vendôme, não tanto como resultado de uma nova luta de foices e martelos, mas como o produto de uma lenta evolução educacional. Esta é a revolução mais difícil de ser provocada, mas constitui, legitimamente, o único processo revolucionário de que o Brasil necessita.
Paulo Roberto de Almeida
Marx e as eleições brasileiras
Paulo Roberto de Almeida
Dom Total, 02/09/2010
Uma tendência bem conhecida da ciência política consiste em fazer uma análise econômica dos processos eleitorais e dos sistemas políticos. Embora se possa dizer que metodologias e problemas podem ser aproximados, para fins de análise e de interpretação, o fato é que existem diversos elementos diferenciadores que fazem com que o mercado político não seja o exato equivalente do mercado de bens e serviços correntes. Este último é, em princípio, caracterizado pela atomização dos ofertantes e pela livre disposição de seus recursos da parte dos demandantes, ao passo que o primeiro se caracteriza por tendências bem claras ao monopólio e à exclusão.
Independentemente, porém, do grande número de variáveis que concorrem para diferenciar um do outro, pode-se dizer que mercado político não é igual a mercado de bens e serviços correntes por um motivo muito simples: embora o Estado possa interferir tanto num quanto noutro – por meio de regras quanto ao seu funcionamento, ou por meio de impostos sobre as transações, por exemplo –, nos mercados puramente econômicos, os compradores dispõem (pelo menos nos sistemas capitalistas e razoavelmente democráticos) de liberdade completa para determinar quantidades, tipos e formatos das prestações dos bens e serviços aos quais pretendem alocar seus ativos financeiros.
O consumidor é, em princípio, soberano nas suas escolhas e atua com base nas informações disponibilizadas pelos produtores, que teoricamente concorrem entre si pelas preferências do primeiro. Economistas liberais tendem a considerar a economia dos livres mercados como sendo uma espécie de “ditadura do consumidor”, o que se aproxima apenas parcialmente da realidade (já que cartéis, monopólios, coalizões e colusões de produtores deformam as condições de concorrência, em detrimento dos consumidores, obviamente). Na prática, todos os mercados são imperfeitos.
Nos mercados políticos, ao contrário dos de natureza econômica (ou com bem maior ênfase do que nestes), o Estado é não apenas um interlocutor incontornável e um regulador necessário, como atua, também, como agente de seus próprios interesses, obviamente não enquanto Estado, mas enquanto governo. O Estado é, em grande medida, uma figura abstrata, virtual ou, em certo sentido, quase ficcional; ele existe, obviamente pelas suas instituições e pelo conjunto de leis e normas que regulam a ação de seus agentes permanentes, mas se expressa de modo muito mais afirmado enquanto ator de primeiro plano em suas roupagens de governo e de coalizão de forças a serviço dos partidos e dos grupos de interesse representados, e ocupando suas instituições dotadas de vontade política.
Nessa condição, o Estado deixa de ser abstrato para passar a representar interesses políticos, econômicos e projetos tangíveis e intangíveis vinculados aos líderes políticos que ocupam temporariamente suas alavancas de comando. Isto é básico e elementar, conhecido de qualquer estudante de graduação que tenha lido seus manuais de ciência política ou se debruçado sobre a obra de Max Weber. Aliás, até mesmo Marx, nas páginas muito rudimentares do Manifesto Comunista, ou naquelas melhor elaboradas do 18 Brumário, já tinha detectado essa captura do Estado por forças políticas ou por personagens excepcionais – nem todos representando as “elites” tradicionais – que se movimentam no grande palco das lutas pelo poder.
Uma interpretação marxista dos embates eleitorais no Brasil de 2010
Justamente, se Marx fosse chamado a reescrever suas obras políticas mais conhecidas – como os já citados Manifesto e 18 Brumário, acrescidos do Luta de Classes na França – adaptando-as ao cenário do Brasil atual, eis o que ele talvez redigisse, como síntese da campanha eleitoral em curso e da própria conjuntura.
Se considerarmos o estado atual da luta de classes no Brasil, depois de anos e anos de afirmação de uma liderança cesarista e carismática, o que se pode dizer é que todas as classes se renderam ao Bonaparte do momento. Não ocorreu, para todos os efeitos, qualquer golpe na trajetória política recente do país, algo inesperado como um raio caído de um céu azul. Não; tudo foi o resultado racional-legal da lenta ascensão de classes pouco trabalhadoras ao pináculo do poder, o produto final da lenta acumulação de forças pelo partido da reforma conservadora. O final lógico desse teatro de lutas contra os burgueses liberais nos últimos anos já era o esperado: o manto imperial caiu, finalmente, nos ombros do pequeno Bonaparte, sem sequer algum gesto dramático, menos ainda com qualquer sinal de tragédia. Foi, assim, um triunfo de comédia.
Todas as classes, com exceção de uma fração extremamente reduzida de ideólogos da pequena burguesia libertária, se renderam ao líder aclamado; a minoria que o ataca não tem qualquer força social atrás de si para contestar o seu domínio completo sobre a sociedade. A máquina burocrático-sindical já estava ganha desde o início, pois foi dela mesmo que o novo Cesar emergiu para uma ascensão lenta, mas irresistível. Os movimentos desorganizados do lumpesinato e do proletariado não sindicalizado foram os que convergiram em segundo lugar, pois eles encontraram no Tesouro da República a justa compensação pela escolha judiciosa que fizeram.
Não foi preciso repetir a história, sequer como farsa, no caso da grande burguesia industrial e dos representantes da alta finança: eles já tinham sido convencidos, desde antes da ascensão do imperador, de que seus interesses de classe seriam regiamente compensados, como de fato o foram, pela fidelidade demonstrada ao novo esquema de poder. Todos eles foram colocados na mesma categoria de apoiadores, meras figuras decorativas na urna de votos do novo Cesar, como se fossem simples unidades indistintas de um grande saco de batatas.
O fato é que até mesmo o antigo partido da reforma conservadora foi parar nesse saco de batatas, e virou o partido da Ordem, submisso como todos os outros ao poder do chefe supremo. As bases de seu poder são relativamente transparentes, pois basta seguir o itinerário do dinheiro que escorre dos cofres públicos – isto é, dos bolsos da burguesia e da pequena burguesia, dos grandes proprietários fundiários, dos caixas das empresas da burguesia industrial, e até mesmo dos parcos tostões do proletariado e seus aliados menores.
Temos, em primeiro lugar, a plutocracia financeira, aquela que sempre se opôs ao partido da reforma, quando este era desestabilizador, mas que logo se acomodou, ao constatar que o grande líder propunha, na verdade, uma coalizão diferente para manter o mesmo esquema de poder real; ela foi contemplada, como sempre, com os juros da dívida pública, sem precisar fazer qualquer esforço no mercado de capitais ou na busca de clientes para seus empréstimos extorsivos. A grande burguesia das fábricas e dos negócios comerciais também soube encontrar o seu nicho no novo esquema de poder: um mercantilismo renascido com um Estado ainda mais forte, capaz de dispensar empréstimos facilitados, isenções fiscais, tarifas protetoras e toda sorte de prebendas e subsídios que tinham uma existência mais modesta na antiga República neoliberal.
Vem em seguida a nova aristocracia sindical, que já não era operária havia anos, provavelmente há décadas; sua fração burocrática converteu-se em parte integrante da nomenklatura estatal, a nova classe privilegiada, que alguém já chamou de “burguesia do capital alheio”. A maior parte, porém, continuou nas corporações sindicais, agora se locupletando de fundos públicos, que lhe são repassados sem qualquer controle. Junto com os militantes do antigo partido da reforma, eles constituem os elos mais relevantes do novo peronismo em construção, uma nova força política que é puro movimento, sem qualquer doutrina ou construção teórica mais elaborada.
Os aliados da academia, que poderiam fornecer uma base intelectual para o partido da reforma, os universitários gramscianos, estes parecem singularmente estéreis na produção de novas idéias, pois ficam repetindo velhos slogans do socialismo do século 19, sem qualquer originalidade ou refinamento. São tão atrasados, e alienados, esses acadêmicos repetitivos, que terminaram por ver num coronel golpista, de notórias tendências fascistas, um líder progressista do novo socialismo; o êmulo de Mussolini pretende que o seu socialismo seja do século 21, quando este nada mais constitui senão uma confusão mental e uma construção estatal digna do que havia de pior no sovietismo esclerosado.
Outros componentes do mesmo saco de batatas são os funcionários públicos, alguns verdadeiros mandarins, a maioria simples beneficiários da prodigalidade estatal, que, na média, recebem o dobro do que ganhariam na iniciativa privada, para níveis de produtividade que são, na média, menos da metade daquelas do setor privado.
Figuram ainda no saco, finalmente, os recipientes do maior programa social do mundo, que vem a ser, também, um grande curral eleitoral: o lumpesinato, de forma geral, e os vários lumpens urbanos, em particular, com alguns pequeno-burgueses espertalhões aqui e ali. Não se deve esquecer, tampouco, tubérculos igualmente vistosos, como os beneficiários de bolsas para diversas categoriais sociais ou as cotas para os representantes do Apartheid em formação, os promotores do novo racismo oficial.
Ficam de fora do saco de batatas apenas e tão somente 3 ou 4% do eleitorado, representado politicamente por figuras teimosas, que recusam inexplicavelmente o mito do demiurgo e que pretendem continuar o combate de retaguarda, sem qualquer esperança de reverter o curso do processo político no futuro previsível. Esses novos mencheviques intelectuais também fazem sua própria história, mesmo se eles ainda não têm consciência disso: eles não podem, contudo, esperar fazer sua revolução a partir de um passado já enterrado; apenas em direção ao futuro, embora o caminho seja longo e os resultados muito incertos.
O que parece certo é que a mistura de pequeno Napoleão com um Perón improvisado também terá um dia sua estátua derrubada do alto da coluna Vendôme, não tanto como resultado de uma nova luta de foices e martelos, mas como o produto de uma lenta evolução educacional. Esta é a revolução mais difícil de ser provocada, mas constitui, legitimamente, o único processo revolucionário de que o Brasil necessita.
Carga Tributária Brasileira - Comparacao internacional
Alguém aí imagina que nossos serviços públicos sejam "vários pontos" melhores do que os do Japão, da Suíça, dos Estados Unidos?
Eu até diria que nossa carga efetiva é muito maior do que o valor nominal aqui abaixo consignado, dada a obrigação da classe média comprar no mercado serviços (saúde, educação, segurança, por exemplo), que seriam, teoricamente, fornecidos pelo Estado.
Caberia, também, considerar o chamado "custo-oportunidade", ou seja, os mesmos serviços que os cidadãos poderiam comprar no mercado, em condições de abertura dos mercados e de concorrência total, em lugar de atender e esperar por serviços vagabundos por parte do Estado (sempre superfaturados pelos prestadores, obviamente).
Paulo Roberto de Almeida
Carga Tributária Brasileira (CTB) - COMPARAÇÃO INTERNACIONAL – Fonte MF
CTB Comparada 2008 – Brasil x Países OCDE Selecionados
Base: Ano de 2008
Com relação à CTB total, observa-se que o Brasil encontra-se abaixo da média da OCDE, situando-se próximo a países como Espanha e Nova Zelândia. Para uma análise coerente, deve-se ter em mente que a carga tributária de cada país é determinada pela combinação de sua legislação tributária e de suas características sócio-econômicas. Fatores culturais e comportamentais, como o nível de cumprimento espontâneo das obrigações tributárias, também podem afetar a relação tributos/PIB nas diferentes sociedades. Além disso, há que se considerar a questão das políticas públicas: nos países que se comprometem diretamente com o provimento de bens e serviços relacionados ao bem-estar – como educação, saúde e seguridade social – define-se implicitamente um nível mais elevado de pressão fiscal do que naqueles que limitam sua atuação direta, deixando espaço para a iniciativa privada.
Países: %
Japão: 18
México: 20
Turquia: 24
Estados Unidos: 27
Irlanda: 28
Suíça: 29
Canadá: 32
Espanha: 33
Brasil: 34
Nova Zelândia: 35
Média OCDE: 35
Reino Unido: 36
Alemanha: 36
Portugal: 37
Luxemburgo: 38
Hungria: 40
Noruega: 42
França: 43
Itália: 43
Bélgica: 44
Suécia: 47
Dinamarca: 48
Arquivos oficiais do governo estão disponíveis aos leitores: Ricardo Bergamini
Eu até diria que nossa carga efetiva é muito maior do que o valor nominal aqui abaixo consignado, dada a obrigação da classe média comprar no mercado serviços (saúde, educação, segurança, por exemplo), que seriam, teoricamente, fornecidos pelo Estado.
