Guedes diz que Brasil pode sair do Mercosul se Kirchner vencer eleição e fechar economia da Argentina
'Desde quando o Brasil precisou da Argentina?' pergunta ministro sobre o país que é o terceiro maior parceiro comercial brasileiro
Leo Branco
O Globo, 15/08/2019 - 16:23 / Atualizado em 15/08/2019 - 22:04
SÃO PAULO - O ministro Paulo Guedes disse nesta quinta-feira que o Brasil pode sair do Mercosul caso a candidatura do peronista Alberto Fernández, em que a ex-presidente Cristina Kirchner é candidata a vice, vença as eleições presidenciais da Argentina, marcadas para outubro.
— Não podemos ficar pendurados na crise da Argentina. O Mercosul, claro, é um veículo de inserção do Brasil no comércio internacional. Mas, se a (Cristina) Kirchner quiser entrar e fechar a economia deles? Se quiser fechar a gente sai do Mercosul. Se ela quiser ficar aberta? Beleza, continuamos. O Brasil é uma economia continental. Temos que recuperar a nossa economia — disse Guedes, em evento a empresários e investidores promovido pelo banco Santander, em São Paulo.
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Para Guedes, uma continuidade do governo Macri facilitaria a abertura comercial do Brasil, inclusive com os Estados Unidos, por causa da proximidade entre Macri, Bolsonaro e o presidente americano Donald Trump.
— Evidentemente há química excelente do (Mauricio) Macri com o presidente Bolsonaro, e os dois com Trump. Isso tudo facilita as coisas (para uma abertura comercial). Agora, o destino é dos argentinos. Nós somos um país continental e precisamos resolver a nossa dinâmica de crescimento. Desde quando o Brasil precisou da Argentina? — disse Guedes, dizendo que o governo tem preocupação “zero” com um eventual aprofundamento da crise no país vizinho.
À tarde, em palestra durante seminário de gás natural no Rio, Guedes disse que não teme efeitos de uma eventual crise na Argentina ou no mundo, e que o Brasil poderá se aproveitar de eventuais oportunidades em tal cenário — promovendo, por exemplo, o crescimento da atividade de setores da indústria.
— Não vai ser nenhum ventinho do Sul, ou ventania do mundo inteiro que vai dessincronizar o Brasil — disse Guedes. — Não tenho nenhuma preocupação. É evidente que, quando se tem o vento favorável, fica melhor para o país. Mas nós temos muita convicção de que a dinâmica de crescimento da economia brasileira é própria. O Brasil é uma economia continental. Durante os últimos 15 anos o mundo estava crescendo aceleradamente e nós não estávamos participando disso. Agora pode ser o contrário, o mundo pode desacelerar e podemos acelerar.
De acordo com o ministro, o país sempre teve uma dinâmica própria de crescimento.
— O Brasil foi até um pouco desindustrializado durante o período em que o câmbio se valorizou — disse Guedes. — Agora pode ser o contrário, se o mundo desacelera e caem os preços das commodities, o dólar pode subir um pouco menos e em compensação, com energia mais barata e o câmbio um pouco mais alto, você vai reindustrializar vários setores, como autopeças, móveis, sapatos, indústria têxtil. Nós não devemos temer o efeito contágio, o Brasil tem uma dinâmica própria. É uma ventania que incomoda um pouquinho.
A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, depois da China e dos Estados Unidos. Atualmente, a Argentina compra mais do Brasil do que países como Alemanha e Holanda, e é a principal compradora de produtos manufaturados brasileiros.
No domingo, a candidatura de Fernández ficou com 47% dos votos nas primárias obrigatórias, uma espécie de prévia da votação de 27 de outubro. A chapa do presidente Maurício Macri, de cunho liberal, ficou com 32% dos votos.
O fraco desempenho de Macri, muito abaixo das previsões de analistas, provocou pânico no mercado financeiro na Argentina e com repercussões no Brasil. O risco, para muitos analistas, é de que a volta de Cristina ao poder prejudique a abertura comercial e a liberalização econômica promovida por Macri e, também, o acordo comercial assinado entre Mercosul e a União Europeia, assinado em julho.
Guedes avaliou ainda que o Brasil está preparado para a turbulência global causada pela guerra comercial entre Estados Unidos e China, e agravada entre os países do Mercosul pela incerteza causada pelo resultado pré-eleitoral da Argentina. Para o ministro, a economia brasileira tem uma “dinâmica de crescimento própria” por ser uma das mais fechadas do mundo.
— Vamos continuar abrindo a nossa economia. Não somos dependentes da crise. Fechamos a nossa economia e por isso somos uma ilha, temos uma dinâmica própria de crescimento — disse à plateia.
Mais cedo, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não quis fazer uma previsão sobre o futuro do Mercosul caso Alberto Fernández vença a eleição presidencial na Argentina. Fernández e Cristina são tratados por Jair Bolsonaro como “ bandidos de esquerda ”. Em resposta, o candidato da oposição argentina chamou o brasileiro de "racista, misógino e violento".
— Temos que ver qual a plataforma que eles trariam nesta hipótese — disse o ministro.
Após três dias de perdas, a moeda argentina se valorizou 4,88% nesta quinta-feira, fechando a 57,10 pesos, um dia depois que Macri e o candidato opositor Alberto Fernández pediram calma aos mercados. Os papeis das empresas argentinas em Wall Street também subiram, e risco país, que mede o risco de não pagamento da dívida, caiu 8,5%, para 1.780 pontos — uma queda de 166 pontos em relação ao fechamento anterior.
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