Caberia, também, considerar o chamado "custo-oportunidade", ou seja, os mesmos serviços que os cidadãos poderiam comprar no mercado, em condições de abertura dos mercados e de concorrência total, em lugar de atender e esperar por serviços vagabundos por parte do Estado (sempre superfaturados pelos prestadores, obviamente).
Paulo Roberto de Almeida
Carga Tributária Brasileira (CTB) - COMPARAÇÃO INTERNACIONAL – Fonte MF
CTB Comparada 2008 – Brasil x Países OCDE Selecionados
Base: Ano de 2008
Com relação à CTB total, observa-se que o Brasil encontra-se abaixo da média da OCDE, situando-se próximo a países como Espanha e Nova Zelândia. Para uma análise coerente, deve-se ter em mente que a carga tributária de cada país é determinada pela combinação de sua legislação tributária e de suas características sócio-econômicas. Fatores culturais e comportamentais, como o nível de cumprimento espontâneo das obrigações tributárias, também podem afetar a relação tributos/PIB nas diferentes sociedades. Além disso, há que se considerar a questão das políticas públicas: nos países que se comprometem diretamente com o provimento de bens e serviços relacionados ao bem-estar – como educação, saúde e seguridade social – define-se implicitamente um nível mais elevado de pressão fiscal do que naqueles que limitam sua atuação direta, deixando espaço para a iniciativa privada.
Países: %
Japão: 18
México: 20
Turquia: 24
Estados Unidos: 27
Irlanda: 28
Suíça: 29
Canadá: 32
Espanha: 33
Brasil: 34
Nova Zelândia: 35
Média OCDE: 35
Reino Unido: 36
Alemanha: 36
Portugal: 37
Luxemburgo: 38
Hungria: 40
Noruega: 42
França: 43
Itália: 43
Bélgica: 44
Suécia: 47
Dinamarca: 48
Arquivos oficiais do governo estão disponíveis aos leitores: Ricardo Bergamini
Republica Mafiosa do Brasil (20): eis uma série que promete...
Comecei a série "república mafiosa do brasil" (tudo em minúsculas, obviamente), assim como quem não quer nada, apenas para registrar os (que eu imaginava poucos) casos mais clamorosos de "atentados" e "violações" -- estupros, seria a palavra correta -- à legalidade jurídica, aos preceitos constitucionais e à legislação eleitoral por parte desses personagens que todos vocês sabem quem são.
Não é que a série está crescendo, se delongando na acumulação -- aparentemente inútil -- de casos cada vez mais clamorosos -- na indiferença completa de um TSE castrado, inútil, sem vergonha -- sem que a sociedade, a cidadania tenha uma reação mais indignada frente ao que se constata serem abusos repetidos da moralidade política?
A sociedade brasileira está "alienada" -- como dizíamos nos anos 1960 -- em relação à situação reinante, o que só pode antecipar mais algumas décadas de decadência ética e deliquescência política.
Triste constatar isso; triste verificar que estamos entregues, literalmente a uma confraria de mafiosos...
Paulo Roberto de Almeida
Macunaíma
Dora Kramer
O Estado de S.Paulo, 8 de setembro de 2010
Só porque é popular uma pessoa pode escarnecer de todos, ignorar a lei, zombar da Justiça, enaltecer notórios malfeitores, afagar violentos ditadores, tomar para si a realização alheia, mentir e nunca dar um passo que não seja em proveito próprio?
Depende. Um artista não poderia, sequer ousaria fazer isso, pois a condenação da sociedade seria o começo do seu fim. Um político tampouco ousaria abrir tanto a guarda.
A menos que tivesse respaldo. Que só revelasse sua verdadeira face lentamente e ao mesmo tempo cooptasse os que poderiam repreendê-lo, tornando-os dependentes de seus projetos dos quais aos poucos se alijariam os críticos, por intimidação ou desistência.
A base de tudo seria a condescendência dos setores pensantes e falantes, consolidada por longo tempo.
Para compor a cena, oponentes tíbios, erráticos, excessivamente confiantes, covardes diante do adversário atrevido, eivados por ambições pessoais e sem direito a contar com aquele consenso benevolente que é de uso exclusivo dos representantes dos fracos, oprimidos e ignorantes.
O ambiente em que o presidente Luiz Inácio da Silva criou o personagem sem freios que faz o que bem entende e a quem tudo é permitido - abusar do poder, usar indevidamente a máquina pública, insultar, desmoralizar _ sem que ninguém se disponha ou consiga lhe pôr um paradeiro - não foi criado da noite para o dia.
Não é fruto de ato discricionário, não nasceu por geração espontânea nem se desenvolveu apenas por obra da fragilidade da oposição. É produto de uma criação coletiva.
Da tolerância de informados e bem formados que puseram atributos e instrumentos à disposição do deslumbramento, da bajulação e da opção pela indulgência. Gente que tem pudor de tudo, até de exigir que o presidente da República fale direito o idioma do País, mas não parece se importar de lidar com gente que não tem escrúpulo de nada.
Da esperteza dos arautos do atraso e dos trapaceiros da política que viram nessa aliança uma janela de oportunidade. A salvação que os tiraria do aperto no momento em que já estavam caminhando para o ostracismo. Foram todos ressuscitados e por isso são gratos.
Da ambição dos que vendem suas convicções (quando as têm) em troca de verbas do Estado, sejam sindicalistas, artistas, prefeitos ou vereadores.
Da covardia dos que se calam com medo das patrulhas.
Do despeito dos ressentidos.
Do complexo de culpa dos mal resolvidos.
Da torpeza dos oportunistas.
Da pusilanimidade dos neutros.
Da superioridade estudada dos cínicos.
Da falsa isenção dos preguiçosos.
Da preguiça dos irresponsáveis.
Lula não teria ido tão longe com a construção desse personagem que hoje assombra e indigna muitos dos que lhe faziam a corte, não fosse a permissividade geral.
Nada parece capaz de lhe impor limites. Se conseguir eleger a sucessora, vai distorcer a realidade e atuar como se presidente fosse. Se não conseguir, não deixará o próximo governo governar.
Agora, é sempre bom lembrar que só fará isso se o País deixar que faça, como deixou que se tornasse esse ser que extrapola.
Recibo. O presidente Lula resolveu reagir e há três dias rebate a oposição no caso das quebra dos sigilos fiscais para negar a existência de propósitos político-eleitorais.
Ocorre que faz isso usando exclusivamente argumentos político-eleitorais. Em nenhum momento até agora o presidente se mostrou preocupado com o fato de sabe-se lá quantas pessoas terem tido seus sigilos violados e seus dados cadastrais abertos por funcionários da Receita sabe-se lá por quê.
O presidente tampouco pareceu sensibilizado com a informação do ministro da Fazenda de que os vazamentos ocorrem a mancheias.
Esses cidadãos não receberam do presidente Lula uma palavra de alento ou garantia de que seus direitos constitucionais serão preservados.
Lula só responde a Serra, só trata do assunto na dimensão eleitoral e assim confirma que o caso é de polícia, mas também é de política.
=============
A política do deboche
Editorial - O Estado de S.Paulo
07 de setembro de 2010
Quanto mais se acumulam as evidências de que o PT é o mentor do crime continuado da devassa na Receita Federal, de dados sigilosos de aliados e familiares do candidato presidencial do PSDB, José Serra, tanto mais o presidente Lula apela para o escárnio. É assim, desenvolto diante da exposição das novas baixezas de sua gente, que ele procura desqualificar as denúncias de que as violações tinham a única serventia de reunir material que pudesse ser utilizado contra os adversários da candidata governista, Dilma Rousseff.
Do mensalão para cá, essa atitude só se acentuou. No escândalo da compra de votos no Congresso Nacional, em 2005, ele ficou batendo na tecla de que não sabia de nada e que, de mais a mais, o que a companheirada tinha aprontado - diluído na versão de que tudo se resumia a um caso de montagem de caixa 2 - era o que se fazia comumente na política brasileira. Depois, propagou e mandou propagar a confortável teoria de que as acusações eram parte de uma "conspiração das elites" para apeá-lo do poder. Mas não chegou a zombar acintosamente das revelações que iriam ficar gravadas na história de seu partido.
Já no ano seguinte, quando a polícia detonou a tentativa de um grupo de petistas, entre eles o churrasqueiro preferido de Lula, de comprar um falso dossiê contra o mesmo José Serra, então candidato a governador de São Paulo, o presidente incorporou ao léxico político nacional o termo "aloprados" com que, para mascarar a gravidade do episódio, se referiu aos participantes da torpeza. Agora, enquanto escondia a sua escolhida - acusada pelo tucano como responsável, em última instância, pela fabricação de novo dossiê com os documentos subtraídos do Fisco -, o presidente se abandonou ao cinismo.
No fim da semana, em um comício em Guarulhos, na Grande São Paulo, a que Dilma não compareceu, ele acusou Serra de transformar a família em vítima. Ou seja, o que vitimou a filha do candidato não foi a comprovada captura de suas declarações de renda por um personagem do submundo - cuja filiação ao PT só não se consumou por um erro de grafia de seu nome -, mas o "baixo nível" da campanha do pai, que tratou do escândalo no horário de propaganda eleitoral. E ele o teria feito porque "o bicho está em uma raiva só" diante dos resultados desfavoráveis das pesquisas eleitorais. "É próprio de quem não sabe nadar e se debate até morrer afogado", desdenhou.
O auge da avacalhação - para usar uma palavra decerto ao gosto do palanqueiro Lula - foi ele perguntar retoricamente: "Cadê esse tal de sigilo que não apareceu até agora? Cadê os vazamentos?" Se é da filha de Serra que ele falava, o sigilo vazou para os diversos blogs lulistas que publicaram informações a seu respeito que só poderiam ter sido obtidas a partir do acesso ilícito aos seus dados fiscais. E o presidente sabe disso desde janeiro, quando o ainda governador Serra o alertou para a "armação" contra seus familiares na internet. Confrontado com o fato, Lula disse, sem ruborizar-se, ter coisas mais sérias para cuidar do que das "dores de cotovelo do Serra".
Se, no comício, a sua pergunta farsesca tratava das outras pessoas ligadas ao candidato, como, em especial, o vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira, o sigilo vazou para membros do chamado "grupo de inteligência" da candidatura Dilma. No caso de Eduardo Jorge, aliás, a invasão não se limitou à delegacia da Receita em Mauá, no ABC paulista, a primeira cena identificada do crime. Na última quinta-feira, o Estado revelou que um analista tributário lotado na cidade mineira de Formiga, Gilberto Souza Amarante, acessou dez vezes em um mesmo dia os dados cadastrais do tucano. O funcionário é petista de carteirinha desde 2001.
Ninguém mais do que Lula, com o seu imitigado deboche, há de ter contribuído tanto para a "maria-mole moral" em que o País atolou, na apropriada expressão do jurista Carlos Ari Sundfeld, em entrevista no Estado de domingo. Nem a bonança econômica nem os avanços sociais podem obscurecer o perverso legado do lulismo. Por minar os fundamentos das instituições democráticas, essa é hoje a mais desafiadora questão política nacional.
Não é que a série está crescendo, se delongando na acumulação -- aparentemente inútil -- de casos cada vez mais clamorosos -- na indiferença completa de um TSE castrado, inútil, sem vergonha -- sem que a sociedade, a cidadania tenha uma reação mais indignada frente ao que se constata serem abusos repetidos da moralidade política?
A sociedade brasileira está "alienada" -- como dizíamos nos anos 1960 -- em relação à situação reinante, o que só pode antecipar mais algumas décadas de decadência ética e deliquescência política.
Triste constatar isso; triste verificar que estamos entregues, literalmente a uma confraria de mafiosos...
Paulo Roberto de Almeida
Macunaíma
Dora Kramer
O Estado de S.Paulo, 8 de setembro de 2010
Só porque é popular uma pessoa pode escarnecer de todos, ignorar a lei, zombar da Justiça, enaltecer notórios malfeitores, afagar violentos ditadores, tomar para si a realização alheia, mentir e nunca dar um passo que não seja em proveito próprio?
Depende. Um artista não poderia, sequer ousaria fazer isso, pois a condenação da sociedade seria o começo do seu fim. Um político tampouco ousaria abrir tanto a guarda.
A menos que tivesse respaldo. Que só revelasse sua verdadeira face lentamente e ao mesmo tempo cooptasse os que poderiam repreendê-lo, tornando-os dependentes de seus projetos dos quais aos poucos se alijariam os críticos, por intimidação ou desistência.
A base de tudo seria a condescendência dos setores pensantes e falantes, consolidada por longo tempo.
Para compor a cena, oponentes tíbios, erráticos, excessivamente confiantes, covardes diante do adversário atrevido, eivados por ambições pessoais e sem direito a contar com aquele consenso benevolente que é de uso exclusivo dos representantes dos fracos, oprimidos e ignorantes.
O ambiente em que o presidente Luiz Inácio da Silva criou o personagem sem freios que faz o que bem entende e a quem tudo é permitido - abusar do poder, usar indevidamente a máquina pública, insultar, desmoralizar _ sem que ninguém se disponha ou consiga lhe pôr um paradeiro - não foi criado da noite para o dia.
Não é fruto de ato discricionário, não nasceu por geração espontânea nem se desenvolveu apenas por obra da fragilidade da oposição. É produto de uma criação coletiva.
Da tolerância de informados e bem formados que puseram atributos e instrumentos à disposição do deslumbramento, da bajulação e da opção pela indulgência. Gente que tem pudor de tudo, até de exigir que o presidente da República fale direito o idioma do País, mas não parece se importar de lidar com gente que não tem escrúpulo de nada.
Da esperteza dos arautos do atraso e dos trapaceiros da política que viram nessa aliança uma janela de oportunidade. A salvação que os tiraria do aperto no momento em que já estavam caminhando para o ostracismo. Foram todos ressuscitados e por isso são gratos.
Da ambição dos que vendem suas convicções (quando as têm) em troca de verbas do Estado, sejam sindicalistas, artistas, prefeitos ou vereadores.
Da covardia dos que se calam com medo das patrulhas.
Do despeito dos ressentidos.
Do complexo de culpa dos mal resolvidos.
Da torpeza dos oportunistas.
Da pusilanimidade dos neutros.
Da superioridade estudada dos cínicos.
Da falsa isenção dos preguiçosos.
Da preguiça dos irresponsáveis.
Lula não teria ido tão longe com a construção desse personagem que hoje assombra e indigna muitos dos que lhe faziam a corte, não fosse a permissividade geral.
Nada parece capaz de lhe impor limites. Se conseguir eleger a sucessora, vai distorcer a realidade e atuar como se presidente fosse. Se não conseguir, não deixará o próximo governo governar.
Agora, é sempre bom lembrar que só fará isso se o País deixar que faça, como deixou que se tornasse esse ser que extrapola.
Recibo. O presidente Lula resolveu reagir e há três dias rebate a oposição no caso das quebra dos sigilos fiscais para negar a existência de propósitos político-eleitorais.
Ocorre que faz isso usando exclusivamente argumentos político-eleitorais. Em nenhum momento até agora o presidente se mostrou preocupado com o fato de sabe-se lá quantas pessoas terem tido seus sigilos violados e seus dados cadastrais abertos por funcionários da Receita sabe-se lá por quê.
O presidente tampouco pareceu sensibilizado com a informação do ministro da Fazenda de que os vazamentos ocorrem a mancheias.
Esses cidadãos não receberam do presidente Lula uma palavra de alento ou garantia de que seus direitos constitucionais serão preservados.
Lula só responde a Serra, só trata do assunto na dimensão eleitoral e assim confirma que o caso é de polícia, mas também é de política.
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A política do deboche
Editorial - O Estado de S.Paulo
07 de setembro de 2010
Quanto mais se acumulam as evidências de que o PT é o mentor do crime continuado da devassa na Receita Federal, de dados sigilosos de aliados e familiares do candidato presidencial do PSDB, José Serra, tanto mais o presidente Lula apela para o escárnio. É assim, desenvolto diante da exposição das novas baixezas de sua gente, que ele procura desqualificar as denúncias de que as violações tinham a única serventia de reunir material que pudesse ser utilizado contra os adversários da candidata governista, Dilma Rousseff.
Do mensalão para cá, essa atitude só se acentuou. No escândalo da compra de votos no Congresso Nacional, em 2005, ele ficou batendo na tecla de que não sabia de nada e que, de mais a mais, o que a companheirada tinha aprontado - diluído na versão de que tudo se resumia a um caso de montagem de caixa 2 - era o que se fazia comumente na política brasileira. Depois, propagou e mandou propagar a confortável teoria de que as acusações eram parte de uma "conspiração das elites" para apeá-lo do poder. Mas não chegou a zombar acintosamente das revelações que iriam ficar gravadas na história de seu partido.
Já no ano seguinte, quando a polícia detonou a tentativa de um grupo de petistas, entre eles o churrasqueiro preferido de Lula, de comprar um falso dossiê contra o mesmo José Serra, então candidato a governador de São Paulo, o presidente incorporou ao léxico político nacional o termo "aloprados" com que, para mascarar a gravidade do episódio, se referiu aos participantes da torpeza. Agora, enquanto escondia a sua escolhida - acusada pelo tucano como responsável, em última instância, pela fabricação de novo dossiê com os documentos subtraídos do Fisco -, o presidente se abandonou ao cinismo.
No fim da semana, em um comício em Guarulhos, na Grande São Paulo, a que Dilma não compareceu, ele acusou Serra de transformar a família em vítima. Ou seja, o que vitimou a filha do candidato não foi a comprovada captura de suas declarações de renda por um personagem do submundo - cuja filiação ao PT só não se consumou por um erro de grafia de seu nome -, mas o "baixo nível" da campanha do pai, que tratou do escândalo no horário de propaganda eleitoral. E ele o teria feito porque "o bicho está em uma raiva só" diante dos resultados desfavoráveis das pesquisas eleitorais. "É próprio de quem não sabe nadar e se debate até morrer afogado", desdenhou.
O auge da avacalhação - para usar uma palavra decerto ao gosto do palanqueiro Lula - foi ele perguntar retoricamente: "Cadê esse tal de sigilo que não apareceu até agora? Cadê os vazamentos?" Se é da filha de Serra que ele falava, o sigilo vazou para os diversos blogs lulistas que publicaram informações a seu respeito que só poderiam ter sido obtidas a partir do acesso ilícito aos seus dados fiscais. E o presidente sabe disso desde janeiro, quando o ainda governador Serra o alertou para a "armação" contra seus familiares na internet. Confrontado com o fato, Lula disse, sem ruborizar-se, ter coisas mais sérias para cuidar do que das "dores de cotovelo do Serra".
Se, no comício, a sua pergunta farsesca tratava das outras pessoas ligadas ao candidato, como, em especial, o vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira, o sigilo vazou para membros do chamado "grupo de inteligência" da candidatura Dilma. No caso de Eduardo Jorge, aliás, a invasão não se limitou à delegacia da Receita em Mauá, no ABC paulista, a primeira cena identificada do crime. Na última quinta-feira, o Estado revelou que um analista tributário lotado na cidade mineira de Formiga, Gilberto Souza Amarante, acessou dez vezes em um mesmo dia os dados cadastrais do tucano. O funcionário é petista de carteirinha desde 2001.
Ninguém mais do que Lula, com o seu imitigado deboche, há de ter contribuído tanto para a "maria-mole moral" em que o País atolou, na apropriada expressão do jurista Carlos Ari Sundfeld, em entrevista no Estado de domingo. Nem a bonança econômica nem os avanços sociais podem obscurecer o perverso legado do lulismo. Por minar os fundamentos das instituições democráticas, essa é hoje a mais desafiadora questão política nacional.
Politica externa brasileira: o fantasma de Rio Branco
Não tenho esse culto pelo Barão, mas ele está sempre sendo usado pelos observadores como parâmetro para analisar a política externa do Brasil.
Pode até servir, depende do gosto de cada um.
O fato é que a atual política externa não se parece com nenhuma outra...
Paulo Roberto de Almeida
Volta às origens
Editorial O Globo, 08.09.2010
Entre inegáveis ações positivas do governo Lula, infelizmente não está a política externa. A expectativa em torno da atuação internacional do Brasil cresceu consideravelmente, em linha com o destaque que o país passou a ter por conta da consolidação de suas instituições democráticas, da relativa firmeza de sua economia e dos avanços na redução das (ainda graves) desigualdades sociais. Mas as expectativas foram frustradas.
No governo Lula, a política externa brasileira foi reorientada para refletir supostos novos interesses estratégicos do país, em prejuízo da linha histórica traçada pelo Barão do Rio Branco, pautada pelo profissionalismo, pela eficiência e pela sintonia fina dos interesses nacionais.
Simpatias ideológicas começaram a ditar o rumo da diplomacia brasileira, abrindo desnecessárias áreas de desgaste com importantes e tradicionais parceiros do país. Ao mesmo tempo, interesses partidários passaram a interferir nas diretrizes permanentes de nossa atuação externa, deixando o Itamaraty refém de iniciativas descalibradas.
O compadrio ideológico fez com que o Brasil apoiasse sistematicamente o regime comunista de Cuba, para o qual a defesa dos direitos humanos é uma atitude “antirrevolucionária”; o regime bolivariano da Venezuela, para o qual adversários políticos são inimigos jurados; ou o regime indigenista da Bolívia, que nacionalizou instalações brasileiras de exploração de gás.
A política externa brasileira ressuscitou fósseis da Guerra Fria, como a divisão entre Primeiro e Terceiro Mundos, o conflito entre o Hemisfério Norte, desenvolvido e explorador, e o Sul, pobre e espoliado, o que desembocou num antiamericanismo risível. Esse posicionamento brasileiro levou a distorções, como a insistência no apoio ao ex-presidente Zelaya, de Honduras, um chavista tardio, mesmo depois de a crise do país ter sido solucionada com a realização de eleições apoiadas por Washington. Criou situações ridículas, como a do presidente Lula, em visita ao Oriente Médio, tentando posicionar o país como um dos baluartes do processo de paz entre israelenses e palestinos.
E forçações de barra, como a de tentar transformar o Brasil num interlocutor privilegiado do regime clerical-obscurantista do Irã, sendo imediatamente desautorizado pelos Estados Unidos e pelos fatos.
Da ideia do contraponto à OEA, que seria controlada por Washington, nasceu a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), com todo o apoio brasileiro e o objetivo de unir as duas organizações de livre comércio sul-americanas — o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações.
A entidade se desdobraria, entre outras medidas, num Conselho de Defesa da América do Sul. Não está explícito de que ou de quem a região se defenderia.
Mas pode-se imaginar, a julgar pelo antiamericanismo predominante entre seus membros — a Colômbia, maior aliada dos EUA na região, é membro relutante.
Não há dúvida de que a diplomacia deve ser dinâmica para acompanhar a evolução dos interesses estratégicos do país num mundo em rapidíssima transformação. Há novos atores, como os Bric, e novos temas, como a defesa do meio ambiente, mas isso não quer dizer que o país deve abandonar os pilares tradicionais de sua política externa.
Deve, isto sim, é resgatar o equilíbrio e o multilateralismo que sempre caracterizaram a atuação do Itamaraty. O Barão do Rio Branco agradece.
Pode até servir, depende do gosto de cada um.
O fato é que a atual política externa não se parece com nenhuma outra...
Paulo Roberto de Almeida
Volta às origens
Editorial O Globo, 08.09.2010
Entre inegáveis ações positivas do governo Lula, infelizmente não está a política externa. A expectativa em torno da atuação internacional do Brasil cresceu consideravelmente, em linha com o destaque que o país passou a ter por conta da consolidação de suas instituições democráticas, da relativa firmeza de sua economia e dos avanços na redução das (ainda graves) desigualdades sociais. Mas as expectativas foram frustradas.
No governo Lula, a política externa brasileira foi reorientada para refletir supostos novos interesses estratégicos do país, em prejuízo da linha histórica traçada pelo Barão do Rio Branco, pautada pelo profissionalismo, pela eficiência e pela sintonia fina dos interesses nacionais.
Simpatias ideológicas começaram a ditar o rumo da diplomacia brasileira, abrindo desnecessárias áreas de desgaste com importantes e tradicionais parceiros do país. Ao mesmo tempo, interesses partidários passaram a interferir nas diretrizes permanentes de nossa atuação externa, deixando o Itamaraty refém de iniciativas descalibradas.
O compadrio ideológico fez com que o Brasil apoiasse sistematicamente o regime comunista de Cuba, para o qual a defesa dos direitos humanos é uma atitude “antirrevolucionária”; o regime bolivariano da Venezuela, para o qual adversários políticos são inimigos jurados; ou o regime indigenista da Bolívia, que nacionalizou instalações brasileiras de exploração de gás.
A política externa brasileira ressuscitou fósseis da Guerra Fria, como a divisão entre Primeiro e Terceiro Mundos, o conflito entre o Hemisfério Norte, desenvolvido e explorador, e o Sul, pobre e espoliado, o que desembocou num antiamericanismo risível. Esse posicionamento brasileiro levou a distorções, como a insistência no apoio ao ex-presidente Zelaya, de Honduras, um chavista tardio, mesmo depois de a crise do país ter sido solucionada com a realização de eleições apoiadas por Washington. Criou situações ridículas, como a do presidente Lula, em visita ao Oriente Médio, tentando posicionar o país como um dos baluartes do processo de paz entre israelenses e palestinos.
E forçações de barra, como a de tentar transformar o Brasil num interlocutor privilegiado do regime clerical-obscurantista do Irã, sendo imediatamente desautorizado pelos Estados Unidos e pelos fatos.
Da ideia do contraponto à OEA, que seria controlada por Washington, nasceu a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), com todo o apoio brasileiro e o objetivo de unir as duas organizações de livre comércio sul-americanas — o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações.
A entidade se desdobraria, entre outras medidas, num Conselho de Defesa da América do Sul. Não está explícito de que ou de quem a região se defenderia.
Mas pode-se imaginar, a julgar pelo antiamericanismo predominante entre seus membros — a Colômbia, maior aliada dos EUA na região, é membro relutante.
Não há dúvida de que a diplomacia deve ser dinâmica para acompanhar a evolução dos interesses estratégicos do país num mundo em rapidíssima transformação. Há novos atores, como os Bric, e novos temas, como a defesa do meio ambiente, mas isso não quer dizer que o país deve abandonar os pilares tradicionais de sua política externa.
Deve, isto sim, é resgatar o equilíbrio e o multilateralismo que sempre caracterizaram a atuação do Itamaraty. O Barão do Rio Branco agradece.
Mais uma estatal brasileira: alguem tem a lista completa?
Pelos meus cálculos, já devem ter passado de 40 as estatais criadas neste governo, mas talvez sejam mais. Gostaria de ter a lista completa, se alguém dispuser, agradeceria receber.
Isso sem falar na recriação de agências públicas que já tinha sido desmanteladas no governo anterior, como Sudene, Sudeco e várias outras.
Paulo Roberto de Almeida
Governo e seguradoras fecham acordo para criação de agência
DCI, 08.09.2010
O governo e a Confederação Nacional das Empresas de Seguros (CNseg) fecharam acordo para a criação de uma agência de garantias, uma empresa pública que vai administrar os diversos fundos garantidores de crédito do governo federal. A Agência Brasileira de Garantias (ABG) deve ter alcance um pouco mais limitado que a Empresa Brasileira de Seguros (EBS), estatal que a equipe econômica queria criar para reforçar a oferta de seguro das grandes obras de infraestrutura do País, da habitação, das exportações e da educação.
A nova entidade, embora não seja uma seguradora clássica, estará sob a regulação da Superintendência de Seguros Privados (Susep), a quem caberá, por exemplo, definir que nível de alavancagem poderá ocorrer em operações da ABG feitas com capital próprio - fora dos fundos garantidores. Amanhã, governo e representantes do setor privado têm uma última reunião para fechar os detalhes técnicos da proposta que será encaminhada ao Congresso Nacional.
A minuta do projeto de lei foi entregue à CNSeg, que considerou o texto positivo para o setor. As empresas seguradoras privadas foram contra o projeto original e fizerem forte pressão no governo, que abriu negociações para mudança. "Fechamos o acordo. Faltam apenas ajustes técnicos", disse o presidente da CNseg, Jorge Hilário Gouvêa Vieira.
Segundo ele, pela proposta, a nova agência vai ter uma ação limitada em duas frentes: cobrir o seguro adicional de garantia de crédito para os projetos de infraestrutura (o que o setor privado não conseguir oferecer), exportações e o chamado seguro social voltado para os setores habitação, educação e pequena e média empresa. Pela proposta, os fundos garantidores, administrados pela ABG, poderão atuar por meio de consórcios com as empresas do setor privado.
Isso sem falar na recriação de agências públicas que já tinha sido desmanteladas no governo anterior, como Sudene, Sudeco e várias outras.
Paulo Roberto de Almeida
Governo e seguradoras fecham acordo para criação de agência
DCI, 08.09.2010
O governo e a Confederação Nacional das Empresas de Seguros (CNseg) fecharam acordo para a criação de uma agência de garantias, uma empresa pública que vai administrar os diversos fundos garantidores de crédito do governo federal. A Agência Brasileira de Garantias (ABG) deve ter alcance um pouco mais limitado que a Empresa Brasileira de Seguros (EBS), estatal que a equipe econômica queria criar para reforçar a oferta de seguro das grandes obras de infraestrutura do País, da habitação, das exportações e da educação.
A nova entidade, embora não seja uma seguradora clássica, estará sob a regulação da Superintendência de Seguros Privados (Susep), a quem caberá, por exemplo, definir que nível de alavancagem poderá ocorrer em operações da ABG feitas com capital próprio - fora dos fundos garantidores. Amanhã, governo e representantes do setor privado têm uma última reunião para fechar os detalhes técnicos da proposta que será encaminhada ao Congresso Nacional.
A minuta do projeto de lei foi entregue à CNSeg, que considerou o texto positivo para o setor. As empresas seguradoras privadas foram contra o projeto original e fizerem forte pressão no governo, que abriu negociações para mudança. "Fechamos o acordo. Faltam apenas ajustes técnicos", disse o presidente da CNseg, Jorge Hilário Gouvêa Vieira.
Segundo ele, pela proposta, a nova agência vai ter uma ação limitada em duas frentes: cobrir o seguro adicional de garantia de crédito para os projetos de infraestrutura (o que o setor privado não conseguir oferecer), exportações e o chamado seguro social voltado para os setores habitação, educação e pequena e média empresa. Pela proposta, os fundos garantidores, administrados pela ABG, poderão atuar por meio de consórcios com as empresas do setor privado.
Brasil protecionista: contra India e Bangladesh, em sacos de juta...
Alguém pode acreditar que as fábricas indianas e bengalis de sacos de juta se organizaram justamente para fazer dumping de seus sacos de juta contra seus contrapartes do Brasil?
Alguém pode explicar porque precisa de mais CINCO anos -- supostamente vindo de igual período para trás -- para afastar essa terrível ameaça de dumping contra a segurança econômica nacional, contra o bem estar dos produtores brasileiros, contra o nosso interesse estratégico em sacos de juta?
Alguém pode explicar como a Camex consegue ser tão ridícula?
Eu diria que o protecionismo está entranhado nos comportamentos brasileiros...
Paulo Roberto de Almeida
Camex mantém restrição para sacos de juta
DCI, 8.09.2010
A Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidiu prorrogar por até cinco anos a aplicação de direito antidumping nas importações de sacos de juta da Índia e de Bangladesh. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União da última sexta-feira. As alíquotas adicionais cobradas na entrada da mercadoria no Brasil serão de US$ 0,15 por quilo da indiana Birla Corporation Limited e US$ 0,45 por quilo das demais empresas da Índia. Para as firmas de Bangladesh, a sobretaxação será de US$ 0,16 por quilo.
Alguém pode explicar porque precisa de mais CINCO anos -- supostamente vindo de igual período para trás -- para afastar essa terrível ameaça de dumping contra a segurança econômica nacional, contra o bem estar dos produtores brasileiros, contra o nosso interesse estratégico em sacos de juta?
Alguém pode explicar como a Camex consegue ser tão ridícula?
Eu diria que o protecionismo está entranhado nos comportamentos brasileiros...
Paulo Roberto de Almeida
Camex mantém restrição para sacos de juta
DCI, 8.09.2010
A Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidiu prorrogar por até cinco anos a aplicação de direito antidumping nas importações de sacos de juta da Índia e de Bangladesh. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União da última sexta-feira. As alíquotas adicionais cobradas na entrada da mercadoria no Brasil serão de US$ 0,15 por quilo da indiana Birla Corporation Limited e US$ 0,45 por quilo das demais empresas da Índia. Para as firmas de Bangladesh, a sobretaxação será de US$ 0,16 por quilo.
O caos tributario brasileiro: apenas uma amostra da confusao
Em nenhum lugar do mundo, em nenhuma época histórica, imposto pago ao Estado poderia sequer ser considerado como valor agregado, ou seja, como riqueza criada pelos agentes econômicos, pela sociedade.
Apenas num país anormal, com um Estado bizarro, extrator delinquente, é que o imposto -- que configura, justamente, uma extração compulsória de parte da riqueza criada, do valor agregado -- vem utilizado para calcular o valor total do faturamento de uma empresa para fins de recolhimento do imposto, como se a empresa tivesse recolhido esse montante para si mesma, e não, como ocorre, visse uma parte de seu próprio valor agregado ser subtraída pelo Estado.
Não tenho ilusão de que o Supremo julgue a favor da cidadania, ou seja, das empresas. Nunca ocorreu antes e duvido que possa ocorrer agora.
Paulo Roberto de Almeida
STF pode fazer ‘reforma tributária’ e obrigar a União a devolver R$ 60 bi
Lu Aiko Otta
O Estado de S. Paulo, terça-feira, 7 de setembro de 2010
Supremo deve retomar até o fim do mês uma ação, em que o governo já sofreu uma derrota, e que pode mudar todo o sistema tributário
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá retomar no fim deste mês um julgamento que, no entender dos advogados da União, tem potencial de virar de cabeça para baixo todo o sistema tributário nacional. Uma decisão desfavorável ao governo federal, acreditam eles, provocaria um prejuízo de R$ 60 bilhões e poderia modificar a forma como vários impostos são calculados e cobrados no País.
No limite, o julgamento no STF pode desencadear a reforma do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o que o Executivo e o Legislativo tentam fazer sem sucesso desde a Constituição de 1988.
O que está em discussão é se, ao calcular a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), cobrada sobre o faturamento das empresas, deve-se ou não descontar o ICMS. Hoje, ele não é descontado.
O ICMS vem embutido no preço das mercadorias. Uma loja, por exemplo, recolhe a contribuição sobre o valor total de suas vendas. Dessa forma, o ICMS integra o faturamento da loja, que é a base de cálculo da Cofins. Ou seja, é tributo cobrado em cima de tributo, ou como dizem os técnicos, é "tributação por dentro".
Derrota do governo. Várias empresas questionaram essa forma de cobrança na Justiça, mas a União sistematicamente ganhou. Em 2008, porém, a questão começou a ser julgada no STF e, surpreendentemente, o governo federal agora corre o risco de ser derrotado. Na discussão do processo movido por uma empresa, a Axa Seguros, o placar estava 6 a 1 contra o governo.
A União, então, fez uma manobra: pediu que, em vez de julgar o caso específico da Axa, o STF fizesse uma discussão mais geral e declarasse a constitucionalidade da cobrança tal como é feita hoje. Isso zerou o placar, pois o Supremo passou a avaliar a Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC) apresentada pelos advogados do governo federal.
Jeito de tributar. A coordenadora de Atuação Judicial da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional junto ao STF, Cláudia Trindade, acredita que o julgamento será retomado este ano, pois o prazo pedido pelo relator da matéria, Celso de Mello, se encerra no fim de setembro. "Mas sempre pode ter um pedido de vista, por isso não acredito que o julgamento será concluído em 2010." Se a União for derrotada, terá de devolver às empresas a Cofins que recolheu a maior pelo fato de ela ter sido calculada em cima do ICMS.
Seria algo como R$ 12 bilhões ao ano, ou R$ 60 bilhões no período de cinco anos, que é o que pode ser exigido. "Mas essa é uma questão mais séria, porque se a União perder haverá repercussões na tributação estadual e municipal", disse Cláudia. "O que se questiona é o jeito de tributar no Brasil." Já há ações no STF questionando o Imposto sobre Serviços (ISS) na base da Cofins e o ISS na base do ICMS.
Na própria petição da Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC), os advogados da União argumentam que, se o ICMS não pode estar na base de cálculo da Cofins, ele também não poderia estar em sua própria base de cálculo, como ocorre hoje. "Note-se, por fim, que se inconstitucional fosse a incidência da Cofins sobre o valor do ICMS embutido no preço das mercadorias e serviços, também o seria, com muito mais razão, a incidência do ICMS sobre o próprio ICMS", diz o documento, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo então advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli, que atualmente é ministro no STF.
Esse argumento lançando dúvidas sobre a constitucionalidade do ICMS sobre sua própria base incendiou interesses dos dois lados. As confederações nacionais da Indústria (CNI), do Comércio (CNC) e dos Transportes (CNT) ingressaram na ação como "amicus curae" contra a União, isto é, parte interessada na ação. Em apoio ao governo federal, 17 Estados também pediram para ingressar na ADC.
IVA brasileiro. Pelo raciocínio dos advogados da União, uma decisão desfavorável no caso do ICMS na base da Cofins abriria as portas para o fim da tributação "por dentro" em outros tributos, como o próprio ICMS. Se o ICMS passasse a ser cobrado "por fora", ele ficaria mais parecido com o imposto sobre vendas, também conhecido como Imposto sobre Valor agregado (IVA).
A adoção de um IVA pelos Estados é o centro de várias propostas de reforma tributária já discutidas no País. "Seria um IVA", disse Cláudia. "E o IVA não é adotado no Brasil porque temos uma federação que não quer adotar o IVA. É questão muito séria."
Apenas num país anormal, com um Estado bizarro, extrator delinquente, é que o imposto -- que configura, justamente, uma extração compulsória de parte da riqueza criada, do valor agregado -- vem utilizado para calcular o valor total do faturamento de uma empresa para fins de recolhimento do imposto, como se a empresa tivesse recolhido esse montante para si mesma, e não, como ocorre, visse uma parte de seu próprio valor agregado ser subtraída pelo Estado.
Não tenho ilusão de que o Supremo julgue a favor da cidadania, ou seja, das empresas. Nunca ocorreu antes e duvido que possa ocorrer agora.
Paulo Roberto de Almeida
STF pode fazer ‘reforma tributária’ e obrigar a União a devolver R$ 60 bi
Lu Aiko Otta
O Estado de S. Paulo, terça-feira, 7 de setembro de 2010
Supremo deve retomar até o fim do mês uma ação, em que o governo já sofreu uma derrota, e que pode mudar todo o sistema tributário
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá retomar no fim deste mês um julgamento que, no entender dos advogados da União, tem potencial de virar de cabeça para baixo todo o sistema tributário nacional. Uma decisão desfavorável ao governo federal, acreditam eles, provocaria um prejuízo de R$ 60 bilhões e poderia modificar a forma como vários impostos são calculados e cobrados no País.
No limite, o julgamento no STF pode desencadear a reforma do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o que o Executivo e o Legislativo tentam fazer sem sucesso desde a Constituição de 1988.
O que está em discussão é se, ao calcular a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), cobrada sobre o faturamento das empresas, deve-se ou não descontar o ICMS. Hoje, ele não é descontado.
O ICMS vem embutido no preço das mercadorias. Uma loja, por exemplo, recolhe a contribuição sobre o valor total de suas vendas. Dessa forma, o ICMS integra o faturamento da loja, que é a base de cálculo da Cofins. Ou seja, é tributo cobrado em cima de tributo, ou como dizem os técnicos, é "tributação por dentro".
Derrota do governo. Várias empresas questionaram essa forma de cobrança na Justiça, mas a União sistematicamente ganhou. Em 2008, porém, a questão começou a ser julgada no STF e, surpreendentemente, o governo federal agora corre o risco de ser derrotado. Na discussão do processo movido por uma empresa, a Axa Seguros, o placar estava 6 a 1 contra o governo.
A União, então, fez uma manobra: pediu que, em vez de julgar o caso específico da Axa, o STF fizesse uma discussão mais geral e declarasse a constitucionalidade da cobrança tal como é feita hoje. Isso zerou o placar, pois o Supremo passou a avaliar a Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC) apresentada pelos advogados do governo federal.
Jeito de tributar. A coordenadora de Atuação Judicial da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional junto ao STF, Cláudia Trindade, acredita que o julgamento será retomado este ano, pois o prazo pedido pelo relator da matéria, Celso de Mello, se encerra no fim de setembro. "Mas sempre pode ter um pedido de vista, por isso não acredito que o julgamento será concluído em 2010." Se a União for derrotada, terá de devolver às empresas a Cofins que recolheu a maior pelo fato de ela ter sido calculada em cima do ICMS.
Seria algo como R$ 12 bilhões ao ano, ou R$ 60 bilhões no período de cinco anos, que é o que pode ser exigido. "Mas essa é uma questão mais séria, porque se a União perder haverá repercussões na tributação estadual e municipal", disse Cláudia. "O que se questiona é o jeito de tributar no Brasil." Já há ações no STF questionando o Imposto sobre Serviços (ISS) na base da Cofins e o ISS na base do ICMS.
Na própria petição da Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC), os advogados da União argumentam que, se o ICMS não pode estar na base de cálculo da Cofins, ele também não poderia estar em sua própria base de cálculo, como ocorre hoje. "Note-se, por fim, que se inconstitucional fosse a incidência da Cofins sobre o valor do ICMS embutido no preço das mercadorias e serviços, também o seria, com muito mais razão, a incidência do ICMS sobre o próprio ICMS", diz o documento, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo então advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli, que atualmente é ministro no STF.
Esse argumento lançando dúvidas sobre a constitucionalidade do ICMS sobre sua própria base incendiou interesses dos dois lados. As confederações nacionais da Indústria (CNI), do Comércio (CNC) e dos Transportes (CNT) ingressaram na ação como "amicus curae" contra a União, isto é, parte interessada na ação. Em apoio ao governo federal, 17 Estados também pediram para ingressar na ADC.
IVA brasileiro. Pelo raciocínio dos advogados da União, uma decisão desfavorável no caso do ICMS na base da Cofins abriria as portas para o fim da tributação "por dentro" em outros tributos, como o próprio ICMS. Se o ICMS passasse a ser cobrado "por fora", ele ficaria mais parecido com o imposto sobre vendas, também conhecido como Imposto sobre Valor agregado (IVA).
A adoção de um IVA pelos Estados é o centro de várias propostas de reforma tributária já discutidas no País. "Seria um IVA", disse Cláudia. "E o IVA não é adotado no Brasil porque temos uma federação que não quer adotar o IVA. É questão muito séria."
Republica Mafiosa do Brasil (19): rebaixando a cidadania (Merval Pereira)
Lula rebaixa a cidadania
Merval Pereira
O Globo, 7.9.2010
O mais espantoso na atuação do presidente Lula no episódio das quebras múltiplas de sigilo fiscal de pessoas ligadas ao PSDB, até mesmo a filha do candidato tucano à Presidência da República, é como ele manipula seus seguidores, explorando-lhes a boa-fé e, sobretudo, a ignorância.
José Serra lamentou que Lula tenha “debochado de coisa séria” quando fez análises nada republicanas sobre o episódio. Segundo o presidente, em cima de um palanque, o episódio não passa de “futrica”, e o candidato do PSDB “está nervoso” com a previsão de derrota e está usando sua família “para se fazer de vítima”.
Seriam comentários ofensivos à cidadania, partidos de um presidente que deveria ser imparcial quando o assunto são as garantias dos direitos individuais dos cidadãos, sejam eles petistas ou não, lulistas ou não.
Mas o mais grave, do ponto de vista da manipulação do eleitorado, está na frase que jogou no ar como se fosse um desafio: “Cadê esse tal de sigilo que ninguém viu?”
O presidente Lula se utiliza assim da dificuldade que o brasileiro comum tem de compreender os meandros da disputa política, muito mais quando se trata de questões técnicas ligadas a computadores e senhas eletrônicas, para tentar desmoralizar a questão, reduzindo-a a uma “futrica” de perdedor.
Se o tal do “sigilo” não apareceu, é porque não existe, quer levar a crer o nosso nada republicano presidente.
É conhecida a piada que circula entre os petistas segundo a qual Lula teria dito que essa questão de dossiê não abala seu eleitorado, pois eles não sabem o que quer dizer a palavra, e muitos a confundem com “doce”.
Há também o raciocínio segundo o qual como apenas 40 milhões de brasileiros de- claram o Imposto de Renda, a imensa maioria dos eleitores não estaria preocupada com o assunto.
Para se ter uma noção do que esse raciocínio perverso embute, dos 130 milhões de eleitores, cerca de 60% são formados por analfabetos, analfabetos funcionais ou pessoas que não completaram o ensino fundamental.
Ora, a esta altura dos acontecimentos, todo cidadão de boa-fé e minimamente informado sabe que os dados colhidos em diversas instâncias da Receita Federal, em várias partes do país, estão espalhados em diversos documentos que circularam no comitê da candidata oficial Dilma Rousseff.
Não foram usados formalmente, nem nunca seriam, pois trata-se de material ilegal. Mas estão sendo espalhados há muito tempo em diversos blogs e continuam sendo usados com insinuações contra as vítimas dos atentados.
A própria candidata Dilma Rousseff, abusando da inteligência de seus interlocutores e seguindo por um caminho perigoso, insinuou em entrevista coletiva que os dados levantados sobre Verônica Serra seriam usados por membros do próprio PSDB contra Serra, que àquela altura ainda disputava com o ex-governador de Minas Aécio Neves a escolha do partido para concorrer à Presidência da República.
Os petistas engendraram uma pseudoexplicação que culpa a vítima, e Dilma se en-carregou de tornar essa intriga em fato de campanha na sua entrevista.
A disputa entre Serra e Aécio seria a verdadeira origem do tal dossiê, que eles negavam existir e agora, diante das evidências, querem jogar no colo de Aécio Neves, numa mesquinha tentativa de confundir os eleitores.
Mais uma vez coube à chamada grande imprensa, para ódio dos governistas e seus blogueiros chapas-brancas, demonstrar que essa versão não se sustenta.
Tanto os acessos em Santo André quanto os de Formiga, em Minas Gerais, foram feitos por pessoas filiadas ao PT, o que deixa evidente o caráter político das quebras de sigilo.
Essa é uma prática comum ao Partido dos Trabalhadores e tem uma longa história, desde quando o partido era de oposição, mas já mantinha nos principais órgãos públicos uma grande influência graças aos sindicalistas enfronhados na máquina pública.
Na oposição os petistas usavam seu poder de quebrar sigilos e de conseguir documentos para fazer denúncias contra o governo de Fernando Henrique Cardoso.
No governo, montaram uma máquina de informações não apenas para difundir notícias falsas sobre seus adversários como para usar as informações como arma política de chantagem nas negociações de bastidores.
O cérebro desse esquema de informações paralelo e ilegal foi o ex-ministro e deputado federal cassado José Dirceu, que se vangloria até hoje dos métodos que aprendeu quando esteve exilado em Cuba.
Merval Pereira
O Globo, 7.9.2010
O mais espantoso na atuação do presidente Lula no episódio das quebras múltiplas de sigilo fiscal de pessoas ligadas ao PSDB, até mesmo a filha do candidato tucano à Presidência da República, é como ele manipula seus seguidores, explorando-lhes a boa-fé e, sobretudo, a ignorância.
José Serra lamentou que Lula tenha “debochado de coisa séria” quando fez análises nada republicanas sobre o episódio. Segundo o presidente, em cima de um palanque, o episódio não passa de “futrica”, e o candidato do PSDB “está nervoso” com a previsão de derrota e está usando sua família “para se fazer de vítima”.
Seriam comentários ofensivos à cidadania, partidos de um presidente que deveria ser imparcial quando o assunto são as garantias dos direitos individuais dos cidadãos, sejam eles petistas ou não, lulistas ou não.
Mas o mais grave, do ponto de vista da manipulação do eleitorado, está na frase que jogou no ar como se fosse um desafio: “Cadê esse tal de sigilo que ninguém viu?”
O presidente Lula se utiliza assim da dificuldade que o brasileiro comum tem de compreender os meandros da disputa política, muito mais quando se trata de questões técnicas ligadas a computadores e senhas eletrônicas, para tentar desmoralizar a questão, reduzindo-a a uma “futrica” de perdedor.
Se o tal do “sigilo” não apareceu, é porque não existe, quer levar a crer o nosso nada republicano presidente.
É conhecida a piada que circula entre os petistas segundo a qual Lula teria dito que essa questão de dossiê não abala seu eleitorado, pois eles não sabem o que quer dizer a palavra, e muitos a confundem com “doce”.
Há também o raciocínio segundo o qual como apenas 40 milhões de brasileiros de- claram o Imposto de Renda, a imensa maioria dos eleitores não estaria preocupada com o assunto.
Para se ter uma noção do que esse raciocínio perverso embute, dos 130 milhões de eleitores, cerca de 60% são formados por analfabetos, analfabetos funcionais ou pessoas que não completaram o ensino fundamental.
Ora, a esta altura dos acontecimentos, todo cidadão de boa-fé e minimamente informado sabe que os dados colhidos em diversas instâncias da Receita Federal, em várias partes do país, estão espalhados em diversos documentos que circularam no comitê da candidata oficial Dilma Rousseff.
Não foram usados formalmente, nem nunca seriam, pois trata-se de material ilegal. Mas estão sendo espalhados há muito tempo em diversos blogs e continuam sendo usados com insinuações contra as vítimas dos atentados.
A própria candidata Dilma Rousseff, abusando da inteligência de seus interlocutores e seguindo por um caminho perigoso, insinuou em entrevista coletiva que os dados levantados sobre Verônica Serra seriam usados por membros do próprio PSDB contra Serra, que àquela altura ainda disputava com o ex-governador de Minas Aécio Neves a escolha do partido para concorrer à Presidência da República.
Os petistas engendraram uma pseudoexplicação que culpa a vítima, e Dilma se en-carregou de tornar essa intriga em fato de campanha na sua entrevista.
A disputa entre Serra e Aécio seria a verdadeira origem do tal dossiê, que eles negavam existir e agora, diante das evidências, querem jogar no colo de Aécio Neves, numa mesquinha tentativa de confundir os eleitores.
Mais uma vez coube à chamada grande imprensa, para ódio dos governistas e seus blogueiros chapas-brancas, demonstrar que essa versão não se sustenta.
Tanto os acessos em Santo André quanto os de Formiga, em Minas Gerais, foram feitos por pessoas filiadas ao PT, o que deixa evidente o caráter político das quebras de sigilo.
Essa é uma prática comum ao Partido dos Trabalhadores e tem uma longa história, desde quando o partido era de oposição, mas já mantinha nos principais órgãos públicos uma grande influência graças aos sindicalistas enfronhados na máquina pública.
Na oposição os petistas usavam seu poder de quebrar sigilos e de conseguir documentos para fazer denúncias contra o governo de Fernando Henrique Cardoso.
No governo, montaram uma máquina de informações não apenas para difundir notícias falsas sobre seus adversários como para usar as informações como arma política de chantagem nas negociações de bastidores.
O cérebro desse esquema de informações paralelo e ilegal foi o ex-ministro e deputado federal cassado José Dirceu, que se vangloria até hoje dos métodos que aprendeu quando esteve exilado em Cuba.
A obsfuscacao das contas publicas; muita confusao, pouca clareza...
O último orçamento de Lula
Editorial - O Estado de S.Paulo
08 de setembro de 2010
Ao fixar em valores a meta do superávit primário para o próximo ano, e não mais em porcentagem do PIB, como vinha ocorrendo, o projeto de lei orçamentária de 2011- enviado pelo presidente Lula ao Congresso na terça-feira da semana passada - cria uma margem extra de gastos para o futuro governo. Essa margem será tanto maior quanto mais o crescimento da economia superar as estimativas oficiais que balizam a proposta orçamentária e que são consideradas conservadoras dentro do próprio governo. Assim, o projeto do Orçamento da União de 2011 intensifica o processo de deterioração da política fiscal, que vem sendo afrouxada nos últimos anos para acomodar despesas de interesse político do presidente e de seus aliados.
Para o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, a mudança do critério de fixação da meta do superávit primário dá mais "clareza" à gestão orçamentária. É muito provável, no entanto, que, em vez de mais "clareza", a nova regra dificulte a avaliação da política fiscal no ano que vem.
Mesmo raciocinando a partir dos parâmetros conservadores do governo para a montagem do Orçamento de 2011, pode-se concluir que haverá um afrouxamento da meta fiscal em relação aos anos anteriores. Se o PIB crescer 6,5% neste ano e 5,5% em 2011, como está previsto na proposta orçamentária, o valor de R$ 125,5 bilhões para o superávit primário do ano que vem corresponderá a 3,22% do PIB, menos do que os 3,31% utilizados no Orçamento de 2010. Em valor, observou o ministro, a diferença será pequena, de R$ 3,1 bilhões, se os parâmetros estiverem corretos.
Mas é provável que o PIB cresça mais do que as projeções contidas na proposta orçamentária, o que fará a arrecadação crescer bem mais do que está previsto e tornará muito maior a folga do próximo governo para gastar mais no primeiro ano de sua gestão, sem deixar de cumprir a meta de superávit primário.
Outra marca da proposta orçamentária é a preocupação do presidente Lula de assegurar a continuidade de um projeto de inspiração política e escassos resultados práticos, que é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Em 2011, o PAC terá 37% mais recursos do que está tendo este ano (os investimentos passarão de R$ 31,85 bilhões para R$ 43,52 bilhões). Seria bom para o País se esses investimentos fossem concretizados, mas, se a próxima gestão repetir a atual, pouca coisa sairá do papel. O que o histórico da administração do PAC mostra é uma grande lentidão na liberação dos recursos e, sobretudo, na conclusão das obras.
A proposta prevê aumento de 15% dos investimentos totais (de R$ 138,5 bilhões para R$ 159,6 bilhões), mas praticamente dois terços do total programado serão de responsabilidade de empresas estatais (só a Petrobrás deverá investir R$ 78,7 bilhões), ou seja, não beneficiam diretamente programas e ações do governo federal.
Com relação aos gastos com pessoal, depois de ter concedido generosos benefícios a todas as carreiras de servidores, em sua última proposta orçamentária o governo Lula se mostrou mais contido. Incluiu nela apenas as parcelas dos benefícios anteriores que devem ser pagas em 2011.
É preciso, no entanto, aguardar algumas arrastadas negociações políticas - que deverão se realizar somente depois de conhecidos os resultados eleitorais - para saber, na realidade, quanto dessa proposta original do governo poderá ser executado, e quanto terá de ser destinado para outras contas.
O projeto de lei não prevê, por exemplo, aumento real para o salário mínimo, cujo valor baliza outras despesas do governo. A cada ano, o salário mínimo tem sido aumentado de acordo com o crescimento do PIB de dois anos antes. Como em 2009 o PIB encolheu 0,2%, não deveria haver aumento real em 2011. Mas as lideranças sindicais, que negociaram essa regra com o governo, exigem aumento real do mínimo também no ano que vem. O presidente Lula quer que o próximo governo negocie a nova regra.
Se houver aumento real para o mínimo, crescerão outros gastos do governo. A cada 1% adicional no mínimo, as despesas do governo com a Previdência, com a seguridade social e com o abono salarial e seguro-desemprego aumentarão R$ 1,46 bilhão.
===============
JORNALISMO ECONÔMICO
Os detalhes que importam
Por Rolf Kuntz
Observatório da Imprensa, 7/9/2010
Cobrir a capitalização da Petrobras tem sido um duplo desafio. Além de correr atrás da notícia, o pessoal tem suado para montar esquemas gráficos e explicar o processo montado pelo governo. Não é fácil esmiuçar, por exemplo, a cessão onerosa de cinco bilhões de barris de petróleo da União, a forma de converter em dinheiro essa participação e a relação contábil entre a empresa e o Estado. De modo geral, a imprensa tem conseguido realizar a tarefa. De vez em quando, algum jornal se adianta. A Folha de S.Paulo, por exemplo, informou em manchete a discussão sobre o campo inicialmente escolhido para a cessão à Petrobras. A reserva desse campo – Franco – poderia ser menor que os cinco bilhões de barris.
Foi um belo ponto. Não houve desmentido e o arranjo oficial, anunciado poucos dias depois, envolveu a cessão de seis campos e, além disso, um sétimo, o de Peroba, foi escolhido como reserva e precaução. Os jornais informaram com vários dias de antecedência o preço provável do barril de petróleo: US$ 8,50 ou algo muito próximo. Seria a média aritmética dos valores extremos sugeridos por duas consultorias, uma contratada pela Petrobras (US$ 5), outra pela Agência Nacional do Petróleo (US$ 12).
O valor finalmente informado pelo governo foi US$ 8,51. Esse preço foi apresentado como a média ponderada dos valores estimados para cada um dos seis campos. Foi uma coincidência extraordinária. Escreverá uma das melhores histórias do ano – e certamente uma das mais divertidas – quem contar como foram estimados o potencial de cada campo e o preço do petróleo de cada um e quem orientou o trabalho.
Manobras contábeis
O esquema de transferência dos cinco bilhões de barris foi apresentado oficialmente na quarta-feira (1/9). No dia seguinte a Petrobras anunciou os primeiros detalhes do lançamento de ações. Na sexta-feira (3), só o Valor Econômico deu um bom resumo das novas informações, com a estimativa de captação de cerca de R$ 128 bilhões. Os outros jornais tiveram provavelmente problema de horário e só publicaram no sábado o resumo do prospecto.
O governo tem montado uma complicada arquitetura financeira para levar adiante seus planos sem comprometer, pelo menos de forma ostensiva, a meta fiscal. Os arranjos diretos entre a União e a Petrobras são apenas parte desse esforço. Os esquemas de capitalização da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também são exemplos de criatividade, com transferências de ações de estatais e até de direitos do Tesouro sobre futuros dividendos.
Quatro jornais citaram os fatos, na edição de quarta-feira (1/9). A história mais detalhada foi escrita por Adriana Fernandes e Fabio Graner, do Estado de S.Paulo. Conseguiram descrever os lances contábeis e mostrar como o Tesouro ainda conseguiria melhorar suas contas com uma receita não-tributária.
Dados confusos
Os dois outros grandes assuntos da mesma semana foram a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central e a divulgação das contas nacionais do segundo trimestre – e, portanto, do primeiro semestre completo.
O Copom simplesmente manteve os juros básicos em 10,75%, sem surpresa para os analistas econômicos. Porta-vozes do setor privado também reagiram como se previa: reclamaram porque o BC manteve os juros, em vez de cortá-los. Apesar da previsibilidade, os meios de comunicação gastaram o espaço e o tempo habituais com essas declarações.
As contas nacionais, divulgadas na sexta-feira (3/9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram noticiadas em matérias amplas, mas sem novidade no tratamento. As imprecisões também foram as de sempre. O Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre foi 8,8% maior que o de igual período do ano passado. Segundo os jornais, o PIB cresceu 8,8% no período de abril a junho e 8,9% no primeiro semestre. Não tem sentido, em casos como esses, o verbo "crescer". Pode-se usar esse verbo quando se trata de períodos consecutivos: no segundo trimestre o PIB cresceu 1,2% em relação ao primeiro e 4,9% em termos anualizados. Da mesma forma, o PIB cresceu 5,1% nos últimos quatro trimestres sobre os quatro imediatamente anteriores.
Também ocorreu, pelo menos em alguns jornais, uma confusão nos dados sobre o investimento. O valor investido no segundo trimestre foi 26,5% maior que o de um ano antes. Houve quem falasse em recorde de investimento. Mas o recorde foi apenas a diferença entre aqueles dois valores. A taxa de investimento (medida em relação ao PIB) foi 17,9% foi maior que a do segundo trimestre de 2009 (15,8%), mas inferior à do mesmo período de 2008 (18,4%).
Cuidar desses detalhes não é preciosismo.
Editorial - O Estado de S.Paulo
08 de setembro de 2010
Ao fixar em valores a meta do superávit primário para o próximo ano, e não mais em porcentagem do PIB, como vinha ocorrendo, o projeto de lei orçamentária de 2011- enviado pelo presidente Lula ao Congresso na terça-feira da semana passada - cria uma margem extra de gastos para o futuro governo. Essa margem será tanto maior quanto mais o crescimento da economia superar as estimativas oficiais que balizam a proposta orçamentária e que são consideradas conservadoras dentro do próprio governo. Assim, o projeto do Orçamento da União de 2011 intensifica o processo de deterioração da política fiscal, que vem sendo afrouxada nos últimos anos para acomodar despesas de interesse político do presidente e de seus aliados.
Para o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, a mudança do critério de fixação da meta do superávit primário dá mais "clareza" à gestão orçamentária. É muito provável, no entanto, que, em vez de mais "clareza", a nova regra dificulte a avaliação da política fiscal no ano que vem.
Mesmo raciocinando a partir dos parâmetros conservadores do governo para a montagem do Orçamento de 2011, pode-se concluir que haverá um afrouxamento da meta fiscal em relação aos anos anteriores. Se o PIB crescer 6,5% neste ano e 5,5% em 2011, como está previsto na proposta orçamentária, o valor de R$ 125,5 bilhões para o superávit primário do ano que vem corresponderá a 3,22% do PIB, menos do que os 3,31% utilizados no Orçamento de 2010. Em valor, observou o ministro, a diferença será pequena, de R$ 3,1 bilhões, se os parâmetros estiverem corretos.
Mas é provável que o PIB cresça mais do que as projeções contidas na proposta orçamentária, o que fará a arrecadação crescer bem mais do que está previsto e tornará muito maior a folga do próximo governo para gastar mais no primeiro ano de sua gestão, sem deixar de cumprir a meta de superávit primário.
Outra marca da proposta orçamentária é a preocupação do presidente Lula de assegurar a continuidade de um projeto de inspiração política e escassos resultados práticos, que é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Em 2011, o PAC terá 37% mais recursos do que está tendo este ano (os investimentos passarão de R$ 31,85 bilhões para R$ 43,52 bilhões). Seria bom para o País se esses investimentos fossem concretizados, mas, se a próxima gestão repetir a atual, pouca coisa sairá do papel. O que o histórico da administração do PAC mostra é uma grande lentidão na liberação dos recursos e, sobretudo, na conclusão das obras.
A proposta prevê aumento de 15% dos investimentos totais (de R$ 138,5 bilhões para R$ 159,6 bilhões), mas praticamente dois terços do total programado serão de responsabilidade de empresas estatais (só a Petrobrás deverá investir R$ 78,7 bilhões), ou seja, não beneficiam diretamente programas e ações do governo federal.
Com relação aos gastos com pessoal, depois de ter concedido generosos benefícios a todas as carreiras de servidores, em sua última proposta orçamentária o governo Lula se mostrou mais contido. Incluiu nela apenas as parcelas dos benefícios anteriores que devem ser pagas em 2011.
É preciso, no entanto, aguardar algumas arrastadas negociações políticas - que deverão se realizar somente depois de conhecidos os resultados eleitorais - para saber, na realidade, quanto dessa proposta original do governo poderá ser executado, e quanto terá de ser destinado para outras contas.
O projeto de lei não prevê, por exemplo, aumento real para o salário mínimo, cujo valor baliza outras despesas do governo. A cada ano, o salário mínimo tem sido aumentado de acordo com o crescimento do PIB de dois anos antes. Como em 2009 o PIB encolheu 0,2%, não deveria haver aumento real em 2011. Mas as lideranças sindicais, que negociaram essa regra com o governo, exigem aumento real do mínimo também no ano que vem. O presidente Lula quer que o próximo governo negocie a nova regra.
Se houver aumento real para o mínimo, crescerão outros gastos do governo. A cada 1% adicional no mínimo, as despesas do governo com a Previdência, com a seguridade social e com o abono salarial e seguro-desemprego aumentarão R$ 1,46 bilhão.
===============
JORNALISMO ECONÔMICO
Os detalhes que importam
Por Rolf Kuntz
Observatório da Imprensa, 7/9/2010
Cobrir a capitalização da Petrobras tem sido um duplo desafio. Além de correr atrás da notícia, o pessoal tem suado para montar esquemas gráficos e explicar o processo montado pelo governo. Não é fácil esmiuçar, por exemplo, a cessão onerosa de cinco bilhões de barris de petróleo da União, a forma de converter em dinheiro essa participação e a relação contábil entre a empresa e o Estado. De modo geral, a imprensa tem conseguido realizar a tarefa. De vez em quando, algum jornal se adianta. A Folha de S.Paulo, por exemplo, informou em manchete a discussão sobre o campo inicialmente escolhido para a cessão à Petrobras. A reserva desse campo – Franco – poderia ser menor que os cinco bilhões de barris.
Foi um belo ponto. Não houve desmentido e o arranjo oficial, anunciado poucos dias depois, envolveu a cessão de seis campos e, além disso, um sétimo, o de Peroba, foi escolhido como reserva e precaução. Os jornais informaram com vários dias de antecedência o preço provável do barril de petróleo: US$ 8,50 ou algo muito próximo. Seria a média aritmética dos valores extremos sugeridos por duas consultorias, uma contratada pela Petrobras (US$ 5), outra pela Agência Nacional do Petróleo (US$ 12).
O valor finalmente informado pelo governo foi US$ 8,51. Esse preço foi apresentado como a média ponderada dos valores estimados para cada um dos seis campos. Foi uma coincidência extraordinária. Escreverá uma das melhores histórias do ano – e certamente uma das mais divertidas – quem contar como foram estimados o potencial de cada campo e o preço do petróleo de cada um e quem orientou o trabalho.
Manobras contábeis
O esquema de transferência dos cinco bilhões de barris foi apresentado oficialmente na quarta-feira (1/9). No dia seguinte a Petrobras anunciou os primeiros detalhes do lançamento de ações. Na sexta-feira (3), só o Valor Econômico deu um bom resumo das novas informações, com a estimativa de captação de cerca de R$ 128 bilhões. Os outros jornais tiveram provavelmente problema de horário e só publicaram no sábado o resumo do prospecto.
O governo tem montado uma complicada arquitetura financeira para levar adiante seus planos sem comprometer, pelo menos de forma ostensiva, a meta fiscal. Os arranjos diretos entre a União e a Petrobras são apenas parte desse esforço. Os esquemas de capitalização da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também são exemplos de criatividade, com transferências de ações de estatais e até de direitos do Tesouro sobre futuros dividendos.
Quatro jornais citaram os fatos, na edição de quarta-feira (1/9). A história mais detalhada foi escrita por Adriana Fernandes e Fabio Graner, do Estado de S.Paulo. Conseguiram descrever os lances contábeis e mostrar como o Tesouro ainda conseguiria melhorar suas contas com uma receita não-tributária.
Dados confusos
Os dois outros grandes assuntos da mesma semana foram a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central e a divulgação das contas nacionais do segundo trimestre – e, portanto, do primeiro semestre completo.
O Copom simplesmente manteve os juros básicos em 10,75%, sem surpresa para os analistas econômicos. Porta-vozes do setor privado também reagiram como se previa: reclamaram porque o BC manteve os juros, em vez de cortá-los. Apesar da previsibilidade, os meios de comunicação gastaram o espaço e o tempo habituais com essas declarações.
As contas nacionais, divulgadas na sexta-feira (3/9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram noticiadas em matérias amplas, mas sem novidade no tratamento. As imprecisões também foram as de sempre. O Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre foi 8,8% maior que o de igual período do ano passado. Segundo os jornais, o PIB cresceu 8,8% no período de abril a junho e 8,9% no primeiro semestre. Não tem sentido, em casos como esses, o verbo "crescer". Pode-se usar esse verbo quando se trata de períodos consecutivos: no segundo trimestre o PIB cresceu 1,2% em relação ao primeiro e 4,9% em termos anualizados. Da mesma forma, o PIB cresceu 5,1% nos últimos quatro trimestres sobre os quatro imediatamente anteriores.
Também ocorreu, pelo menos em alguns jornais, uma confusão nos dados sobre o investimento. O valor investido no segundo trimestre foi 26,5% maior que o de um ano antes. Houve quem falasse em recorde de investimento. Mas o recorde foi apenas a diferença entre aqueles dois valores. A taxa de investimento (medida em relação ao PIB) foi 17,9% foi maior que a do segundo trimestre de 2009 (15,8%), mas inferior à do mesmo período de 2008 (18,4%).
Cuidar desses detalhes não é preciosismo.
terça-feira, 7 de setembro de 2010
A grande ilusão do socialismo e dos socialistas - Mauricio Tragtenberg
A grande ilusão do socialismo e dos socialistas - Mauricio Tragtenberg
Paulo Roberto de Almeida
Fui aluno, talvez discípulo, mas certamente amigo de Maurício Tragtenberg, com o qual convivi em meus anos de formação acadêmica. Dele obtive a melhor inspiração de leituras e reflexões, como ocorreu com tantos outros jovens que também foram seus alunos e que com ele conviveram dos anos 1960 aos 1990, nas diversas escolas e faculdades em que ele lecionou. Como todos, eu tinha o maior respeito pelo mestre, pelas suas aulas e ensinamentos, o que não quer dizer que acatei totalmente suas ideias e concepções.
No começo, sim, tendíamos a concordar com ele, pois éramos todos socialistas, quase todos marxistas, alguns libertários, como ele, o que não era difícil no ambiente universitário daqueles tempos – talvez mesmo hoje –, ainda mais no contexto da ditadura militar vivida pelo Brasil dos anos 1960 aos 80.
Estas rememorações me vieram à mente ao ler uma resenha feita por Antonio Ozaí na Espaço Acadêmico de setembro de 2010. Destacou ele um trecho de um dos livros – o qual já tinha lido em edição anterior – agora reeditado graças aos esforços de seus seguidores, alunos, discípulos. Assim reza o trecho:
"É pela socialização dos meios de produção controlados pela classe operária organizada em suas organizações diretamente representativas, que é possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem."
In: Mauricio Tragtenberg: O capitalismo no século XX (2ª. ed. revisada e ampliada. São Paulo: Editora UNESP, 2010; Coleção Maurício Tragtenberg, 186p.), p.170-171.
Ao ler esse trecho, constato que nesses poucos argumentos estão resumidos, de forma muito transparente, a grande tragédia do socialismo e dos socialistas, incluindo, portanto, o próprio Mauricio Tragtenberg. Rememoro meu último encontro com ele, exatamente como ocorreu, e depois retomo o argumento substantivo.
Fui visitar Mauricio Tragtenberg em sua casa, em meados dos anos 1980, depois de longos oito anos de intervalo, ao ter voltado de minha segunda estada na Europa, e depois de ter conhecido praticamente todos os socialismos reais, aliás, os únicos existentes. Tinha também conhecido um socialismo “surreal’ na Iugoslávia, a última réstia de esperança para aqueles que, como ele, valorizavam não o socialismo burocrático, centralizado, mas a sua vertente auto-gestionária, supostamente mais benigna ou pretensamente mais “funcional” (já que seria isento dos pecados do excesso de centralismo e de burocratismo estatal).
De forma puramente factual, pude confirmar, para decepção do velho mestre, que, em qualquer da modalidades, o socialismo não funcionava como modo de produção econômica, e menos ainda como forma de organização social. O sistema simplesmente não conseguia fornecer à população bens de uso corrente (esqueçamos produtos mais sofisticados), na quantidade e na qualidade requeridas
Se formos, então, analisar seu desempenho na área política, e nessa vertente a questão crucial das liberdades, seria forçoso concluir que TODAS as experiências socialistas redundaram em fracassos absolutos, já que todas elas recorreram à mais violenta das tentativas de remodelação social conhecidas na história, e todas conduziram a sistemas autoritários, quando não totalitários, e a uma opressão ainda maior do que aquela existente nos antigos sistemas feudais ou capitalistas.
Portanto, ao reler o velho mestre, nas linhas selecionadas na resenha, que acreditava que seria:
“...possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem”
o que eu teria a dizer-lhe, novamente – e que já tinha dito diretamente a ele, em minha volta do socialismo – seria que, NÃO, infelizmente, essa passagem não é possível, pois NENHUMA sociedade planificada centralmente, no sentido socialista – ou seja, sem garantir a propriedade privada dos meios de produção – JAMAIS conseguiu preservar as liberdades básicas do homem.
Sorry, velho mestre, mas a História não esteve consigo, nesse particular, ou seja, não caminhou no sentido desejado por tantos libertários e outros sonhadores socialistas. Não se trata de falhas teóricas dos socialistas ou de incapacidade organizacional de seus movimentos de massa, e sim de impedimentos estruturais que têm a ver com as prescrições formuladas para a organização econômica da sociedade, de uma contradição primária, como diriam os “sábios” da academia soviética.
Tudo isso não me impede de saudar a enorme erudição do mestre, agradecer-lhe, sempre, as inúmeras lições intelectuais que recebi dele, as infinitas recomendações bibliográficas e de leitura, e aquele fino gosto pela ironia que era a marca registrada de Mauricio Tragtenberg.
Grato por tudo, velho mestre, mesmo estando do outro lado do processo histórico, do lado da utopia, esta era formulada com a melhor das intenções, e você foi um homem verdadeiramente digno, honesto intelectualmente, uma personalidade admirável. Minha homenagem a um educador exemplar.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 8 de setembro de 2010)
Paulo Roberto de Almeida
Fui aluno, talvez discípulo, mas certamente amigo de Maurício Tragtenberg, com o qual convivi em meus anos de formação acadêmica. Dele obtive a melhor inspiração de leituras e reflexões, como ocorreu com tantos outros jovens que também foram seus alunos e que com ele conviveram dos anos 1960 aos 1990, nas diversas escolas e faculdades em que ele lecionou. Como todos, eu tinha o maior respeito pelo mestre, pelas suas aulas e ensinamentos, o que não quer dizer que acatei totalmente suas ideias e concepções.
No começo, sim, tendíamos a concordar com ele, pois éramos todos socialistas, quase todos marxistas, alguns libertários, como ele, o que não era difícil no ambiente universitário daqueles tempos – talvez mesmo hoje –, ainda mais no contexto da ditadura militar vivida pelo Brasil dos anos 1960 aos 80.
Estas rememorações me vieram à mente ao ler uma resenha feita por Antonio Ozaí na Espaço Acadêmico de setembro de 2010. Destacou ele um trecho de um dos livros – o qual já tinha lido em edição anterior – agora reeditado graças aos esforços de seus seguidores, alunos, discípulos. Assim reza o trecho:
"É pela socialização dos meios de produção controlados pela classe operária organizada em suas organizações diretamente representativas, que é possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem."
In: Mauricio Tragtenberg: O capitalismo no século XX (2ª. ed. revisada e ampliada. São Paulo: Editora UNESP, 2010; Coleção Maurício Tragtenberg, 186p.), p.170-171.
Ao ler esse trecho, constato que nesses poucos argumentos estão resumidos, de forma muito transparente, a grande tragédia do socialismo e dos socialistas, incluindo, portanto, o próprio Mauricio Tragtenberg. Rememoro meu último encontro com ele, exatamente como ocorreu, e depois retomo o argumento substantivo.
Fui visitar Mauricio Tragtenberg em sua casa, em meados dos anos 1980, depois de longos oito anos de intervalo, ao ter voltado de minha segunda estada na Europa, e depois de ter conhecido praticamente todos os socialismos reais, aliás, os únicos existentes. Tinha também conhecido um socialismo “surreal’ na Iugoslávia, a última réstia de esperança para aqueles que, como ele, valorizavam não o socialismo burocrático, centralizado, mas a sua vertente auto-gestionária, supostamente mais benigna ou pretensamente mais “funcional” (já que seria isento dos pecados do excesso de centralismo e de burocratismo estatal).
De forma puramente factual, pude confirmar, para decepção do velho mestre, que, em qualquer da modalidades, o socialismo não funcionava como modo de produção econômica, e menos ainda como forma de organização social. O sistema simplesmente não conseguia fornecer à população bens de uso corrente (esqueçamos produtos mais sofisticados), na quantidade e na qualidade requeridas
Se formos, então, analisar seu desempenho na área política, e nessa vertente a questão crucial das liberdades, seria forçoso concluir que TODAS as experiências socialistas redundaram em fracassos absolutos, já que todas elas recorreram à mais violenta das tentativas de remodelação social conhecidas na história, e todas conduziram a sistemas autoritários, quando não totalitários, e a uma opressão ainda maior do que aquela existente nos antigos sistemas feudais ou capitalistas.
Portanto, ao reler o velho mestre, nas linhas selecionadas na resenha, que acreditava que seria:
“...possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem”
o que eu teria a dizer-lhe, novamente – e que já tinha dito diretamente a ele, em minha volta do socialismo – seria que, NÃO, infelizmente, essa passagem não é possível, pois NENHUMA sociedade planificada centralmente, no sentido socialista – ou seja, sem garantir a propriedade privada dos meios de produção – JAMAIS conseguiu preservar as liberdades básicas do homem.
Sorry, velho mestre, mas a História não esteve consigo, nesse particular, ou seja, não caminhou no sentido desejado por tantos libertários e outros sonhadores socialistas. Não se trata de falhas teóricas dos socialistas ou de incapacidade organizacional de seus movimentos de massa, e sim de impedimentos estruturais que têm a ver com as prescrições formuladas para a organização econômica da sociedade, de uma contradição primária, como diriam os “sábios” da academia soviética.
Tudo isso não me impede de saudar a enorme erudição do mestre, agradecer-lhe, sempre, as inúmeras lições intelectuais que recebi dele, as infinitas recomendações bibliográficas e de leitura, e aquele fino gosto pela ironia que era a marca registrada de Mauricio Tragtenberg.
Grato por tudo, velho mestre, mesmo estando do outro lado do processo histórico, do lado da utopia, esta era formulada com a melhor das intenções, e você foi um homem verdadeiramente digno, honesto intelectualmente, uma personalidade admirável. Minha homenagem a um educador exemplar.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 8 de setembro de 2010)
Declaracao de voto: pequenas regras contrarianistas...
Declaração de voto: dez pequenas regras contrarianistas
Paulo Roberto de Almeida
Espaço Acadêmico (ano 10, n. 112, setembro 2010, p. 80-87). Publicados n. 989.
Resumo: Considerações sobre a conjuntura política brasileira e declaração de natureza moral sobre o processo eleitoral, contendo posturas contrarianistas ao ambiente de degradação institucional que caracteriza a campanha eleitoral.
Palavras-chaves: política brasileira; campanha eleitoral; atitude dos candidatos.
Não! Contrariamente ao que diz o título do artigo, não vou declarar o meu voto na urna, nas próximas eleições, para qualquer candidato que seja, do mais humilde concorrente a conselheiro municipal – cargo, aliás, que não está em causa desta vez; mas este texto vale também para os vereadores – aos mais ambiciosos pretendentes ao cargo supremo na Nação. Não é esse o objetivo a que aspira este pequeno ensaio, cuja única intenção é a de fixar alguns parâmetros pelos quais eu vou decidir o meu voto, independente de qual seja ele. Não vou definir agora quais são, ou serão, meus candidatos preferenciais em outubro de 2010, nem pretendo influenciar os leitores ou lhes sugerir um nome ou outro dentre os candidatos em liça. Trata-se aqui, apenas e tão somente, de uma declaração de cunho “moral”.
Os que me lêem habitualmente, neste espaço ou em outro qualquer, e os que por acaso passarem por aqui ou vierem a tomar conhecimento deste ensaio, podem ficar seguros de que não faço, nunca fiz, jamais farei propaganda para alguém, para qualquer candidato, de qualquer partido, tanto porque nunca pertenci a qualquer um deles, jamais pretendo ingressar em algum, nem milito por alguma causa política institucional. Meus poucos objetivos na vida cívica são: os de querer a política da verdade e o simples respeito à lógica; de manter um compromisso intransigente com a honestidade – acima de tudo intelectual, mas também política –, metas que podem ser complementadas pelo engajamento na causa das liberdades democráticas e pela luta sem qualificativos pelos direitos humanos, sem qualquer concessão a ditaduras, ou a ditadores, caudilhos, líderes populistas, aos embromadores políticos habituais e outros patifes eleitorais. Pode parecer antiquado, mas é o que me basta.
Sendo assim – certo de que o que vai acima ficou muito claro – devo talvez começar por dizer, não exatamente quais são os meus parâmetros de escolha eleitoral, pois existem muitas variáveis envolvidas, mas iniciar pelos elementos de fato e pelas situações políticas que rejeito absolutamente, pois eles já fornecem uma base de julgamento sobre o quê, exatamente, vai determinar o meu voto e as minhas escolhas eleitorais no escrutínio de outubro de 2010. A rejeição de certos “pecados” políticos pode representar uma preparação para o estabelecimento ulterior de uma plataforma de “acolhimento” do que eu chamaria de “boas virtudes” na vida cívica e política. Vou, portanto, limitar-me a fazer uma pequena lista negativa sobre o que me parece constituir um conjunto de “pecados originais” no atual jogo eleitoral.
1. Sou contra os simplismos eleitorais
(...)
2. Sou contrário aos reducionismos políticos
(...)
3. Sou contra populismos e demagogias
(...)
4. Sou contra os exercícios de mistificação política
(...)
5. Sou contra os imitadores e falsificadores de todo tipo
(...)
6. Sou contra a lei dos benefícios imediatos, sem pesar os custos no futuro
(...)
7. Sou contra a embromação, a mentira, a propaganda enganosa
(...)
8. Sou contra paternalismos e pretensas familiaridades
(...)
9. Sou contra políticos de duas faces e que praticam ambiguidades
(...)
10. Sou contra a utilização de símbolos populares para fins de exploração política, inclusive a religião, supostos artistas populares, figuras do passado, etc.
(...)
Para ler o texto publicado ver neste link.
Para o texto original, com uma última parte que foi publicada em separado, ver aqui : “Declaração de voto: um manifesto quase marxista”,
Blog Textos PRA (link).
Paulo Roberto de Almeida
Espaço Acadêmico (ano 10, n. 112, setembro 2010, p. 80-87). Publicados n. 989.
Resumo: Considerações sobre a conjuntura política brasileira e declaração de natureza moral sobre o processo eleitoral, contendo posturas contrarianistas ao ambiente de degradação institucional que caracteriza a campanha eleitoral.
Palavras-chaves: política brasileira; campanha eleitoral; atitude dos candidatos.
Não! Contrariamente ao que diz o título do artigo, não vou declarar o meu voto na urna, nas próximas eleições, para qualquer candidato que seja, do mais humilde concorrente a conselheiro municipal – cargo, aliás, que não está em causa desta vez; mas este texto vale também para os vereadores – aos mais ambiciosos pretendentes ao cargo supremo na Nação. Não é esse o objetivo a que aspira este pequeno ensaio, cuja única intenção é a de fixar alguns parâmetros pelos quais eu vou decidir o meu voto, independente de qual seja ele. Não vou definir agora quais são, ou serão, meus candidatos preferenciais em outubro de 2010, nem pretendo influenciar os leitores ou lhes sugerir um nome ou outro dentre os candidatos em liça. Trata-se aqui, apenas e tão somente, de uma declaração de cunho “moral”.
Os que me lêem habitualmente, neste espaço ou em outro qualquer, e os que por acaso passarem por aqui ou vierem a tomar conhecimento deste ensaio, podem ficar seguros de que não faço, nunca fiz, jamais farei propaganda para alguém, para qualquer candidato, de qualquer partido, tanto porque nunca pertenci a qualquer um deles, jamais pretendo ingressar em algum, nem milito por alguma causa política institucional. Meus poucos objetivos na vida cívica são: os de querer a política da verdade e o simples respeito à lógica; de manter um compromisso intransigente com a honestidade – acima de tudo intelectual, mas também política –, metas que podem ser complementadas pelo engajamento na causa das liberdades democráticas e pela luta sem qualificativos pelos direitos humanos, sem qualquer concessão a ditaduras, ou a ditadores, caudilhos, líderes populistas, aos embromadores políticos habituais e outros patifes eleitorais. Pode parecer antiquado, mas é o que me basta.
Sendo assim – certo de que o que vai acima ficou muito claro – devo talvez começar por dizer, não exatamente quais são os meus parâmetros de escolha eleitoral, pois existem muitas variáveis envolvidas, mas iniciar pelos elementos de fato e pelas situações políticas que rejeito absolutamente, pois eles já fornecem uma base de julgamento sobre o quê, exatamente, vai determinar o meu voto e as minhas escolhas eleitorais no escrutínio de outubro de 2010. A rejeição de certos “pecados” políticos pode representar uma preparação para o estabelecimento ulterior de uma plataforma de “acolhimento” do que eu chamaria de “boas virtudes” na vida cívica e política. Vou, portanto, limitar-me a fazer uma pequena lista negativa sobre o que me parece constituir um conjunto de “pecados originais” no atual jogo eleitoral.
1. Sou contra os simplismos eleitorais
(...)
2. Sou contrário aos reducionismos políticos
(...)
3. Sou contra populismos e demagogias
(...)
4. Sou contra os exercícios de mistificação política
(...)
5. Sou contra os imitadores e falsificadores de todo tipo
(...)
6. Sou contra a lei dos benefícios imediatos, sem pesar os custos no futuro
(...)
7. Sou contra a embromação, a mentira, a propaganda enganosa
(...)
8. Sou contra paternalismos e pretensas familiaridades
(...)
9. Sou contra políticos de duas faces e que praticam ambiguidades
(...)
10. Sou contra a utilização de símbolos populares para fins de exploração política, inclusive a religião, supostos artistas populares, figuras do passado, etc.
(...)
Para ler o texto publicado ver neste link.
Para o texto original, com uma última parte que foi publicada em separado, ver aqui : “Declaração de voto: um manifesto quase marxista”,
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